—Você deveria estar morto... – Nathalia diz ao tentar levantar-se, sendo ajudado rapidamente por Ban, ajoelhando-se ao lado da morena que permanecia ferida. Todos permaneciam pasmos, observando a situação que o festival havia levado, enquanto Cyberus apenas retomava sua pose após desviar do ataque do Pecado da Raposa.

—Eu estive vivo... – No momento em que Cyberus explicaria a afirmação da tengu, é rapidamente interrompido por seu grito:

—Está me dizendo que tudo aquilo foi uma mentira?! – Ao gritar isso, cospe um pouco de sangue, recebendo um “Não se esforce” por parte de Ban. As terríveis memórias consumiam a morena, sendo acompanhadas pelas lágrimas tristes, continuando a direcionar palavras furiosas – Por quê? Por que até você mentiria para mim, Ciel?!

Sim, este era seu verdadeiro nome por trás de Cyberus: Ciel, como Nathalia costumava chamá-lo durante seus dias de Cavaleiros Sagrados.

—Eu nunca mentiria... – Ele continuava, aproximando-se com passos lentos, cessando apenas receber os olhares cheios de ódios do humano ao seu lado.

—Eu vi você morrer! – Nathalia grita com ódio em seus olhos, misturados pela tristeza ao revê-lo, mas sem observar diretamente em seus olhos. Mantendo-se finalmente em pé com a ajuda do maior, observa pela primeira vez o homem possuindo o corpo de seu irmão e diz retomando um pouco a calma após cuspir mais sangue – Você que morreu em meus braços por minha causa... Por quê?

“Bom trabalho meu amigo” Hades dizia orgulhoso do seu amigo de infância, que se mantinha com a feição arrependida.

“Eu não queria...” Cyberus murmurou para si mesmo, rangendo os dentes.

“Disse alguma coisa?” Seu líder pergunta com um largo sorriso nos lábios ao abaixar-se ao lado de sua irmã desacordada, recebendo um “Não, minha Alteza” pela parte do mais alto ao revirar o rosto e fechar os olhos para não ver o próximo passo.

Cyberus não havia feito nada, sua mente havia se apagado por alguns instantes e apenas se recorda ao já ter feito o que Hades desejava. Fora controlado pela magia Brain Control e não fizera nada, apenas fingira que não vira Nathalia sendo enfeitiçada e continuou a obedecer fielmente a seu líder, mas isto acabou após alguns anos. O arrependimento lhe perturbava e logo lhe devorou completamente, não suportando ver as atrocidades causadas pela irmã de seu melhor amigo por sua culpa.

“Crow, tem um momento?” Cyberus pergunta a Crow que permanecia conversando com vários Cavaleiros Sagrados em uma vasta mesa de madeira, adentrando pela porta do bar lotado de bêbados, utilizando sua gentileza em sua voz como sempre fizera.

“Claro” Ela diz com um sorriso largo, dando um último gole em seu copo de cerveja e levantando-se de seu lugar. Ela acompanhou-o pelas ruas de Liones por alguns quarteirões até chegarem em uma rua pouco iluminada pela lua da noite estrelada e calma. “Até onde vamos? Por que paramos aqui?” Ela dizia dando de ombros para onde iriam, abrindo suas asas para demonstrar seu orgulho por ser uma das Cavaleiras Sagradas mais temidas do reino.

“Você deveria estar tão despreocupada assim?” Cyberus diz de costas para ela, recebendo seu desentendimento com um sorriso debochado com o pensamento de que isto é natural. “Certeza?” Ele pergunta novamente, prendendo-a na parede ao segurar seus braços sobre sua cabeça.

“Ei Cyberus, o que você pretende?” Ela diz em meio a risadas ao ver a ação do homem e tentando sair de seus braços. “Tudo bem, pode me largar” Diz ao ver que não conseguiria sair facilmente das mãos do Cavaleiro Sagrado com a maior força física do reino, desaparecendo o sorriso e fitá-lo séria com seus olhares negros.

“Perdoe-me” Ele dizia ao aproximar-se do rosto da mulher, que corava e virava o rosto para o lado, encostando apenas as testas. “Memory Return (Retorno de Memória)” esta era a magia oposto de Block, a magia que desbloqueava as memórias e retornando elas. Após sussurrar essas palavras, Cyberus deixa ser acertado pelo chute da morena e dá alguns passos para trás.

“O que foi que você fez?! Que porcaria você...” Antes mesmo que Nathalia pudesse concluir sua cessão de perguntas furiosas, sente uma enorme dor de cabeça e cai ajoelhada ali mesmo. As memórias invadiam sua mente e estava sendo difícil assimilar todas elas de apenas uma vez.

“Eu deveria ter feito isso há muitos anos, me perdoe...” Ele diz ao sentar-se encostado no muro de alguma construção. Ele sabia que logo ela voltaria ao normal, a mulher que nunca conhecera ou melhor, uma tengu com os cuidados de fadas. E estava certo, na manhã seguinte, ela despertou assustada, sem saber o que fazer por lembrar de todas as atrocidades que fizera sem vontade, fingindo estar tudo bem. “Crow, tem um minuto?” Cyberus pergunta ao vê-la andando sem destino em uma das ruas do reino, que aceitou rapidamente e acompanhou-o para uma lanchonete ali perto.

“O que você...” Ela iria perguntar ao sentar-se a frete dele em uma das mesas próximas a janela.

“O que você achou do reino de Liones?” Ele pergunta com um sorriso gentil.

“Como?”

Nathalia agora sabia tudo e o que deveria fazer a partir deste momento, voltaria ao seu reino durante a noite e que não precisava preocupar-se com o homem em que a libertou por ele logo ir ao seu encontro. Mas tudo havia sido estragado. Naquela noite, o Reino das Fadas estava em chamas e Nathalia não pôde fazer nada, enquanto Cyberus havia sido pego por Hades e sido torturado até o momento do retorno da tengu, pois ele sabia que ela voltaria.

O ódio em que Nathalia sentia por seu irmão se amplificou e ela e Cyberus estavam presos nas mãos de Hades: fariam todos os desejos dele sem reclamar ou ambos morreriam, mesmo que Nathalia já desejasse isso. Cyberus não permitia que ela fosse absorvida pela escuridão e pelo desespero, ajudando-a seguir em frente até o momento de sua morte.

Era uma noite comum em que Nathalia retornava tarde de uma missão que fora sozinha, que fora surpreendida por um rastro de penas negras até o quarto do homem em que lhe trouxe as memórias, permanecendo abismada ao encontrar o local totalmente ensanguentado. O rastro continuava até os subsolos do castelo, onde finalmente chegara nos calabouços e na cela mais longe de toda luz solar, e lá estava seu irmão, gargalhando paranoicamente.

“Ciel...?” Era o que ela conseguia dizer ao ter a vista do inferno novamente, pela terceira vez em apenas uma vida. O homem de cabelos longos permanecia deitado no chão com as asas totalmente destruídas, junto a outros ferimentos, que sangravam sem parar.

“Crow, que bom que veio. Venha também se divertir” Ele convidava a torturar seu companheiro ao estender suas mãos manchadas de vermelho. As lágrimas não paravam de escorrer e sentia o desespero percorrer por todo o seu rosto, estava totalmente paralisada. “Eu avisei a vocês” Hades diz ao desfazer o sorriso e ir em sua direção, permitindo que ambos ficassem sozinhos.

“Ciel! Por favor... Por favor...” Ela dizia ao acolhê-lo em seus braços, deixando que suas lágrimas quentes pingassem no rosto pálido do homem.

“Minha Alteza...” Ele sussurra ao abrir um pouco de seus olhos.

“Por favor, aguente firme...” Não importava o que dissesse ou fizesse, já era tarde. Esta havia sido a última noite do Cavaleiro Sagrado Ciel, conhecido como Cyberus, o Guardião do Inferno. O último suspiro dado diante a mulher que tanto queria salvar, a morte em que ninguém soubera até hoje.

—Eu confiei em você, Ciel! – Nathalia dizia.

—Perdoe-me, fora tudo culpa minha – Ciel diz atordoado por ver Nathalia daquela forma e continua – Seu sofrimento por todos esses anos, pelo Reino das Fadas e por todas as vezes que tentou se matar – Sim, sempre fora o que ela queria. Morrer. Mas após várias tentativas falhas ao ser impedido por seu irmão, recebeu a Maldição de Hades – Mas o fato de eu estar contente em poder lhe rever, é verdade...

—Ninguém se importa! – Nathalia diz impedindo-o de terminar sua frase, ao rapidamente voar em sua direção e acertar-lhe um soco, fazendo-o cair no chão quase caindo do ringue – Eu queria me matar por quê eu deixei a Elaine morrer e você morrer! – Ela diz dando ênfase ao dizer sobre ele, diminuindo um pouco de sua voz – Mas olha só você aqui, após tantos anos.

—Eu sempre... – Ciel impede sua própria frase ao demonstrar uma forte dor de cabeça ao tentar levantar-se, colocando uma de suas mãos em seu rosto e tampando um de seus olhos – Você realmente vai acreditar nele, minha querida irmãzinha? – Esta já era a voz do verdadeiro dono do corpo, era de Jin, e ao mostrar o olho destampado, elas retornavam a ser negros – Não... Ela nunca mais irá lhe obedecer, amigo... – Agora de Ciel que tirava a mão sobre o rosto e mostrando o olho ainda azulado, deixando óbvio que ele não conseguiria mais manter a consciência – Antes que eu finalmente morra e descanse em paz... Eu queria dizer que... Eu estive vivo em suas memórias e permaneci adormecido até o momento em que Jin voltaria a dominar a sua mente... Resumindo... Eu voltei por ainda estar preocupado com você... Alteza...

—Ah é? – Nathalia perguntava tristonha, pois sabia que ele nunca mentira para ela, fingindo não se importar. Mas agora ela sabia o motivo de não ter visto a alma dele na Capital dos Mortos.

—Eu não tenho muito tempo, vou o mais longe possível com este corpo e... – Antes mesmo que pudesse encerrar sua frase, é surpreendido pelo forte abraço de Nathalia – Você não precisa mais de meus cuidados, Nathalia.

—Eu... – Ela já não continha a tristeza – Senti tanta a sua falta.

—Eu também – Ele diz.

Sem dizer mais nada, apenas sussurra uma frase em seu ouvido e deixa-a ao bater as asas e parte. Nathalia apenas observou-o sumir de seu campo de visão, enquanto Ban se aproximava da mulher que tinha suas feridas curadas em questão de segundos: ela queria morrer novamente, principalmente após o que ele disse:

“Eu te amo, minha Alteza”