De onde que Jethro tinha tirado a ideia de que eu seria uma boa mãe? Uma criança não está nos meus planos. Nunca esteve! Eu tenho toda a minha carreira traçada, um bebê só me atrapalharia!

As pessoas precisam aprender que nem todas as mulheres nasceram para serem mães! E eu sou uma delas. Nunca seria mãe, até porque eu seria uma péssima figura materna, fui criada somente pelo meu pai, e nunca tive uma mulher de referência. Eu não faço a menor ideia de como ser mãe ou o que é ter uma mãe!

Logicamente eu não falaria nada disso pra ele. Apenas exclamei que ele era maluco e fiquei olhando meio incrédula para a hilaridade da situação. Mas mesmo assim ele me fitava como se me imaginasse com um pequeno bebê no colo. E eu tive que ignorar essa, pelo próprio bem dele!!

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Foi estranho, depois que as palavras saíram a minha boca, foi que eu realmente percebi que Jenny seria uma excelente mãe. Ela tinha jeito pra isso. Não só se conectou com a minha filha sem ao menos conhecê-la, como sabia dar os conselhos ideais para a situação.

Engraçado foi ver a sua reação. Ela pareceu descrente disso. Creio que duvida da própria capacidade, já que, pelo que ela deixou escapar, ela foi criada sem a mãe, e, talvez ela pense que isso faça dela incapaz de criar uma criança. E onde ela se engana. São situações assim que tornam os pais melhores e mais compreensíveis com os filhos.

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Tratei logo de tirar essa ideia da cabeça, às vezes as pessoas falam as coisas sem pensar. Ideias bobas essas, eu! Mãe! Haha

Logo que acabamos nossa estranha conversa, decidimos que seria uma boa hora pra reconhecer o local e aprender os melhores lugares para uma emboscada ou até mesmo para esconderijo, caso algo aconteça.

Se levarmos em consideração a diferença ente as duas cidades até agora, a pequena Positano e essa metrópole de mais de um milhão de pessoas que é Marselha, nosso trabalho poderia ser mais fácil ou não. Ao mesmo tempo em que temos muitos pontos para poder agir sem chamar atenção, também há muito mais lugares que temos que cobrir para evitar uma eventual emboscada. Ou seja, mais do que nunca precisaríamos dos três agentes trabalhando em sincronia perfeita para evitar um novo incidente.

Não sei se fico preocupada ou feliz ao ver todos estes pontos de ação. - Conjeturei alto, enquanto Gibbs e eu voltávamos ao sótão por uma rota alternativa.

— Se tudo der certo, fique feliz. Será mais fácil para ir embora.

— Você acha que podemos encerrar a missão aqui?

— Nah... esse tal de Zhukov é escorregadio, vai tentar se blindar de todas as formas até que possa confiar em nós. E isso vai levar tempo.

— Então nossa permanência na Europa está condicionada à habilidade dos analistas de perfis da NCIS. Quanto mais comprido for seu passado, melhor pra gente. Irônico.

— Mas eficiente. Só não sei se posso confiar em todos deles. Nem os conheço!

— Ha!! Não é questão de confiança nos analistas, Jethro, é só a sua aversão à tecnologia se rebelando ao fato de que sua vida depende das informações que serão devidamente colocadas na internet!

Ele nada disse. Até porque não precisava. Tecnologias e Leroy Jethro Gibbs em uma mesma frase só coexistem se o último estiver atirando na primeira. Caso contrário, alguém tem que ser o intermediário dessa conversa!

O clima acabou por ficar pesado até que chegamos aonde consideraríamos como nossa casa pelos próximos meses.

Como as únicas coisas a se fazer eram ficar de vigia ou responder à última carta de Kelly, dei a ele a opção de escolher primeiro.

— Eu fico de vigília, vá você dormir, depois trocamos.

Olhei descrente para o mínimo quarto que nos esperava. Mal cabia uma cama de casal. Suspirei alto e decidi que, já que dormir estava fora de cogitação, pelo menos, por enquanto, minha melhor opção de se ter algo para fazer era responder a carta de Kelly, o que muito provavelmente me tomaria bastante tempo, já que não tinha a menor ideia do que deveria escrever.

Então comecei, não tendo a certeza de onde minhas palavras iriam me levar:

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“França, 1998

Carta 01

Olá Kelly!!

Fico feliz que minhas palavras tenham te deixado menos preocupada! Era essa minha intenção.

Como te escrevi, já estive na sua posição. Sou filha de um Coronel do Exército, e quando eu era pequena, ou melhor, mais nova, pois não cresci tanto assim, ele vivia sendo enviado a diversas missões. Naquela época, a carta era o único meio viável de comunicação, mas meu pai nunca foi de falar muito, então eu só recebia cartas no meu aniversário e no Natal. Estranho eu sei, mas era o jeito dele. Assim, acabei me acostumando que falta de notícias era melhor do que uma péssima notícia. E espero que você entenda isso. Às vezes, não receber notícia nenhuma é a melhor das opções. Creia em mim.

Você pediu que eu te contasse mais coisas sobre mim... bem... sempre achei isso difícil... nunca fui lá uma garota de ter muitas histórias pra contar. Sempre fui na minha, tentando não ser massacrada pelas insuportáveis líderes de torcida na escola. Minha meta sempre fora ser Agente Federal. E como eu falei com seu pai algum tempo atrás, hoje pode até soar como algo importante, mas no Ensino Médio, eu era considera a louca!! Sério! Na época não liguei, meu pai me criou pra ser independente e não ligar para a opinião alheia, e foi exatamente o que fiz. E, se você quiser um conselho é a melhor coisa que você pode fazer! Seja você mesma, e não se importe com a opinião alheia! A vida é só sua!

E foi pensando assim que cheguei onde estou... e vou te dizer, não foi fácil! Mas tudo o que passei está valendo a pena.

Mas fora isso, sempre tive passatempos, e um deles é a fotografia! Como você pôde notar! Adoro tirar fotos, sempre gostei! Ainda não sou aquela fotógrafa profissional que gostaria, mas acho que, para o que quero, minhas fotos são boas. Você é quem tem que me dizer! Andou recebendo algumas delas.

Agora, quanto a uma foto minha.... isso vai ser difícil, apesar de adorar tirar fotos das outras pessoas e da paisagem ao meu redor, não gosto de tirar fotos minhas! E detesto que tirem se surpresa!! Mas, você me pediu uma. Contudo, antes de te mandar a foto - que nem tirada ainda foi - quero ver se você é boa pra descobrir como as pessoas se parecem! Isso, claro, se seu pai não me descreveu pra você! Tente a sorte na próxima carta e você só saberá se acertou quando receber a carta de número 02!!

Fique tranquila por aí!!

Beijos,

Jenny”

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Quando terminei de escrever estava sorrindo para a carta, fazia tempo que eu escrevia pra alguém. Uma certa sensação de nostalgia me atingiu. E fiquei pensando na última carta que escrevi, contando a minha maior novidade...

— Hei, Jenny, é a sua vez de ficar de vigília. - Escutei Jethro me chamar. Estava tão distraída com meus pensamentos que nem tinha percebido se essa era a primeira vez que ele me chamava ou não.

— Desculpe! Estava distraída...

— Nunca se desculpe. É um sinal de fraqueza.

— Como é?

— Regra seis.

— O que é isso de regra 06??

— Você me ouviu. Nunca se desculpe, é um sinal de fraqueza.

— É um sinal de educação!!! Pelo amor de Deus!

— Não, fraqueza. Se você fez algo, deve assumir que fez, não ficar se desculpando!

— Fico me perguntando se um dia eu irei entender essa sua cabeça doida! Me diga uma coisa, você bateu a cabeça muito forte quando era pequeno para ser assim?

— Sua hora de vigiar. Vou dormir.

— Mentira! Você vai é escrever para a Kelly - soltei essa vitoriosa.

Recebi um grunhido de resposta, mas não esperava outra coisa, mesmo. E ele seguiu para o quarto. Mas pouco tempo depois voltou e um ar curioso estava estampado em suas feições.

— Afinal, em que mundo você estava dessa vez?

— Repete.

— Não vai ser educada?

— Você disse que é sinal de fraqueza! Não vou quebrar a sua preciosa regra! Falando nisso, tenho que anotá-la?

— Não sei como você sobreviveu todo esse tempo sendo tão chata, Shepard!

— Pode soar estranho para você, Gibbs, mas existem pessoas que gostam de mim! Calma! Não fique tão assustado assim! - eu não poderia perder a oportunidade de rir da cara dele!

— No que você estava pensando? - ele estava claramente perdendo a paciência! Era a primeira vez que eu conseguia fazê-lo chegar a esse ponto.

— Não é da sua conta! Agora vá ter o seu sono de beleza, vai! É o meu turno!

— Olha aqui, cuidado com o que você escreve para a minha filha. Ela pode até ter te mandado uma carta, mas não se esqueça, ela é minha filha e só tem quinze anos!

— Hei! Calma! - eu não contive a gargalhada do tanto de ciúmes e proteção que emanavam das suas palavras - Eu sei que ela é uma adolescente e eu não vou escrever nada de demais, papai coruja! Eu estava lembrando da última vez em que eu escrevi uma carta!

— Ah! Era isso?

— Sim! - eu ainda ria da cara dele, enquanto ele ficava ainda mais sem graça.

— Foi há tanto tempo assim pra você ficar com esse ar de saudades.

— Não foi há tanto tempo. Mas toda essa saudade não é para o fato de ter escrito uma carta, mas sim para quem eu escrevi.

— Você não me parece uma mulher que fica mandando cartas para o namorado. Mas sortudo ele.

— Jethro! Você não existe! Foi para o meu pai! E a situação foi mais ou menos igual a essa que a Kelly está vivendo!! - eu agora ria com vontade! Tadinho! Ele não tinha culpa! Mas a conversa tomou um rumo tão inesperado e ele estava tão sem graça, mas tão fofo ao mesmo tempo, que não tive outra opção a não ser rir dele!

— Seu pai? E por que não escreve para ele mais?

Agora quem não queira continuar a conversa era eu.

— Ele já se foi. - Sussurrei, e foi tudo o que pude responder.

Jethro apenas meneou a cabeça em minha direção e, ao invés de sair e ir pra o quarto dormir como ele havia dito anteriormente, pegou o bloco de folhas e a caneta que eu usara, começando sua carta para Kelly. E eu fiquei a sós com meus pensamentos, de novo. Melhor acontecer algo do outro lado da rua ou eu vou acabar surtando, detesto reviver o passado.

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“Algum lugar da Europa, 1998

Carta 06

Filha,

Recebi a sua carta e notei que você não me respondeu se eu acertei ou não a profissão que você escolheu seguir. Vai fazer suspense até quando?

Fico feliz que tenha gostado do seu passeio à Stillwater, mesmo lá não tendo muitas coisas para se fazer para alguém da sua idade. Quanto às perguntas que me fez, seguindo o conselho de alguém, vou respondê-las pessoalmente, tem muita coisa envolvida ali, Kelly, que eu teria que parar e te explicar com detalhes, algumas eu creio que você não irá gostar de saber, outras talvez você possa me dar sua opinião.

Vi que mandou uma carta para a Shepard, sobre o que ela era? Jenny até me ofereceu para lê-la, mas não quis. Se você não quiser me contar, tudo bem, mas olhe lá o que anda escrevendo! Não vá falando coisas que irá se arrepender depois!

Como já te disse, não posso te dar detalhes da missão, só que nosso cronograma inicial continua o mesmo.

Já tem algum plano para as férias de verão? Pois estão chegando. E você sempre tem mil e um ideias.

Espero que sua avó esteja sendo uma pouco mais compreensível com você e tenha parado de comparar com a sua mãe.

Falando em comparações, não gostei nada das fotos. Principalmente a minha. Aliás, gostei da foto da sua mãe, estava precisando de uma dela comigo. E também não entendi a sua surpresa ao ver a minha foto. Nem sempre tive o cabelo branco, e detesto te dar notícias ruins, mas é uma condição genética, que só os primogênitos da família Gibbs tem, então se prepare, pois sendo você filha única, é o seu futuro ficar com a cabeça toda branca e isso será mais cedo do que pensa. Quanto a sua foto, notei sim a diferença, e esse corte de cabelo caiu bem em você, apesar de que prefiro seu cabelo quando está comprido, mas você fica bonita de qualquer jeito!

Sinto a sua falta.

Papai”

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Eu suspirei olhando para as fotos. Shannon... o baile de formatura. E tudo o que o pós festa acarretou... até hoje não sei se foi a melhor das ideia termos saído daquele jeito, pelo menos não para ela. Já eu, se ficasse, com certeza seria preso.

Fiquei olhando para o grande amor de minha vida e para a foto recente da minha filha, e fiz aquilo que jurei que não faria quando Shannon se foi. Comparei as duas. Kelly herdara o mesmo formato de rosto da mãe, e estava ficando parecida com ela fisicamente, mas eu tinha que estragá-la. Cabelos e olhos meus. Por que não os da mãe? Por quê?

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Jethro estava há um bom tempo olhando em direção à quatro fotos. Kelly também tinha lá o seu meio de colocá-lo a par do que estava fazendo.

Não queria ser curiosa, mas eu realmente estava com fome e o único caminho para a geladeira era passar atrás dele. Quando cheguei perto, afinal, pensei que ele notaria a minha presença, se não por mim mesma, seria pelo barulho de meus sapatos que ele odiava tanto, achei que ele abaixaria ou viraria para o outro lado, mas ele não o fez, ficou simplesmente ali, olhando. Fitava com tanto amor a pessoa que lá estava que fiquei sem graça.

Então notei, eram duas fotos, uma de uma adolescente de cabelos castanhos na altura dos ombros, um lindo sorriso e olhos azuis. Azuis iguais aos dele. E na outra foto, uma mulher, fisicamente parecida com a garota da primeira foto, porém, tinha grandes olhos castanhos claros e cabelos ruivos. Um tom de ruivo mais escuro que os meus próprios cabelos. Deduzi, então, que eram Kelly e Shannon, e que a garota era a mistura exata dos pais.

— Ela é uma linda menina! Tem seus olhos! E aposto que a cor dos cabelos também é sua... apesar de que não posso ter certeza...

Quando falei, Jethro saiu de seu mundinho particular e, meio assustado, olhou em minha direção. Antes de falar, piscou duas vezes, como se para ter certeza de quem falara com ele.

— Certeza do que? – Ele disse, ainda meio confuso.

— Da cor do seu cabelo! Não dá pra saber!

— Até você!

— Kelly também brincou com isso? Gosto mais dela a cada dia! – Era bom ter algo para me distrair.

— Ainda bem que vocês duas estão separadas por muitos quilômetros!

— Senão o que?

— Eu atirava em você!

— Em mim? – Eu pisquei inocentemente na sua direção – Cuidado, Gibbs, a recíproca pode ser verdadeira e pode acontecer mais cedo do que você pensa – Disse em um tom ameaçador.

— Veremos quem vai atirar primeiro. – Ele me desafiou.

— Isso é uma aposta?

— Sim. – E ele me ofereceu a mão.

— Aceito. – Apertei a mão dele. – Agora é oficial, queremos matar um ao outro. – Eu disse rindo e ele me acompanhou com um pequeno sorriso.

Após essa pequena demonstração de carinho mútuo, ele pegou a carta e as fotos e rumou para o quarto. Uma das fotos, a que eu tinha certeza de ser da ex esposa falecida, ficou na mesa. Resolvi que não estava satisfeita de perturbá-lo tão pouco, então fui entrega a foto pessoalmente.

— Ei, vê se não bagunça essa suíte presidencial, porque eu também vou dormir aqui! Cada um no seu lado da cama! E você esqueceu essa foto aqui. – Estendi-a na sua direção enquanto eu ficava preguiçosamente apoiada no batente da porta.

Ele suspirou alto, não sei se foi pelo que disse ou pela figura da fotografia.

— Um de nós dois vai voltar bem antes do fim da missão para os EUA... disso eu tenho certeza.

— Não sabia que você estava tão animado para ficar livre de mim, Jethro! Agora se me der licença, tenho uma vigília para fazer – e antes de me virar para a porta, tomando cuidado em não topar a perna no pé da cama, fiz uma continência na direção do meu parceiro.

Escutei um grunhido vindo do quarto, eu tinha conseguido mais uma vez... ele ficara com raiva.

— Shepard 2. Gibbs 0. Cantarolei já na janela.

— Não por muito tempo. – Ele gritou do quarto.

E assim, uma parte da noite tinha se passado.

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— Zukhov não sai desse maldito esconderijo. – Suspirei enquanto reclamava.

— Não te falaram que paciência é a virtude mais necessária em missões assim? – Jethro me respondeu assim que pisou na sala, vindo de um banho rápido.

— Sim, me avisaram, Senhor Sabe Tudo! – É que é atípico até mesmo para um traficante de armas/negociante de pessoas/ mau caráter como ele ficar tanto tempo preso dentro de um maldito barco! O que se tem para fazer dentro de um barco? – estava tão indignada que levantei os braços para o teto.

— Não é um barco, é um iate, e posso te garantir que é bem maior que esse sótão onde estamos – ele tinha um sorriso em minha direção como se estivesse rindo da minha incapacidade de saber que modelo de barco era aquele que estávamos observando.

— Que seja. O cara não saiu dali nos dois últimos dias!

— E nem nós daqui! Dê tempo ao tempo, Shepard. Qualquer movimento brusco toda essa operação já era.

— Me rendo! Você venceu. Sua vez de pegar a vigília. Eu estou morta de sono, e já são quase três da manhã.

— Não tome toda cama para você como fez na noite passada, eu também durmo ali. – Ele disse repetindo as minhas palavras de duas noites atrás.

— Tudo bem. Só cuidado quando for deitar. Você quase me esmagou ontem! – Se era para reclamar eu também tinha o meu arsenal.

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Estávamos acampados naquele lugar minúsculo a mais de uma semana, e nada de qualquer vislumbre de Zukhov. Pessoas entravam e saiam daquele iate o tempo todo, mas nenhuma delas era ele.

Chegamos a desconfiar que pudesse estar disfarçado, mas nem o reconhecimento facial vindo de Washington nos contradisse.

Se por esse lado as coisas estavam ruins, no quesito “habitação” estava pior ainda.

Jethro e eu estávamos dividindo o quarto, agora nos mesmos horários. Notamos depois de quase dez dias de vigília que, após duas da manhã, ninguém entra ou sai daquele barco. Então, começamos a estipular nossa observação nos turnos em que sabíamos que haveria gente entrando e saindo. O que significava que agora nós dois estávamos, também, dividindo a cama. E céus, esse é o problema!

Jethro não para de mexer! A noite inteira ele se vira na cama como se estivesse dentro de um pesadelo que não tem fim, e isso tem tirado o meu sono. Há duas noites que não durmo... e isso está afetando diretamente o meu humor!

— Bom dia, Jen! – ele veio com a carinha de quem havia dormido a noite inteira e me passou pela cabeça responder com o famigerado: “bom dia para quem?” Mas não o fiz.

— Dia, Jethro. – e foi impossível conter o bocejo que acompanhou a última vogal do seu nome.

— Não anda dormindo bem? – Sua preocupação parecia sincera, mas mesmo assim preferi não arriscar...

— Calor... estamos no meio do verão, dividindo uma cama minúscula. E não tem sido fácil com essa onda de calor, conseguir dormir...

— Não é o que parece, você resmunga coisas inteligíveis a noite inteira. Não tem como você falar sozinha durante toda a noite, então, sim, você está dormindo a noite toda!

Eu vi vermelho. Como ele ousa falar assim!

-E você não para quieto! Remexe a noite inteira e não me deixa dormir. Talvez as palavras que você anda ouvindo são simplesmente os palavrões que eu te dirijo toda santa vez que você me chuta ou até mesmo se deita em cima de mim!

— Eu não remexo.

— Mexe sim! E muito!

— E você não para de falar! Fica murmurando um monte de coisa em francês!

— E como você sabe que é francês e não russo?

— Porque eu falo russo!

Nessa ele me pegou...

— Como eu te disse, eu fico te xingando... agora, por favor, me deixe em paz que ainda tenho que acabar de revisar os vídeos da noite, para ver se seguiram o mesmo padrão de sempre

— 2x1

— Que?

— 2x1, Shepard, eu disse que ia vencer esse jogo!

— Mas eu vou vencer a aposta! É você quem vai voltar para a América dentro de um caixão de pinhos! – E saí clicando os saltos pelo linóleo, não que fosse grande coisa, pois a distância não era grande, foi mais para uma autoafirmação.

— Vê se fica pronta logo, temos que nos passar pelo casal feliz de novo hoje, e essa sua cara de quem não dormiu vai nos ajudar muito com o nosso disfarce! – Ouvi ele dizer alegremente de dentro do quarto!

— Dezessete! Dezessete meses e eu me livro de você!

— Nem se você quisesse Jen! Nem se você quisesse.

Mas que diabos ele quis dizer com isso?