Ao Pôr do Sol

O Primeiro Dia de Trabalho - parte 1


Elas estavam ficando cada vez mais perto, aquilo estava me cheirando a encrenca então eu me levantei e tirei a camiseta e os shorts. Elas estavam mais perto ainda, Thomas virou a cara quando viu que eu ia entrar na água.

– Eu acho que estava errado, você fica melhor vestida – ele disse.

– Vai se foder Thomas!

Eu corri para a água, a areia estava gelada e o vendo batia contra eu, mas tenho certeza que aquilo era melhor do que ver Zoe de biquíni. A água estava gelada e as ondas fortes, eu virei-me de costas para uma onda que estava por vir e percebi que Thomas ainda olhava para eu, então mergulhei e engoli um pouco daquela horrível água salgada. Eu continuei nadando até o fundo e sento quase sufocada pelas ondas quando um surfista de aproximou de mim.

– Acho que não deve ir para o fundo senhorita Ashley Cooper – ele disse.

– Esta brincando com a minha cara, quantas mais pessoas sabem do meu nome aqui?

Ele riu.

– Ash, sou eu... Noah!

Eu não o reconheci sem óculos e em cima de uma prancha, Noah era o garoto da quinta série que era apaixonado em mim e costumava me mandar cartinhas de amor com frases tipo: “Gosto do cheiro do seu xampu doce princesa”, eu sempre o achei bizarro pelo fato de ser excluído do grupo do fundo que jogava bolinhas de papel molhadas em suas costas. Eu não era muito desse tipo, mas já joguei uma bola nele naquele mesmo ano porque ele tentou me beijar na aula de educação física, foi nesse mesmo dia que eu fui para a diretoria e fiquei sem andar de skate por um século. E “Ash” era como meus amigos legais costumavam me chamar, como Scarlett, e é claro que Noah não fazia parte desse grupo.

– Noah...? Você mudou, não tem mais espinhas, não usa mais óculos e nem aparelhos... Maneiro! - eu não costumo usar “maneiro” só que não achei outra palavra que se encaixasse.

–Você por outro lado quase não mudou nada, estou feliz em te ver Ash!

Noah se mudou assim que passamos para a sexta série, não quero ser chata, mas assim que vi a lista de chamada e não o vi foi como se uma bomba de alegria se explodisse em meu coração ou como se minha mãe dê-se três reais e eu comprasse tudo de bala de uva verde. Mas isso não importa porque quando eu estava quase para passar para a sétima série ele me mandou um presente de natal, era uma miniatura de skate que estava escrito: “De seu amor, Noah”, minha irmã ficou o ano inteiro achando que ele era o meu namorado, mas meu primeiro namorado mesmo veio no fim do ano. Ele era o tal garoto que no primário tirava meleca do nariz e comia e na nona série costumava tirar péssimas notas e roubas balas das pessoas no recreio, mas isso também não importa.

Voltamos para a beira da praia, viemos conversando sobre o tempo passado e eu consegui chegar a conclusão que a vida dele é um tremendo tédio e que eu era uma má garota, ele não era tão ruim assim quanto parecia. Ele chegou a comprar um álbum dos The Beatles porque a Scarlett disse que era minha banda favorita, e que meu animal favorito era um tipo de mutante que saiu de um unicórnio e o pai era um dragão e que eu costumava chamar de dracórnio (isso era verdade). Ele me acompanhou até onde todos estavam sentados, e até deu um beijo na bochecha de Ammy o que eu acho totalmente desnecessário.

– Quem era ele? – Ammy perguntou quando Noah foi embora.

– Um velho amigo, coisa besta nem liga.

Ela sentou-se na minha frente e apoiou suas mãos em minhas pernas, olhando dentro dos meus olhos naquele momento eu já estava pensando: “Fudeo, o que eu fiz dessa vez?”. Quando ela finalmente disse:

– Ashley, Zoe me contou sobre o acidente que incidente que houve ontem. Querida você quebrou mais de trinta tartarugas e cada uma custava cerca de setenta reais, ou seja que você vai ter que pagar.

– Ammy, eu não tenho dinheiro esqueceu? Ashley ser uma menina pobre! – Eu disse fazendo voz de índio, que eu nunca ouvi falar, mas acho que é assim.

– É por esse motivo que Zoe acha que você poderia trabalhar em uma das barracas, e assim vai pagando ela aos poucos. Mas é claro que você vai continuar cuidando de Connor, só vai ser um pequeno tempo até você pagar pelo menos algumas tartarugas. E Connor vai se comportar como um anjo.

Eu virei o olho para ela com uma cara de “fala sério!”, só que ela continuou com aquele sorriso no rosto que sempre me faz senti-me uma má pessoa que precisa obedecer sua irmã, eu suspiro e topo desde que Connor me obedeça e eu possa dar patas na cabeça dele toda vez que ele cortasse o cabelo. Sobre dar tapas eu não consegui, mas pelo menos tenho quase certeza que Connor não vai me obedecer porque é um recorde porque sempre eu tenho certeza.

.🌴.

Eu finalmente estava em minha cama, eu ainda sentia as ondas indo e vindo pelo meu corpo e sentia as vezes que estava me afogando, mas depois lembro que eu estou em minha cama e eu não tenho medo de água. Eu estava me preparando para no dia seguinte começar a trabalhar naquela barraca, eu imagino que ficarei com uma daquelas garotas que somente tem cara de santa e afirma que aquele dinheiro vai para a faculdade, mas na verdade gasta tudo em bares todas as sextas-feiras.

Na manhã seguinte Ammy me acordou quando faltavam vinte minutos para dar seis horas, eu estava com tanto sono que eu mal conseguia segurar a escova ou fechar a boca e a pasta caia na pia, toda hora eu esfregava o olho e andava me apoiando na parede antes que eu caísse outra vez e quebrasse mais malditas tartarugas. Ammy tinha feito vitaminas e pão integral com queixo branco, minha irmã é uma daquelas pessoas que fingem que gosta de comida leve, só que quando vê uma pizza só falta comer a caixa.

Eu comi tudo bem rápido, e não senti gosto porque graças a Deus meu estomago ainda estava dormindo junto com meu cérebro que quase sempre esta dormindo. Eu me levantei e peguei a bolsa e fui para a varanda da frente esperar o funcionário que me pegaria no primeiro dia, sentei-me e apoiei a cabeça na mão e dei pequenos cochilos, quando minha cabeça caia eu acordava e assim foi umas dez vezes até alguém buzinar na frente de casa. Era Thomas, no momento em que eu o vi eu pensei em voltar para casa eu até subi uns dois degraus até ver uma tartaruga e me senti mal por ter deixado mais tartarugas falsas aleijadas nesse mundo, eu sei que isso é ridículo.

Então eu entrei no carro e fiquei me escondendo atrás da bolsa tentando fazer com que ele não comentasse da minha cara de sono.

– Quer um café? – ele me ofereceu um café direto da boca dele.

– Não, mas aceito um refrigerante se tiver.

Ele ficou calado e voltou a prestar atenção no volante, então ele ligou o rádio em uma rádio Rock, eu não gosto muito de Rock. Acho um pouco estranho, mas ele insistiu em ouvir e ainda dar dancinhas somente com a cabeça o que é ridículo. Então ele estacionou um pouco torto na frente da praia, eu desci no carro com um pulo e peguei minha bolsa.

– Você não estacionou direito – eu comentei.

– Faça melhor – ele disse.

– Me dê a chave.

Eu aprendi a dirigir quando arrumei meu primeiro emprego numa mecânica e eu tinha levar os carros até eles e depois devolver aos donos sem nenhum arranhão, confesso que já paguei o conserto de mais de quinze carros, mas já aprendi bem a dirigir. Ele me jogou a chave por cima do carro e deu a volta e entrou novamente para poder me ver dirigir, eu também entrei liguei o carro e aos poucos fui arrumando, não quero me gabar só que eu mando muito bem nisso.

– Você até que estaciona bem – ele disse.

Ele foi abrindo uma pequena barraca de madeira que ficava no começo da praia, eu olhei para cima para ver a placa e estava escrito “Doce Tartaruga”, isso é bem estranho... eu não sei o que acontece com esse povo que mora na praia para amar tanto tartarugas, elas são velhas e lentas.

Ele me jogou o avental e disse:

– É só atender, que o dinheiro eu pego.

– Isso vai ser um saco!