— Você tem certeza que não quer revisar tudo mais uma vez, então, Amy? — Perguntou o moreno, vestindo cinza chumbo naquele dia. Ele trajava novamente a manta e o gorro que o deixavam tão irresistível aos olhos de Amy, embora ele provavelmente não soubesse disto.

— Acabei de checar, está tudo bem. — Ela não conseguia esconder como seu corpo inteiro se aquecia com o jeito como ele dizia seu nome. Aquecendo-a quase tão bem como a lareira da sala.

As malas já estavam lá fora, Ian as havia levado e entregado para um taxista guardar no carro. Só faltava Amy pegar sua bolsa e nada mais deles estaria naquela casa.

— É uma pena, não é? — a voz do moreno interrompeu o sliêncio enquanto Amy admirava novamente a casa que trouxe tantas felicidades para seus pais. — Termos que ir embora, eu digo.

Amy assentiu. Ela havia passado a parar de confiar em si mesma na presença de Ian. Toda vez que ele falava com ela, ela sentia como se pudesse recitar uma poesia, dançar e cantar na frente dele. Quando suas mãos se tocavam, normalmente sem querer, uma corrente elétrica passava por todo o seu corpo, deixando-a ainda mais presente de tudo aquilo. Quando seus olhos se encontravam seu coração disparava numa corrida contra ele próprio. Ian a deixava totalmente ciente de sua presença.

Ela estava pegando sua bolsa marrom quando reparou no que vinha pendurado no pescoço do moreno. A ruiva tentava não passar muito tempo o olhando, com medo do que pudesse vir a fazer, por isso não notou antes.

— Para que a câmera? — perguntou, um leve ponta de desconfiança surgindo em si. — Vamos parar em algum lugar para uma última tomada de suas fotos secretas?

Havia um sacarmo ali. Bem escondido, mas havia, Ian sabia. A ruiva havia passado os últimos dias brincando com aquilo. Ian, na verdade estava tirando mais fotos dela, mas toda vez que ela ameaçava olhar para ele, ele virava a câmera na direção da primeira coisa que pensava. Amy pediu para ver umas três vezes, ele, óbvio e sabiamente, negou.

— Uma para a posteridade? — Perguntou, segurando a câmera e apontando para ela.

— Oh, não, Ian! — Amy colocou a mão no frente do rosto, enquanto tentava sair da linha da câmera.

— Ora vamos Amy, apenas uma. — Ele pediu, pensando que a ruiva iria ficar um tanto brava se algum dia viesse a descobrir a quantidade de fotos que ele tinha dela ali.

Amy se escondeu atrás do sofá, fazendo Ian rir um pouco daquilo tudo.

— Para você é fácil falar, sai ridiculamente bem em qualquer coisa — a garota devolveu, ainda escondida pelo sofá. — Eu vou sair horrível, não faça isso comigo, Ian!

Ian arrumou a câmera para três disparos, enquanto ajeitava-a em cima da mesa.

— Se eu sair com você, você tira?

— Para quê? — Amy retrucou. — Para sair ainda mais mortalmente normal enquanto você sai como um deus grego ao meu lado?

O orgulho de Ian estava bem alto aquela altura, para alguém que há pouco tempo atrás achava que a garota não reparava na existência dele. Mas ele não conseguiu deixar de revirar os olhos, se havia algo que Amy nunca iria parecer era mortalmente normal.

— Eu vou tirar a foto, pode ser segurando você em cima dos meus ombros ou ao seu lado, a escolha é sua. — Ele tinha um toque de seriedade na voz repleta de humor que deve tê-la feito acreditar que ele a colocaria nos ombros para tirar a foto.

— Eu vou matá-lo! — Amy chiou, pelos dentes, fazendo uma cara feia enquanto saia do seu esconderijo.

— Essa é a minha garota — o garoto provocou, só para ver aquela cor vermelha subindo pela face da garota. Ele clicou para a câmera começar a contagem regressiva e correu para o lado dela, sorrindo descontraído enquanto dizia com os dentes cerrados: — São três fotos.

— O quê? — Flash. A primeira já havia ido.

— Sorria Amy! — Três, dois, um... Ele havia colocado os braços envolta dela naquela última e feito cosquinhas na barriga, sendo recompensado por uma sonora gargalhada por parte da ruiva, que ficaria linda se houvesse sido gravada. Flash.

O moreno olhou para a ruiva corada, que desta vez havia finalmente se ajeitado e encarado a câmera da maneira mais tímida e fofa que Ian já viu alguém encarar. Ela estava com uma toca verde naquele dia, que provavelmente iriam destacar seus cabelos ruivos na imagem.

Ian ficou tão abobalhado olhando para ela que deve ter saído de uma maneira bem ridícula nesta última foto, sendo que ele nem viu que havia sido tirada. Só quando Amy se movimentou, indo para longe dele.

— Nunca mais me faça cocegas! — A ruiva disse, séria. Mas a sua seriedade não chegava aos olhos. Ian nunca pensou que fosse ver aquele olhar divertido nos olhos jade da ruiva.

Bleeding Out

Quando o avião vindo de Aspen parou na pista de aterrizagem de Boston, Dan correu em direção ao portão de desembarque, sendo seguido pelas duas mulheres que o acompanhavam.

Passar aqueles dias com a Natalie havia sido legal, ela era ainda mais incrível do que ele havia pensado, embora ela tenha pirada quando viu uma bolsa Prada no shopping, os atrasando em dez minutos para o filme que viram no cinema do lugar.

Mas haviam dois motivos pelo qual ele queria a irmã dele de volta. Primeiro, e obviamente, porque ele estava sentindo saudades dela. Isso mesmo, sentindo saudades da ruiva fechada que havia passado anos sem falar direito com ele e que em semanas foi forçada a mudar ao ponto dele não reconhecer mais a irmã. Mas querendo ou não, era a sua irmã.

O outro motivo era um pouco mais complicado, e andava ao lado de Natalie com uma postura imperial. Ele conseguia reconhecer semelhanças entre as duas, mas onde Natalie tinha uma bondade e ingenuidade pura nos olhos, a mulher – que na verdade era sua mãe – tinha um olhar quase assustador, que deixava Daniel fora de sintonia.

Isabel Kabra parecia uma víbora pronta para dar o bote. E estava logo atrás dele.

Bleeding Out

Amy sabia que o estava por vir. Toda a dor e o luto que ela jogou para baixo das cobertas em Aspen ali seriam revelados. Afinal ela estava justamente de volta à Boston.

Ian parecia relaxado ao seu lado, embora houvesse lançado alguns olhares preocupados em sua direção durante aquelas horas, quase como se para ter certeza que não havia sonhado com aquilo, que era real.

Amy não sabia o que pensar do moreno, e nem queria saber. Aquele episódio das fotos... Céus, ela deveria torturá-lo até ele concordar em queimar os negativos, mas ela não era capaz de machucar qualquer coisa com vida... Qualquer coisa, menos ela.

Sua cabeça girava mais rápido do que aquela esteira onde suas malas estavam, aguardando para serem pescadas pelos donos. O ar de Boston estava quase tão frio quanto o de Aspen, o inverno estava definitivamente dando as caras por ali.

— Então, você falou com Alistair? — Ian perguntou, enquanto puxava a mala dele da esteira, já tendo pego a dela e colocado ao seu lado. Amy odiava que ele fizesse tudo aquilo. Agindo como se ela fosse quebrar o tempo inteiro.

— Sim.

Ela não se daria ao luxo de conversar com Ian, corria o risco de se ver prisioneira dele novamente. Ela não sabia o que estava sentindo – como de costume – mas sabia que era algo forte demais para ser combatido por ela naquele momento.

Para ser sincera, Amy estava exausta. Ela não havia dormido durante o vôo, com medo de repetir o incidente do último, e a sua poltrona não foi a coisa mais confortável do mundo para se relaxar, com uma criança de uns sete anos chutando suas costas o tempo inteiro.

A conversa com Alistair parecia distante com o cansaço quase dominando por completo sua mente. Ele havia perguntado se ela estava bem e, após ouvir a garantia disto, pediu milhões de desculpas mas avisou que estava indo para Seul, sua terra natal, a procura de mais uma relíquia histórica ou algo assim. Amy não podia culpá-lo, Alistair vivia para o trabalho, e o seu trabalho o levava para diversas partes do mundo todo.

— Ele não está em Boston, certo? — Ian adivinhou, como sempre, sorrindo ao segurar as alças de ambas as malas e fazer sinal para Amy começar a andar em direção as portas automáticas que davam para a parte central do aeroporto.

— Viajando a trabalho.

— Era de se esperar. — Ian sorria e agia como se tudo fosse a coisa mais normal do mundo. Como se estar com ela, ali, naquele momento fosse exatamente o que ele queria.

Mas Amy sabia que não poderia se enganar, e a medida que eles andavam rumo a porta de saída ela tinha mais e mais certeza disto.

O que aconteceu em Aspen, deveria ficar eternamente enterrado nas dezenas de camadas de neve de lá. Ela não podia deixar-se levar pela fala mansa e carinhosa dele, ela simplesmente não podia.

No meio de seus pensamentos confusos e olhando fixamente para o chão enquanto mordia forte o seu lábio inferior, Amy quase nem percebeu quando Ian deu uma estancada no chão.

A garota olhou para ele confusa, eles tinham acabado de passar pelas portas e ela pensou que talvez Ian tivesse esquecido algo no avião, mas quando olhou para o rosto do rapaz viu que ele encarava a frente fixamente. Uma expressão perto de horror estava em sua face.

Amy seguiu o olhar dele e encontrou Dan e Natalie, parados a alguns metros. Amy mal teve tempo de lidar com a onda de felicidade por ver Dan quando ela reparou que havia outra pessoa junto. Perto demais para ser um desconhecido, longe o suficiente para não ser relacionada.

A mulher tinha longos cabelos negros que iam até sua cintura fina, uma pele morena que combinava lindamente com seu vestido de corte definido branco e olhos dourados como os olhos de duas pessoas que também estavam ali. Olhos que Amy conhecia muito bem.

— Isabel. — Ian sussurou com a voz tremula do seu lado e Amy entendeu que estava na presença da mãe do rapaz. Isabel Kabra estava em Boston.