Beyond

Capítulo 5


Peter sentou-se no sofá e apoiou o rosto nas mãos. Sherlock teve a clara sensação de que aparecera no lugar num dia extremamente conturbado.

—Meu filho? —perguntou ele, olhando a ruiva.

—Nosso filho—respondeu ela, com a mira novamente em Sherlock, ele abaixou a arma e a colocou no chão: duas miras contra ele, sua desvantagem era evidente.

Olívia executou seu imenso autocontrole para não atirar contra a sua versão alternativa. Então era aquilo que o seu sentido de empata vinha-lhe tentando avisar... Não era o que Peter sentia apenas por ela que definiria tudo. "Um filho", pensava ela, era mais do que o suficiente para afastar os dois para sempre.

Peter levantou sobressaltado. Tinha que encontrar o seu filho! Agarrou Holmes pelo colarinho e o chocou contra a parede:

—O que significa tudo isso? Quem você estava ajudando?

Com uma voz calma e com os nervos visivelmente inabalados, respondeu:

—Eu vim sozinho, o que aconteceu aqui não tem nada a ver comigo.

A Olívia alternativa abaixou o próprio revólver, lembrando-se que identificara aquele homem, minutos antes de toda a confusão:

—É verdade, estamos perdendo tempo—e, sentindo o chamado do seu telefone, atendeu-o: —Lincoln?

—Liv, tem pelo menos vinte agentes rondando a área. Fique calma, vamos encontrá-lo depressa.

—Eu vou me juntar à vocês, não consigo ficar parada!

Antes que Olívia pudesse impedir Sherlock de se movimentar, ele caminhou até o quarto do bebê. A loira perguntou:

—O que você está fazendo?

—É evidente que ninguém responderá minhas perguntas enquanto este bebê não for encontrado.

Ela guardou sua arma e, deixando para lá o estranho homem alto, ela voltou o seu olhar para o confuso Peter. Sentia como se ele estivesse deslizando de suas mãos, para nunca mais o poder recuperar.

—Eu vou junto—falou Peter, atordoado, seguindo a ruiva para fora do apartamento. Olívia os seguiu como se não existisse.

Sozinho, no apartamento, Sherlock observou a janela arrombada e o berço. O sequestro fora feito de maneira amadora e desesperada. Não fosse pela distração que promoveu à agente, ela provavelmente teria evitado o ocorrido, sozinha.

Voltou para a sala e percebeu todo o material de trabalho dela espalhada pela mesa de centro. Acendeu um cigarro e começou a mexer nos papéis. Logo seus longos dedos tatearam uma foto inesperada. Piscou algumas vezes diante da fotografia de John Watson.

.o.

A porta foi aberta com violência. John acordou num pulo, mal tendo tempo de se esquivar do homem furioso que correra até ele.

Lincoln o agarrou pelo colarinho e o prendeu na parede:

—O nome do seu amigo, AGORA!

John o encarou como se fosse louco. Francis veio logo atrás, apressado, para separá-los:

—Isso não tem sentido—disse Charles. —Vamos voltar...

Lincoln o largou e saiu furioso da sala, com Francis o seguindo.

Sorte ou não, o lápis que rolara interrompeu o movimento de fechar-se da porta. Entreaberta, John aproveitou e olhou o lado de fora. Escapuliu mesmo sabendo que câmeras o denunciavam. Não sabia até onde poderia chegar, mas sabia que não aguentava mais esperar sua sorte mudar trancado naquela sela.

Não conseguiria chegar ao lado de fora sozinho. Alcançou o elevador como alguém que não quer nada e desceu os vários andares. Chegou ao Hall de entrada e continuou caminhando de cabeça baixa. Chegou na porta de saída. Não conseguia acreditar que conseguiria! Cruzou a porta e sentiu uma dor imensa em seu ombro esquerdo.

O sangue tingia toda a sua roupa e ele sentiu, como se estivesse de volta no dia em que fora atingido no Afeganistão, como se seus tendões, nervos e músculos se dilacerassem. Caiu no chão quase sem conseguir gritar e percebeu quem investira contra ele: em pé, com um sorriso vingativo, Lincoln abatera o fugitivo.

.o.

Olívia observava Peter sentado no banco da frente do veículo. Sua versão ruiva dirigia alucinada, como leoa caçando o filhote. Por mais que odiasse aquela situação, descreveu para a outra todas as informações que tinham de Richard Visconsin.

Peter conseguia, aos poucos, voltar ao seu senso. Olhou para a loira no banco de trás e sentiu um peso no seu coração. Não fazia ideia de como lidar com aquela situação. Voltou a olhar as ruas, enquanto a ruiva passava as informações que acabara de receber para Lincoln e Francis pelo telefone.

Um momento tenso de silêncio se seguiu. Liv não queria que a sua outra versão estivesse atrás de si para ter aquela conversa com Peter, mas não sabia se teria outra chance dali para frente:

—O que eu disse para você, antes de ir embora, era verdade. Agora você sabe que era verdade... Foi algo a mais, Peter. Eu me apaixonei por você!

—Podemos nos concentrar? —perguntou ele, cortando-a.

Ela meneou e percebeu a expressão descontente de sua igual através do retrovisor. Sentiu uma tremenda dor no peito. Desejara tanto aquele reencontro com ele, não imaginava que ele pudesse ocorrer de maneira tão desastrosa... Percebeu que nunca teria Peter. Percebeu que, de fato, nunca o teve... Que grande besteira havia feito! Henri... Se algo acontecesse com ele, Peter a perdoaria? Então percebeu, ela mesma, não conseguiria se perdoar...

Viu o Observador numa esquina próxima antes do caminhão os atingir. A ruiva bateu seu rosto contra a direção e Peter sentiu sua própria face se rasgar pelo vidro estilhaçado. Olívia, sem o cinto de segurança, foi atirada para fora do carro pela janela do acompanhante e rolou para longe, evitando que o carro capotasse sobre ela.

A buzina soou contínua. Peter piscou os olhos, atordoado. Percebeu estar de ponta cabeça e descobriu que a buzina não era um som da sua cabeça: o banco de Liv se soltou e ela tinha o seu peito esmagado contra a direção.

Ele a soltou primeiro, desatando o cinto de segurança e empurrando o banco, como podia, para mais distante dela. O ruivo de seus cabelos adquiriu uma tonalidade de vermelho mais vivo.

Ele soltou o próprio cinto e sentiu-se despencar do acento. Saiu do carro pela janela lateral e puxou a moça para fora: ainda respirava.

—Olívia! —ele percebeu, vendo a loira desacordada há poucos metros dali. Cambaleou até ela e ajoelhou ao seu lado: — Olívia! —chamou novamente.

Ele ouviu um barulho distante de sirene se aproximando. O segundo de alívio se esvaiu quando, à sua frente, o Observador se fez presente. Olhou para Peter como se analisasse a sua alma.

—O que você quer? O que você fez? —perguntou Peter, furioso.

O Observador olhou para Olívia, e de voltar para ele:

—Ela está viva. E vai viver. As duas. E o seu filho também.

—A pessoa que vai morrer! Era o meu filho não era? Você trouxe um assassino aqui para matar o meu filho!

Parou por um instante, como se analisasse aquela situação:

—O seu lado deve vencer, para que o meu mundo exista.

—RESPONDA O QUE EU TE PERGUNTEI!

—Eu acabei de responder... Pegue a sua Olívia e volte para o outro lado. Se quiser o seu filho, apanhe-o. Você pode ter tudo o que o seu coração desejar. O bebê vivo é o seu filho... —disse, como se apontasse algo com o olhar.

Olívia se moveu no chão, acordando um pouco atordoada:

—Peter?

Ele agachou para socorrê-la e percebeu que o homem não estava mais lá. Olhou na direção apontada, percebeu que outro veículo havia sido atingido.

—Olívia, consegue andar?

Ela tentou colocar-se de pé, ele procurou ajudá-la, envolvendo a sua cintura:

—Vamos ter que andar até aquele carro, tudo bem?

—Sim.

Os dois se moveram com dificuldade, Peter pôde identificar o choro vindo de dentro do carro, ambos olharam para dentro. Olívia empurrou o homem morto e viu a sua face: era Richard Visconsin. No banco de trás, dois corpinhos em duas cadeirinhas: apenas um dos bebês estava vivo.

As sirenes se aproximavam e Peter, sem pensar duas vezes, apanhou a criança. Quando ele começou a se mover em direção oposta à do acidente, Olívia o encarou com desentendimento.

—Olívia! —pediu ele. Ela engoliu seco e viu sua versão ruiva morrendo aos poucos sobre o asfalto gelado.