Se tem uma coisa que já havia passado pela minha cabeça desde que eu entrei no NCIS era essa, como eu morreria.

Imaginei mil cenários diferentes. Posso dizer que a grande maioria envolvia sim, um tiro. Mas nunca me imaginei morrendo em um cemitério, no meio da neve e na Sérvia, abraçada com o meu parceiro, com o homem que eu tinha aprendido a amar.

E, apesar de todos os avisos que o meu sexto sentido tinha me mandado, e eu rebeldemente tinha decidido não escutar, estou aqui, com um buraco de bala na minha coxa esquerda. Sangue saindo em profusão. A dor, o pânico e o medo tomando cada parte do meu corpo. E nem a presença de Jethro é capaz de aliviar o meu sofrimento.

— Jen, Jen, olhe para mim. – Ele pedia, em sua voz eu podia ouvir desespero também.

Tentei olhá-lo. Ver suas írises azuis mais uma vez. Mas eu não tive forças para abrir os olhos.

Eu estava com dor, mas algo subiu queimando em minha perna quando Jethro tentou mudar o torniquete que ele havia feito de lugar. Senti a pressão mais forte onde eu sabia tinha um enorme buraco de um calibre 40.

— Gibbs, o que aconteceu com ela? – Ouvi, de muito longe, a voz de Will.

— Precisamos levá-la daqui. – A voz de Jethro soou mais forte.

— Você acha que ela aguenta ser transportada? Olha a quantidade de sangue que está saindo da perna dela.

— Não é se ela aguenta ou não, Decker. É simplesmente o que TEMOS que fazer. Jen não vai morrer aqui.

Senti dois braços me soltarem e me erguerem do chão. Eu estava com frio. Muito frio. Mas o movimento reacendeu a dor. Algo lancinante subiu por mim e eu gritei. Como nunca tinha gritado antes. Gritei algo inteligível até para mim mesma.

Jethro me chamou novamente, e encostou sua testa na minha.

— Eu juro, Jen, você vai ficar bem.

Com isso, o apoio da minha perna foi trocado. Outra onda de dor passou por mim, e eu não tive forças para gritar novamente. O escuro era muito mais convidativo agora, e eu o recebi de braços abertos.

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OITO HORAS ANTES

Por mais confortável que nossas posições estivessem agora. Era preciso começar a agir.

Não sei o que tinha dado em Jenny. Ela, depois de um tempo deitada em meu peito, simplesmente me atacou. Começou pela minha boca. Suas mãos traçando caminhos pelo meu peito. Ela buscava qualquer pedaço de mim com urgência. Algo atípico para ela. E dessa maneira urgente e avassaladora fizemos amor.

Quando terminamos, ela levou ambas as mãos ao meu rosto e me encarava. Seus olhos brilhantes do desejo, seu rosto ainda vermelho, sua boca inchada e seus cabelos embaraçados formavam uma das visões mais bonitas que já tinha visto. E ela me encarava com um sorriso.

Eu tinha certeza que ela queria dizer alguma coisa. Algo importante, mas suas palavras ficaram presas na garganta, e ela tentou se comunicar com seus olhos verdes. Porém, dessa vez eram tantas emoções reunidas que não consegui lê-la. Seu sorriso se desfez, e ela, antes de me deixar ali na cama, apenas me deu um beijo.

Seu último olhar antes de fechar a porta do banheiro me indicou uma única coisa: ela estava com medo. Muito medo. E eu passei a temer realmente por sua segurança. Se algo acontecesse com ela, eu jamais me perdoaria.

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Era estranho como eu tive a súbita necessidade de dizer tudo o que eu penso e sinto para Jethro. Uma sensação de urgência, de finalismo me alcançou nesta manhã, e eu acordei de um cochilo repleto de pesadelos com o fúnebre pensamento de morte.

Eu havia sonhado com um cemitério. Lápides altas, algumas com imagens de santos, outras com anjos. Em uma delas, um anjo abraçava a placa de concreto onde o nome do residente daquela sepultura estava escrito.

A beleza do anjo, os detalhes do mármore branco. A delicadeza dos traços, tudo naquela escultura me chamava a atenção. E eu tive que chegar mais perto para ver.

Eu sabia que tinha mais alguém comigo, mas a minha mente se rebelou em dizer quem era, ou qual era o nome. Meu olhar focado no anjo.

Não me contentei em somente chegar perto, eu tinha que tocar. Ver se o mármore era de uma textura diferente. Já que tudo ali dava a impressão de ser vivo. Macio.

Então, finalmente eu chegara ao meu destino. Passei a minha mão por toda a escultura, sentindo as penas das asas, os cabelos, admirada com tamanha fidelidade. Por fim, meus olhos desceram para a lápide. E eu me assustei.

Ali, gravado no frio mármore preto, estava meu nome, minha data de nascimento e de óbito. O óbito, não sendo outro a não ser a data de hoje.

Eu estava vendo a minha própria sepultura.

Aqui jaz Jennifer Shepard.

Honra, Lealdade e Bravura

28 de outubro de 1968 – 20 de setembro de 1998

Dei um pulo assustada. Aquilo deveria ser a minha mente desesperada me pregando uma peça. Eu me forcei a acordar, mas não conseguia, E a cena que se desenrolava na minha frente me deixava doente. Pessoas que eu conhecia iam passando em fila na minha frente. Colegas de faculdade, outros do escritório de San Diego. Vi minha fiel governanta chorar enquanto depositava uma orquídea lilás em meu caixão, por fim, quatro pessoas fechavam a fúnebre procissão. Decker, Ducky, Jethro e Kelly.

Quando meu cérebro focou na imagem de pai e filha, eu acordei. Tentei me recompor às presas, mas não tive como abafar meus sentimentos.

Seria possível sonhar com a própria morte? Com o próprio funeral?

E foi com esse misto de desespero e fatalismo que eu acabei por beijar Jethro. Eu precisava tê-lo nem que seja por uma única vez. Eu precisava falar para ele tudo o que eu sentia. E quando eu tive a oportunidade perfeita, eu perdi a coragem.

Se aquilo com o que sonhei era verdade. Se hoje era o meu último dia na terra, eu não poderia fazer isso com ele, eu não poderia dizer que o amo, e depois, deixá-lo. Eu não posso ser uma segunda assombração na vida dele. Então resolvi guardar para mim. Tudo isso. Jethro não precisava sofrer junto. Assim, levantei da cama, como se fosse a coisa mais normal a se fazer, e fui me arrumar. Iriamos almoçar com Decker para ter certeza da hora exata em que deveríamos agir.

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Eram dez da noite. Estávamos separados, cada um cobrindo um lado do cemitério. Decker estava no portão dos fundos e acabara de nos avisar pelo intercomunicador que Zukhov tinha acabado de chegar.

Ouvi passos a minha esquerda e notei que o comerciante libanês, ou pelo menos era isso que a inteligência do Mossad tinha nos dito, também chegara.

Para uma reunião de negócios, eram muitos capangas reunidos. Mas creio que Anatholy deve der aprendido depois da bagunça que fizéssemos no iate dele.

— Eu contei dez capangas para cada um. – A voz de Jen soou alta e clara em meu ouvido. Ela estava do outro lado, escondida em cima de uma das árvores, no melhor ponto que conseguimos para poder tirar fotos de todos os envolvidos nessa negociação.

— Onze para Zukhov, tem um no seu ponto cego. – Eu a informei.

— É muito bom você ficar de olho nesse, Jethro... não quero ser puxada daqui por um brutamontes. – Ela sibilou.

— Pode deixar, Madame. – Brinquei com ela. – Alguém que reconheça nessa festinha gótica?

— Tirando o segurança seis por seis que é muito seu amigo e o próprio Anatholy, ninguém. Mas você não vai acreditar na macabra coincidência. – Ela continuou.

— Regra 39, Shepard. Coincidências não existem.

— Uou! Essa eu tenho que anotar! Mas bem, nossos amigos e os novos amiguinhos deles estão reunidos em torno da lápide de um dos caras que matamos em Marselha.

Um frio percorreu minha espinha.

— Queria poder ler lábios, estão falando em inglês, mas não consigo pegar o teor da conversa. – Ela continuou.

Devagar, me aproximei de onde eles estavam.

— Estão discutindo valores. E agora chegaram em um ponto que nos interessa. – Eu disse.

— Onde vão fazer a troca? – Decker soou ansioso.

Tive que esperar. Zukhov e o libanês ainda estavam decidindo onde seriam, um queria Paris, o outro, Londres.

— Ou Paris, ou Londres.

— Isso não nos ajuda muito.... – Jen disse. – Mas tem outra coisa acontecendo.

— O navio libanês vai ancorar em Londres. – Informei.

— Jethro, os capangas estão chegando perto de onde você está, saia daí agora. – Shepard sibilou com urgência.

Quando eu me escondi, acabei por perder de vista quem estava parado bem perto de Jen. E esse foi o maior erro da noite.

— Posição, Jen. O que está acontecendo?

— Os libaneses saíram. Consegui todas as fotos, poderão passar no reconhecimento fácil assim que Will as enviar.

— E o russo? – Decker disse. – Ele ainda não saiu, pelo menos não nesse portão.

— Ainda está na lápide. – Jen nos informou. – Jethro, é seguro para você sair daí. Caminhe na direção contrária ao portão dos fundos. Não tem mais ninguém aqui dentro. Eu vou continuar observando o que Zukhov está fazendo.

Eu segui o ela havia me dito. Se tinha alguém de olho nele, não haveria problemas, certo?

Errado. Nós estávamos vigiando o local. Mas tinha alguém nos vigiando. Eu havia esquecido da Regra 35[1]. E mal eu havia virado as costas, escutei o som de um tiro.

— Todo mundo mantenha as posições. – Ordenei.

— Copiado. – Decker me respondeu. Mas Jen ficou em silêncio.

— Jen? Shepard? Você me ouviu? – Tornei chamá-la.

Outro som de tiro. Pela altura, era uma arma de calibre alto. Pelo som que chegou aos meus ouvidos logo em seguida, uma das sepulturas fora atingida. Corri o mais rápido que podia até a posição inicial de Jen. Vi a câmera ainda dependurada na árvore, mas não a via em local nenhum.

— Bom ver vocês, faz um tempo que não cruzamos os caminhos um do outro. – A voz de Anatholy era alta no silêncio do cemitério.

Olhei ao redor, mas não o vi, e também não havia sinal de Jen.

Outro tiro foi ouvido. Na verdade, uma troca de tiros, e pude ouvir nitidamente que alguém havia atingido o chão.

As palavras de Jen, há duas noites atrás retornaram aos meus ouvidos: “Bem, pense pelo lado positivo, se algo der errado, e algum de nós morrermos, já estamos perto da cova.”

Eu não poderia gritar por ela, sem entregar a minha posição. Mas comecei a ouvir com atenção, e uma respiração pesada cortava o silêncio da noite.

— Vou te deixar aqui, Isabelle. Com esse ferimento, você não vai sobreviver muito tempo. O que é uma pena, se você tivesse feito a escolha certa há alguns meses atrás, poderia estar vivendo muito bem em um lindo apartamento em Paris. – A voz de Zukhov era desnecessariamente alta.

— Will. Ele vai sair, dê um jeito nele. – Mandei Will terminar o serviço.

— Mas as ordens de D.C. são para deixá-lo vivo.

— Só faça isso! – Sibilei de volta.

Procurei entre as lápides. Até que encontrei um rastro de sangue.

— Jen... Jen... você está me ouvindo?

Só escutei o uivar do vento.

Pareceu que tinha atravessado todo o cemitério quando eu a vi. Uma poça de sangue se formava debaixo dela. Ela estava mais branca que o normal.

Corri em sua direção e procurei por ferimentos em seu abdômen. Não vi nenhum. Mas quando tentei levantá-la, seus olhos abriram de supetão, e ela, fracamente, tentou tirar as minhas mãos dela e foi quando eu notei. Suas próprias mãos vermelhas. Ela havia sido atingida na perna. Na parte interna da coxa havia um enorme buraco de bala. Notei que não tinha atravessado, o que não ajudava em nada.

Ela piscou, seus olhos teimavam em fechar, e, não sei se por instinto ou por puro medo, me abraçou. Aproveitando que ela estava conseguindo se segurar em mim, rasguei um pedaço da sua blusa e amarrei em torno da sua perna. Quando fiz isso, ela sibilou de dor.

— Você vai ficar bem. – Mas mesmo um idiota conseguia ver que ela estava ficando cada vez mais pálida.

Ela não me respondeu. Seu aperto em meus ombros de afrouxou e eu tive que sustentá-la.

— Will, onde você está?

— Zukhov não saiu por aqui.

— Venha aqui agora. Mas antes, pegue a câmera na posição onde Jen estava. – E ouvi a sua respiração ficar mais rápida com o esforço da corrida.

— Jen, Jen, olhe para mim. – Eu pedi. Tinha que fazer com que ela abrisse os olhos. Mas ela continuava desmaiada.

Dei outra olhada para a perna dela. O torniquete não estava adiantando para muita coisa. Quando tentei apertar mais e fazê-lo um pouco mais alto, ela mexeu, e tentou tirar a perna de perto de mim.

Com pouco, Will chegou. E assim que ele pôs os olhos em Shepard, ele conseguiu ficar ainda mais pálido que ela.

— Gibbs, o que aconteceu com ela?

— Precisamos levá-la daqui. – Eu disse convicto. Se ela ficasse mais tempo aqui, não só o sangramento, mas também o frio, iriam acabar por matá-la.

— Você acha que ela aguenta ser transportada? Olha a quantidade de sangue que está saindo da perna dela.

— Não é se ela aguenta ou não, Decker. É simplesmente o que TEMOS que fazer. Jen não vai morrer aqui.

Troquei o modo como a estava segurando, para poder passar um braço por trás de suas costas e o outro por baixo de suas pernas. Eu sabia que o movimento poderia ser doloroso para ela, mas não imaginei que seria tanto. Quando a ergui do chão, Jen tremeu de frio, um péssimo sinal, para logo em seguida soltar um grito, alto, vindo do fundo da garganta, nada mais do que um claro sinal do tamanho da dor que ela sentia.

Ela gritou até não ter mais forças, ou até que a dor em sua perna ganhasse a guerra interna.

Eu não tinha muito o que fazer, a não ser tentar confortá-la. Encostei minha testa na sua e falei, mais como uma promessa, do que uma frase de conforto:

— Eu juro, Jen, você vai ficar bem.

Apressei meu passo, e não pensei duas vezes, quando a coloquei no banco de trás do nosso carro.

— Will, dirija o mais rápido que puder até o seu esconderijo.

Tentei deixa-la mais confortável. Mas, parecia tarde demais. Jen não reagia a mais nada.

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— Onde está o Ducky? – Gritei para Will assim que consegui ajeitar Jen em uma das camas da casa segura.

— A uma hora de distância daqui. Você lembra das instruções do Diretor, quando deixamos Marselha.

— Merda! – Eu xinguei. Desde que entramos dentro do carro, mesmo aumentando a temperatura do aquecedor para ver que Jen reagia, ele continuava desmaiada.

— Você fica aqui, Will. Tome conta dela. Eu vou buscar Ducky. – Disse, vestindo um casaco limpo de Will, já que o meu estava ensopado com a sangue de Jenny.

— Você acha que ela tem duas horas, Gibbs? – Decker lançou um olhar preocupado em direção a ela.

— Faça com que ela tenha, Decker. Quero voltar e ver que ela ainda está viva. – Eu disse e saí para a madrugada fria.

Quando entrei dentro do carro, notei que minhas mãos tremiam. A última vez que tive que fazer uma viagem como essa, correr atrás de um médico, ou de hospital, foi há sete anos e, quando finalmente cheguei, recebi a pior notícia da minha vida. Dessa vez tinha que ser diferente.

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Era para a morte ser tão dolorida? Achei que, por mais que eu não tivesse sido um exemplo de pessoa, ter tido os meus problemas e tirado algumas vidas, eu, pelo menos, poderia ter um descanso eterno sem dor.

Porém, não era o que estava acontecendo.

Tudo em mim doía. E queimava. Eu tentava gritar, mas não encontrava a minha voz.

Podia ouvir zumbidos próximos a mim. Mas não identificava o que diziam.

Seria aqui o inferno? Porque sei muito bem que o céu não seria o meu destino final.

Algo me tocou. E a onda de dor ficou ainda mais forte, como era possível doer ainda mais?

Eu queria xingar, pedir para ficar quieta. Soltar alguns palavrões para ajudar a dor a se dissipar, mas eu estava presa em um eterno nada. Um nada muito doloroso.

E, antes que eu apagasse novamente, meu pesadelo dessa manhã passou de forma rápida por minha mente. Sendo a última imagem, minha lápide preta, com o anjo branco chorando debruçado sobre ela.

Que assim seja, então.

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Uma hora. Will havia dito que levava uma hora para chegar até onde Ducky estava. Levei vinte e cinco minutos.

Desci do carro sem me dar o trabalho de desligar o motor. Essa era uma missão urgente.

Soquei a porta do apartamento onde ele estava. Como ninguém me respondeu, tornei a socar.

Um minuto depois, ouvi a voz sonolenta através da madeira:

— Um minuto, por favor.

— Eu não tenho um minuto, Ducky! – Todo o meu desespero sendo demonstrado nestas seis palavras.

— Oh, Jethro, o que houve? – Mas ele não entrou em mais perguntas. Eu deveria estar mais sujo com o sangue de Jen do que pensei. – William ou Jennifer?

— Jen, Ducky. Depressa. Eu não acho que ela... – Engoli as últimas palavras, eu tentava não pensar nessa cena novamente.

— Vou pegar a minha maleta. – Ele correu porta adentro, me deixando no batente, um olho na quietude aquecida do pequeno apartamento, e outro nas ruas frias e nevadas de Belgrado.

Cinco minutos depois, Dr. Mallard vestia seu sobretudo e colocava seu chapéu. Eu já estava dentro do carro, pronto para dar a partida.

Ducky mal tinha fechado a porta e eu já dava a partida. Ele teve problemas em afivelar o cinto de segurança, mas eu não podia diminuir.

— O quão grave é? Vejo que você também está coberto de sangue, está ferido, Jethro?

Dei uma rápida olhada no retrovisor interno. Eu realmente tinha sangue em meu rosto, e minhas mãos estavam vermelho escuro com o sangue seco.

— Não. Tudo.... tudo isso é de Jen.

Ducky, mantendo a compostura, não disse nada. Mas palavras não eram necessárias, quando os olhos dizem tudo. E Ducky já tinha um diagnóstico em sua cabeça.

Ela não conseguiria.

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A viagem de volta foi ainda mais rápida. Eu não tive pena do estômago de Ducky enquanto derrapava pelas curvas cobertas de gelo.

Parei cantando pneus na porta da casa segura, e, antes de entrar, segurei o braço de Ducky e fiz um pedido a ele:

— Eu não quero receber outra notícia de que ela está morta.

Duck assentiu e entrou, cumprimentando Will enquanto já caminhava para onde, eu esperava, Jen ainda estivesse viva.

Já eu fiquei mais um tempo lá fora. Tinha medo de entrar e, assim que olhasse para Will, descobrisse que ela não estava mais aqui. Como eu justificaria isso com Kelly? Como eu poderia pedir desculpas a ela? Como eu conviveria com mais uma morte sobre meus ombros?

Não fiquei muito tempo sozinho. Logo Will parou do meu lado.

— Ducky está te chamando. Parece que ele precisa de ajuda.

Em que eu poderia ajudar?

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Quando Jethro me acordou no meio de da madrugada, eu sabia que alguém estava ferido. Eu só não tinha noção de quão grave era.

Mas Jennifer, ela precisava com urgência de um hospital. Aquele buraco de bala não se cicatrizaria sozinho.

— Wiiliam, onde está Jethro? Eu preciso dele aqui.

— Acho que ele ainda está lá fora, Ducky. Eu vou chamá-lo.

Engraçado como duas pessoas podem ser tão iguais e tão diferentes ao mesmo tempo.

Há seis meses atrás, em Positano. Jennifer estava subindo pelas paredes de preocupação quando Jethro foi atingido. Ela ficava indo e voltando por todo o apartamento. E, passou três dias acordada, sentada em uma cadeira enquanto ele dormia. Me lembro de como os olhos dela estavam. E ali eu pude ver, a pobre garota tinha se apaixonado tão perdidamente por ele que era bem capaz de trocar de lugar só para que ele sobrevivesse.

Jethro, sendo Jethro, conseguiu manter escondido todo e qualquer sentimento por todo esse tempo. Até nessa madrugada. Na porta do apartamento, eu vi a mesma preocupação que estampou os olhos de Jennifer há seis meses. E vi o mesmo sentimento quando ele me pediu para não dar a mesma notícia que ele um dia recebera. E agora, tenho certeza que ele está se culpando por isso. Mas tem coisas que são o destino.

Estava tentando extrair a bala da perna dela quando notei que ele estava na porta do quarto.

— Ah, Jethro, por favor, preciso da sua ajuda. – Pedi.

Ele não se moveu. Seus olhos presos no rosto dela.

— Você sabe que eu não consigo. – Sua voz quebrada.

Eu sabia o que tinha acontecido no passado. Sabia a história completa da morte de Shannon e como ele terminou como pai solteiro de uma garota de oito anos.

— Ela não saiu do seu lado nem por um segundo, quando era você em uma cama, em Positano.

— Eu sei. – Ele suspirou.

— Ela te disse? – Fiquei surpreso, de volta a tudo o que aconteceu, lembro perfeitamente de Jennifer ficar apreensiva que eu fosse contar algo para Jethro.

— Não. Ela não falou nada... mas, eu só sei.

— Entendo. – Me concentrei em tirar a bala. Finalmente tinha encontrado.

— Uma calibre 40. - Jethro disse de longe. Eu ouvi o disparo. Mas não sabia que tinha atingido Jen.

— Saber o calibre e tirar a bala não ajuda na recuperação dela. Às vezes só piora.

— Só me diga que ela vai sobreviver, Ducky.

— Não posso dizer isso. O mais sensato seria levá-la para um hospital. Ela perdeu e está perdendo muito sangue.

— Não podemos simplesmente jogá-la em qualquer hospital e fingir que isso não aconteceu. – Jethro disse zangado

— Não, não podemos. Devemos levá-la para Londres. Lá tem o hospital que precisamos. A missão inicial que vocês fariam aqui já está terminada?

— Sim. Conseguimos o que nos mandaram fazer.

— Peça para Will entrar em contato urgente com D.C. Ela tem que ser transportada com urgência.

Jethro, por fim, tomou coragem, e conversou com Jennifer.

— Eu te proíbo de morrer hoje, Jen. Está me ouvindo? Você não vai morrer!

[1] Regra 35 – Sempre vigie os observadores.