As Sete Ameaças

Parte II: O Reencontro – Dupla perseguição.


Zaki Leeu olhava para a pequena aldeia, escondido entre as árvores. As pessoas andavam despreocupadamente, conversando e fazendo tudo o que pessoas normais fazem quando não sabem que estão sendo observadas. O homem tirou a bandana da cabeça e amarrou no braço direito para esconder seu Jolly Roger.

Saiu de seu esconderijo, fazendo a expressão menos ameaçadora que conseguia, o que ainda colocou algumas criancinhas para correr.

Depois de doze anos sendo um perigoso pirata do mais perigoso navio dos três reinos, Zaki estava desafinado em ser uma pessoa normal.

Remexeu nos bolsos, sentido duas sacolas gordas de moedas que roubara do tesouro de Teach e olhou ao redor. Precisava de comida, roupas novas e um cavalo. Aquela aldeia parecia pequena demais para que conseguisse o cavalo, mas talvez conseguisse a comida e as roupas.

— Com licença, cavalheiro – disse um homem em frente à Zaki – O senhor procura alguma coisa aqui?

Ele olhou o homem franzino que o olhava. Parecia com medo, embora o mais corajoso de todos por ali.

— Olá, desculpe a intromissão. Sou... – não poderia dar Zaki como nome, já devia estar sendo procurado e se desse Taú, seria temido por ser um pirata perigoso. Precisava dar um nome desconhecido – Paul. Sou um viajante perdido. Poderia me dizer onde estamos?

— Estamos ao sul de Luzarium. Somos uma aldeia completamente inofensiva e pobre.

Zaki deu um sorriso sem graça. Aquele homem nem se importava em esconder o medo, era patético.

— Claro... e existe algum lugar onde eu poderia comprar comida e roupas?

— Comprar?

— Sim, comprar.

— O senhor tem dinheiro?

Zaki manteve o sorriso, testando sua paciência.

— Sim, eu tenho dinheiro.

— Oh, então venha comigo, por favor!

Zaki seguiu o homem até uma casa de taipa simples onde funcionava uma singela boutique. Prateleiras pequenas exibiam todos os tipos de coisas comestíveis e em um canto, uma mulher dobrava algumas calças em uma pilha.

— Obrigado – falou o ex-pirata.

— Não há de quê!

Zaki se aproximou do balcão.

— Bom dia – cumprimentou – gostaria de comprar um alforje, um litro de aguardente, um cantil, um quilo de carne seca e algumas roupas.

— Pois não – respondeu o homem – Fará uma viagem?

— Na verdade sim.

— Pretende ir a pé?

— Por que pergunta?

— Um amigo está com dificuldades e precisa vender o cavalo. Uma pena, grande alazão aquele! Uma obra de arte.

— Gostaria de dar uma olhada.

— Pois não! Aqui está o alforje, a aguardente, o cantil e a carne seca. São cinco moedas de prata.

Zaki pegou uma moeda de ouro, em parte por que não tinha nenhuma de prata, mas também para agradar o homem, e depositou no balcão.

— Aqui está.

— Oh, que os deuses lhe agraciem – falou o homem rindo – Pode comprar as roupas ali com minha mulher.

Zaki saiu meia hora depois com quatro moedas de ouro a menos e completamente preparado para a viagem.

O cavalo que comprara era, de fato, uma obra de arte. Corria como os ventos de Clyde e era forte como Ananya. Se conseguisse ser discreto e andar rápido, chegaria em uma semana em Gapazium. E em mais dois dias, poderia chegar em sua Vila.

Aumentou o ritmo de Fazias, o cavalo. Tinha medo de que os piratas chegassem onde ele estava com pressa. Conhecia Edward Teach e sabia que assim que descobrisse sua falta e a perda do tesouro, iria imediatamente para terra atrás de Zaki e se tinha uma coisa que Barba Negra era bom, essa coisa era vingança. Ele se vingava melhor que qualquer pessoa.

Ao entardecer, sentiu o cavalo ofegante, diminuindo o ritmo. Zaki então parou em um campado perto de um rio e abasteceu o cantil, enquanto seu cavalo pastava um pouco, aproveitando para comer também.

Comeu três fatias de carne seca e bebeu um pouco de água. Não beberia a aguardente, comprara para usá-la como álcool caso se machucasse.

Zaki pegou um graveto por perto e começou a desenhar na terra perto do rio o mapa dos três reinos que tantas vezes tinha visto na sala de Teach. Calculou que estava aproximadamente perto da capital de Luzarium, que ficava perto da costa. Segundo fontes seguras do capitão, um casamento seria realizado no outro dia ali, a capital estaria cercada de guardas, então teria que desviar dela, talvez tomando um curso perto do coliseu.

Como será que ele recuperara a memória? Era algo que ele ainda não entendia. Tinha certeza que Potter Lobus tinha limpado completamente seu cérebro, mas, de repente, tudo volta. Como? Será que seus amigos também tinham recuperado suas memórias? Se tinham, então todos nos três reinos estariam com atenção dobrada. Teria de ser cuidadoso.

E com certeza não poderia ir direto para a Vila, ela estaria cercada de guardas. Precisava ir para um local diferente encontrar seus amigos, mas onde? Talvez o Vale das Pedras. Apenas eles sabiam onde ficava a entrada subterrânea para a cova entre as sete pedras que eles tinham nomeado com seus animais guias. Zaki sentia falta daquelas pedras em formato de animais que ganhavam vida quando eles as tocavam.

Ouviu então vozes. Correu para onde Fazias estava e pensou em montar no cavalo, mas as vozes já estavam muito próximas, decidiu que o melhor seria escondê-lo. Não queria causar confusão e se fossem bandidos com certeza iriam querer levar seu cavalo.

Escondeu Fazias atrás de algumas árvores grossas, colocou as duas bolsas de moedas no alforje e usou a linguagem calma e compenetrada que Yuki uma vez dissera que animais gostavam.

— Fique aqui, tudo bem? Não faça barulho.

Então se distanciou o máximo de onde o cavalo estava e se escondeu atrás de algumas árvores.

— Ei, você aí – ouviu alguém chamar.

Fora visto, não iria se esconder para não causar problemas. Saiu de trás das árvores e viu que eram soldados vestindo vermelho e preto: as cores de Luzarium. Segurou um sorriso no rosto, nervoso.

— Pois não, boa tarde, cavalheiros.

— O que fazia escondido? – perguntou um deles.

— Eu? Oh, sim. Escutei suas vozes e pensei que fossem ladrões então me escondi.

A explicação não pareceu convencer o homem.

— É mesmo?

— Sim. Garanto que é verdade.

— E por acaso está sendo perseguido?

— Não, mas em tempos como este é muito comum ver bandidos rondando as florestas à procura de viajantes descuidados – explicou torcendo que fosse um fato e não uma suposição – Mas eu não sou descuidado, ou pelo menos tento não ser.

— E por que viajas pela floresta? Tem medo de ser pegue na estrada?

— Bom, creio que quando se trata de bandidos, é bem mais fácil se esconder deles na floresta do que em estradas abertas.

— Faz sentido – falou um jovem soldado.

— Não é mesmo?

— Certo. Trate então de... – então o homem que parecia ser o líder estreitou os olhos, como se reconhecesse Zaki de algum lugar, mas não recordasse de onde – Qual o seu nome, viajante descuidado?

— Taú – respondeu uma voz por detrás dos soldados – Este é Taú, imediato da tripulação Barba Negra, de onde não deveria ter saído.

E o próprio Edward Teach saiu da floresta, com seu sorriso raivoso, que só mostrava àqueles que estavam prestes a morrer.

O soldado se voltou para Zaki e depois para Barba Negra e gritou:

— Peguem eles!

Os piratas então saíram de grupos por todos os lugares visíveis e começaram uma batalha contra os soldados. Zaki estava no meio, tentando não ser visto por nenhum dos dois grupos, mas sem sucesso afinal, era o motivo da briga.

Pegou a espada de um cadáver e finalmente entrou na batalha. Para o azar deles, Zaki era um ótimo espadachim além de ser uma Ameaça experiente, usando seu calor para fazer a espada ficar quente, ferindo mesmo sem necessariamente cortar o inimigo.

Defendia e atacava com destreza, lutando tanto contra soldados quantos contra piratas.

Quantos matou naquela luta? Não soube dizer, mas fez um número significante de baixas nos dois grupos. Em pouco tempo, os soldados estavam extintos e Zaki lutava apenas contra os piratas. Mas eles não tinham código de honra na hora da luta, então não foi surpresa quando, batalhando contra um pirata, foi apunhalado pelas costas.

Caiu de joelhos ofegante e recebeu outro golpe no ombro.

— Parem agora – falou o capitão.

Zaki caiu por terra, derrotado, vendo tudo embaçado em sua frente. Viu apenas três vultos em sua frente. Barba Negra tinha vindo ali com pelo menos cinquenta homens e voltava com apenas dois além dele mesmo.

— Você foi longe Taú. Não entendo por que fugiu, poderia me explicar?

Zaki tossiu um coágulo. Se estava morrendo, por que não ser sincero?

— Meu nome é.... Zaki Leeu. Eu sou... uma das... Sete Ameaças Prodí... gio. Preciso... voltar... pra casa.

Barba Negra soltou uma gargalhada e olhou o homem moribundo. Então pisou em uma de suas feridas, fazendo-o gritar.

— Não me importa quem é ou quem deixou de ser. Você fez um juramento com minha bandeira – falou o capitão cortando com a espada a bandana de Zaki e abrindo um talho em seu braço – E você só quebra esse juramento com a morte. Não é mesmo homens?

— Aye! – gritaram os outros dois.

— Agora, vamos deixar Taú agonizar em paz.

Eles então se viraram, não sem antes cuspir em Zaki e saíram pelo caminho que vieram.

Quando já tinham ido embora, Zaki se arrastou para onde Farias estava. O cavalo se agitou quando viu o homem cheio de sangue, mas permaneceu onde estava, deixando Leeu pegar a aguardente no alforje. Ele abriu com pressa e trêmulo a garrafa e sentou-se encostado em uma árvore, jogando o líquido na ferida no ombro. Gritou de dor, mas não parou até achar que tinha usado o suficiente. Então deu um longo gole e virou o resto da garrafa na ferida da cintura que o atravessava, fazendo-o gritar ainda mais.

Quando a garrafa estava vazia, jogou-a do outro lado e olhou para o céu. Morreria, tinha certeza disso.

Então apenas fechou os olhos e, mesmo com toda a dor que sentia, adormeceu.