Uma turba de alunos nada feliz avança pelos corredores da escola a passos pesados devido à moleza do feriadão. Sendo motivados pelo barulho estridente do sinal para a primeira aula da manhã de segunda. Alguns resplandecem em uma pele bronzeada enquanto outros parecem estar mais pálidos.

Tio Joshua sacode os braços e faz um barulho estranho com os lábios. Olho bem para ele duvidando de seu nervosismo, crendo que ele enfrentou momentos piores para se formar e se firmar na profissão que escolheu. Mas logo retiro este pensamento porque ninguém deveria se sentir bem no momento em que volta para a escola em que estudou. Creio que nem a Rosa, nossa professora linha dura, se sentiu bem logo que pisou na escola em que estudou. Algo que deve ter durado apenas poucos minutos porque aquela professora sente uma alegria doentia em punir alunos por não seguirem suas regras rígidas igual a de um quartel.

– Você está ótimo - digo passando a mão na gravata azul escuro que ele usa por baixo de um colete cinza sob uma blusa azul claro.

Como sempre ele se vestia com elegância enquanto eu trajava calças jeans rasgadas e uma blusa vermelha com botões muito amarrotada. Não sei bem quando comecei a me vestir assim, se foi antes de Vini ou durante, ou se foi mais recente com nosso rompimento. Aquele estilo metade grunge e metade comum parecia estar mais próxima da minha realidade.

– E quando não estou? - ele indaga mudando a coloração da pele.

– Acha que vai vomitar?

– Não, já fiz isso - ele olha bem em meus olhos e coloca as mãos em cada lado dos meus ombros - Você está parecendo sua mãe, ela me disse essas mesmas coisas quando entrei aqui pela primeira vez.

– E isso ajuda?

– Nem um pouco. Mas isso ajuda - ele me abraça forte e deixo ser abraçada.

Ouço um pigarro e empurro Joshua bruscamente para tirá-lo da minha linha de visão e vejo Lucius de cabeça baixa, as mãos nos bolsos da calça jeans preta e os olhos baixos e diretos em cima de mim. Não era uma boa visão os olhos negros dele espremidos, não por questão de beleza - ele continuava lindo -, mas por uma questão de ser intimidador. Era uma visão que assustaria qualquer um.

Ele deu um passo a frente ficando lado a lado com uma das colunas que sustentam o teto da escola, o local para onde Joshua havia me levado para evitar os alhares dos alunos. Dei um passo a frente, quase esperando um reconhecimento mais amistoso da parte dele. Mas logo recuei sabendo que eu merecia algo bem pior do que seu olhar frio sobre mim. Afinal, eu o havia deixado sem nem me despedir, sem nem ao menos ele saber. No entanto fiz o que achei certo e assim perduraria.

– Olá, Lucius, este é Joshua, meu tio - apresento os dois que se cumprimentam com um aperto de mãos.

– Ah, você é o famoso Lucius. A Ruby me contou coisas interessantes sobre a relação que vocês têm - falou tio Joshua.

Se fosse possível eu enterraria minha cabeça na terra e fingiria que aquilo não era comigo.

– Foi mesmo? - ele arqueou as sobrancelhas e deu um leve sorriso.

– Eu gostaria muito que me ajudasse a decifrar o que se passa na cabeça dela então - Lucius se inclinou para frente cúmplice - Sério mesmo.

– Nem eu entendo, acho que isso é o melhor. Seria muita confusão para nós - Joshua rebateu.

– Ótimo! - exclamei quando vi Joshua abrir a boca novamente - Conversem a sós sobre mim. Tenho mais o que fazer.

Comecei a andar a passos firmes sem esperar por resposta. A escola era famosa pela grande quantidade de corredores, sendo conhecidos pelos alunos como labirinto por todos terem os mesmos ladrilhos brancos e verdes no chão e por as paredes serem brancas com faixas verdes na horizontal. Raramente se viam cartazes nas paredes desde que a escola fora repintada pelos próprios alunos, o que fez desaparecer a incidência de pichações nos muros e paredes.

Andei pelo corredor que ficava em frente a biblioteca, evitando os inspetores que deveriam estar a procura de alunos que haviam ignorado o sinal do início da aula. Parei em cima de um conjunto de lâmpadas queimadas, que eram quebradas com a mesma rapidez que era concertada.

– O que quer, Lucius? - perguntei encarando as pontas de meus All Stars azuis marinho.

– Saber o motivo de ter me deixado sem se despedir - ele se recostou na parede, apoiando um pé nela - E porque não atendeu minhas ligações.

Voltei a encarar meus tênis.

– Meu celular está no guarda roupa da minha mãe - dei de ombros.

Só não conclui que eu o pusera lá desligado para evitar as ligações dele.

Lucius suspirou.

– Não sei o que fazer com você. Não entendo o que se passa em sua mente. Pensei que estivéssemos juntos e agora me ignora como se me odiasse.

– Não dá para ficarmos juntos, Lu.

– Você tem razão - ele diz e desta vez levanto a cabeça assustada por sua desistência tão rápida.

Lucius me dá à costa e começa a andar. Cada célula do meu corpo em sua vibração me ordena para ir atrás dele, porém minha mente me impede e minhas pernas petrificam. Ir atrás dele complicaria tudo e isso era o que menos precisávamos.

– Não te odeio, ao contrário – falei em um sussurro apático que mal chegou aos meus próprios ouvidos.

Uma lágrima solitária escorre por meu rosto quando o vejo pela última vez.