CN Beyond: Elemento X

A Mulher de Vermelho


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O fogo se espalhou por toda a cidade e junto a ele o caos desenfreado. Gritos e choros acompanhados de medo e pânico ecoavam pelas ruas de Townsville. Não era uma guerra, era um verdadeiro apocalipse. Criaturas horrendas e seres poderosos nunca vistos antes levavam a anarquia e destruição por toda parte e o pior ainda estava por vir.

O banco estava sendo assaltado por um grupo de arruaceiros mascarados. Aproveitando-se do frenesi das ruas para lucrar em cima do sofrimento alheio. Eram seis homens usando lenços como mascaras improvisadas, dois deles apontavam suas armas para as cabeças de duas funcionárias do banco feita de refém. Os outros quatro forçavam os guardas cooperarem para abrir o cofre trancado por uma enorme porta impenetrável que se abria com código complexo. Uma funcionária mais velha, provavelmente uma gerente do lugar, escondia-se de baixo da mesa da recepção apertando o botão de emergência que chamava a polícia. Mas, a ajuda da polícia não era uma opção pois estavam ocupados demais com problemas maiores.

(trilha sonora: – Link Panic! At The Disco - Bohemian Rhapsody )

Tudo parecia perdido para estes funcionários. Até que de repente um par de mãos elásticas enrolou-se em um dos bandidos e o puxou para fora do banco. Ele gritou ao perceber algo enrolando em seu pescoço. Era o tórax cumprido e esticado de um mulher de pele esverdeada e longos cabelos pretos. Ela estrangulou o pescoço dele enquanto o encarava com seus olhos e língua de serpente. Era ela, a própria Snake, sentindo um prazer natural em estrangular aquele homem. Os outros cinco tentaram ajudar amigo atirando na Snake, mas um vulto veloz escuro passou por eles em uma velocidade sobre humana e do nada, todas as suas armas sumiram e foram parar nas mãos de uma garotinha, também de pele verde com cabelos pretos cobrindo o olho direito, que emergiu diante de seus olhos.

— Legal. Gostei dessas armas. — Disse a Pequena Artura. — Pena que armas são obsoletas pra gente agora.

Atrás dos cinco, surgiu outro ser esverdeado, esse ainda mais medonho que os anteriores. Era Grubber e seus olhos estavam agora esbugalhados, saltando do crânio, era corcunda e baixo, com uma boca enorme cheia de dentes tortos. Ele abriu a boca sorrindo e mostrando sua língua cumprida e soltou um poderoso grito sônico que reverberou em todas as vidraçarias do banco partindo-as em pedaços. Dois dos homens se afastaram um pouco e conseguiram se salvar, mas os três que ficaram mais perto da fonte daquele som mais que ensurdecedor sofreram. Sangue escorreu de seus ouvidos e narizes e olhos ficaram vesgos. Em cada um daqueles homens, o estrondo sônico fez estourar veias em seus cérebros tendo derrames na hora. Um dos que sobraram em pé cagou-se nas calças de medo e tentou correr o mais longe do banco que conseguia, mas se esbarrou na barriga de um estranho gigante, também de pele verde e cabelo ruivo que cobria seu agora único olho.

— Oi. Você quer ser amigo do Billy? — Perguntou o Gigante.

— Sai de perto de mim! — Disse o homem se afastando, mas não era o suficiente.

— Big Billy abraça novo amigo! — E com seus enormes e grossos e verdes braços, Billy abraça seu “novo amigo” com uma força desumana, triturando seus ossos e esmagando suas entranhas que escorreram por vários orifícios.

Só restou um bandido, que tentou se esconder, mas foi agarrando por um última figura verde que o ergueu no alto. Era um jovem já conhecido por nós, mas agora estava diferente. Ele agora tinha orelhas de pontudas e pequenas garras amarelas em cada mão, como se fosse um duende alto e esguio. O bandido erguido no alto olhou para face do homem que levantava, e viu seus cabelos pretos cumpridos, seu discreto bigode que nascia em sua face e seus dentes de vampiro que lhe mostravam um sorriso sedento. Lembrou-se de um revolver escondido no bolso de trás e tentou o pega-lo. Quando conseguiu imediatamente apontou para o rosto de Ace, mas o agora esverdeado garoto bloqueou com sua mão direita quando o tiro veio. A bala abriu um buraco perfeito na mão direita de Ace, mas ele não sentiu nenhuma dor, ele apenas riu ao olhar através daquele ferimento feio. Depois de rir, olhou novamente para o rosto de sua vítima e na hora o homem percebeu que aquilo seria a última coisa que iria ver.

Todo o calor do corpo do homem começou a desaparecer, a ser roubado de si. Ace estava drenando o calor do corpo daquele homem até lhe restar apenas o zero absoluto. Ele sentiu seus ossos e partes do corpo se tornando solidas, tão sólidas que poderiam facilmente quebradas. Em segundos, o bandido havia se tornado uma estatua de gelo nas mãos de Ace que só precisou pressionar um pouquinho para quebrar toda a cabeça do homem se fosse feita de vidro. No final, olhou sorrindo ainda mais para o ferimento de sua mão e percebeu que havia sumido e em seguida, gargalhou de prazer como se fosse um vampiro que acabou de saciar sua fome por sangue.

A gerente levantou-se do chão olhando para aqueles homens e mulheres estranhos, todos de pele verde sorrindo amargamente para ela com seus olhares malignos.

— Obrigada — Ela agradeceu com medo. — Vocês nos salvaram.

Ace gargalhou de novo, e sua gangue acompanhou a risada.

— Dona, acho que tu nos entendeu mal. — Disse ele aproximando-se da mulher que ficou pasma diante da figura assustadora do rapaz transformado. — A gente veio roubar esse banco, só que os malandro ali chegaram primeiro. Mas, como você viu o que a gente pode fazer, você vai deixar a gente levar o que quiser de boa, né Dona?

A mulher respondeu engolindo seco e balançando a cabeça.

— Você quer a senha do cofre? — Perguntou ela.

— Não se de o trabalho, dona. Big Billy, faça a sua parte

O gigante verde de cabelo ruivo, andou com seus paços pesados que pareciam gerar leves tremores até a porta do cofre que era feita de um metal bem resistente, onde com um simples puxão, arrancou-a toda da parede como se fosse feita de papelão. Em seguida, a Pequena Artura, entrou lá correndo na velocidade do som enquanto segurava um saco de lixo e de segundo para outro, o cofre estava vazio e sua sacola estava cheia e pesada.

— Ho Ho Ho, meninos. O natal chegou mais cedo. — Disse ela em tom sarcástico.

— Beleza, galera. Nosso lance aqui tá feito. Vamos embora. A festa só está começando — Ordenou Ace enquanto acendia um cigarro. — Ah, Grubber, solta um som maneiro ai pra gente.

Então, enquanto saíam, Grubber, aquele corcunda de aparência incomum, surpreendentemente começa a cantar um trecho do final de “Bohemian Rhapsody” quase que perfeitamente, conseguindo replicar inclusive os instrumentos, como se fosse uma caixa de som viva.

“So you think you can stop me and spit in my eye

So you think you can love me and leave me to die

Oh, baby, can't do this to me, baby,

Just gotta get out, just gotta get right outta here”

E o quinteto verde partiu enquanto cantarolavam a música. Depois da adrenalina e toda aquela situação, a reação da gerente foi desmaiar no chão.

(trilha sonora: – Link Jo Blankenburg – Dystopic )

Os noticiários batizaram esses encrenqueiros de Gangue Gangreena, mas a violência e periculosidade deles era apenas uma pequena parte do caos anárquico que reinava sobre a cidade. Fuzzy Confusão, agora transmutado em uma grande e poderosa criatura peluda roxa dona de força descomunal, fazia jus a seu apelido, disputando as ruas com os policiais que tentavam detê-lo com seus revólveres, entretanto, balas de quaisquer calibre não lhe fazia nem cócegas agora. Os irmãos Protozovsky, agora chamados pelos noticiários de “Trio Ameba”, rastejavam em seus novos corpos unicelulares gosmentos pelos engarrafamentos, raptando pessoas com seus pseudópodes gigantes. A Femme invadiu uma joelheira, depois usou seus novos poderes de persuasão para fazer com que os próprios funcionários entregassem a mercadoria a ela. Por mais que a polícia e os bombeiros se esforçassem para proteger e resgatar os cidadãos, eles não eram o bastante. O caos e o fogo de prometeu se espalharam rápido demais para ser controlado.

E aonde estava o ser responsável por tamanha desgraça? Caco estava no topo de um edifício em construção que, futuramente, viria a se tornar o mais alto de Townsville, onde o símio mutante se encontra finalizando sua máquina que faria o mesmo que fez a cidade com o resto do mundo inteiro. Enquanto ligava vários cabos de alimentação que transferiram energia para sua engenhoca, o vilão permitiu distrair-se para contemplar por um momento a discórdia que havia criado. Para ele, aquilo era belo, era reluzente, era uma tempestade que viria antes de uma prazerosa calmaria. Para o seu mundo ideal ser criado, o anterior tinha que ser destruído e assistir de camarote a tal destruição lhe fazia sorrir de deleite.

Enquanto isso, na prefeitura Townsville, Prefeito Mayer, um senhor careca, baixinho, de monóculos e com bigode chamativo, estava em seu escritório tendo uma conversa difícil com o Presidente dos Estados Unidos pelo telefone ao mesmo tempo que assistia as calamidades noticiadas pelos jornais locais através do televisor de seu escritório.

— Entendo, Senhor Presidente. — Falava o Prefeito ao telefone. — Eu entendo sua posição, mas... O que? Sim, estou vendo tudo pela televisão agora mesmo.

Na TV, era exibido uma reportagem ao vivo do Canal 7 descrevendo a destruição que se espalhava por toda a cidade.

Uma série de criaturas mutantes estão devastando a cidade e como se já não bastasse, uma onda de crimes seguiu com ela. A cidade está se transformando na definição pura do próprio inferno. Hospitais estão recolhendo feridos aos montes e muitos estão próximos de atingir o limite. Muitos policiais estão bravamente enfrentando tais criaturas, mas sem sucesso devido às estranhas habilidades delas nunca antes vistas. Há relatos de uma criatura peluda e roxa causando destruição na Avenida Benjamin Franklin. Um trio de criaturas amebas gosmentas foram vistos raptando pessoas de seus de seus veículos mesmo em movimentos próximo ao parque de Townsville e agora pouco, uma gangue de homens verdes acabou de assaltar o Banco de Townsville. O Prefeito Mayer declarou estado de emergência e iniciou uma evacuação. Contudo, nem todos os habitantes estão em condições de abandonar a cidade, além dos engarrafamentos que estão dificultando a evacuação. Investigadores acreditam que a causa dessa situação caótica está ligada ao Homem-Macaco visto roubando um recipiente com o mesmo líquido mutagênico que gerou o incidente com as trigêmeas Utonium. Não temos qualquer informação de quando esta situação irá melhorar. Será que estamos em um beco sem saída? O que será de Townsville agora?

— Jesus Cristo nos ajude! — Exclamou o Prefeito ao ver a reportagem esquecendo-se do Presidente. — Desculpe, Senhor Presidente, eu me distraí por um momento. O que dizia?... O que?!! Senhor, isso é loucura! Não pode fazer isso. Estamos falando da cidade de Townsville, se fizer isso não irá matar apenas os bandidos, mas milhares de inocen... Eu sei que é questão de segurança nacional, mas esta é uma solução radical demais vale a pena sacrificar tantas vidas? A evacuação neste momento está em 45% e está em ritmo lento. Se fizer isso muitas pessoas perderão suas vidas sem falar dos hospitais que não podem evacuar com facilidade. Peço-lhe que ao menos me dê algum tempo para acelerar a evacuação... está bem. Obrigado, Sr. Presidente, vou fazer um bom uso desse tempo. — Ele desligou com ódio e depois gritou de frustração. — Filho da Puta!

O exausto senhor de bigode sentou-se em sua cadeira furioso e desesperado. Se ainda tivesse cabelos na cabeça estaria arrancando eles um por um pela tamanha frustração que sentia naquele momento. O Prefeito de Townsville era bom homem, mas não era conhecido pela aptidão em tomar boas decisões, ainda mais em ocasiões tão extremas. O que ele mais queria era afogar suas mágoas devorando um pote de picles dos quais ele era viciado, mas tinha que focar na missão. Ainda cabisbaixo, o Prefeito, ouviu outro barulho do telefone, desta vez era de sua jovem assistente que trabalhava na sala ao lado, avisando-lhe que uma agente do FBI estava querendo falar com urgência.

— Diga que eu estou ocupado tentando liderar uma crise histórica nunca vista antes. — Respondeu o Prefeito quase que de forma irônica.

“Senhor, ela disse que tem informações cruciais que podem nos ajudar”

O Prefeito bufou com desgosto e logo aceitou.

— Está bem. Deixe-a entrar.

A porta abriu-se e dela saiu uma bela mulher, a mais alta e atraente que ele teria visto em sua vida. Alta, pele morena, com belas curvas e longos, espessos e ondulados cabelos alaranjados que cobriam-lhe quase o rosto todo. A beleza da mulher era tão estupenda que chegava a ser assustadora de alguma forma. Só de encará-la, o Prefeito ficou vermelho como um pimentão e até fingiu uma tosse para disfarçar suas emoções e manter um comportamento educado e profissional. A moça usava um terno vermelho elegante com um cinto preto onde podia ver seu distintivo do FBI e ao lado de sua arma.

— Olá, Sr. Prefeito. Sou a Agente Sarah Bellum, trabalho no FBI. — Apresentou-se a moça com uma voz igualmente bela e suave.

Desajeitado, o Prefeito novamente fingiu uma tosse repentina para novamente disfarçar seu constrangimento e voltou-se com sua postura adequada e séria para evitar qualquer constrangimento. Tal situação o fez até recordar de quando conheceu a sua já falecida esposa quando ainda era jovem e ainda mais desajeitado perto de moças bonitas do que é hoje.

— Olá, Senhorita. O que a traz até mim nesses tempos tão difíceis? — Perguntou o homem.

— Se eu estiver correta... e Senhor acaba de falar com o nosso Presidente, não é?

— É, eu falei com ele. Ele disse que se eu não resolver isso a tempo, ele vai mandar bombardear a cidade, mesmo se isso matar inocentes.

— Estamos cientes da decisão dele. Contudo, a agência decidiu dar uma alternativa viável para esse dilema. Algo que certamente vai nos ajudar a resolver essa situação antes do prazo.

O prefeito levantou suas sobrancelhas ao se deparar com a novidade.

— Alternativa? E o que seria?

A moça deixou uma pasta transparente em cima de sua mesa. Curioso, o Prefeito a abriu e viu fichas e dados de três jovens que lhe eram muito familiares.

— Isto é um tipo de piada, Srta. Bellum?

— De maneira alguma, senhor. — Disse a moça com sorriso discreto em seu rosto.

— Achei que o objetivo fosse conter as aberrações e não soltar mais três para trazer ainda mais problemas a esta cidade — Questionou o homem que cruzou os braços desconfiado.

— Com todo respeito, o Senhor está agindo baseado nas emoções.

— É, talvez... devo estar pensando nos estragos e na dor de cabeça que essas três causaram a esta cidade e a mim em uma noite só. — Respondeu ele em tom de sarcasmo.

— Estamos falando de três meninas de catorze anos que até agora foram tratadas não muito diferentes de terroristas. Aqueles indivíduos lá fora, Senhor, nós reconhecemos alguns em nosso banco de dados. A maioria deles já eram malfeitores e criminosos fichados na polícia antes mesmo de suas “mutações”. Já essas três não tinham quaisquer fichas criminais anteriormente. Analisamos seus perfis, históricos escolares e entrevistamos todos aqueles que as conheciam. Todos dizem que eram apenas três adolescentes normais que viviam uma vida normal e honesta, nunca fizeram mal a ninguém em anos.

— Isso não as faz mais inocentes. Elas destruíram a cidade! — Apontou o Prefeito, mas a Sra. Bellum ainda persistia.

— Elas são crianças, Prefeito. Crianças e jovens cometem erros e com frequência, mas não os tratamos como bandidos e terroristas. Entenda, senhor, não nego os danos à propriedade que elas causaram, mas, é notório que as três não queriam objetivamente machucar ninguém. Foi uma briga de criança que saiu do controle. Sim, crianças com superpoderes, mas ainda crianças. Elas nem tem culpa de seus poderes. A agência tem experiência em indivíduos anômalos desde o período pós-guerra. Já lidamos com adolescentes com superpoderes antes e afirmo, podemos ajudar e moldar essas meninas, torná-las algo maior e melhor. Com os poderes delas, elas poderão nos ajudar facilmente a virar esse jogo. Existem pessoas acima de mim que acreditam nisso também e é por isso que estou aqui.

— Está me dizendo para tornarmos estas três jovens em super-heroínas? — Perguntou o Prefeito refletindo sobre as palavras da moça.

— Em resumo...

O Prefeito bufou ao sentir-se pressionado e indeciso. Tinha que tomar uma decisão, pois as vidas de milhares dependiam disso. Contudo, sua cabeça só pensava em devorar um pote de picles...

— Que Deus nos ajude. Essa é nossa única alternativa? Tem certeza do que está fazendo, Agente Bellum?

— Senhor, analisamos todo o caso delas. Estudamos elas, seus poderes e personalidades. Acredito com absoluta certeza que elas vão cooperar. É uma opção muito melhor que deixar metade da cidade morrer em vão.

— Tudo bem. Você me convenceu, Agente Bellum. Vou falar com a Comissária de Polícia. A cidade irá cooperar totalmente com o FBI nesse caso. Irei focar na evacuação e deixarei todas as minhas esperanças em você, senhorita. — Ele afirmou com olhar decidido.

— Uma decisão inteligente, senhor. Prometo que não iremos decepcioná-lo.

— Espero que sim. A cidade conta com isso.

— Só mais uma coisa, senhor. Gostaria de me fizesse um pequeno favor...

— E o que seria? — Perguntou curioso.

( Trilha Sonora: : Solitude – Black Sabbath

Algum tempo depois, em algum lugar dentro da ilha-prisão próxima a baía de Townsville, as trigêmeas Utonium se encontravam confinadas em uma cela especial de cor branca com apenas três camas desconfortáveis acompanhadas apenas de um silêncio irritante que se fixou no ar. Depois de tudo pelo que passaram, era de se esperar que as irmãs estivessem tristes, solitárias e desesperadas, cada uma, é claro, à sua maneira. Lindinha, a loira sensível, chorava e chorava de forma silenciosa e em posição fetal contra a parede. Só pensava o quanto as pessoas a odiavam ainda mais pelo que havia ajudado a fazer. Pessoas que ela amava de coração, e incluía seu namorado Mike nessa lista de ódio, talvez até no topo dela. A garota tinha esse pesadelo acordado em que seus amigos e todos que conhecia gritavam “Aberração” repetidas vezes enquanto a encaravam com olhares amargos e tal delírio parecia ter fixado em sua mente e se recusava a ir embora.

Já Docinho, a morena durona, descarregava seu ódio jogando repetidas vezes uma bolinha pula-pula, dada por um dos guardas que as vigiava a cela para evitar que ela fizesse mais buracos nas paredes de aço reforçado de tanto socá-la para extravasar a raiva. A jovem pensou até em fugir, pois a fuga seria fácil com sua força e velocidade, mas suas irmãs a convenceram do contrário. Além do mais, pra onde ela iria? Só lhe restou suas irmãs e agora mais que nunca, ela precisava delas, mesmo não admitindo isso.

Por fim, Florzinha, a ruiva esperta, apenas deitou-se em sua cama tremendamente desconfortável e fingiu dormir. Até tentava esperar o sono, mas estava à mercê de seus próprios pensamentos que a torturavam. “Esperta uma ova!” reverberava em sua mente como se a própria culpa gritasse em sua cabeça. Depois de ser manipulada, usada e humilhada daquele jeito, só pensava que deveria ser honesta consigo mesma e atear fogo em todas as suas notas “A”. Nenhuma prova a preparou para a vida de verdade. Quando ficou sem esperança, ignorou seus instintos e confiou, literalmente, no primeiro MACACO que apareceu em sua frente. “Como eu pude ser tão burra?” ela perguntava a si mesma. A ruiva tentou chorar também, mas as lágrimas haviam secado. Pensou em socar algo também, mas suas forças haviam se esvaecido. A imagem de sua mãe apareceu repentinamente em seus pensamentos. Sua voz doce, seu olhar gentil, seus conselhos e broncas todos resgatados da época em que tinha cinco ou seis anos. Tudo o que ela queria na vida era ser como ela. Uma mulher forte, gentil e inteligente, e o mais importante, com um coração esperançoso. Contudo, talvez estivesse só enganando a si mesma esse tempo todo. Talvez, não merecesse isso.

No lado de fora, a cela era vigiada por um guarda gordinho que observava as três irmãs pelas imagens das câmeras de segurança enquanto degustava uma vitamina do Sr. Sorvete. Ao lado dele estava a Agente Sarah Bellum, que também observava as meninas nos monitores, acompanhada de outros homens do FBI vestidos preto seguindo suas ordens.

— Há quanto tempo elas estão assim? — Perguntou a agente ao guarda.

— Faz algumas horas. A que tem cabelos pretos tentou fugir abrindo uns buracos com a força bruta, mas acho que mudou de ideia na hora. Fiquei chocado. Nunca vi nada como isso na vida. — Declarou o guarda.

— Fala de garotinhas superfortes? Não é algo comum mesmo.

— Não, eu falo delas não quererem fugir desse lugar. — Disse o guarda que interrompeu a própria fala para dar mais uma sugada em sua vitamina. — Nem eu quero estar aqui nesse inferno. Tenho certeza que nem vocês e nem os prisioneiros gostam deste lugar. Mas, essas três, parecem que são as únicas que querem estar aqui por livre espontânea vontade. É bizarro!

— Quer saber, seu guarda? Você tem toda razão. — Afirmou a agente. — Já observamos o suficiente. Libere as portas, quero falar com elas.

— Sim, senhorita. — Disse o guarda.

Sufocadas em seu próprio isolamento, as meninas escutam os rangidos altos da porta eletrônica de aço pesado se abrindo vagarosamente. As três se assustam e ficam confusas com o que estava acontecendo. Quem estaria atrás da porta? Logo, a bela agente de terno vermelho e longos cabelos alaranjados elegantes e de salto alto entra na sala e fica diante das jovens. Docinho ignorou com desdém e voltou a jogar a sua bolinha. Lindinha encarou a moça assustada e em seguida tentou enxugar suas lágrimas disfarçadamente. Florzinha distraiu-se por alguns segundos com a bela fisionomia da moça mais velha e ficou vermelha de vergonha por um instante.

— Dia difícil, né? — Disse a Srta. Bellum com braços cruzados.

— Dia... semana... mês... vida... — Completou Docinho em tom de sarcasmo.

— Vocês pisaram na bola feio, não é mesmo? — Disse a moça. — Colocaram a cidade em uma baita enrascada.

— Escuta, ô da cintura fina, você vem aqui interrompeu o nosso silêncio pra ficar ai falando o que a gente já sabe?! — Disse a tomboy aborrecida. — Se toca, a nossa vida já é uma merda sem você ficar jogando na nossa cara. Na real, vai tomar no seu...

— Docinho! — Repreenderam as irmãs ao verem a grosseria de sua irmã.

Bellum apenas riu suavemente ao ver a criancice das meninas, que ironicamente, achou adorável.

— Escuta, quem é você? — perguntou Lindinha.

— Meu nome é Sarah Bellum. Trabalho para o FBI. Peço desculpas pelo incómodo, mas quero fazer uma proposta importante para vocês.

— Você é uma agente do governo? — Questionou Docinho dando risada. — Pensei que o FBI fosse lugar de gente durona não de top models frouxas. Essa conversa eu não engulo, deve ser uma pegadinha.

— É tão difícil de acreditar assim? Eu não posso ser durona e atraente ao mesmo tempo? Quem inventou essa regra?

— A lógica talvez. — Afirmou ingenuamente a garota morena.

A agente novamente riu discretamente da imaturidade da garota. Ela pegou sua carteira e mostrou seu distintivo para a morena. Docinho logo notou ao lado do distintivo uma foto dela no exército americano com uma aparência bem diferente da atual, mas percebe que era mesma pessoa pelos cabelos ruivos só que curtos.

— Isso é durona o bastante pra você?

Surpresa, Docinho apenas respondeu com silêncio.

Impaciente, Florzinha se meteu na conversa.

— Escuta, você disse que iria fazer uma proposta pra gente, diga logo! — Exigiu Florzinha.

— Eu já ia chegar lá. — Disse a moça que tomou uma postura séria e profissional. — Meninas, vocês erraram. Sabem que erraram, mas nós também erramos. Quero dizer, vocês são jovens, ainda tem um futuro pela frente. Eu venho aqui representando não só o FBI, mas a própria cidade Townsville. Peço que nos ajudem a parar aquele chimpanzé mutante que vocês conhecem como Caco.

— O Macaco Louco. — Relembrou a loira.

— Esse mesmo. Ele montou um exército usando o Elemento X e estão destruindo a cidade inteira. O governo federal quer soluções radicais para resolver isso, mas o Prefeito de Townsville e o FBI acreditam que vocês são a nossa melhor chance. Se nos ajudarem, podemos negociar sua liberdade. Com pouca idade e seu histórico anterior, tenho certeza que...

Florzinha se enfureceu com as palavras da moça e a interrompeu rudemente.

— NÃO! — Gritou ruiva bem alto deixando Bellum e suas irmãs confusas.

— Não o quê, Florzinha? — Perguntou Docinho aborrecida. — Essa pode ser a nossa chance de...

— Não tem chance, Docinho! — Interrompeu a ruiva de novo. — Não aprendeu a lição ainda? Nós causamos aquilo! Caco nos usou, nos manipulou como se fossemos crianças de cinco anos querendo doces.

— Mas, Florzinha, a cidade está sendo destruída! Nós somos as únicas que podem fazer alguma coisa. — Argumento Lindinha.

— E por culpa de quem? — Insistiu ela deixando finalmente as emoções a dominarem e finalmente se permitindo chorar. — Por nossa culpa Lindinha! Nossa culpa! Nós pioramos tudo. Será que não percebem? Nós não somos normais, não podemos ter família, amigos ou uma vida e muito menos salvar o mundo. Nós nascemos para destruí-lo que nem o Caco. Podemos fingir que não, mas somos iguais a ele. Nosso lugar é aqui, longe de tudo e todo mundo.

Lindinha e Docinho trocaram olhares tristes não querendo admitir que a irmã estava certa por mais doía.

— Ela tem razão. — Confessou Lindinha cabisbaixa. — Não merecemos isso. Nosso lugar é aqui.

— Além disso, ô da cintura fina, não temos razão para confiar em você. Já vamos enganadas uma vez, não vamos fazer isso de novo. — Completou Docinho.

Srta. Bellum ficou decepcionada com a reação das meninas, mas não ficou surpresa. Depois de tudo o que passaram era de se esperar que elas não confiassem em ninguém, inclusive, em si mesmas. Contudo, a agente tinha uma carta na manga. Ela aproximou-se de Florzinha que chorava tudo o que não tinha chorado antes e a bela moça colocou a mão em sobre o ombro da garota demonstrando empatia pelo seu sofrimento e com voz doce e acolhedora ela disse:

— Eu sinto pelo que vocês passaram. Sinto mesmo. O mundo lá fora parece que se esqueceu que vocês são só crianças e não tem qualquer culpa de serem o que são. Mas, eu estou aqui pra mudar isso. Estão certas em não confiar em mim, mas saibam que não precisam. Por que eu conheço alguém em que vocês confiam com própria vida e essa pessoa acredita muito em vocês. Pode entrar, Professor Utonium.