Levy POV

Encarei os cílios imóveis de Heartphilia. Me senti cansada dos pés à cabeça. O quarto pacífico era algo irônico comparado com o meu humor turbulento.

A brisa suave passou pelas cortinas e escutei levemente o bipe da máquina.

O coração de Lucy ainda está batendo.

Mesmo sabendo desse fato, a tez pálida da minha amiga e os movimentos imperceptíveis de sua respiração me faziam duvidar se ela ainda está viva.

— Não conseguimos saber porque ela não acordou, estamos pesquisando e procurando as causas.

O doutor disse pesaroso ao meu lado. Me sentei rigidamente.

Quantas vezes não escutei essa frase nessa semana?

Não respondi às desculpas do homem. E quando ele saiu, estiquei a mão para ver se Lucy ainda respirava. A máquina que relata batimentos cardíacos parecia mentiroso quando visse a pele pálida dela. Mas ao sentir o leve ar sendo empurrado pelo nariz da maga celestial, suspirei.

Toc Toc

A porta se abriu atrás de mim. Mas me senti tão cansada que não tive forças para me virar.

— Senhorita McGarden, pode me acompanhar por favor?

Ergui meus olhos e havia um homem ao meu lado. Pelo seu uniforme sabia que era um mago do conselho. Um desconhecido que foi enviado para investigar sobre o parque.

Olhei levemente para a minha bolsa jogada no canto do quarto e me levantei da cadeira.

— Ok, vamos para fora -respondi.

O corredor do hospital parecia um sonho de um observatório marítimo. De um lado haviam portas brancas e do outro janelas com peixes nadando.

Quarto 121 com letras bem polidas posou nos meus olhos. Esse é o número da sala que acabei de sair.

— Senhorita McGarden, você se lembra de ter visto algo suspeito?

Cruzei os braços. Meu olhar subiu para o homem mais alto que eu. Ele é grande mas não é dois, isso não me intimida.

— Uma bizarra horda de ursinhos eletrônicos assassinos não é suspeito o suficiente?

— Coff -ele pareceu um pouco surpreso- Digo, algo que seja em relação ao que controlava a horda.

— Não, eu não vi -respondi secamente.

O mago responsável de tudo estava embaixo de um escombro em uma poça de sangue. Pedi para Gajeel fingir que não viu, quando ele levantou para mim a enorme pedra que esmagou o criminoso. Porque encontrei junto ao homem, alguns papéis suspeitos. E esses papéis poderiam ser um grande problema se o conselho souber que eu os conheço.

— Gostaria de saber por que os magos da Fairy Tail estavam em uma missão retirada pela Mermaid Heel e Sabertooth.

Seus olhos suspeitavam de algo. Me perguntei se ele já havia entrevistado Gajeel. Seria melhor se esse investigador falasse com os magos que são os responsáveis da missão. Mas nenhum dos principais envolvidos acordou em uma semana.

Eles estão com um grave esgotamento de mana e lesões corporais.

— Você deve saber que Lucy Heartphilia era da guilda Fairy Tail. Só por que ela se mudou, não significa que seus amigos também foram deixados para trás. Eu a segui deliberadamente.

— Sabe que existe uma multa para os magos que não tomaram a missão estarem envolvidos, correto? E uma penalidade para a guilda também.

Eu o fuzilei com o olhar. Essas são as leis e eu sabia delas. Então não pude refutar.

— Entendi -falei baixinho.

Ele deu um passo para trás e se curvou para se despedir.

— Tenha um bom dia -disse e saiu.

Olhei para suas costas até sumirem. Botei a mão no vidro o que fez alguns peixes nadarem para longe. Assustados.

É uma instalação incrível, eu tenho que admitir. A manutenção desses animais marinhos e calefação para que o hospital não esfrie deve ser de um custo muito alto.

Não só isso, como o mantimento dos médicos deve superar a vários bilhões anuais.

Encarei as algas trêmulas e corais em cores brilhantes.

A cidade se permitia a esse luxo. É incrivelmente bem sucedida e a quantidade de "clientes" ricos que se hospedam nesse lugar já chegava aos ingressos satisfatórios. Parece que o investimento alto alcançou seu objetivo.

— Hey -alguém tocou no meu ombro.

— Gajeel -murmurei.

Ele também parece muito cansado. Ao ver suas olheiras, pensei que eu deveria estar mais defasada que o Dragon Slayer.

Voltei ao meu olhar para o vidro, dessa vez reparando no meu próprio reflexo.

Há quanto tempo não arrumei meu cabelo? Se antes parecia um arrepiado pelo de gato, agora parecia mais um ninho de ratos que poderia aparecer surpresas dimensionais a qualquer momento.

Minha tez também parecia mais magra e o redor dos olhos mais fundos.

— Esse investigador é muito persistente -o moreno sorriu- Ele esteve aqui anteontem e fez as mesmas perguntas.

— Você disse alguma coisa para ele? -perguntei. Me lembrei o que está dentro da minha bolsa.

— Claro, disse que eles eram muito preguiçosos. Se as guildas estão a cargo de lutar e se expor ao perigo, não é trabalho do conselho fazer as investigações e as papeladas?

Gajeel incrivelmente tinha ideia de como funciona o sistema de cargos da guilda e do conselho. Fiquei ligeiramente surpresa.

As guildas ganhavam dinheiro se expondo ao perigo. A parte burocrática era trabalho do conselho. Concordei.

— E os outros? -encarei seus olhos e ele riu.

— Pode ficar tranquila, já está resolvido. Agora só resta Bunny Girl e o Bunny Boy. Os outros foram transferidos ontem. Ah, e os gatos foram enviados com segurança para a guilda Sabertooth, já que eles e a cosplayer da Mermaid estão bem, essa daí também deve ter voltado para a guilda dela nessas alturas.

Suspirei ao lembrar dos gatos inconsoláveis, olhando para os Dragon Slayers adormecidos.

— Infelizmente parece que Milliana também não sabe muito sobre o que aconteceu -suspirei.

— Foi uma magia impressionante, uma bola impenetrável? -deu de ombros.

Assenti com a cabeça. Impressionantemente Gajeel também é confiável, contrastando com sua aura despreocupada e resolveu a transferência dos outros magos.

Baumwolle tem uma regra de não deixar outras pessoas além dos trabalhadores se tratarem no hospital deles. Se quiser ter uma estadia, sua mensalidade seria cara. Mas em outros casos, se o paciente não está apto para transferência, eles não seriam imorais e os transferir a força.

Segurei na fria maçaneta.

Lucy não está apta. Me senti amarga.

Rogue Cheney foi o mais grave dos feridos. Em um esgotamento de mana que parecia estar meio morto. Um corpo tão machucado que teve de receber transplante de sangue às pressas.

Por isso ele ainda está aqui.

— Baixinha, ela vai ficar bem -a voz atrás de mim disse- Estou voltando. Se precisar de algo, só chamar.

Gajeel esteve me apoiando esse tempo, e enquanto eu assistia Lu-chan, ele via o Dragon Slayer da sala ao lado.

— Eu também espero -sussurrei.

Fechei a porta e voltei para a minha cadeira.

— Era para você ter acordado, Lu-chan -murmurei.

Esse também era um mistério. Lucy era a pessoa que mais tinha mana sobrando no corpo em comparação com os outros. Não era muito, mas não foi perca o suficiente para um coma tão longo. E seu corpo nem sofreu danos físicos, como os outros.

Me estiquei e peguei a bolsa.

Como pensei. Tem algo a ver com isso.

De dentro peguei alguns papéis amassados. Eram documentos que achei depois de retirar algumas pedras dos escombros com a ajuda de Gajeel. Essas são as cópias que fiz com a minha magia "Solid Script Copy".

"Pesquisa de Magia"

Era o grande título.

"Dr Robertson,

Minha nova pesquisa diz que podemos fazer um transplante mágico. A taxa de probabilidade é baixa, mas não é impossível.

Um dos exemplos e inspiração dessa pesquisa, foi o raro caso que aconteceu na família de magos, Laxus Dreyar. O implante de uma esfera de mana de dragão foi bem sucedida. Mas isso abriu a possibilidade, é possível fazer esse mesmo fenômeno em pessoas sem mana?

A taxa de rejeição pode ser calculada e ainda está em tempo de testes.

Os dados confirmam que a maior probabilidade é com magos menores de nove anos, se uma criança com compatibilidade mágica ainda tem seu núcleo puro, podemos transplanta-lo para pessoas que nasceram não-mágicas.

Segue as fichas das cobaias em anexo"

Quando li a primeira carta, senti meu estômago revirar. Era um documento meio antigo de dez anos atrás. Não só isso. Como o parque também não era recente de um ou dois anos, já batia com duas décadas pelo menos.

Parece que alguém criou um laboratório secreto no parque. Um bem horripilante que usava atrações sonhadoras para sequestrar crianças.

E como pensei, as fichas depois delas tinham pregadas uma foto do rosto da criança.

"Josen Philap, 7 anos.

Aptidão mental alta, mana baixa. Tem alto controle para manuseio de eletrônicos e mecânica.

Tem problemas psicológicos irregulares, violento e introvertido, parece se tornar estável com brinquedos de pelúcias"

"Rinyl Crisow, 8 anos.

Aptidão mental baixa, mana alta. Sua magia parecida com telecinese e consegue enviar comandos a longa distancia.

Status psicológico estável, extrovertido e cooperativo."

Eu suspeitei que eram esses dois magos os responsáveis por esse incidente. Provavelmente os investigadores falharam em algo e essas crianças se rebelaram no laboratório, pode ter acontecido há muito tempo. Mas só agora eles colapsaram o parque.

De alguma forma, eram muitas crianças nas fichas. Deixando um sabor cruel e amargo na boca.

Sabia que existiam pessoas que não podem usar mana, também existem as que invejam e desejaram usar magia. Mas tinham os loucos que tiveram a coragem de fazer experimento com crianças para ganhar poder.

Sem querer amassei os papéis com a ponta dos dedos.

Isso com certeza seria algo que o conselho tentaria ocultar. Quanto pânico surgiria na sociedade se isso aparecer? Um lugar tão grande como Baumwolle tinha pessoas escondidas que faziam essas pesquisas.

Mas parece que a presidente não sabia desse lado horrível na sua cidade. Me lembrei do pedido de desculpas da mulher há alguns dias atrás. Seus olhos continham fúria e senti um sentimento de amor verdadeiro pela cidade.

Não importa quantos planos perfeitos você crie. Sempre existirá sujeira em algum lugar. A líder deve ter percebido que seu companheiro que administrava o parque, a havia traído.

É impossível fazer algo tão grande sem o apoio de alguém para fechar os olhos dos outros.

Também por causa dessa vergonha na falha de administração, a líder de Baumwolle permitiu que eu e Gajeel ficassemos. Não entrou em detalhes, e apenas deixou a permissão. Tive o palpite que ela foi informada pelo conselho sobre o acontecimento, mas não era para dizer uma palavra para os outros. Seja eu ou Gajeel. Mas já sei de tudo e fingi não saber.

Agora, esse não é o problema.

Era óbvia que também tinha pessoas "comprando" esses transplantes de núcleo mágico, assim como alguém que deve ter apoiado financeiramente essa pesquisa.

Hoje, as coisas entre magos e não magos está pacífico. Mas esse episódio poderia abrir portas para uma guerra civil. Um lado os magos que se sentiam enojados das pessoas comuns, pensando que eles podem fazer de tudo para arrancar sua magia. E do outro, as pessoas comuns que eram inocentes se revoltariam quando os magos os ameaçarem.

É um acontecimento que em nome da paz, o Conselho precisa suprimir.

Coloquei os documentos na minha bolsa novamente. Trabalhos burocráticos não são da minha conta. Mas Lucy era.

Escutei um arfar dolorido.

— Lu-chan!? -me levantei em um susto.

Peguei a bolsa de gelo que sempre estava ao meu lado.

O rosto da loira ficou vermelho com sobrancelhas trincadas. Sentia falta de ar e agarrou inconsciente seu peito.

Coloquei a compressa na sua testa e a chamei.

— Lu-chan! Lu-chan!

Segurei sua mão firmemente e rezei. Os médicos não sabem o que fazer. Não só eles, como magos de cura também passaram uns dias atrás e não puderam ajudar.

— Lu-chan, por favor, por favor... -murmurei, sentindo meus olhos lacrimejarem.

Pude ver sua cara de dor, tentei suprimir com a bolsa de gelo. Ela parecia desconfortável, segurei sua mão.

Mas era só.

Me senti imponente e o bipe da máquina tocou como louco.

A porta se escancarou. Um médico e dois enfermeiros chegaram.

— Rápido, preciso injetar a solução do paciente 121!

— Aqui está doutor!

— Alguém traga a bomba de oxigênio!

— Sim doutor!

Fui empurrada para trás e um par de braços me abraçou fortemente.

— Não olhe -a voz sussurrou cobrindo meu rosto com uma mão grande.

— Gajeel, a Lu-chan... A Lu-chan! -escondi as lágrimas no peitoril dele.

— Fique calma, ela vai ficar bem -mas sua voz não podia esconder seu desconforto.

A verdade é que Lucy ficava a maior parte de forma tão pacífica que parecia simplesmente sumir no ar se eu não checasse sua respiração. Mas de repente seu corpo entrava em crise. Era como se resetasse algo nela.

Foram tantas vezes que seu braço tinha muitos pontos vermelhos da quantidade de injeções que ela recebeu.

Comecei a tremer e as lágrimas não paravam.

Essa razão bizarra e desconhecida foi o que a impediu de ser movida.

Se Rogue estava muito fraco para ser transferido a outro hospital. Então Lucy estava em um mistério que parecia que ia morrer a qualquer momento, por isso era perigoso fazer uma viagem de algumas horas para outra cidade. Era muito imprevisível.

Logo tudo ficou calmo, assim como Redfox disse. A condição de Lucy voltou ao normal, pálida e imóvel.

— Por enquanto está tudo sob controle -suspirou o médico, preenchendo a prancheta.

Abaixei a minha cabeça e dei alguns passos para perto da minha amiga adormecida.

Esse pesadelo não terminava e a cada momento sentia um susto pior que o outro. Segurei a mão da loira.

Vi seus lábios tremerem. Senti meu coração bater rápido pela surpresa, quando aproximei meu ouvido, escutei seu sussurro.

— Natsu, espera por mim.

Arregalei meus olhos. Estremeci e senti mais uma lágrima trilhar minha bochecha.

Esse lugar bonito e cobiçado, podia ser comparado a um paraíso, mas dentro do meu coração tinha um contraste desesperado e congelante.