Anjos

Capítulo 1


Acordou lentamente, sentia seu corpo mais leve, estava tudo tão abafado, aguçava seus sentidos, agora mesmo seu faro estranhava um cheiro que nunca sentira. Mesmo imóvel em baixo das cobertas procurou entender o que acontecia, era uma sensação estranha... Estava faltando algo... Um peso. Começou a mover seu corpo lentamente. Os dedos, as mãos, os braços, os pés, as pernas... Sobressaltou-se num pulo. Com as mãos tremendo, agora se lembrava, havia perdido suas asas.

—Por quê?

Não conseguia entender.

Olhou ao redor, não reconhecia nada. Seu primeiro pensamento era de que se encontrava num lugar escuro, desconhecido e pobre. Era um pequeno quarto com as janelas tampadas por flanelas negras, o chão escuro coberto de pedaços de pano manchados de vermelho. Sangue. Seus olhos dourados marejavam-se. Era um mundo completamente diferente do que conhecera. Havia vivido em palácios brancos, delicados e repletos de luz, com menos paredes quanto possível, o ar lhe fazia falta, o vento, a brisa...

— Por quê?

— Por que você é humana agora?

Assustou-se. Não percebeu que não se encontrava sozinha. Mas sentado num banco ao seu lado encontrava um garoto humano, sabia disso, pois ele não tinha asas, ele era alto, com os olhos azuis e o cabelo tão negro quanto à escuridão que envolvia o quarto. Um humano! Humanos são perigosos!Ouvia sua mente em confusão. Perigo!

Levantou da cama num gesto de recuo, dando um longo pulo para trás. Estava sozinha com um humano, e o seu maior impulso era de fugir, de voar, tudo aquilo que não poderia mais fazer.

Fique longe. — ameaçava. — Se você se aproximar, humano imundo, juro que em nome do rei dos anjos, não sobrará sequer um pedaço seu.

— Você fala como um anjo soldado. Isso é estranho. Já que você é mulher.

— Todos os anjos sabem se defender, principalmente de vocês, humanos. — e o garoto pode ouvir o som de repulsa com que a garota pronunciara a ultima palavra.

— Só tem um problema. Você não é mais um anjo. Com o que exatamente pretende me matar, se agora mesmo, você não possui penas?

— Tenho garras. — dizia, observando com alivio suas unhas pontudas e afiadas.

— Eu também. — disse o rapaz, com os olhos azuis cintilando. — E nesse momento seu equilíbrio está totalmente afetado pela falta das suas asas, você nunca deve ter percebido mais elas também te ajudavam a se equilibrar, fora que você está sob efeito de medicamentos e com um ferimento feio nas costas que pode abrir a qualquer momento. Agora eu sou o \"anjo caído\" mais rápido aqui.

Com uma velocidade anormal o garoto correu ao seu encontro, seus olhos mal o acompanhavam, parecia um anjo-soldado. Ele apareceu como um espectro as suas costas, mesmo se virando ao seu encontro, se sentia lenta. O que sentiu em seguida foi uma dor aguda na nuca com sua visão cada vez mais nublada.

Os braços dele a envolveram e já inconsciente se encontrava imóvel sob seu olhar raivoso.