"A miragem que estava tão distante,
agora está diante dos meus olhos
Eu sou um cantor nato,
apenas um pouco cedo para confessar
De qualquer forma, estou feliz
Sou bom"

Born Singer — BTS

Fazia um tempo que Tae havia pedido licença para atender uma ligação e Luna já estava ficando entediada por estar sozinha na mesa tendo apenas seu café amargo e um bolo de chocolate como companhia.

Eles haviam entrado em um café estilo retro que era bem aconchegante; uma coisa que chamou a atenção de Luna assim que ela entrou foi a jukebox que estava encostada perto do balcão do café, mas não era uma daquelas atuais que eram cheias de botões e sim uma daquelas bem antigas que precisava botar uma moeda para funcionar, do tipo que aparecia em algumas cenas do filme "Greese - Nos Tempos da Brilhantina", era impossível Luana não se lembrar do filme toda vez que olhava em volta. Outra coisa que lhe chamou a atenção – além é claro da decoração estilo anos 80 e o piso de lajotas preto e branco – foi o fato de que os garçons e as garçonetes do lugar usavam patins nos pés ao invés de sapatos normais; "Deve ser divertido ser pago para andar de patins o dia inteiro...", brincou Taehyung assim que eles entraram no café.

— Está tudo bem por aqui? – perguntou a mesma garçonete que os havia atendido quando chegaram se aproximando da mesa em que, agora, Luana estava sozinha, tirando a morena de seus pensamentos.

Taehyung conhecia essa garota. Luna constatou isso assim que eles entraram no café. Ela havia o recebido com um "oi" amigável e ele perguntou como ela havia passado as férias, depois eles tiveram uma pequena conversa sobre o namorado aparentemente idiota dela enquanto Luana decidia o que iria pedir. Mas assim que fizeram os pedidos a garota se afastou rapidamente para atender outros clientes. Depois disso, Luana e Taehyung começaram a conversar sobre coisas banais; a tal garçonete voltou apenas para entregar seus pedidos e logo se afastou mais uma vez. Mas agora, lá estava ela novamente...

— Está. – Luana finalmente respondeu apontando levemente para o garoto que estava um pouco mais afastado da mesa parado perto da jukebox –, estou apenas o esperando...

— Ah... – a coreana encarou Taehyung que parecia entretido com a conversa que tinha com quem quer que estivesse do outro lado da linha. – Ele deve estar falando com um dos meninos...

— Você conhece os amigos dele? – perguntou Luana encarando a garota que não parecia ser mais velha que a própria.

— Sim, eu estou no segundo ano da Seoul's Artistic University – respondeu a garota –, conheço os meninos apenas porque sou da mesma turma de dança, canto e atuação que o MongTae ali – ela apontou para o coreano com um movimento de cabeça antes de olhar novamente para Luana que franzia a testa ao ouvir o apelido que a coreana usava para se referir a Taehyung e lhe estender a mão. – Me chamo Song Hayoon.

— Luana – disse a morena juntando uma de suas a mão a da outra garota em um aperto de mão amigável.

Song Hayoon era claramente coreana, seu rosto pequeno possuía traços finos e delicados, seus olhos eram azuis claros – algo que Luna estranhou já que asiáticos não tinham olhos claros – e seus lábios eram levemente cheios e rosados; não parecia ser muito mais alta que Luna, talvez tivesse 1,75 ou algo assim; seu corpo era magro, mas sua silhueta era bonita e talvez um pouco fora dos padrões coreanos, mas nada que fosse realmente tão diferente. Seus cabelos eram longos e levemente ondulados nas pontas, e Luana não tinha muita certeza, mas não achava que o tom loiro deles era natural.

— Você é de onde Luana? – perguntou Hayoon se sentando em frente a ela no mesmo lugar que o Kim estava minutos antes sem se importar se alguém estava olhando.

— Sou do Brasil – respondeu ela fazendo a coreana arregalar levemente os olhos de surpresa. – Estou entrando agora no primeiro ano da Seoul's Artistic University...

— Agora entendi porque MongTae parece gosta tanto de você... – disse ela rindo fazendo Luana franzir o cenho em curiosidade, Hayoon se apressou em responder – Ele costuma gostar mais de pessoas estrangeiras, acha que elas são diferentes e muitas vezes bem mais divertidas que as pessoas que encontramos por aqui – a garota olhou em volta e Luna a imitou vendo os outros universitários/clientes conversando baixinho em suas mesas enquanto tomavam suas bebidas e comiam alguma coisa. – E, para ser sincera, eu concordo com ele; a maioria das pessoas daqui são muito quietas...

— Vocês são bem mais agitados do que eu esperava – disse Luana se encostando ao encosto da cadeira enquanto olhava para o pedaço de bolo que agora estava pela metade em um prato em cima da mesa a sua frente.

— Bem, ai depende de quem se fala – disse Hayoon em tom de brincadeira. – O MongTae definitivamente não é nem um pouco quieto, nem nenhum amigo dele e eu com certeza me incluo nisso...

— Por que você o chama de MongTae? – perguntou Luana bebendo mais um gole de seu café sentindo o gosto amargo descer queimando por sua garganta.

— O TaeTae tem a mania de dar uma volta no mundo da lua de vez em quando e, quando ele faz isso, ele fica mais ou menos assim... – a coreana relaxou os ombros, olhou para um ponto fixo na mesa, entreabriu os lábios começando a respirar pela boca, Hayoon ficou naquela posição por alguns segundos fazendo Luana soltar uma risada sendo logo seguida pela outra.

— O que vocês estão fazendo? - perguntou Taehyung curioso enquanto se aproximava da mesa parando ao lado da mesma e apoiando um dos braços no encosto da cadeira de Hayoon e o outro na cintura. Ele tinha um sorriso divertido no rosto, estava feliz em saber que as duas estavam se dado bem.

— TaeTae, quem sou eu? - perguntou a coreana parando de rir apenas para refazer novamente a mesma posição, arrancando mais risadas de Luana.

— Yah, eu já disse que não faço isso! – indignou-se o garoto enquanto ria um tanto envergonhado.

— Ah, você faz sim – acusou Hayoon ainda soltando pequenas gargalhadas, Luana já não sabia se estava rindo da imitação da garota ou de sua risada que por si só já era muito engraçada.

— Você não deveria estar trabalhando agora Hayoon – emburrou-se Taehyung cruzando os braços para a garota.

— Talvez, mas é muito mais divertido constranger você – respondeu Hayoon se voltando novamente para Luana. – Sabia que o TaeTae já participou de um concurso drag queen?

Luana se limitou a balançar a cabeça em negação enquanto ria tentando imaginar aquele garoto em um vestido. O coreano bufou chamando a atenção das duas para si.

— E é justamente por causa disso que eu consigo andar de salto alto muito melhor do que você! – ele mostrou língua para a garota em um ato totalmente infantil.

— Vamos dizer a verdade TaeTae, você consegue andar de salto alto melhor que mais da metade da população feminina do planeta – disse a coreana rindo.

— Não sei se eu acho isso completamente estranho ou muito engraçado – disse Luana alternando o olhar entre os outros dois enquanto tentava prender o riso, ela não conseguia não imaginar Taehyung com um vestido florido e salto alto...

— Estamos falando do MongTae aqui, então podemos considerar como uma coisa completamente estranha e muito engraçada! – afirmou a coreana se levantando da cadeira para que Taehyung pudesse voltar a se sentar, afinal ele era o cliente ali e não ela. – E os meninos, como estão?

— Na mesma... – disse o garoto roubando um pedaço do bolo de Luana recebendo uma cara de indignação da garota que lhe deu um pequeno tapa na mão, TaeTae fez uma careta de dor e acariciou o local atingido antes de continuar a falar. – Vou encontra-los em dez minutos no estacionamento perto do prédio 3, quer vir?

— Vou estar ocupada – respondeu a garota. – Caso você não tenha percebido eu estou trabalhando e eu sou super focada no meu trabalho...

O tom irônico em sua voz fez Luana soltar uma pequena risada, logo a garota começou a se afastar devagar com seus patins acenando levemente para os dois.

— Ela é legal! – afirmou Luana, havia gostado da companhia da garota, mesmo que por pouco tempo.

— Sim – concordo Taehyung balançando a cabeça para a morena. – Eu acho que ela puxou o bom humor de seu pai, ele é australiano, já sua mãe é coreana mesmo.

— Você disse que vai ter que encontrar os seus amigos em alguns minutos? – perguntou a garota voltando a encara-lo.

— Sim, eles tinham saído para almoçar e aproveitaram o tempo bom para passear pela cidade – respondeu ele. – Se quiser vir junto será muito bem-vinda, acho que meus amigos vão gostar de te conhecer, eles nunca viram uma brasileira antes.

— Seria legal oppa, mas eu acho melhor eu voltar para meu dormitório – disse Luana olhando a hora em seu celular, quase seis e meia. – As minhas amigas já devem ter voltado e podem ficar preocupadas.

— Tudo bem, então te deixo em frente do dormitório feminino – ele deu de ombros e Luana terminou de comer rapidamente seu bolo antes que Taehyung se lembrasse da existência do mesmo e tentasse roubar mais um pedaço, percebeu que o garoto comia muito quando acabou rapidamente seus dois brownies e a lata de Coca-Cola que lhe foram entregues antes mesmo que Luana desse a décima garfada em seu bolo

Logo que entraram no café ambos concordaram em rachar a conta para não tivesse aquela famosa briga do "Deixa que eu pago" antes de finalmente pagarem. Despediram-se de Song Hayoon e logo estavam fora da lanchonete caminhando calmamente em direção ao prédio 5. Passaram o caminho todo em, apenas aproveitando a caminhada pelo campus. Na hora da despedida Luana quase se esqueceu dos costumes do país e abraçou o garoto, por sorte ela lembrou exatamente de onde estava antes que fizesse algo que poderia deixar o outro sem graça. Eles se despediram com uma reverência e logo cada um estava seguindo seu próprio caminho.

Luana subiu a escada do prédio com calma e refez o caminho para seu quarto pela terceira vez apenas naquele dia, ao abrir a porta do quarto encontrou suas amigas ali jogadas em cima das duas camas.

— Ah, vocês voltaram — disse Luana entrando no quarto chamando a atenção de suas dongsaengs.

— Onde você estava? — perguntou Bia com curiosidade enquanto sua unnie retirava seus tênis e colocava-os ao lado dos sapatos das outras quatro perto da porta.

— Sai para comer alguma coisa — respondeu empurrando Vanessa que estava sentada na ponta de sua cama para lado antes de se jogar bem no meio do móvel. – Como foi o passeio?

— Foi divertido — respondeu Vanessa se sentando novamente na cama, no mesmo lugar que estava antes, mas dessa vez cruzando suas pernas como um índio.

— A Coreia é um lugar realmente incrível! — disse Lia com um olhar sonhador no rosto.

— Tem certeza que você está falando da Coreia? — brincou Drica com um sorriso malicioso nos lábios. – Não teria um Namjoon oppa no meio disso não?

Malia revirou os olhos e deu um tapa no braço de sua amiga que estava sentada ao seu lado na cama, não era a primeira vez que faziam brincadeiras desse tipo desde que chegaram no dormitório, Lia se arrependeu de ter comentado sobre Namjoon no momento em que ouviu a primeira piadinha sobre o assunto, por que elas precisavam voltar naquele assunto a cada 4 segundos? Não dava para começarem a falar sobre os comentários que Bia havia feito sobre Kim Seokjin? Eram bem mais comprometedores, disso a garota tinha certeza.

Namjoon oppa? — repetiu Luana de forma sugestiva deitando-se de barriga para baixo na cama e encarando as amigas enquanto apoiava a cabeça em suas mãos.

— Conhecemos alguns garotos durante o passeio — explicou Vanessa olhando para sua unnie – Lia unnie disse que havia gostado de Namjoon que é um desses garotos, então você já pode imaginar o que aconteceu depois.

Vocês conheceram alguns garotos? — perguntou Luna encarando a maknae que concordou com a cabeça, a mais velha abriu um sorriso brincalhão fazendo a mais nova franzir o cenho – Nessa, você sabe que só podemos dizer que conhecemos alguém se conversamos com essa pessoa, né?

— Aigo, unnie! — reclamou cobrindo o rosto com as mãos com medo de corar com aquele simples comentário causando risadas nas outras quatro, a mais nova tirou as mãos da frente do rosto quando teve certeza que o sangue não subiria para suas bochechas repentinamente e revirou os olhos sentindo-se um pouco envergonhada, não era como se ela não conseguisse conversar com desconhecidos, apenas era tímida de mais para puxar uma conversa – Sim eu sei disso, okay? E eu conversei com eles! São pessoas legais e estudam aqui também...

— Eu também conheci um garoto que estuda aqui — disse Luana puxando o travesseiro para perto e deitando a cabeça em cima do mesmo – O nome dele é Kim Taehyung e ele é do segundo ano.

— Nós conhecemos seis garotos no total — disse Beatriz levantando seis dedos em sua direção – Tinha o Park Jimin, Jeon Jungkook, Kim Namjoon, Jung Hoseok, Kim Seokjin e Min Yoongi, acho que não errei o nome de ninguém...

— Agora eu tenho amigas populares — brincou Luana soltando uma risada. – Conhecendo o pessoal mais velho, né suas safadas...

— E como você espera que sejamos convidadas para as festas de arromba da faculdade se não conhecemos ninguém mais velho? — brincou Lia rindo.

— Falando em festa, vamos sair hoje? — perguntou Drica de repente fazendo as outras quatro a encararem – Podemos ir à boate que eu vi mais cedo quando estávamos voltando, ela não é muito longe daqui, na verdade. Se eu não me engano o nome é Octagon.

— Octagon? — perguntou Vanessa franzindo a testa e inclinando a cabeça levemente para o lado – Acho que já ouvi falar de lá...

— Vamos sim ou não? — perguntou Ádrian ansiosa, apenas queria ter uma primeira noite inesquecível naquele lugar e não existia nada melhor que fazer uma pequena noitada com suas amigas... Bem, talvez existisse, mas o que ela realmente queria era ficar com suas amigas e curtir uma boa musica, dançar e beber um pouco, qual seria o gosto de Soju? Ela sempre quis provar a bebida, mas como ela não existia no Brasil ainda não havia tido a chance de experimenta-la.

— Pode ser legal — disse Bia olhando para as outras três –, eu até estou um pouco cansada, mas me deu uma vontade repentina de sair... Além de que, não temos muita coisa para fazer agora, eu e Lia só precisamos terminar de arrumar nossas coisas o que com certeza vai demorar menos de duas horas, ficaremos entediadas se continuarmos aqui...

— Nisso a Bia tem razão — disse Lia balançando a cabeça –, eu acabei dormindo um pouco na volta pra cá, então estou um pouco mais descansada agora e não quero ficar enfurnada dentro do dormitório sem nada para fazer e seria bom ver como esses lugares funcionam por aqui.

— Estou dentro! — disse Luana surpreendendo suas amigas que imediatamente a encararam de olhos arregalados – O que? Eu não tenho mais nada para fazer por aqui também e tenho certeza que não vou conseguir dormir tão cedo!

— E como sempre eu vou ficar sozinha... — disse Vanessa suspirando enquanto brincava com seu relógio de pulso.

— Ou você poderia vir com a gente — disse Drica dando de ombros para a irmã que revirou os olhos e a encarou com a famosa cara de “Sério mesmo que você ‘tá falando isso?” A resposta à pergunta de Ádrian era bem óbvia para qualquer um que visse a careta no rosto de sua irmã mais nova, a mais velha deu de ombros. – Não vai ser nada de mais Nessa, só vamos a uma boate qualquer, você vai poder dançar um pouco e se divertir com a gente, não teria nem porque ficar tímida, certeza que o local vai estar lotado então eles não vão prestar atenção só em você!

— Eu sou menor de idade — apontou a maknae olhando para a irmã –, não posso nem dirigir ainda e você quer que eu entre em um lugar onde pessoas abaixo de 19 anos não são permitidas?

— Em termos simples... É isso mesmo — concordou Ádrian balançando a cabeça fazendo sua irmã revirar os olhos.

— Não, obrigada, prefiro esperar mais alguns meses antes de me meter em uma loucura dessas... — disse ela se levantando da cama e arrumando suas roupas. – Mas vocês podem ir sem problema nenhum, vou ficar bem sozinha, posso explorar um pouco mais o campo, ou ficar em um dos estúdios, sei lá... — deu de ombros. — Eu dou meu jeito.

— Se você diz— falou Lia repetindo o gesto da maknae.

— Agora vamos vocês duas — disse Vanessa olhando para Bia e Lia que a encararam com o cenho franzido em confusão – Eu vou ajudar vocês a terminarem de arrumar suas coisas.

As duas se levantaram em menos de três segundos e logo se despediram de Drica e Luna que ficariam em seu quarto antes de saíram as pressas do lugar levando Nessa com elas, não deixariam a oportunidade de uma pequena ajuda para arrumar a bagunça que estava o quarto que compartilhavam escapar...

Elas caminharam em direção à porta do quarto que ficava do outro lado do corredor e destrancaram a mesma dando espaço para que Vanessa pudesse entrar no local; a primeira vista o quarto em si não estava tão ruim, o problema eram as roupas que estavam espalhadas pelo local, as duas não haviam achado um jeito de arrumar as coisas no baú e acabaram se enrolando ainda mais com aquilo. Vanessa soltou um longo suspiro ao ver o trabalho que teria ali e quase se arrependeu de ter se oferecido para ajudar para arrumar, mas agora já era tarde de mais para voltar atrás.

°-°-°-°-°

Malia estava em frente ao prédio 5, sentada em um dos bancos que estava em baixo de uma árvore. Ela havia demorado cerca de uma hora inteira para conseguir arrumar sua parte do quarto mesmo com a ajuda de Vanessa, quando finalmente terminou disse que deixaria as duas sozinhas e saiu do quarto antes que tivessem a chance de pedir que ela ficasse para ajuda-las a arrumar a parte de Bia, e Lia tinha certeza que Vanessa lhe xingaria muito por causa disso.

Lia observava tudo a sua volta, prestando atenção aos mínimos detalhes. Em sua opinião era algo incrível que elas estivessem ali, pela primeira vez estava fazendo algo por conta própria sem dar a chance para que seus pais voltassem a se meter em sua vida, agora ela estava sob sua própria direção...

Os pais de Malia não eram más pessoas, apenas gostavam de ter tudo ao seu controle. Seu pai era um grande empresário internacional e sua mãe era cirurgiã muito famosa, ambos estavam sempre buscando fazer o que achavam que era melhor para sua filha, independente da opinião da garota e por isso Malia costumava se sentir sufocada quando estava perto deles, mas Lia tentava ao máximo deixar aquilo de lado porque ela sabia que tudo o que eles faziam era por amor. É claro que ela não podia negar que estar ali na Coreia sem sua mãe falando sobre o que ela deveria vestir ou seu pai dizendo com quem ela poderia sair, era extremamente libertador; ela sabia bem que eles não gostavam muito daquela ideia que ela tinha de seguir o ramo artístico, mas não se opuseram a sua faculdade como ela esperava que fossem fazer, o que a havia deixado bastante feliz, era a primeira vez que eles apoiavam uma de suas escolhas, mesmo que minimamente...

— Cabeça cheia? – Malia se virou imediatamente ao ouvir uma voz perto de si, quase caindo do banco no processo.

— Que susto, garoto! Meu Deus! Não faz isso comigo não, que eu sou cardíaca! – disse ela colocando a mão no peito sentindo seu coração martelar pelo susto enquanto olhava para Kim Namjoon.

— Desculpe! – pediu ele soltando uma pequena risada enquanto se curvava levemente, mesmo que tenha se incomodado um pouco por ela ter falado com ele de um modo um tanto informal tentou ao máximo não demonstrar, sabia que por ser Brasileira provavelmente não estava acostumada com os tratamentos que eram utilizados ali – Não percebi que você estava tão distraída...

— Tudo bem – disse ela balançando a cabeça – O que faz aqui?

— Estava entediado então resolvi caminhar um pouco para ver se tinha algo de interessante para fazer pelo campus quando eu te vi – ele deu de ombros se aproximando mais do banco – Posso sentar ou você está esperando alguém?

— Fique à vontade – ela deu de ombros, Namjoon se sentou na outra ponta do banco se virando em sua direção enquanto Lia fazia o mesmo, estavam perto o suficiente para que seus joelhos se encostassem de vez em quando, mas longe o suficiente para que ninguém olhasse torto em direção a eles caso conseguissem vê-los escondidos a sombra da árvore – Onde estão os outros meninos?

— Hoseok Hyung, Jimin e Jungkook estão na sala de ensaios com o nosso amigo, o Taehyung, não sei se você lembra mais falamos sobre ele mais cedo – ele a encarou e ela acenou levemente com a cabeça concordando, lembrava vagamente de ouvi-los falando sobre um tal de TaeTae antes de se separarem, então aquele era provavelmente esse Taehyung que Namjoon comentara – Jin Hyung disse que iria arrumar seu quarto quando chegamos ao campus e Yoongi Hyung provavelmente está fazendo o mesmo, ou então está no estúdio, não tenho certeza...

— O que seus amigos estão ensaiando? – perguntou curiosa se inclinando levemente na direção do garoto. – As aulas ainda nem começaram e vocês estavam falando sobre uma coreografia nova mais cedo.

— Antes do inicio das aulas a escola tem o costume de fazer uma pequena apresentação para os alunos novatos com o intuito de mostrar o que eles apreenderão no decorrer do ano e, nesse ano, eles convidaram nosso grupo para se apresentar, além de terem pedido para os meninos que fazem aulas de dança farem uma apresentação especial – Namjoon estava claramente orgulhoso com aquilo, seu sorriso demonstrava isso mais do qualquer coisa e Lia precisou se controlar para não apertar as bochechas dele e brincar com suas covinhas...

— Eu não sabia sobre essa apresentação – murmurou ela ainda apreciando a existência das covinhas do garoto. Se Drica tinha uma queda por covinhas, Malia tinha um penhasco inteiro...

— E suas amigas, onde estão? – perguntou ele sem parecer notar que ela estava praticamente babando por suas covinhas.

— Nessa ficou no quarto que estou dividindo com Bia para ajuda-la a arrumar suas coisas – ela disse olhando para o prédio que se erguia mais a frente. – Drica provavelmente está no quarto que divide com Luana unnie tentando decidir o que vai vestir hoje anoite...

— Vestir hoje anoite? – perguntou ele franzindo a testa levemente.

— Vamos sair mais tarde – explicou Malia. – Drica queria ir em um lugar chamado Octa-alguma-coisa e resolvemos acompanha-la.

— Octagon? – perguntou surpreso.

— Sim, conhece? – perguntou vendo ele balançar a cabeça em concordância; ao prestar atenção ao que havia falado Lia começou a se bater mentalmente apesar de ter apenas revirado os olhos por fora. – Que pergunta besta Malia, como ele saberia o nome se não conhecesse o lugar?

Namjoon riu da atitude da garota que riu de sua própria desgraça junto com ele.

— Na verdade faz um tempo que não entro naquele lugar, ano passado íamos ao menos uma vez por semana depois que Jungkook completou 19 anos – ele soltou uma pequena risada anasalada – Eu e os meninos gostávamos de sair um pouco da rotina de vez em quando e um lugar como aquele é perfeito para isso.

— Você quer ir hoje com a gente? – perguntou Malia fazendo o garoto ficar um pouco surpreso, ela deu de ombros tentando ao máximo não corar ao perceber que havia praticamente chamado-o para sair. – Seria legal ir para a cidade com pessoas que a conhece bem, você poderia chamar os meninos, ai podemos ir todos juntos...

— Suas amigas não vão ligar se formos com vocês? – perguntou ele hesitante.

— Elas gostaram da companhia de vocês então não seria problema – ela deu de ombros. – Além disso, Jin oppa tem um carro, então vai ajudar muito a nossa situação...

— Se você diz... – ele deu de ombros pegando seu celular para mandar uma mensagem para os meninos e Lia fez o mesmo mandando um simples Teremos carona hoje anoite, os meninos vão com a gente, nem uma delas apareceu para reclamar então Lia constatou que elas não se importariam com aquilo.

— Elas concordaram – disse Lia para Namjoon que ainda mexia em seu celular.

— Os meninos também, mas ainda não recebi a resposta do Yoongi hyung... – ele parou um minuto para ler uma mensagem que mandaram para ele e suspirou preocupado – Jin-ie hyung disse que foi procurar por ele no quarto porque talvez estivesse dormindo, mas disse que Suga hyung não estava lá e que seu celular estava em cima da cama...

— Suga? – perguntou Lia confusa.

— Ah, sim, este é o nome artístico de Yoongi hyung – disse Namjoon. – Um de nossos sunbae que lhe deu esse nome, ele disse que era por causa da aparência fofa de hyung e porque sua pele é um pouco branca de mais.

— Bem, até que isso faz sentido... – ela sorriu ao lembrar-se da cor de pele de Yoongi, se ele fosse loiro ela até poderia acreditar que o mais velho era albino. – Mas o fato de ele estar fora de seu quarto sem o celular é muito ruim?

— Bem, ele não costuma ir para lugar nenhum se não tiver o celular a sua disposição então eu talvez isso seja algo muito ruim – ele soltou mais um suspiro antes de levantar o olhar para a garota e sorri minimamente –, mas eu não preciso me preocupar com isso agora, ele pode estar apenas caminhando por ai e quando der falta de seu celular vai voltar correndo para o dormitório e ver as mensagens.

— Se você diz – a garota deu de ombros olhando em volta sentindo o vento frio do inverno balançar seus cabelos, usavam um casaco que a deixavam protegida do frio e por isso não estava ligando muito para ele, apesar de seu nariz estar congelando. Ela respirou fundo. Era incrível o fato de que até mesmo o ar daquele lugar parecia ser completamente diferente do que ela estava acostumada inalar.

— Você parece feliz... – observou Namjoon chamando a atenção de Lia para si, a garota sorriu para ele.

— E estou! – ela olhou em volta mais uma vez. – Estar em um lugar como esse faz eu me sentir tão... Livre! – ela sorriu abertamente e encarou o garoto mais uma vez vendo seu olhar curioso sobre si fazendo-a suspirar e começar a se explicar. – Meus pais são um pouco protetores de mais; até a algum tempo atrás a minha vida se resumia muito a seguir suas regras e eu estava cansada disso. Sei que meus pais me amam e eu entendo que talvez eles estivessem apenas tentando cuidar de mim, mas às vezes esses cuidados estremos cansam então eu estou muito feliz de estar aqui agora escolhendo o que fazer da minha vida sozinha, estou fazendo meu próprio caminho e isso é muito bom em minha opinião. Tendo uma família como a minha, acho que isso pode ser considerado como uma pequena vitória, a minha vitória...

— Acredite se quiser eu entendo bem o que você quer dizer com isso – ele apoiou os cotovelos em seus joelhos e olhou para frente sem focar realmente em alguma coisa. – Passei minha vida inteira seguindo as regras da sociedade... Eu me preocupava com o que as pessoas pensavam de mim, o que meus pais pensavam de mim e principalmente com as minhas notas, elas sim eram tudo o que realmente me importava naquela época. Era pressão de mais para um adolescente e eu ficava muito sobrecarregado, foi ai que a minha paixão pela musica nasceu; a música me acalmava e naquela época eu escrevia minhas rimas apenas por diversão, mas foi isso que me trouxe para onde estou hoje. Sinceramente, se eu pudesse refazer todos esses anos novamente, eu não mudaria nada, faria tudo exatamente como da primeira vez...

Malia encarava Namjoon com cuidado, prestava atenção em cada um de seus movimentos; ele não era uma pessoa qualquer, havia encontrado a música como um meio de se desligar do mundo e relaxar, a musica era sua rota de fuga quando o mundo inteiro parecia pesar em sua costas, aquilo ficava bem claro em suas palavras. Eles tinham mais aquilo em comum...

°-°-°-°-°

Vanessa descia as escadas sem muita pressa, não teria nada para fazer pelo resto da noite então quem estava com pressa?

Ela e Bia terminaram de arrumar o quarto menos de 15 minutos depois que Lia saiu, Bia falou que iria escolher o que usaria mais tarde e depois passaria no quarto de Luana e Drica para fazer companhia as duas, Vanessa logo concordou e disse que iria para o seu quarto. Quando chegou lá o encontrou do jeito que havia o deixado, sua metade do quarto arrumada e a outra vazia...

Resolveu tomar um banho rápido, estava um pouco cansada e, apesar do frio, seria muito bom tomar um longo banho antes de voltar para o quarto. Logo ela pegou suas coisas e desceu para o banheiro tomando um banho rápido e voltando para o quarto em seguida já usando uma roupa de frio confortável o suficiente para ficar no quarto, mas também arrumada o suficiente para passear pelo campus caso ficasse entediada; e foi exatamente o que aconteceu, estava sem nada para fazer então pegou seu celular, seus fones de ouvido e saiu do quarto descendo para o campus.

Assim que estava em frente ao dormitório feminino ela olhou em volta. O céu já havia escurecido completamente e as meninas estariam saindo em mais ou menos três horas. As luzes dos postes que ficavam espalhados pelo campus a impediam de ver as estrelas, mas nem mesmo isso diminuía a felicidade que sentia por estar naquele lugar...

Uma risada alta cortou o ar e ela olhou em volta vendo o campus quase que completamente vazio, procurou a fonte da risada e viu duas pessoas sentadas em um banco que estava abrigado em baixo de uma das árvores do lugar, elas pareciam estar conversando, Nessa não conseguia vê-los direito por causa sombra que a árvore fazia sobre eles.

Sem ter muito que fazer Nessa se virou e começou a se afastar do dormitório em direção ao prédio 1. Ela lembrava bem de como suas alas eram divididas, eram 5 andares no total, isso claro sem contar com o térreo; logo que entravam um longo corredor seguia em direção ao anfiteatro, tinha uma escada localizada no Hall de entrada, ela subia para o primeiro andar onde ficavam as salas de jogos; no segundo estavam as salas de ensaios, como as de instrumentos ou de canto; no terceiro ficavam os estúdios de gravação; no quarto ficavam as salas de dança e o quinto era fechado, Mhynna havia comentado sobre um deposito ou algo assim em que os alunos eram proibidos de entrar. Nessa estava subindo as escadas em direção ao segundo andar, estava procurando uma sala em especial, lembrava de Mhynna tê-la mostrado durante o breve tour durante a tarde...

Sala 5... 6... 7... 8!

Ao entrar na sala 8 ela se apressou em tatear a parede em busca de um interruptor e quando o achou acendeu as luzes da sala iluminando vários instrumentos diferentes, entre eles estava um lindo piano de calda feito de madeira negra, a garota soltou um peno sorriso e se aproximou do instrumento com certa ansiedade. A última vez que havia visto um piano de calda estava na casa de sua avó quando a mais velha ainda era viva, dona Tereza era apaixonada por aquele instrumento e costumava gastar boa parte de seu tempo com suas netas ensinado as duas a toca-lo quando as mesmas iam visita-la, algo que costumava acontecer todos os dias; mas depois de sua morte, a mãe de Vanessa – que era a única descendente direta da mais velha – resolveu vender o instrumento junto com grande parte das coisas que antes pertenciam a velha senhora. Apenas olhar para aquele instrumento trazia várias lembranças a Vanessa.

O piano...

Para começar aquele havia sido seu primeiro instrumento e, de certa forma, sua luz. As notas delicadas que ela havia ouvido da primeira vez em que seus dedos tocaram as teclas de um piano a encantaram de uma maneira surpreendente, ela era apenas uma criança na época e tinha uma vida inteira pela frente, mas, naquele momento, mesmo que de forma inconsciente, Vanessa havia escolhido seu rumo. Ela aprendeu a tocar e se empenho naquilo, a música a enchia de alegria e satisfação, aquela foi sua primeira paixão. A dança entrou em sua vida apenas aos 14 anos quando sua irmã começou a se dedicar a intensamente a ela; a forma como Ádrian se mostrava apaixonada por aquele tipo de arte a incentivou ainda mais e agora ela sabia se expressar com o corpo como ninguém. Quanto a atuação... Bem, Vanessa não sabia ao certo de onde veio aquele prazer que ela havia criado em representar, mas também não se importava muito com o porque, o importante era aonde ele a havia levado.

Mas tudo aquilo, toda essa paixão e esse amor que ela sentia por quase todo tipo de arte havia começado com aquele bendito piano de calda que um dia havia tocado. Por mais incrível que pareça ela ainda se lembrava de seu primeiro contato com o instrumento, se lembrava de como seus pequenos dedos começaram a explorar aquele novo mundo de maneira tão inocente sem ter consciência de que ele a levaria tão longe; naquela época ela não achava nada daquilo importante, era apenas algo que gostava de fazer e que poderia chegar a se assemelhar a ver seus desenhos preferidos na tevê ou mesmo desenhar, até que um dia Nessa finalmente percebeu que aquelas frias teclas brancas eram mais importante do que qualquer outro passatempo pelo qual ela havia se interessado um dia. Era como se o piano tivesse se tornado um importante órgão de seu corpo, ela não conseguia passar um dia longe de suas teclas, sem ouvir aquelas notas que costumavam sair de delicadas para algo mais forte e agressivo antes de voltar novamente ao tom delicado, ele havia tomado toda aquela parte de sua vida, desde o final de sua infância até a metade de sua adolescência e, por mais longo que esse período possa parecer aos olhos de outros, aos de Vanessa nem todos aqueles anos foram o suficiente para que ela pudesse saciar aquele desejo que sentia por querer toca-lo novamente.

A partir do momento em que aquelas teclas se tornaram conhecidas por si a música se tornou tudo o que Nessa precisava, a cada vez que ela se sentia perdida, a música se tornava seu refugio, a cada vez que ela precisava desabafar de alguma forma, a música a permitia fazer isso sem que precisasse sair de casa. Vanessa vivia por causa de sua música e gostava disso porque, mesmo nas vezes que achava que não poderia mais seguir em frente – coisa que acontecia com mais frequência do que Nessa gostaria que acontecesse –, a música parecia fazê-la voltar atrás e ver que nem tudo estava perdido. A música conseguia lhe fazer sentir coisas das quais Vanessa costumava sentir falta durante seu dia a dia...

Ela lhe dava esperança.

Porém, após a morte de sua avó, Nessa nunca mais havia tido a chance de tocar em um piano como aquele. Por alguns meses aquele distanciamento era proposital, ela sentia falta de sua avó e era impossível não se lembrar da mais velha quando via aquele instrumento em especial, e isso costumava fazê-la chorar, então ela começou a negligenciar aquela ânsia que sentia por toca-lo novamente; aquele querer e não querer já estava deixando-a louca, mas isso continuou se repetindo todos os dias, até que ela percebeu que a lembrança de sua avó finalmente havia parado de lhe causar dor, deixando apenas a saudade em seu coração e nada mais que isso, então aquela vontade louca por tocar reapareceu com força total e ela não conseguiu mais reprimi-la. Vanessa sentia falta daquilo, de sentir seus dedos sobre as teclas brancas frias feitas de jade, de ouvir aquelas notas tão características, de se sentar em frente a um desses grandes instrumentos e apenas tocar como se nada mais importasse, como se aquela fosse a única coisa que ela soubesse fazer, como se cada nota se tornasse mais um sopro de ar fresco dentro daquele quartinho estreito e abafado em que ela se sentia presa durante quase que o tempo inteiro, e agora ela tinha a chance de sentir tudo aquilo novamente, pois ali estava ele, parecendo clamar por seu toque, como se aquele instrumento precisasse dela tanto quanto ela precisava dele...

Desesperadamente.

Nessa se sentou em frente ao instrumento e levantou a tampa do mesmo vendo suas teclas muito bem limpas brilhando por causa da luz que batia nelas. Vanessa precisou respirar fundo antes que seus dedos finalmente tocassem as teclas do piano com estremo cuidado. Como já fazia um bom tempo desde a última vez que havia tocado ela imaginava que estaria um pouco enferrujada na primeira tentativa, mas se surpreendeu ao ver como seus dedos tocavam as teclas com tamanha precisão que até mesmo davam a impressão de estarem programados para fazer aquilo.

Vanessa não havia notado de primeira, mas assim que percebeu que cada uma das notas que tocava naquele momento a faziam lembrar-se de sua avó ela finalmente se deu conta de que estava tocando uma das composições da mais velha. Aquela foi a primeira música que sua avó havia lhe ensinado, isso havia acontecido quando a mais nova tinha por volta de seus 10 anos e, entre todas as músicas que Nessa conhecia, aquela sem dúvida era a sua favorita, toca-la naquele momento lhe trazia um sentimento novo e acolhedor e, bem... Era como estar em casa novamente.

Vanessa sentia como se tivesse voltado no tempo, ela era aquela garotinha de 10 anos novamente, estava sentada ao lado de sua avó enquanto a mais velha tocava piano. Seus olhinhos curiosos encaravam as mãos experientes da mais velha enquanto seus dedos corriam pelas teclas, até que dona Tereza a encarou com um enorme sorriso no rosto e finalmente lhe permitiu tocar o instrumento pela primeira vez. Vanessa foi cuidadosa e tocou em apenas uma tecla da primeira tentativa, havia rido um pouco com o tom fino que ela produzia e tentou novamente ouvindo um som diferente dessa vez, mas igualmente engraçado.

Nessa sorriu com a lembrança e continuou a tocar enquanto mais e mais memórias como aquela invadiam sua mente. Com tudo o que havia acontecido até aquele momento a garota sequer havia percebido que tinha deixado a porta aberta e se arrependeu de não ter se lembrando de fecha-la no mesmo momento em que ouviu um grito vindo de fora da sala fazendo-a se assustar.

Yah! Yoongi Hyung!— Nessa olhou para o lado imediatamente e se afastou o máximo possível do piano quase caindo para trás no processo; em meio ao seu desespero seu joelho bateu com força na parte de baixo do piano fazendo a tampa do mesmo cair sobre as teclas e quase amputar seus dedos fazendo-a voltar a olhar para o instrumento. A garota continuou encolhida em seu lugar com os olhos arregalados olhando para o piano e ouvindo o silêncio cortante após o estrondo feito pela tampa do instrumento.

Nessa precisou de mais alguns segundos para sair de seu transe e finalmente voltar seu olhar para o garoto parado a porta, a respiração de ambos estava um tanto ofegante pelo susto e seus corações batiam forte em suas caixas torácicas.

O garoto a olhava de olhos arregalados num misto de surpresa e confusão.

— V-Você... Você está bem? – ele perguntou preocupado enquanto Vanessa ainda o encarava tentando acalmar sua respiração. A voz do garoto era extremamente grossa e estava ainda mais rouca devido ao susto fazendo Nessa se perguntar como um garoto que aparentava ter menos de 20 anos poderia ter uma voz naquele tom, era grave de mais, poderia ser considerada a voz deu um homem de 30 anos fumante, uma comparação estranha, mas que fazia sentido em sua cabeça...

O garoto era alto, muito alto, parecia ser um pouquinho vesgo e seu rosto era quase que simétrico, o que era realmente incrível, seus cabelos eram de um castanho claro, parecia ser mel, mas, como estavam molhados – provavelmente por causa de um banho recém tomado –, era difícil de se ter certeza. Ele estava parado na porta com os braços abertos segurando em ambos os lados do batente dela, seus olhos estavam arregalados e sua boca entreaberta, foi só ai que Vanessa lembrou que ele havia lhe feito uma pergunta...

— E-Estou – gaguejou ela em um tom baixo desviando os olhos para o chão, seu corpo ainda tremia levemente pelo susto. – Eu ao menos acho que sim...

— Eu sinto muito por isso – disse ele parecendo um pouco constrangido enquanto largava lentamente o batente da porta. – Não queria ter te assustado, é que eu estou procurando um amigo e ele costuma ficar por aqui quando está entediado, então, quando eu ouvi você tocando, pensei que fosse ele...

— Está tudo bem – ela suspirou olhando novamente em direção ao piano ainda tentado se recuperar do susto. Levantou rapidamente a tampa dele e encarou as teclas tendo certeza de que nada havia acontecido com elas.

— Você não o viu por aqui? – perguntou o garoto chamando sua atenção para si novamente. – Ele é muito branco e seus cabelos estão pintados de preto e verde, ele é dessa altura – o garoto levantou a mão mais ou menos na altura de sua boca depois parou alguns segundos parecendo pensar um pouco. – E... Ah, ele parece muito com um velho rabugento!

Vanessa soltou uma pequena risada com a forma como ele descreveu o outro que era provavelmente mais velho que o próprio, isso ela sabia apenas porque ele havia chegado gritando na sala um alto e sonoro "Yoongi Hyung!"...

Espera, Yoongi?

— Desculpe, mas você estava falando de Min Yoongi? – perguntou ela e o garoto abriu um sorriso mais feliz ao perceber que ela conhecia seu amigo.

— É! Você o viu por aqui? – perguntou o outro adentrando a sala e olhando em volta como se esperasse encontrar o mais velho ali em algum lugar, ele andou até ficar ao lado do piano fazendo-a se sentir minúscula mais uma vez. Por que a maioria dos coreanos era tão alto?

— Na verdade não – Vanessa sorriu como um pedido de desculpas e olhou para suas próprias mãos ao perceber que ele a encarava. – E-Eu conheci Yoongi sunbae mais cedo na cidade, ele estava com alguns amigos lá e...

— Então você é uma das brasileiras que os meninos conheceram hoje? – perguntou ele e seu sorriso não poderia ser maior. – Me chamo Kim Taehyung, mas meus amigos me chamam de TaeTae...

— Kim Taehyung? – ela encarou o garoto que havia se curvado para si com curiosidade – Você é o garoto que Luana unnie conheceu?

— Ah, então você é uma das amigas de Luana! – ele sorriu novamente.

— Sim... Meu Deus, hoje será o dia das coincidências... – brincou Nessa. – Por que você está procurando Yoongi sunbae?

— Você não soube? – perguntou ele surpreso. – Vamos com vocês para a Octagon.

— Ah, as meninas convidaram vocês? – ela olhou para a porta da sala pensativa. – Elas não me falaram, mas isso não importa, eu não vou mesmo.

— E por que não? – perguntou curioso.

— Eu sou menor de idade... – disse simplesmente e ele ficou surpreso novamente, tudo bem que ela parecia ser bem nova, talvez até mesmo menos de 16, mas, por ela estar ali, ele imaginou que ela ao menos já havia passado dos 19.

— Quantos anos você tem? – perguntou se apoiando no piano com ambas as mãos para poder olha-la mais de perto, mas sem se aproximar muito.

— Tenho 18 anos em idade coreana – respondeu ela dando de ombros enquanto desviava o olhar novamente, era mais um problema causado por sua timidez, ela não conseguia olhar para uma pessoa que a estivesse encarando por muito tempo, na verdade, quando Vanessa percebia que tinha alguém lhe encarando ela costumava corar, o que a deixava mais envergonhada ainda.

— Ah... Então você vai ficar sozinha aqui? – perguntou ele e ela concordou com a cabeça sorrindo em seguida.

— Mas está tudo bem, eu gosto de ficar sozinha... – soltou um longo suspiro e deu de ombros. – Me ajuda a pensar, além de que acho bem mais fácil me expressar quando estou sozinha.

— Percebi – disse ele olhando para o piano fazendo-a corar um pouco. – Aproposito, você toca muito bem...

— Ah... Bem... – Nessa ficou um tanto encabulada sem saber o que dizer então a única coisa que conseguiu fazer foi mudar de assunto. – Você quer ajuda para encontrar Yoongi sunbae?

— Por favor – concordou ele e ela balançou a cabeça enquanto se levantava. Assim que a mais nova parou ao seu lado Taehyung soltou uma risada fazendo-a encara-lo curiosa

— O que foi? – perguntou confusa.

— Você é muito pequena! – disse ele ainda rindo enquanto bagunçava os cabelos da mais nova de uma forma carinhosa. A garota o encarou com os braços cruzados incrédula com o comentário do garoto e deu um pequeno tapa na mão do mais velho fazendo com que ele tirasse-a de seus cabelos.

— Sabe o lado bom de ser pequena? – perguntou retoricamente enquanto arrumava seus cabelos. – Nós podemos acertar certos lugares com mais facilidade do que a maioria das pessoas mais altas...

Taehyung demorou um pouco para entender as palavras da garota, mas quando viu aonde ela queria chegar parou de rir imediatamente protegendo a sua "área restrita" com ambas as mãos e deu um pequeno pulo para trás. Vanessa sorriu meiga para ele e começou a andar em direção a porta fazendo-o segui-la um pouco mais devagar, ainda estava com certo medo de se aproximar de mais...

— Você é a Vanessa, não é mesmo? – perguntou curioso e Vanessa se virou para encara-lo balançando a cabeça em concordância, como ele sabia seu nome? – Luana bem que me disse que você era uma criança maldosa – um bico fofo se formou nos lábios do maior fazendo a maknae rir –, e Kookie-ah ainda concordou quando nos encontramos hoje na sala de ensaios, mas mesmo não te conhecendo eu defendi você, só que agora eu percebo que o errado era eu...

— Eu não sou tão má assim – ela sorriu envergonhada sentindo suas bochechas darem uma leve corada...

— Você é fofa e tem um ar muito inocente... – acusou ele espremendo os olhos. – Essas são as piores!

A garota riu constrangida e ele tomou a frente da procura fazendo-a segui-lo pelas salas seguintes procurando por Yoongi que parecia ter evaporado da face da terra. Eles passaram todo aquele tempo se conhecendo melhor, Vanessa falou principalmente de suas amigas, sua irmã e sua falecida avó, fazendo Taehyung repara no quanto a garota amava cada uma daquelas pessoas; já Taehyung falou mais de seus pais, seus irmãos, tios e sua avó, as pessoas que mais o apoiaram em sua vida com relação aos seus sonhos. Eles tinham algumas coisas em comum e compartilhavam alguns desejos, ambos gostavam muito de atuar e, além de se focarem na música, iriam se focar também nas artes cênicas durante aquele ano.

— Onde será que está Yoongi hyung... – resmungou o garoto quando subiram para o quarto andar. Taehyung já estava cansado de ficar andando de um lado para o outro procurando pelo mais velho, ele não poderia simplesmente aparecer por ali de uma vez?

Estavam prestes a entrar na primeira sala de dança – apesar de TaeTae ter garantido que Yoongi não estaria em uma das salas de dança, os dois no final acabaram concordando que era melhor prevenir e checar todos os lugares possíveis – quando o celular de Taehyung apitou informando uma nova mensagem, ele prontamente pegou o celular e o desbloqueou para poder ler a tal mensagem murmurando em seguida um "Aish!" um tanto irritado.

— Eles acharam o hyung – o garoto suspirou olhando para Vanessa. – Ele estava dormindo em baixo de uma das árvores do campus!

A garota riu baixo da situação fazendo o mais velho soltar uma risada também, foi a primeira vez que Vanessa prestou atenção no sorriso de Kim Taehyung, era um sorriso retangular muito parecido com uma daquelas carinhas do Watts App e era extremamente fofo, além de que, aquele sorriso deixava suas bochechas mais evidentes e marcava bem as linhas em volta de sua boca, o que indicava que já era costume do garoto sorrir daquele jeito.

— Venha – chamou ele caminhando em direção a escada sem se dar conta que a garota estava um pouco desligada do mundo. Nessa o encarou em confusão e o garoto se virou para olha-la ao reparar que a mesma não estava seguido-o. – Hoseok hyung vai dar uma bronca em Yoongi hyung por sumir tão de repente, eu não posso perder isso.

E pela trigésima vez apenas na ultima meia hora, Vanessa riu.

Era incrível como aquele garoto poderia dizer uma coisa daquelas sorrindo como uma criança que havia acabado de ganhar o presente que havia pedido de natal ao Papai Noel; Taehyung realmente parecia ser uma criança no corpo de um adulto, apenas isso explicaria o porquê de ele agir daquele jeito extremamente infantil e encantadoramente fofo. Vanessa soltou mais uma risada quando o mais velho voltou a descer as escadas um tanto saltitante antes de finamente começar a segui-lo escada abaixo.

"Em um canto da minha memória
Um piano marrom encostado a um lado
No canto da minha casa de infância
Um piano marrom encostado a um lado
Eu me lembro daquele momento
Muito maior do que minha altura
O piano marrom que me guiou
Eu procurei por você
Eu ansiava por você
Quando eu te toquei com os meus pequenos dedos
Eu me sinto tão bem, mãe, eu me sinto tão bem
Eu tocava o piano toda vez que minhas mãos me possuíam
Eu não sabia o seu significado naquela época
Naquele tempo eu ficava contente em apenas te olhar"

Fist Love - Suga