Caminhantes

Chegar até você


Mirajeene POV

Está escuro. Abracei meus joelhos.

Em algum momento, já estava aqui. Nesse estranho vazio. E bem na minha frente, tem um pequeno buraco de luz.

Quando espio esse buraco, posso ver o mundo, mas sempre que vejo lá fora, é cheio de sangue e morte.

— PARA, POR FAVOR, PARA -gritei.

Mas minhas mãos ensanguentadas não pararam.

— Por favor, para.

Chorei mais forte.

— Me salva, por favor! -um homem correu, um vulto cortou seu pescoço.

— Não encosta no meu filho, monstro! -a mãe abraçou uma criança. Os dois caíram mortos logo depois.

Chamas se estenderam para todos os lados junto com lamentos e o desespero.

Solucei.

Não importou o quanto chorasse, não parou. Então apenas abracei minhas pernas e tampei os ouvidos com força.

Mas as vozes, os gritos, ecoaram na minha mente.

— Para... Por favor, eu imploro.

— Monstro! Seu monstro! -eles gritaram.

— Eu sinto muito. Eu não queria...

Não sei há quanto tempo estou aqui. Desejei fortemente poder sumir. Se sou obrigada a assistir, então queria não existir mais.

A culpa passou pelo meu corpo várias e várias vezes, tentando me enlouquecer a cada segundo.

Me abracei mais forte.

Deus, se você está aí, por favor, me faça parar.

Mas não parou.

Deus, se não pode me parar, me mate. Eu não quero mais, eu não quero assassinar pessoas.

Então lembrei. Mirajeene Strauss é uma maga de rank S, e entre os magos de rank S é um dos mais fortes.

Eu sou forte.

E essa força, foi imparável. O que essas pessoas fracas são, contra um poder tão grande?

— Pfff... HAHAHAHAHAHA! -a voz da Mirajeene lá de fora riu, banhada de morte. Se deliciando de massacres.

Tampei meus ouvidos.

Levá-la para a floresta proibida usou todas as minhas forças. Mas nem os monstros puderam ganhar de mim.

— Eu não consigo. Ninguém pode me parar?

Na floresta foi outro banho de sangue. Como uma máquina sedenta de loucura.

Até eu senti que estava perdendo a razão.

Simplesmente não quero mais pensar em nada.

O desespero de estar sozinha, a dor de não poder impedir essa culpa. Quebrou e fragmentou dentro de mim. Uma hora, bloqueei tudo, fingindo que não escutei nada, me iludindo que nada aconteceu.

Essa foi a única forma que encontrei de proteger o pouco que restou de mim.

Como um sono profundo, fechei os olhos para tudo o que aconteceu afora.

Mas então...

— Solta o meu irmão mais velho!! -uma linda voz fina apareceu.

Esfreguei meus olhos levemente, meio tonta, com poucas forças... Olhei para o buraco levemente. Mas para mim, tudo pareceu borrado.

Quem são?

Um menino e uma menina. Eles tem o cabelo castanho...

— Não chegue perto! -o menino gritou.

Algo puxou minha memória dormente.

Com minha mente confusa, bati na parede negra, ao lado do pequeno buraco.

— Lisanna... Elfman... -sussurrei- Não toque neles!

Uma dor passou pelo meu corpo, como se sugasse mais energia de mim.

— Lis... Elf...

Adormeci novamente.

Num sono sem sonhos, sem tempo. Apenas existência, com meus desejos pendurados girando em volta do meu coração, fazendo fluir toda minha força para poder realizá-los.

Em uma hibernação profunda.

Quanto tempo passou?

Eu não sei.

Então uma voz que conheço me chamou. Algo familiar e nostálgico...

Gritando uma e outra vez.

Me fazendo sentir que se eu não abrir os olhos, me arrependeria para sempre.

Lutando contra o cansaço, me obriguei a levantar as pálpebras pesadas.

— Esqueceu dela, Mira? De Lucy Heartphilia.

Meus olhos se abriram.

— Lu... cy... Lucy...! -suspirei ao escutar esse nome familiar.

Me virei para a parede. Coloquei a mão ao lado do buraco, aproximei o meu rosto. Hesitei em espiar.

O que está acontecendo ali?

Meus dedos tremeram. Quando olhei, ainda estava tudo turvo.

Tem... Alguém... Muito machucado.

Esse alguém brilhou de forma ofuscante com linhas douradas e rebeldes explodindo para os lados.

— Pare... -murmurei- Fuja antes que ela te mate também.

O homem loiro se manteve em pé, cheio de sangue. Sua figura borrada cheia de confiança veio voando persistentemente.

— Não... -tentei falar com ele.

No segundo em que seu rosto ficou bem perto, eu o reconheci.

— Laxus...!

Mas minha mão o fez voar. Ele gritou de dor.

— Não... Laxus!

Bati violentamente na parede.

— Fuja! O que você veio fazer aqui...? -então escondi o meu rosto nas minhas mãos- Não, não olhe para mim. Eu queria que pelo menos você nunca me visse desse jeito. POR QUE VOCÊ ME SEGUIU?

Não importa o quanto gritei ou chorei, minhas reclamações não chegaram até ele.

Plap!

Um estranho som sinistro me fez arregalar os olhos. Espiei novamente.

Minha mão cravou bem no peitoril dele. Minha respiração parou.

— Não... NÃO!

Laxus sorriu tristemente para mim. Os olhos acinzentados cheio de lágrimas e dor.

Em todos os anos que o conheci, nunca o vi parecer tão patético e lamentável. Estremeci sem poder fazer nada.

— Laxus...!

O sangue jorrando e manchando o meu braço de vermelho, enquanto o homem riu como se isso não doesse. Ele me prendeu e disse:

— Mira. Eu sinto muito por não estar quando você precisava.

Congelei.

— Agora, não vou te deixar mais sozinha.

Luzes brilharam para todos os lados.

A dor do trovão passou pelo meu corpo. A eu de fora gritou. Mas com esse sofrimento, estranhamente me senti aliviada.

— Eu te amo Mira.

Minhas lágrimas caíram.

Laxus...

Laxus...

LAXUS!

— Ficarei com você agora -seu sorriso confiante, mesmo com o seu corpo tão machucado, foi incrivelmente cativante.

Nem mesmo Deus escutou minhas orações. Mas Laxus veio até aqui para me salvar.

— Eu também quero estar com você.

Com essas palavras, rachaduras brilhantes apareceram, iniciando do pequeno furo que eu usei para espiar o mundo e se estendeu, rompendo toda a parede.

Laxus POV

Mal respirando, minha cabeça abaixou, olhei fixamente para meu peito. Um buraco jorrando sangue e me fazendo sentir frio. A tontura me tomou e continuei sentado de joelhos.

A primeira coisa que apareceu na minha mente, foi Lucy.

Ah, a minha estúpida irmãzinha. Ela voltaria a chorar se souber o que eu fiz?

Quando sua dor está para se fechar, e ela descobrir isso, vai ficar magoada e sofrer novamente? Essa mulher idiota que em vez de se preocupar com ela mesma... A gentileza dela é como um veneno para si mesma!

Mas isso é o que torna Lucy, alguém especial para mim.

Com as poucas forças, enfiei a minha mão no bolso da jaqueta. Retirei uma lácrima e a apertei, logo se acendendo.

— Oh, Laxus? Finalmente resolveu dar as caras? -Sting foi o primeiro a atender.

— Raiozinho estúpido, sua mãe não te ensinou que... Espera. O que houve? -Gajeel franziu a sobrancelha.

Eu sorri.

Até nessas horas eu tenho com quem contar. Tudo porque Lucy nos uniu, criei amigos inesperados.

— Caras, eu estou com problemas... -murmurei.

— Aonde você está, Laxus? -Gajeel se colocou sério.

Será que é tão evidente o quanto estou machucado?

— Eu tenho algo a pedir para vocês dois -continuei falando.

— Pedir? Me fala logo aonde você está! Depois você pede! -Sting ergueu a voz.

De repente me lembrei daquele dia em que fiquei preso na magia de Minerva Orlando junto com o bolo maligno. Acabei rindo, fazendo mais sangue jorrar.

— Sabe, eu acho que não posso mais cuidar da Lucy. Então vocês terão que proteger ela no meu lugar.

— Ei... O que você está falando? -Sting ficou mais nervoso.

— Laxus, apenas nos diga aonde você está! E você mesmo faz isso!

— Me escutem -dei um sorriso- Não deixem que ela saiba disso.

Os dois começaram a gritar e espernear.

Eles são muito enérgicos, huh? Só com isso me senti melhor. Talvez eu sinta saudades disso.

— Lucy me disse... Com todas as palavras -murmurei- Que ela está amando novamente. Esquecendo e superando a dor.

— O que...? -ambos arregalaram os olhos.

— E eu não seria um péssimo irmão se estragar o momento? Então, não é para contar a ela.

Não é para bloquear a vida de Lucy por causa das consequências das minhas escolhas. Lucy, eu quero que você seja feliz.

— Espera, Laxus!

— O que você quer dizer com isso?

E desliguei a lácrima, com um sorriso.

Meus olhos vaguearam para Mirajeene, seus olhos fechados deu a ilusão que está dormindo. Eu também estou ficando com muito sono. Seria lindo dormir ao lado de Mira, se não fosse por esse chão banhado de sangue.

Então as pálpebras dela se moveram lentamente, mostrando os olhos azuis que tanto amo.

Seu rosto gentil sorriu para mim. E arregalei meus olhos.

— Obrigada -os lábios dela se moveram lentamente- Por me encontrar.

Me esforcei para segurar sua mão.

— Como eu não te encontraria?

Ela apertou os dedos que segurei, senti o pouco do seu calor que começou a enfraquecer.

Então suas orbes vaguearam para a caverna, com sentimentos persistentes. Eu acompanhei e então percebi. De alguma forma estamos próximos da entrada, com a distância de alguns metros.

Não havia sentido antes, mas tinha um cheiro diferente no ar. Algo que não me toquei antes.

Um menino e uma menina estão dormindo profundamente na caverna. São duas crianças desconhecidas de cabelos castanhos, sob algum feitiço de sono.

— Você os estava protegendo?

— Lisanna... Elfman...

Minhas pupilas tremeram.

Mira matou todos.

Isso foi uma mentira. Mesmo entre sua sede imparável de sangue, o pequeno pedaço de seu coração conseguiu salvar duas crianças.

Crianças que ela confundiu com seus irmãos.

Os olhos dela preocupados encararam as duas crianças e eu sussurrei:

— Eles vão ficar bem.

Ela me encarou e eu sorri.

— Acredite em mim.

Pouco a pouco seus olhos se fecharam novamente de forma pacífica.

Apertei minha mão que segurou a dela.

Lucy, você estava certa.

Quase vacilei duas vezes, mas você acreditou em Mira. E você estava certa. O pequeno pedaço que sobrou de Mira é importante, assim como você me disse. Ela batalhou e persistiu. Estou feliz em ter confiado também.

Por causa disso eu pude reencontrá-la.

Eu pude encontrar Mirajeene.

Lucy, conhecer você, foi como conhecer a esperança. E queria poder dizer novamente: Você é incrível. Assim como um tesouro que tive o orgulho de chamar de irmã.

Obrigado.

— LAXUS DREYAR! -escutei a voz longínqua de Mest.

Você está atrasado. Pensei, com meus olhos se cerrando.

Meu corpo tombou para frente, espirrando sangue. Continuei a segurar a mão de Mira firmemente.

Lucy, se for você, então eu desejo. Seja malditamente feliz!