— Chegaram as ordens para sua próxima missão, e pelo que vi, vai ser uma missão externa. - Shion passava o pergaminho com as ordens para Iduna que leu por alto.

— Reino de Akarui? Esse eu não conheço, tem algum livro sobre esse lugar, Shion?

— Temos pouca coisa, só esse livro dando um contexto geral sobre o lugar. Ele se tornou aliado da Guarda de Eel a pouco tempo e antes disso era um reino bem fechado.

— Entendi, vou dar uma lida nele e na missão.

Iduna se sentou em uma parte mais tranquila da biblioteca para ler sua missão e estudar sobre o novo reino que conheceria. Era uma missão de escolta. Ela e outros membros da guarda iriam escoltar a princesa do reino Hyogaki para outro reino, Akarui. A jovem acabou pegando outro livro sobre Hyogaki, que era o mesmo caso que Akarui, um reino fechado que se abriu a guarda a pouco tempo e não havia muita informação sobre ele.

— Uma coisa que não vai estar nesses livros é a relação conturbada entre esses dois reinos. - Shion começou a falar e Iduna prestou atenção, interessada. - A lenda de origem desses dois reinos diz que seus fundadores eram irmãos gêmeos, mas um expulsou o outro de seu reino e fundou a cidade, ou seja, em Hyogaki, o fundador expulsou sua irmã gêmea e criou o reino. Já em Akarui, teria sido a fundadora que expulsou o irmão para criar seu reino. Seja como tenha sido, o fato é que os dois reinos têm ancestrais em comum e é por causa disso que acredito que vocês estão sendo enviados para essa missão, os reinos irmãos querem uma reconciliação através do matrimonio. A princesa de Hyogaki irá se casar com o príncipe de Akarui.

— Shion, eu estou lendo algumas informações sobre esses reinos. Eles não falam o idioma geral de Eldarya, correto?

— Não, ele tem um idioma próprio chamado nihongo.

— Tem algum exemplo dessa língua aqui na biblioteca? - Shion pega alguns pergaminhos empoeirados em cima de uma estante.

— Acho que tem algo aqui, eu não sei essa língua, então não sei o que está escrito.

— Mas eu sei. Bem, boa parte pelo menos. - Iduna revela, lendo os pergaminhos.

— Como você sabe essa língua? - Shion parecia surpreso e admirado.

— É uma forma arcaica da minha língua materna, o japonês. Tem alguns kanjis que eu não entendo, mas dá para entender o contexto dos textos. Esses pergaminhos contam sobre a história que você acabou de me falar, mas de um ponto de vista de alguém que viveu nas duas cidades na época da fundação. Parece que as cidades realmente foram fundadas por irmão gêmeos, mas eles decidiram se separar de comum acordo, ambos tinham ideias diferente de como deveriam governar e acabaram se separando. Os simpatizantes de cada irmão os seguiram e as cidades foram fundadas em pontos opostos do continente, Akarui ao sul e Hyogaki ao norte. Parece que essa diferença geográfica também tem a ver com a habilidade de cada irmão. A irmã se chamava Natsune e o irmão Fuyutsune, aqui diz que eles vieram para Eldarya durante o Grande Exilio. Eles devem ter vindo do Japão Feudal. Natsune era uma kitsune com habilidade de fogo e o

Fuyutsune um kitsune da neve, ambos tinham nove caldas, devia ser por isso que eram tão admirados. Ao que parece, os irmãos perderam o contato e proibiram seus reinos de terem contato com o mundo externo, eles aceitavam muitos poucos forasteiros e o escritor desses relatos parece ter sido um dos poucos que viveu nos dois reinos por um tempo. Pela forma que ele escreve, parece ser um historiador, está assinado por Haruka Ushio.

— Sei que é pedir muito, mas você pode me ajudar a traduzir esse pergaminho? É uma informação muito interessante. - Iduna passou o resto do dia ajudando Shion nas traduções.

Ao final do dia, a jovem voltou a ler o pergaminho de sua missão mais detalhadamente. Ela começaria no dia seguinte, pela manhã, com a chegada da comitiva da princesa de Hyogaki. Seria uma missão com Lance, Matheus, Koori e a própria Iduna. Escoltariam a princesa até seu prometido e ficariam na cidade até o casamento para garantir que a cerimônia ocorresse sem problemas.

Voltou para seu quarto e arrumou sua bagagem, poucas coisas como sempre. De repente, seu estomago se manifestou e foi quando percebeu que não havia comido nada desde o almoço. Já havia passado muito da hora do jantar, mas foi a cantina na esperança de achar alguma fruta para aplacar a fome. Quando entrou, via Lance servindo um prato de sopa que estava no balcão. Ela se aproximou, sentindo o cheiro delicioso e seu estômago roncou tão alto que chamou a atenção do dragão. Iduna ficou vermelha de tão sem graça. Ele estendeu a tigela para ela e perguntou.

— Está servida?

— Não precisa me dar sua comida, eu vou pegar uma fruta e já está bom pra mim.

— Deixa de ser boba, tem sopa o suficiente para nós dois. O Karuto sempre deixa uma panela de sopa e um pouco de pão para os membros da guarda que se atrasam por jantar, com tanto que lavem sua louça depois. - Iduna pegou a tigela, esquentando as mãos na tigela de sopa que ainda estava quente. Pegou também um pedaço do pão e esperou Lance se servir para irem sentar.

— A missão de amanhã, escoltar a princesa, é algo que a guarda costuma fazer? Eu não lembro de ter visto muitas missões dessa com o Shion. - Iduna indagou curiosa.

— De fato não é costume de a guarda dar uma de guarda-costas, mas foi um pedido de Hyogaki e Akarui juntos, e como estamos tentando criar boas relações com esses reinos, acredito que Huang Hua abriu uma exceção.

— A população desses reinos são de kitsunes também? Não tinha muita informação sobre eles na biblioteca.

— Pelo que eu fiquei sabendo de emissários que enviamos, somente as famílias reais são kitsunes, o resto da população são de diversos faeyres, alguns que só existem nesses reinos, como tanukis, eles descreveram como nossos purrekos, mas a aparência lembra mais um panalulu. Também há kappas entre eles e algumas criaturas parecidas com ogros, mas eles davam outro nome, não estou me lembrando agora.

— São onis.

— Isso mesmo. Mas como você sabe?

— Essas são todas criaturas do folclore do Japão. Eu acho que os antepassados dessas cidades podem ter vindo do Japão Feudal. Shion tinha uns pergaminhos na língua desses reinos, mas que ele não conseguia traduzir. É uma forma antiga de japonês, eu consegui ajudar ele na tradução, foi por isso que esqueci de jantar.

— Interessante, todo dia você revela uma habilidade nova. É impressionante.

— Não é nada demais. – Iduna estava visivelmente acanhada, o que Lance achou fofo.

Ambos terminaram suas refeições e lavaram seus pratos para não despertar a ira de Karuto. Seguiram cada um para seu quarto para descansar para a missão que se iniciaria no dia seguinte.

Quando o sol nasceu naquela manhã, Iduna já havia despertado e estava pronta para a viajem, tomou café da manhã cedo e seguiu para a o quiosque central, pois o grupo de escolta também deveria recepcionar a princesa de Hyogaki. Ela foi a primeira a chegar, dez minutos depois Lance apareceu. Um tempo depois Koori apareceu junto com Matheus, que ainda estava com cara de sono.

— Bom dia, empolgados com a missão? - Koori parecia animada.

— Bom dia, Koori. Empolgada não sei se é a palavra, mas estou ansiosa. - Iduna respondeu e notou a cara de Matheus. - E você, Matheus, dormiu mal?

— Eu tive um sonho bem louco e não consegui pregar os olhos depois. Eu era perseguido por uma raposa branca, ela tentava me devorar e eu não conseguia escapar.

— Me senti pessoalmente ofendida. - Koori fez uma cara de reprovação.

— Se fosse você, eu não precisaria escapar, mas não era. Era uma raposa que eu não conheço.

— Vamos para o portão de entrada do QG, temos que esperar os batedores da princesa. - Lance ordenou aos presentes.

Ao chegar no portão principal, não demorou muito para os batedores chegarem e anunciarem a chegada da princesa. Huang Hua foi para o portão para recepciona-la pessoalmente. Iduna viu o quanto e chefe da guarda reluzente estava empenhada em estreitar os laços entre a Guarda de Eel e os reinos de Hyogaki e Akarui. Quando a comitiva da princesa chegou, uma dezena de pessoas a acompanhava. Pelo que a meio-kitsune pode perceber, seis eram soldados, duas empregadas ou damas de companhia da princesa e os dois batedores. Quando ela entrou nos muros de Eel, sua beleza hipnotizou a todos. Ela uma linda jovem kitsune de pelo branco como a neve, pele clara e marcas no rosto. Usava um kimono branco com detalhes em azul e vermelho, o cabelo era longo e liso e branco e tinha nove caldas brancas e volumosas. Seus olhos eram vermelhos, que combinavam com seus lábios carmesim. Huang Hua se pôs em frente a ela e começou as apresentações.

— Bom dia, princesa Akame. Seja bem-vinda o Quartel General da Cidade de Eel. Estamos muito felizes com sua chegada e cumpriremos nossa missão com máximo empenho. – Huang Hua se vira De lado para mostrar os membros da missão. – Esses são os guardiões designados para sua escolta. O chefe da guarda Obsidiana, Lance, nossa perita em poções, Koori, e dois dos nossos melhores guerreiros, Iduna e Mateus. – Todos fizeram uma reverência respeitosa quando seus nomes foram citados. Iduna não soube dizer se a princesa os olhava com desprezo ou se o olhar frio dela era algo natural, quase involuntário. Akame sussurra algo no ouvido de uma de suas empregadas e ela fala para Huang Hua.

— Akame-hime está feliz em estar sob a proteção da guarda de Eel e está ansiosa para seguir viajem na companhia dos senhores.

— Princesa Akame, serei o líder dessa missão e prometo que faremos de tudo para levá-la a Akarui em segurança. – Lance se apresentou a princesa e Huang Hua voltou a falar.

— Temos aposentos reservados para a senhorita e sua comitiva descansarem e reabastecerem o que precisarem para seguir sua viajem. Por favor, venha comigo. – Huang Hua segue para o refúgio com a comitiva logo atrás. Os soldados da guarda permaneceram do lado de fora da casa, montando guarda. Mesmo ainda estando em Eel, a missão já havia começado. O comandante dos soldados da princesa e Lance conversavam sobre como seria feita a proteção dela. Ainda levou mais um dia para que a comitiva seguisse viajem, sendo acompanhados pelos soldados da guarda de Eel.

A viajem até Akarui duraria mais 3 dias. Na primeira noite, nada de estranho aconteceu. Um membro da guarda estava sempre de vigília junto aos guardas da princesa.

No segundo dia, porém, foi mais complicado. Eles foram atacados por ladrões que tentaram levar a princesa. Durante o ataque, um dos bandidos tentou ataca-la, mas Matheus protegeu de forma heroica e Iduna tratou de ‘finalizar’ o oponente.

— Não se preocupe princesa, estamos aqui para protege-la a todo custo. - Matheus sorria para ela, ajudando-a a se pôr de pé e colocando-a de volta em sua carruagem.

O jeito como a princesa olhava para Matheus não passou despercebido por Iduna e Koori que se entreolharam e deram um suspiro de pesar em uníssono.

Durante o acampamento, naquela noite, quando as empregadas foram buscar um prato de refeição para a princesa que estava recolhida em sua tenda, Koori e Iduna ouviram as mulheres conversando em sua língua e a meio-kitsune pôde constatar que era realmente uma forma antiga do idioma japonês.

Como a princesa tem a audácia de proferir tais dizeres sobre aquele rapaz. Ela mal o conhece, ainda mais estando noiva de outro homem. – A empregada com aparência mais nova comentou.

A senhorita é uma princesa, nunca poderá se envolver com esse tipo de homem, de uma reles tão inferior. – A outra empregada mais velha e com aparência severa complementou.

Elas comentaram mais algumas coisas, sobre Matheus e o fato de a princesa ter se encantado pelo rapaz. Estavam perto delas apenas Koori e Iduna e a kitsune fazia cara de interrogação, pois não entendia nihongo, Iduna simulava a mesma cara, mas entendia perfeitamente o que as mulheres falavam. Quando elas se afastaram, Iduna olhou para Koori com cara de preocupação dizendo.

— Estamos com um problema, temos que falar com o Lance e o Matheus agora.

— Como assim? Do nada um problema? – Koori indagou.

— Vamos encontrar os rapazes que eu explico tudo. – As companheiras procuraram os rapazes e, quando acharam, Iduna chamou todos para um canto para contar o ocorrido. – A gente está com um problema.

— O que aconteceu dessa vez? Já não bastava o ataque mais cedo. – Matheus lamentava.

— Mas nosso problema agora é você. – Iduna disse, apontando para o companheiro humano e todos o observaram perplexos.

— Explica isso direito que eu estou confusa até agora. – Koori tentava entender.

— Quando eu e a Koori estávamos comendo, as empregadas foram buscar o jantar da princesa. Elas estavam conversando entre elas no idioma nativo achando que não entendíamos. Elas falaram que a princesa está ficando apaixonadinha pelo Matheus. Ele foi dar uma de príncipe encantado hoje cedo e agora a princesa que está encantada.

— Peraí! Você entende a língua deles? - Matheus parecia mais surpreso com esse fato do que com a paixão da princesa Akame.

— Sim, eu entendo. A língua deles é uma forma antiga de japonês. Mas isso não é importante agora, se a princesa se apaixonar por você de verdade, isso pode atrapalhar o casamento entre os reinos de Hyogaki e Akarui, e se eles souberem que isso foi causado por um guardião de Eel, podemos dizer adeus a aliança entre a Guarda e os dois reinos e todos os esforços de Huang Hua terão ido por água abaixo.

— Isso é um baita problema. - Koori frisou.

— Matheus, você vai ficar longe da princesa o máximo possível, não fale com ela mais do que o necessário e se ela vier falar com você, seja rápido e desconverse, mas não a destrate. - Lance foi firme na ordem e Matheus engoliu a seco, assentindo com a cabeça. Quando todos estavam voltando a seus postos, o Chefe da missão ressaltou - Sobre a Iduna entender a língua nihongo, isso é um segredo nosso e espero que continue assim, nada de comentar com os guardas ou empregados, estamos entendidos? - Todos assentiram e seguiram para seus postos.

O resto da viajem transcorreu sem mais incidentes. Assim como Lance havia pedido, Matheus manteve contato mínimo com a princesa. Dando preferência para que Koori ou Iduna atendessem suas demandas. As companheiras perceberam que Akame havia ficado triste com o ‘gelo’ que Matheus estava dando nela, mas o rapaz estava mais preocupado em não estragar a missão do que nos sentimentos da princesa. Após mais um dia e meio de viagem, a comitiva chegou em Akarui e teve uma recepção com toda a pompa e circunstancia. Iduna se sentiu especialmente nostálgica, lembrando-se dos festivais que ia quando criança e as cidades antigas que visitara. A arquitetura da cidade lembrava bastante os bairros mais antigos de Kyoto e parecia que não só ela, mas seus companheiros também estavam admirados com a cidade. Ao chegar às portas do palácio, foram recepcionados pela família real da cidade. A rainha Hikari e o príncipe Satoru observavam a chegada da comitiva da princesa Akame e o príncipe parecia especialmente ansioso para conhecer sua futura esposa. Quando a princesa saiu de sua carruagem, um silêncio se fez no ambiente. Todos estavam admirados com a beleza dela e até o grupo de Iduna parecia pasmo, pois ela estava ainda mais bela do que nos últimos dias. Suas servas haviam se dedicado ao máximo para deixá-la deslumbrante. Satoru foi ao encontro dela, dando as boas vindas para os recém chegados.

Sejam bem-vindos todos. Estamos em júbilo por recebê-los aqui. Todos serão acomodados devidamente, sintam-se a vontade e não hesitem em solicitar nada do que precisarem. — enquanto ele falava, a empregada mais velha da princesa Akame traduzia para os soldados de Eel o que o príncipe dizia. Com um bater de palmas do príncipe, os servos se movimentaram e levaram cada grupo para sua devida acomodação.

Os integrantes da guarda de Eel foram levados para dentro do castelo, mas ficaram em quartos mais periféricos, Iduna imaginou que, por terem sido convidados como guarda-costas da princesa e estarem ali para garantir o matrimônio, o príncipe quis dar um lugar de destaque a comitiva dentro do castelo, mas sem deixá-los esquecer que ainda eram servos e não nobres. Um servo levou-os até um quarto com quatro camas. Também entregou roupas a cada um deles, o que deixou os guardiões confusos, e o servo explicou.

— Olá, eu me chamo Kaoru. Serei o responsável pela sua estadia na cidade. Aqui em Akarui, somos muito tradicionais. Os visitantes devem se vestir de acordo com os costumes da cidade. Vou levá-los ao banho do castelo e depois vocês devem vestir nossos trajes tradicionais. – O servo falou no idioma comum, mas com sotaque forte. Os rapazes se separaram das moças durante o banho, e ao final se reencontraram já com os trajes tradicionais. A nostalgia pegou Iduna novamente, estava vestida com uma yukata de seda linda com flores bordadas em vermelho, Koori estava com uma yukata azul com estampa de neve. Os rapazes também estavam de yukata com padrões geométricos, em verde e azul escuro.

— Uau, vocês ficaram ótimos. – Koori disse sem a menor cerimônia.

— Vocês também estão lindas. – Matheus rebateu o elogio. Iduna só observava como a roupa havia caído bem em Lance que parecia especialmente desconfortável com aquele traje.

— Me sentiria melhor com a minha armadura e espada. – O dragão lamentou.

— O servo havia dito que não podemos andar armados dentro do castelo. Temos que obedecer. – Koori apontou.

— Eu sei, mas não me deixa menos desconfortável com isso.

— Eu achei que você ficou muito bem. Concorda, Iduna? – A meio-kitsune foi trazida a realidade ao ouvir seu nome.

— Hã... Ah sim, sim. Combinou com você. – Ela respondeu sem graça, o que foi percebido por Koori, que também percebeu o rosto de Lance ruborizar de leve. Todos voltaram para o quarto que estavam alojados até que o servo retornou novamente.

— Senhores, o príncipe gostaria de encontrá-los agora. Por favor, me acompanhem. – Kaoru guiou o grupo pelo palácio até o salão principal, onde o príncipe, a rainha e outros nobres se encontravam. Eles ajoelharam ante o príncipe, que estava sentado numa parte mais alta da sala.

— Membros da Guarda de Eel, agradeço muito por terem trazido minha noiva até aqui. Quero criar laços de amizade com Eel e desejo que se sintam bem-vindos a nossa humilde cidade. – O príncipe disse em tom formal.

— A Guarda de Eel também deseja manter amizade com Akarui e Hyogaki. Por isso, como presente de casamento, nós oferecemos esse pergaminho antigo. Acreditamos ser de um historiador que viveu nas duas cidades na época de suas fundações. Quem assina é Haruka Ushio. – Uma pequena comoção se fez quando Lance proferiu o nome. Um servo foi até o dragão e recolheu o pergaminho para levá-lo até o príncipe. Ele correu o olho e falou.

— Haruka Ushio foi um conselheiro muito importante para as duas cidades. Esse pergaminho é parte importante da nossa história, agradeço a bondade da Guarda em nos dar esse presente. Agora pode ficar a vontade no castelo e, novamente, sejam bem-vindos.

Os companheiros de guarda saíram do salão principal e seguiram um servo até uma sala onde havia uma refeição posta. Depois de uma pequena aula que Iduna deu a eles ensinando como utilizar os hashis, todos se serviram à vontade. Após a refeição, eles estavam liberados para visitar as dependências do castelo. Eles se separaram e Iduna foi para um dos jardins que havia chamado sua atenção. Um lago com carpas com uma grande cerejeira na margem. As pétalas das flores caiam sobre a superfície da água e eram beliscadas pelos peixes. A jovem se sentou aos pés da árvore e um pimpel filhote veio se aninhar no seu colo. Enquanto acariciava o mascote, acabou pegando no sono, naquela calmaria tão familiar. Ela sonhou com a infância, quando morava no templo da deusa Inari, quando brincava com seu irmão e aprendia como ser sacerdotisa com sua mãe e artes marciais com seus avós. Uma pétala de flor caiu na ponta de seu nariz e ela ouviu uma risada baixa, mas que a fez despertar. Lance estava sentado ao seu lado, observando seu rosto. Quando ela despertou, o pimpel em seu colo despertou junto se se afastou, seguindo para outra parte do jardim.

— Acho que peguei no sono, devia estar mais cansada do que pensei. - Iduna disse, se espreguiçando.

— Parecia estar tendo um sonho bom, você estava sorrindo. - O chefe da obsidiana disse, tirando a pétala de flor no nariz dela. Aquilo fez Iduna enrubescer. Ele começou a observar a paisagem a sua volta. - Nunca tinha visto esse tipo de paisagem em Eldarya, é muito bonito.

— Sim, me lembra do Japão, parece muito com as cidades mais tradicionais.

— Me parece que teria sido interessante ter nascido em um país como o Japão.

— Mas talvez você tivesse nascido uma carpa. - Iduna disse apontando para o lago com os peixes. Lance fez uma careta de desgosto e Iduna riu e tratou de explicar. – Há uma lenda no meu país de como nasceram os dragões, uma carpa começou a nadar contra a correnteza do rio. Quando chegou em uma cachoeira, ela não se deu por vencida e nadou cachoeira a cima. Com muita dificuldade conseguiu chegar no topo e sua recompensa pela obstinação foi ser transformada em um dragão.

— Seu país parece mais mágico do que Eldarya. – Lance sorriu para Iduna, que cada vez mais reparava na beleza de seu chefe de guarda. Ela se movimentou para se levantar, o dragão se por de pé mais rápido para estender a mão e ajudá-la a se levantar. Por alguns instantes eles se olharam intensamente, mas o momento foi cortado por alguém que se aproximava rapidamente.

— Amor, que bom que eu te achei. Estava preocupado. – Matheus se aproximou de Iduna, puxando-a para si e beijando sua boca sem a menor cerimônia.