Além das fronteiras: O destino de duas dimensões

O mundo do Sol, a origem e... conversas


Eu sou Eleodora, uma habitante do Mundo do Sol, uma dimensão dentro de outra onde há luz eterna e calor vibrante. Desde que me entendo por gente, minha vida sempre foi banhada pela intensidade do nosso sol, um astro que nunca se esconde completamente.
Aqui, o sol apenas muda de posição no céu, criando uma dança de luzes douradas que tingem tudo com um brilho especial.
A energia do nosso mundo é palpável, como se cada raio de sol carregasse consigo uma vitalidade inquebrantável.
Aqui somos um povo de pele escura bem radiante e cabelos em tons de loiro dourado, que refletem a luz do sol de maneira extraordinária. A luz solar é tão forte que nossos cabelos parecem emitir um brilho próprio, como se estivessem constantemente imersos em ouro líquido. Esse brilho é um símbolo de nossa identidade, uma marca do nosso vínculo inseparável com o sol. Mas claro... Também faz parte da nossa genética.

Há muito tempo atrás, os primeiros habitantes receberam de forma única e misteriosa uma pequena essência do sol dentro de si, os tornando seres mágicos, resistentes ao sol, ao calor e ao fogo.
Nosso mundo se chama "Mundo do Sol", tem esse nome porque é uma das únicas dimensões conhecidas até então que tem o sol muito próximo de nós. Ainda é um mistério de como os primeiros seres surgiram aqui... Mas temos várias teorias.

A vitalidade que essa luz nos confere é evidente em nossas vidas diárias; somos conhecidos por nossa alegria, nossa energia e nossa força. No entanto, essa luz e essa vitalidade vêm acompanhadas de um grande peso: a cautela constante em relação ao Mundo da Lua... A nossa outra dimensão vizinha, onde a lua fica bem pertinho de lá, segundo o que dizem. Essa dimensão fica dentro da nossa, porém de alguma forma estão divididas.
Desde pequena, ouço histórias assustadoras sobre os habitantes daquele mundo "sombrio", o povo assim chamava.


"O Sol queima suas vidas e a Lua os engana para a escuridão", diziam nossos anciãos com vozes graves e olhos cheios de advertência. Essas palavras estavam enraizadas em nossa cultura, moldando nosso comportamento e nossas crenças.
Todos os seres viviam de acordo com essas regras. Mas claro, sempre haviam alguns poucos que também eram como eu, que não compreendiam essa desunião.

...

Meus pais me deram este nome de Eleodora, que significa "Presente do Sol", porque eu fui um presente precioso para eles, há tempos eles queriam filhos, até que chegou a velhice e então nasci de uma forma misteriosa e inexplicável, ninguém acreditava que uma idosa poderia ter filhos, pois isso nunca havia acontecido por aqui.
Nasci em um dia em que o sol brilhou mais forte do que nunca. Eles me contavam que, no dia do meu nascimento, o céu estava excepcionalmente claro, e o sol parecia estar celebrando minha chegada ao mundo. Cresci, hoje tenho 17 anos de vida e fui cercada de amor e carinho, me sentindo especial e protegida. No entanto, dentro de mim, sempre havia uma curiosidade latente, um desejo de entender mais sobre o mundo além do nosso.

O Mundo do Sol é um lugar de paisagens deslumbrantes e natureza exuberante. A maioria das florestas são densas e verdes quase douradas, com árvores que parecem alcançar o céu, suas folhas refletindo a luz do sol como espelhos naturais. Os rios e lagos brilham como se fossem feitos de cristal líquido, e os animais que habitam no nosso mundo são igualmente vibrantes, exibindo cores intensas e movimentos graciosos. Vivemos em harmonia com essa natureza radiante, mas sempre com um olho cauteloso voltado para o horizonte, onde o sol encontra a lua.

Enquanto crescia, sempre me perguntei sobre o Mundo da Lua. Como seria viver em um lugar onde a luz era suave e prateada, em vez de intensa e dourada? Será que a luz lá era mesmo suave? Será que faz frio? O que os habitantes de lá pensavam de nós? Seriam realmente tão perigosos e traiçoeiros quanto nossas histórias diziam? Essas perguntas me inquietavam... Eu tinha uma curiosidade imensa sobre eles.

[...]

Escola central da aldeia dourada - Mundo do Sol - 09:36h

Acordar cedo para ir à escola era um prazer pra mim. Minha turma era dos maiores entre 16 a 18 anos, gostava muito daqui, pois era onde eu descobria mais sobre nossos mundos.
Sentada em minha carteira de madeira, ao meu lado estava Cloe e Yevi, meus dois colegas mais próximos. Cloe era uma menina muito fofa e gentil, um pouco mais alta do que eu, seus cabelos eram curtos e bem cacheadinhos, onde o seu tom de loiro era ainda mais brilhante.
E o Yevi era um rapaz alto assim como a maior parte dos meninos e os homens do nosso mundo, forte, aparência simpática e engraçado, ele sempre alegrava nossos momentos, seu cabelo era um liso bem curtinho. Muitas das meninas aqui vivem atrás de sua atenção.

A sala estava cheia, como todos os dias, todos ansiosos para ouvir a lição do dia. Nosso professor, o Senhor Theros, estava de pé no centro da sala, pronto para nos contar uma das histórias mais antigas e enigmáticas do Mundo do Sol.

Theros era um homem de grande sabedoria, com longos cabelos cacheados brancos com uns fios do loiro dourado, tinha uma barba que quase tocava seu peito. Sua voz era grave e penetrante, capaz de transformar qualquer lição em uma narrativa cativante. Hoje, ele prometeu nos contar a história do Fogo e da Água, uma lenda sobre esses elementos que muitos acreditavam ser fundamental para entender a relação entre o Mundo do Sol e o Mundo da Lua.

— Hoje, jovens, vamos falar sobre os acontecimentos que envolveram os elementos do Fogo e da Água, como eu havia prometido! — anunciou Theros, sua voz ecoando pela sala — Esses elementos, que parecem tão distintos, têm uma conexão profunda que moldou a história dos nossos mundos.

Eu me inclinei para a frente, ansiosa para ouvir mais. Sentia a tensão e a curiosidade no ar, assim como o calor familiar do sol que banhava a sala.

— Há mais ou menos 500 atrás... os habitantes do Mundo do Sol e do Mundo da Lua viviam em harmonia na dimensão perdida no universo, disso vocês já sabem... Mas o que talvez poucos saibam, era que eles compartilhavam conhecimento, cultura e recursos. E usavam o poder do fogo e da água para prosperar. O fogo era visto como uma força de criação, enquanto a água era vista como uma força de cura. esses elementos juntamente com os outros, mantinham o equilíbrio da nossa dimensão.

Theros fez uma pausa, deixando que suas palavras reverberassem em nossas mentes. Eu queria entender como esses elementos podiam ser tão poderosos e ao mesmo tempo tão perigosos.

— Um dia — continuou Theros — um evento catastrófico ocorreu. O fogo, que deveria ser uma fonte de calor e luz, descontrolou-se e causou uma destruição imensa. As chamas devastaram aldeias inteiras atingindo a maior parte dos habitantes, tanto no Mundo do Sol quanto no Mundo da Lua. Em resposta, a água, que deveria ser uma fonte de vida, transformou-se em uma força avassaladora, inundando terras e destruindo o que restava. Depois, os outros elementos da natureza também se descontrolaram... causando o caos às duas dimensões. Infelizmente houve muita destruição e mortes.

A maioria dos alunos estavam espantados com a história, eu havia lido sobre isso em um dos livros antigos da biblioteca central, mas ouvir alguém narrando ela era como se fosse algo totalmente novo!

O Yevi levantou a sua mão.

— Professor Theros, como o fogo atingiu o mundo do sol se temos resistência ao calor e ao fogo?

— Segundo as teorias, meu jovem, os nossos ancestrais só receberam essa resistência que temos hoje, anos depois desse tormento. No tempo da guerra entre o mundo do Sol e o mundo da Lua, éramos frágeis criaturas... mas hoje somos fortes! Após nossos ancestrais adquirirem a essência do sol, passando para as gerações futuras. — Concluiu Theros.

— Ah... professor! — Falei levantando minha mão em seguida — Significa que o fogo e a água não podem coexistir? Que estamos destinados a viver com medo desses elementos?

Theros me olhou com seus olhos penetrantes, mas havia uma suavidade neles.

— Veja bem, a história do fogo e da água nos ensina sobre o poder da natureza e o perigo de perdermos o equilíbrio. Esses elementos são fundamentais para a vida, mas também podem trazer destruição se não forem respeitados. O medo pode ser superado com conhecimento e coragem. É possível encontrar um equilíbrio, mas isso exige sabedoria e cooperação. Talvez.... um dia, ou um futuro próximo, alguém prove que os dois mundos podem se unir novamente, sem medo da destruição e da guerra. — As últimas frases ele falou quase sussurrando.

— O Senhor acredita que isso pode acontecer? — Perguntei ansiosa pela resposta.

— Eu acredito que não posso perder a esperança, Eleodora. — Disse ele diminuindo o tom de voz, dando um pequeno sorriso em seguida.

Suas palavras ficaram gravadas em minha mente. Eu queria ser essa pessoa, queria descobrir a verdade por trás das lendas e talvez, quem sabe, unir os dois mundos! É um desejo do meu coração desde que conheci a história sobre nossos mundos.

[...]

Após a escola, eu sempre gostava de compartilhar o que aprendi com meus pais. Eles adoravam me ouvir, e essas conversas muitas vezes nos aproximavam ainda mais. Naquela noite, estávamos na cozinha, tomando um chá de frutas vermelhas bem quentinho, acompanhado de uma torta de maçã feita pelo meu pai. A combinação da massa levemente salgada com a geleia de maçã era simplesmente perfeita para mim.

Meus pais tinham a mesma idade, quase oitenta anos, eram os idosos mais generosos que eu conhecia. Eu havia herdado as suas estaturas, era bem baixinha de tamanho, meus cabelos eram ondulados como os da mamãe e os meus olhos eram semelhantes aos olhos cor de âmbar do meu pai.
Eles eram o meu lar.

Enquanto cortava um pedaço generoso de torta, meu pai, com um olhar pensativo, continuou a falar sobre o assunto do dia.

— Penso que pode haver guerra de novo se tentarem unir novamente nossos mundos... — Comentou ele, sua voz carregada de preocupação.

Eu parei por um momento, pensando nas palavras de Theros sobre o fogo e a água, e sobre o medo que governava nossos mundos.

— Mas a guerra não é algo que lutamos por um motivo valioso, pela vida? — Eu questionei, tentando entender a complexidade dessa ideia.

Meu pai suspirou, mexendo o chá em sua xícara.

— Na maioria das vezes, sim... Em partes. — Ele respondeu, seus olhos encontrando os meus com uma seriedade que eu raramente via. — As guerras podem começar por motivos nobres, como a defesa de nossas vidas e nossa liberdade. Mas também podem ser motivadas pelo medo, pela ignorância e pelo desejo de poder.

Minha mãe, que estava sentada ao meu lado, me deu um sorriso encorajador e acrescentou:
— O importante é lembrar que, mesmo em tempos de conflito, devemos buscar a paz e a compreensão. A história que seu professor contou hoje é um lembrete de que o equilíbrio e a união são possíveis, mas exigem esforço e coragem.

Peguei um pedaço de torta, saboreando a combinação deliciosa de sabores enquanto refletia sobre suas palavras. Então arrisquei a pergunta:

— Vocês acham que um dia poderemos realmente nos unir ao Mundo da Lua de novo? — Perguntei, a esperança e a curiosidade era evidente na minha voz.

Meu pai colocou sua mão sobre a minha, seu toque quente e reconfortante — Se houver pessoas corajosas e determinadas, como você, Eleodora, acredito que sim. — Ele disse com um sorriso. — A chave está em não deixar o medo ditar nossas ações, mas sim a busca por conhecimento e entendimento.

Terminamos nosso chá e torta de maçã, compartilhando histórias e risadas, deixando que a noite se transformasse em uma memória calorosa. E, em meu coração, a chama da determinação ardia mais brilhante do que nunca.