POV Jesse

Estamos deitados na cama de Rachel, nossos corpos em direções opostas, nossas cabeças se tocando enquanto olhamos pro teto. Descobrimos que esta é a forma mais segura de reduzirmos o contato físico e garantir que não acabaremos fazendo nada que combinamos de não fazer. Vamos manter o nosso acordo, ela precisa pensar e descobrir o que sente de verdade.

Mais 3 semanas. Eu posso esperar por ela.

Rachel faz carinho no meu cabelo, e eu fecho os olhos, aproveitando o momento.

"Nosso dia foi perfeito, Jess." - ela diz, ainda acariciando meu cabelo.

"É, foi sim." - respondo - "E olha que eu fui demitido hoje."

"Demitido?" - ela levanta da cama, e me encara - "Por quê?".

"Nada demais. A Sra. Apple vai vender a loja e se mudar pro interior, só isso. Ela disse que vai me recomendar pro próximo dono, mas que eles devem usar o ponto pra fazer alguma outra coisa. Mas quem sabe não me contratam, né." - digo, mas não estou muito preocupado. Tenho boas notas e referências, logo devo conseguir alguma outra coisa. O emprego era ótimo, mas acontece. Guardei quase tudo que ganhei nos últimos anos para me bancar quando for pra Universidade da Califórnia no ano que vem, e devo conseguir o que falta trabalhando como garçom ou algo do tipo quando me mudar pra lá.

Rachel sabe de todos os meus planos, assim como sabe de tudo sobre a minha vida. Vendo que estou verdadeiramente tranquilo, ela se deita novamente na mesma posição, nossas cabeças se tocando, e volta a fazer carinho no meu cabelo.

"Você podia parar de trabalhar, sabia." - diz.

"É, devo largar quando estiver mais perto das provas finais mesmo, não posso dar bobeira agora." - estou concorrendo a uma bolsa de estudos parcial, mas preciso manter minhas notas impecáveis pra conseguir. Sem essa bolsa, não tenho a menor condição de bancar essa faculdade.

"Não, eu me refiro a agora, sabe? É o seu último ano no colégio, e você trabalha desde o primeiro ano. Não tem nada que você queira fazer no colégio? Nenhum clube que queira participar?" - Rachel me pergunta. Penso um pouco sobre o assunto.

"Acho que não, na verdade." - Acho que o McKinley não oferece nada que me atraia.

"Você poderia reativar o clube de dança." - ela me diz. Faz anos que o clube de dança do colégio foi desativado, não temos nenhum professor que queira assumir, e também não há muitos alunos interessados.

"Eu sou só um aluno, Rach." - digo.

"É, mas é um veterano, super responsável, já foi monitor… está na hora de começar a usar as vantagens de ser o filho do professor mais querido do colégio, Jess." - ela diz, e eu dou uma risada leve. Ela se senta na cama, e me encara - "Estou falando sério. Você ama dançar, Jesse, dava pra ver isso nos vídeos que a Emma me mandava, das suas apresentações. Está na hora de começar a fazer algo que você gosta, por você mesmo." - ela me diz, com um brilho no olhar de quem entende a conexão que a arte pode ter. Eu sou extremamente tímido, passo a maior parte do tempo quieto e evitando encarar as pessoas, mas quando estou no palco me apresentando, ou mesmo praticando alguma coreografia, me sinto verdadeiramente livre, conectado comigo mesmo. Rachel entende tudo isso, porque é essa a conexão que ela tem com o teatro e com a música. Não sou muito de admitir, mas é mais uma das nossas semelhanças: compartilhamos uma paixão pelas artes.

Reflito sobre tudo o que ela disse, ainda encarando o teto.

"É, acho que você pode ter razão." - digo, por fim.

Passamos mais alguns minutos em silêncio, apenas curtindo a companhia um do outro, quando percebo que já está ficando tarde.

"Acho que essa é a minha deixa pra ir embora." - digo, me levantando. Ela me segura pelas mãos.

"Ir embora? Pensei que fosse dormir aqui." - ela diz, seus olhos me pedindo pra ficar, seus lábios se contorcendo num biquinho de reclamação.

"Nope." - digo - "Não confio em nenhum de nós dois sozinhos aqui com tudo isso que compramos hoje."

"Sim, compramos muitos pães. Deveríamos ter comprado menos pães." - ela diz, mordendo os lábios e brincando comigo.

"Sim sim, compramos muitos pães que vão ficar guardadinhos comigo até o futuro, Rachel Berry." - digo, e ela continua segurando a minha mão.

"Estatisticamente falando, nós nunca fizemos nada no meu quarto, então os riscos são menores do que se estivéssemos no seu." - ela diz, um sorrisinho escapando dos seus lábios.

"Ah sim, faz muito sentido. Estatisticamente falando." - digo, me inclinando sobre ela na cama. Se ela quer brincar de me provocar, esse é um jogo que eu também posso jogar.

"O que eu faço, hein? Não consigo mais ficar sem você." - ela diz.

"Quase soa como uma declaração." - digo, com um misto de provocação e de uma vontade genuína de que ela me diga que sente por mim o mesmo que sinto por ela.

"E se eu te disser 'não', hein? Daqui a 3 semanas?"

"Bom, nesse caso acho que vou ter que gastar todos aqueles pães com a Santana Lopez." - digo. E ela taca um travesseiro na minha cabeça com toda a força que tem.

"Aí." - digo, me sentando na cama. Rachel é, obviamente, bastante ciumenta. A "não-namorada" mais ciumenta que eu já tive.

"Mas, falando sério…" - o tom de voz dela fica sério, de repente - "E se eu pensar bastante e… e achar melhor a gente não ficar juntos? Você não vai se afastar de mim do nada, né?" - me pergunta, e eu sou perfurado por milhares de pequenas agulhas. Porque apesar de ser um cenário possível quando alguém te pede um tempo pra pensar, eu não estou preparado pra ouvir um não, principalmente com toda essa conexão que sinto entre nós. Me pergunto se não estou confundindo as coisas, se essa conexão não passa da amizade que sempre tivemos somada com a atração física que obviamente sentimos um pelo outro.

"Bom…" - digo, e seguro sua mão - "acho que seremos só amigos de novo, né? Esquecemos tudo o que passou, e seguimos em frente."

Um silêncio paira entre nós.

"Você vai embora no final do ano…" - ela sussurra, e está encarando os próprios pés enquanto os balança.

"É disso que você tem medo, Rach? É por isso que você quer pensar?" - pergunto. Não estou tentando pressioná-la, mas quando a garota que você ama também é a sua melhor amiga, acho que as linhas e os limites acabam se misturando. Quero entender o que a aflige.

"Também. Quer dizer, você vai ser um cara da faculdade cercado de várias pessoas interessantes da Califórnia. Eu vou continuar sendo a garota insignificante do ensino médio por mais um ano, e depois vou pra Nova Iorque… será que os nossos caminhos ainda vão se cruzar?"

Eu respiro fundo, e a olho nos olhos.

"Eu não tiro a sua razão, sabe? Acho que… é muita coisa pra pensar, e eu vou respeitar o tempo que você quiser." - eu beijo sua mão - "Mas quero que saiba que eu amo você da forma mais pura que já amei alguém em toda a minha vida. E tudo que eu quero agora é poder gritar pro mundo inteiro o quanto eu amo você. E quanto ao futuro, bem, vamos dar um jeito, se você quiser. Você ficou 5 anos no Canadá. A faculdade são só 4, e vamos estar no mesmo país!"

"E minha mãe tem muitas milhas. Que ela certamente vai me deixar usar pra atravessar o país e ir dormir com você." - ela diz.

"Olha só que incrível!" - brinco com ela. Ela balança a cabeça, e dá um sorrisinho tímido.

Sei que as coisas estão confusas por agora, mas que vão se acertar em breve. Vamos conseguir passar por tudo isso, preciso continuar acreditando.

Me despeço dela com um beijo e vou pra casa, o coração batendo descompassadamente no peito.

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Pov Kurt

Estou sentado na mesa da cafeteria do shopping, com Blaine me olhando nos olhos enquanto nosso copo de café esfria. Ele me olha com a cara mais desconfortável que já o vi ter. Ao lado dele, Sam, com a cara emburrada e um fone de ouvido gigantesco no ouvido.

Blaine veio me chamar para tomar um café após o ensaio do Glee Club. E Sam insistiu em vir junto. Ele está usando fones de ouvido “para não ouvir a nossa conversa”, palavras dele mesmo.

Blaine olha de lado para Sam e para mim.

“Isso é mesmo necessário?” - Ele pergunta, apontando para Sam.

“Yeap.” - Sam responde, sem erguer a cabeça do celular, e balançando a cabeça ao som da música - “Você ainda tá na minha mira.”

“Pensei que não fosse ouvir a nossa conversa.” - Blaine diz. Sam continua balançando a cabeça, e o ignora completamente. Blaine rola os olhos.

“Bom, lembra quando você me perguntou se eu tinha algum amigo gay? Pois bem, não tenho. E quero conversar sobre isso.” - Blaine diz, tomando um gole do seu café. Acho a atitude protetora de Sam muito fofa, mas entendo que esta é uma conversa que Blaine talvez não se sinta à vontade para ter ao lado dele. Eu me comunico com Sam através do olhar, e ele entende rapidamente.

“Bom, eu vou ali comprar um hambúrguer naquela fila bem demorada e imensa. Mas estou de olho em você.” - ele faz o gesto com os dedos nos olhos, e aponta para Blaine enquanto sai da mesa colocando o capuz na cabeça.

“Eu tenho uma reputação horrível.” - Blaine diz.

“Tem.” - confirmo, bebendo o meu café.

“Espero conseguir mudar isso um dia.” - Ele mexe seu café com a colher - “Eu nem sei como foi que eu me tornei essa pessoa.”

Não tenho o que responder. Espero de verdade que Blaine se torne uma pessoa melhor, com o tempo.

“Olha… Eu nunca tive a oportunidade de conversar sobre essas coisas com ninguém, então…”

“Eu sou virgem, Blaine. Não sei de muita coisa, também.” - Digo, antes que o momento se torne constrangedor. Não sei o que Blaine pensa sobre mim, mas sou só um garoto comum e inexperiente, prestes a completar 17 anos.

“Não, não é sobre isso que eu quero falar, não se preocupe.” - Ele diz - “Eu só queria saber… como é que você… soube? Que você era… gay.” - ele praticamente sussurra a última palavra.

“Não sei dizer, sabe? Eu só sempre soube. Eu comecei a me interessar por pessoas bem tarde em comparação com meus amigos, e essas pessoas sempre foram meninos. Então eu sempre soube e fim. Quando eu contei pro meu pai, ele já sabia, também.” - conto a ele um pouco da minha experiência.

“Bom, eu acho que soube meio tarde, também. Eu comecei a perceber que, quando eu via algumas coisas na internet… eu não estava prestando atenção exatamente no que eu deveria prestar atenção…” - Ele fala, ainda girando a colher no copo de café, e sem me encarar - “Ai eu comecei a procurar mais coisas… Desculpe, papo estranho, né?” - ele dá uma risada tímida.

“Acho que é normal. Só não é o meu estilo. Mas muita gente curte.” - digo, um pouco envergonhado.

“É.” - ele diz.

“Posso te fazer uma pergunta?” - digo, tentando desviar o assunto.

“Uhum.” - Ele murmura, bebendo o café.

“E a Brittany? Vocês estão meio que juntos, não?”

“Não. Quer dizer, ela é uma das minhas melhores amigas desde sempre. A Britt é muito livre e segura, então já, a gente já ficou umas vezes, mas… bom, obviamente ela não é o meu tipo, né.” - ele dá uma risadinha tímida.

“E como é a sua família, Blaine? Você acha que eles não te aceitariam?” - pergunto. Estou gostando desse nosso momento de conversas sinceras.

“Olha, pra falar a verdade eu não sei.” - Blaine faz uma pausa, e respira fundo - “O meu pai morreu quando eu tinha 12 anos, e meu irmão 16. O sonho dele era que eu seguisse os passos do meu irmão no futebol, sabe? Quando ele se foi, meu irmão meio que reproduziu isso comigo. Mas eu não sou muito parecido com ele, o que acho que é uma grande decepção pra ele. Meu irmão, o popular do colégio, o que ganhou bolsa pra Yale pelo futebol, é o cara mais galinha que eu conheço desde que tinha, sei lá, uns 14 anos. Eu achei que tinha que ser igual a ele também, e que tinha alguma coisa errada comigo se não fosse. Mas ai eu acabei virando só o ‘idiota do futebol’, mesmo. E eu nem sou tão bom assim no futebol.”

Ele toma um gole do café, e eu deixo que continue falando.

“Minha mãe trabalha a beça pra manter o padrão de vida que o nosso pai nos deixou. E é isso. Eu a amo muito, e sei que ela me ama também, mas, sei lá, nem sei se ela sabe que eu larguei o futebol. Não sobra muito tempo pra gente conversar.”

Nunca imaginei que Blaine tivesse todos esses sentimentos guardados dentro de si. Eu sempre o vi como o “idiota do futebol”, e nada além disso. Num impulso que nem eu mesmo consigo controlar ou explicar, eu seguro sua mão por cima da mesa, e lhe dou um sorriso.

“Vai ficar tudo bem, Blaine.” - digo. Ele me olha, e sorri.

“Vai sim.” - diz, balançando a cabeça. Acho que, nesse momento, ele também acredita nisso.

Só percebo que ainda estou segurando a mão de Blaine quando Sam chega mastigando a metade que resta do seu hambúrguer. Solto a mão de Blaine o mais rápido que consigo, e ele parece perceber.

“Bom, já deu, né. Já conversamos, já tomamos café…” - Sam fala, com a boca cheia - “Vamos jogar alguma coisa, ver um filme ou o que?”.

“Acho que é melhor eu ir pra casa.” - Blaine diz, se levantando da mesa bem quando Sam senta. Sam dá de ombros, e segue mastigando o que resta do hambúrguer. Blaine e eu nos despedimos, e ele se vira para ir embora. E então, se vira novamente na minha direção.

“Kurt… estava pensando… boliche no sábado? O que acha?” - ele diz, e eu vejo um brilho em seu olhar que não gostaria de ver. Blaine tem se mostrado um cara legal, mas não quero que ele confunda as coisas. Me ofereci para que fossemos amigos, nada mais que isso. Não é porque somos ambos gays que precisamos obrigatoriamente ter alguma coisa.

Não tenho coragem de simplesmente negar o convite. Então improviso.

“Claro… você também pode, não é, Sam?” - cutuco Sam, que olha na minha direção.

“Claro. Vamos chamar o pessoal todo.” - ele diz, engolindo o último pedaço.

“Ótimo! Mandamos mensagem pra combinar.” - digo, e dou um tchauzinho para Blaine, que balança a cabeça E se afasta de nós sem dizer mais nada.

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É sábado, e praticamente todo o pessoal do Glee Club veio pro boliche. Sam chamou o nosso pessoal, e cada um foi chamando o outro, até que acabamos todos aqui.

No sofá de frente para o meu estão sentados Tina, Mercedes, Finn e Blaine, a cadeira de Artie estacionada perto deles. Quinn está sentada numa cadeira, Puck sentado no chão próximo aos pés dela. Sam e Rachel estão sentados cada um de um lado meu, com Jesse ao lado de Rachel, os dois com os dedos entrelaçados em cima da coxa dele.

Todos estamos terminando de comer as pizzas que estamos rachando, apesar de Quinn mal tocar na comida, e Finn estar mais preocupado em prestar atenção a cada movimento de Jesse e Rachel, que parecem alheios aos olhares dele.

E Rachel encara Blaine sem o menor pudor.

"Estou confusa. O que ele faz aqui?" - ela diz, sem deixar de encará-lo. Apesar de indiretamente estarmos todos aqui por causa dele, Blaine foi o último a chegar, achei que nem viesse mais.

"Blaine pediu desculpas a mim e ao Sam." - digo, enquanto Blaine nos olha com uma cara envergonhada - "Ele está disposto a se tornar uma pessoa melhor, e estamos tentando ser amigos agora." - digo, me comunicando telepaticamente com Sam para que me ajude nessa.

"Ainda estou decidindo." - Sam diz, quando Rachel o encara.

"Eu preciso mesmo me desculpar com todos vocês, pela forma como eu os tratei durante esses anos." - Blaine diz, se levantando. Todos o observam com um misto de curiosidade, choque e incapacidade de dizer algo. Ele se senta novamente, e um silêncio mortal paira no ar.

"Bom, eu sou um novo homem agora, sou pai, mas não esperem que eu comece a pedir desculpas pra vocês por tudo o que eu fiz, porque eu só conseguiria terminar no dia do parto da Beth!" - Puck diz, e nós acabamos rindo.

"Então, vamos jogar ou não vamos?" - Artie diz, e todos concordamos que já podemos começar. Alugamos a pista por 1 hora, e Jesse se levanta para configurar os nossos nomes no painel eletrônico.

"Porque não fazemos um torneio? Meninas contra meninos?" - Tina diz.

"Não dá, estamos em menor número." - Mercedes comenta.

"Vamos tirar times, então." - Tina sugere, e nós concordamos.

"Certo, quem lidera?" - Sam pergunta, e ficamos todos quietos. É surpreendente que Rachel, competitiva como é, não tenha se oferecido para liderar um time. Ela parece mais concentrada em acompanhar Jesse com o olhar, enquanto ele continua colocando nossos nomes no painel.

"Vão os mais velhos, então." - sugiro - "Jesse e Puck, pode ser?"

"Opa! O atual versus o ex, vambora!" - Puck diz, se levantando do chão, mas apesar da provocação, Jesse, Quinn e ele estão dando risada. Eles parecem realmente lidar muito bem com toda essa história que há entre os três.

"Não." - Finn diz, se levantando de repente. - "Jesse e eu lideramos os times. O que acha, Jesse?" - ele pergunta, encarando Jesse nos olhos.

Rachel engasga com o refrigerante que estava terminando de tomar. E Jesse e Finn estão automaticamente ajoelhados ao redor dela, Finn dando tapinhas em suas costas, Jesse segurando suas mãos, ambos perguntando repetidamente se ela está bem, enquanto ela tosse e balança a cabeça em afirmação.

Rachel se recupera, Finn e Jesse se levantam e se encaram outra vez.

"Tá bem…" - Puck diz, e volta a se sentar no chão ao lado de Quinn.

"Certo, tirem par ou ímpar pra ver quem começa." - Tina diz. Finn escolhe par antes que Jesse tenha tempo de dizer qualquer coisa.

"Já!" - dizemos, e eles mostram as mãos, cada um com exatos 4 dedos expostos.

"Vitória do time Glee!" - Mercedes brinca, mas Finn continua encarando Jesse sem desviar o olhar.

"Rachel." - ele diz, já a escolhendo pro seu time. Rachel olha para Jesse com uma cara de quem não sabe o que fazer, mas se levanta e vai para perto de Finn.

"Quinn." - Jesse diz.

"Obrigada, garotão, mas você já viu o peso dessa bola?" - Ela diz, passando a mão na barriga, que já está bem aparente por baixo de sua blusa - "Noah vai no meu lugar, mas vou torcer por vocês." - ela ergue os braços como se estivesse repetindo uma coreografia das Cheerios, e Puck vai para perto de Jesse.

Os times acabam divididos da seguinte forma: no time de Finn, temos Rachel, Sam, Blaine e eu, enquanto o time de Jesse tem Puck, Artie, Tina, Mercedes e a torcida de Quinn Fabray.

O jogo fica equilibrado na maior parte do tempo. Nenhum de nós faz ideia do que está fazendo, e na maioria das vezes a bola vai pro lado errado ou derruba poucos pinos. Quando nós descobrimos que dá pra levantar a canaleta e impedir que a bola simplesmente caia pra fora da pista, alguns de nós começam a fazer pontos. Ambos os capitães dos times, Jesse e Finn, são extremamente descoordenados, cabe ressaltar. Os melhores jogadores são Sam, Puck e Blaine, que parece realmente saber o que está fazendo. Faz sentido, já que foi ele quem teve a ideia de jogar boliche, pra começo de conversa.

Inesperadamente, Jesse tem uma sorte gigantesca e faz um strike. E Rachel, que está no time oposto, o olha como se ele fosse o maior jogador que a NBA já viu, e se pendura no pescoço dele. Os dois estão rindo e comemorando juntos, quando o painel eletrônico nos indica que nosso tempo está perto de acabar.

“Vamos lá, últimas jogadas.” - Sam diz, pegando uma das bolas e a jogando pro lado errado mais uma vez.

“Poxa, estava tão divertido!” - Tina reclama, se sentando num dos sofás.

“E nem estamos perto de completar o número de rodadas da partida.” - Mercedes comenta. Nós passamos a maioria do tempo dando risada uns dos outros e tentando desconcentrar o time adversário ao invés de nos concentrarmos em seguir o número de partidas proposto pelo painel.

“Vamos colocar mais uma hora?” - Artie sugere.

“Não vai dar, pessoal. Temos uma bebê a caminho, já passamos do limite hoje.” - Puck diz, enquanto Quinn balança a cabeça confirmando.

“É, eu também tô meio quebrado.” - Sam diz.

“Eu pago pra todo mundo.” - Blaine fala, de repente. Todos olhamos pra ele. - “Quer dizer, se vocês não se importarem. Tá… tão legal aqui…” - ele vai parando de falar enquanto continuamos o encarando. Blaine é obviamente o mais rico de todos nós, mas não esperávamos isso dele.

“Não vai ficar pesado pra você sozinho?” - Pergunto.

“Eu divido com ele.” - Jesse diz - “Eu ganhei uma graninha com a minha demissão, mesmo.” - Ele olha de relance para Quinn, e eu imagino que ele esteja fazendo isso para que ela não sinta vergonha de aceitar a gentileza de Blaine. Rachel me disse que foi ele quem insistiu para que ela viesse e se divertisse um pouco, já que Quinn tem basicamente apenas estudado e trabalhado desde que descobriu a gravidez.

“Poxa, meninos, que legal da parte de vocês. Obrigada!” - Mercedes diz, e todos nós agradecemos. Blaine parece realmente feliz de estar se sentindo útil, mas eu espero que ele entenda que nenhum de nós quer o dinheiro dele, o que queremos é que ele seja uma pessoa melhor e se sinta verdadeiramente livre.

Jesse e Blaine vão até o caixa pagar pela hora adicional da pista, enquanto nós aproveitamos os minutos que restam e continuamos jogando.

Pov Rachel

Sento em um dos sofás para descansar um pouco, enquanto observo de longe Blaine e Jesse conversando na fila do caixa. Ainda não entendi essa de “Blaine quer ser uma pessoa melhor”, e Kurt vai precisar me explicar essa história direitinho depois. Como assim o Sam parece saber de alguma coisa que eu não sei?

Estou distraída pensando nisso quando Finn se senta ao meu lado no sofá.

“Rachel, eu queria conversar com você.” - ele diz, pegando a minha mão - “Não queria que fosse aqui, mas você não tem respondido às minhas mensagens e parece que tá fugindo de mim no colégio.”

Finn. O momento que eu tenho evitado finalmente chegou, e eu não posso simplesmente fugir dele aqui, com nossos amigos por perto, nos observando. Eu poderia dar uma desculpa e ir ao banheiro ou algo do tipo, mas a verdade é que preciso mesmo esclarecer as coisas com Finn. Nós mal nos falamos desde que terminamos, e apesar de eu não fazer mais a menor ideia do que sentia por ele antes, ele é um garoto muito especial e não merece sofrer por minha causa. Não vou fingir que não percebi a forma como ele continua me olhando, tudo entre nós começou e acabou rápido demais, e eu não queria que tivesse sido assim, não planejei nada disso. Mas, mesmo com ele sentado na minha frente, não consigo parar de pensar em Jesse, que só está longe de mim a uns 5 minutos, mas já parece me fazer tanta falta.

“Finn…” - digo, tentando falar o mais baixo que consigo -”realmente não é o melhor lugar pra conversarmos, mas você merece sim uma explicação.” - tento afastar minha mão da dele, mas ele continua a segurando delicadamente, e não tenho coragem de puxá-la com agressividade.

“Rachel… eu não sou bom com palavras, mas eu só quero que você saiba que eu não me importo com o que aconteceu, quer dizer, com o que não aconteceu, não precisa acontecer, me desculpe se te assustei… Quis te dar espaço pra você pensar, mas você tá me evitando e eu sinto sua falta, eu não vou te pressionar a nada, eu juro. A gente pode só namorar, sem cobrança nenhuma...” - ele me fala com tanta sinceridade, e eu me sinto uma pessoa horrível pela forma como tudo aconteceu. Eu nem sequer expliquei nada pra ele, eu gostei dele por tanto tempo, e simplesmente fui embora quando o sentimento acabou. Será que houve mesmo um sentimento? Ou era a manifestação de um sonho que a Rachel criança manteve guardado quando se mudou pro Canadá? Eu realmente me sentia muito feliz com Finn. Mas… Jesse.

Só agora eu sei disso. Sempre foi ele.

“Você não sente mais nada por mim?” - Finn me olha com tristeza.

“Finn, eu…” - estou tentando formular as palavras porque não o quero magoar, não tenho esse direito, quando ele se inclina na minha direção e pressiona seus lábios nos meus. Por alguns segundos, tudo o que eu consigo fazer é manter meus olhos abertos, meus lábios cerrados, os lábios dele nos meus enquanto ele fecha os olhos e eu continuo ali, parada, sem conseguir fazer nada.

Finn se afasta de mim, e é como se um zumbido silencioso estalasse nos meus ouvidos. O planeta parece parar de girar por alguns segundos e eu fico parada ali, sem falar nada, sem sentir nada. Tudo o que eu senti por Finn um dia se foi, e só restou o vazio.

Me viro para o lado, e meus amigos estão todos nos encarando, em silêncio. Apenas Quinn não nos observa, ela olha fixo para a direção oposta, seu rosto parece preocupado. Eu sigo o seu olhar com o meu, e viro a cabeça.

Jesse. Ele está parado bem próximo do sofá onde Finn e eu estamos, com Blaine ao lado dele, segurando o cartão que libera o tempo adicional na pista. Ele me olha, e está pálido, quieto, e completamente imóvel.

“Jesse.” - o nome dele sai estrangulado da minha garganta, enquanto eu continuo parada no mesmo lugar, sem conseguir me mover.

“Kurt…” - ele diz, sem tirar os olhos de mim - “Você poderia levar Rachel em casa pra mim? Eu preciso ir embora agora.” - ele diz. Não sei o que Kurt responde, porque meus olhos continuam vidrados nos de Jesse, que observam os meus. Ele me olha mais uma vez, seu rosto se fecha, ele se vira e sai, se afastando de mim.

E um buraco gigantesco se forma na minha garganta e no meu peito, como se o planeta estivesse prestes a me engolir.