After Ever After-Interativa

Chapter XXXIII - Parques, Sorvetes e Música


Henry Malik Smith

Eu passei a noite na casa de Finn naquela sexta. Nós ficamos jogando videogame até mais ou menos três da manhã, quando algumas batidas fortes soaram na parede que dava para o quarto de Azaleh, e Finn falou que era melhor irmos dormir logo. Havia um colchão no chão, com cobertas, lençóis e um travesseiro macio, ao lado da cama de madeira maciça, e eu fiquei mais do que feliz em me acomodar naquele monte de panos.

Na manhã seguinte ambos dormimos até tarde, só acordando com a discussão da irmã de Finn e algum amigo no quarto ao lado, por volta das onze da manhã. Quando eu perguntei à Finn, ele disse que Azaleh havia mencionado um projeto de Física no qual James Bezerra ficara de lhe ajudar antes de os dois saírem com outros amigos. Dei de ombros, me espreguiçando de novo dentre os lençóis. Finn olhou para mim de onde estava na cama e riu:

— Você não vai levantar agora, vai?

— Só se você levantar. Eu sou a visita, se lembra? — Devolvi ainda deitado.

— Como se você aqui em casa fosse algum tipo de novidade — ele debochou.

— Ainda tenho de manter alguma etiqueta, ao menos na frente do seu pai.

— Por um segundo, quase achei que você ia incluir minha mãe nessa.

Eu ri secamente.

— Posso ser meio lerdo às vezes, mas acho que ninguém seria burro a esse ponto.

Ele riu e concordou, e acho que teríamos continuado dormindo não fosse, um minuto depois, batidas terem soado em sua porta.

— Finn! Malik! — Reconheci a voz de Alanna, a irmã mais nova. — Mamãe diz que, se não descerem agora, vão ter de arrumar seu próprio café!

— Já vamos! — Finn respondeu esfregando a cara para afugentar o sono, enquanto eu me punha de pé e colocava uma camiseta.

— Sabe Alanna, não tem problema nenhum em abrir a porta! — Eu disse, brincando com a ruiva que tinha essa mania de nunca entrar nos cômodos que eu e Finn estávamos fechados. Ela abriu a porta de supetão e sorriu para mim sarcasticamente.

— Olha Malik, ao contrário do Finn, eu não tenho necessidade nenhuma de ver você seminu, obrigada — ela ironizou, fazendo caras e bocas, o que me rendeu gargalhadas bem altas. — E pelo amor de Odin, por que vocês pararam de dormir com flanelas?

— Algum problema com os pijamas de cetim? — Finn brincou, já na porta do quarto.

— São como camisolas. Mostram bem mais do que eu preciso ver — Lanna disse, levantando as sobrancelhas e nos fazendo rir de novo antes de entrar em seu próprio quarto.

Segui Finn até o primeiro andar, onde a mesa do café ainda estava posta, embora quase tudo já houvesse sido devorado. Ele se sentou, e eu imitei-o, pegando a faca e partindo para mim uma fatia da rosca no centro da mesa. Ele, por outro lado, só se serviu de café e bolachas, encarando o nada enquanto comia.

— Ah! Aí estão vocês! — Exclamou uma voz, vinda da porta de entrada atrás de nós — Como dormem, adolescentes. Eu não conseguia passar nem oito horas na cama — disse Hiccup, enquanto se aproximava da mesa.

— Como se eles conseguissem — uma outra voz, vinda da sala ao lado, disse. Os cabelos ruivos de Merida apareceram pela porta. —Não seja ingênuo, Hic. Eles ficaram jogando videogame até no mínimo uma da manhã.

— Você realmente tem de trabalhar sua matemática, mãe. Onze menos um é dez, então nós ficamos sim mais de oito horas na cama — Finn brincou, engolindo sua bolacha enquanto seu pai ria.

— Que seja. O ponto é: da próxima vez, ou vocês dormem mais cedo ou tiram o som daquela maldita televisão — a ruiva disse pegando numa bolacha e indo de seguida para o quintal das traseiras. Hiccup, porém, se apoiou nas costas da cadeira ao lado de seu filho.

— O que pretendem fazer hoje?

Engoli antes de responder, o que me deu tempo para pensar. Tudo o que eu pretendia, na verdade, era passar o dia longe de casa. No final de semana, com os cinco membros da família Smith em casa, aquele lugar tendia a ser o inferno na Terra.

— A loja de instrumentos do shopping está com uma ótima promoção essa semana — disse eu então, até porque era verdade. Spencer tinha passado por lá enquanto fazia compras, e resolveu me contar. Olhei para Finn, que pareceu gostar da ideia, então continuei. — Pensamos em ir lá e talvez pegar alguma sessão de cinema depois.

Ele sorriu concordando, e então se virou para Finn; pedindo que ele comprasse mais material de desenho para ele ou qualquer coisa assim. Quando acabamos, tiramos a mesa e levamos tudo para a cozinha, guardando nos lugares apropriados. Depois de tanto tempo vindo à casa de Finn, eu quase sabia melhor do que ele onde cada coisa ficava.

Depois disso, voltamos para o quarto dela para nos vestirmos apropriadamente e eu juntei minhas coisas na mochila que havia trago, jogando no banco traseiro do carro dos irmãos Haddock. Como Azaleh havia saído com James e Alanna não dirigia (ainda), Finn tinha o carro todo para ele naquele sábado. Assim que entramos no carro e ele girou a chave na ignição, procurei pela capinha de CDs dele. A Rádio Encantia podia ser o suficiente para Spencer ou Tristan, mas não para mim. Além do mais, como a casa dos Haddock era fora da cidade, levaríamos algum tempo até o shopping.

— Cara — Comecei, enquanto fuçava o porta-luvas extremamente bagunçado. — Vocês têm de dar um jeito de manter isso arrumado. Não dá para achar nada aqui dentro.

— A culpa não é minha. Quem está no banco do passageiro é sempre Azaleh — ele apontou, e eu levantei uma de suas meias com um olhar acusador e uma risada cética. — Tá bem. Talvez eu também bagunce um pouco. Mas você não pode falar nada, eu achei uma embalagem de chips no chão do carro de Tristan da última vez que veio aqui.

— Não é minha culpa se eles comem no carro — dei de ombros.

— Malik. Era Doritos. Seus irmãos são alérgicos à Doritos.

— Onde deixou a capinha dos CDs? — Desconverso, o que faz com que ele ria — É sério. Eu preciso colocar alguma coisa. Não aguento ouvir a voz de Portia Wander por nem mais meio segundo.

— Eu não sei. Já olhou no porta-luvas?

— Você realmente não me viu basicamente revirando seu porta-luvas?

— Estou dirigindo. Não soe tão indignado.

— Finn. Foco. A capinha.

— Ah, hum, tente a porta. Tem um buraco, deve estar aí.

E realmente está, mas não na minha porta. O que obviamente me obriga a me esticar como uma mola por cima de meu amigo e bater a cabeça no volante para pegar. Era bom que tivesse algo bom naquela capinha. Felizmente tinha, e eu escolho um CD de um do melhores shows dos Queen. Finn balança a cabeça no ritmo das músicas enquanto canta e eu toco meu baixo imaginário, rindo alto.

— Daríamos uma boa banda, você sabe. Um duo. Como twenty one pilots — disse, no intervalo entre uma música e outra, citando um dos meus duos favoritos.

— Uhum, tá.

— Foi você que sempre falou de perseguir uma carreira na música.

— Você que sempre se recusa a comprar um baixo e perseguir essa carreira.

Touché — admito, e então tenho uma ideia. Pego minha carteira no bolso da minha bermuda, junto ao meu celular, e verifico o número do cartão de crédito. Meu pai e minha mãe não conseguiam concordar em quase nada, então quem controlava nosso dinheiro era papai. Ele dera um cartão de crédito para mim e um para Tristan, e tínhamos um limite mensal a gastar. Spencer, por outro lado, recebia em dinheiro, para que não se descontrolasse. Consultando as anotações que eu fazia no celular, pude confirmar o que eu havia pensado. Olho para meu amigo. — Finn.

— Malik.

— A Garage realmente está em queima de estoque, não é? — Pergunto, me referindo à loja de instrumentos do shopping. Ele faz uma cara estranha antes de responder.

— Até onde eu sei, sim. Por que a pergunta?

Sorrio.

— Quem sabe seja hora de começar a fazer música de verdade.

●●●

No final das contas, eu comprei um baixo. Preto, liso, e grande. Com quarenta por cento de desconto, me custara trezentos e setenta e oito majs(*). Eu e Finn rodamos o shopping depois disso, olhando os gibis e as próximas estreias no cinema – e finalmente comprando nossos ingressos para a primeira sessão de Batman versus Superman(**), que estrearia em breve. Ele me deixou em casa após almoçarmos, e encontrei Moony e Tristan saindo. A namorada de meu irmão me abraçou e segurou pelas bochechas enquanto me cumprimentava, mas Tristan parecia exausto. Ele fez uma cara estranha quando viu o baixo, e pediu para Moony que esperasse no carro, o que ela fez depois de uma careta de questionamento.

— Você sabe que eu não consigo arranjar um lugar para gente sozinho, né? — Meu irmão me falou sério, e só então eu entendi o que estava acontecendo. Tristan, Speedy e eu planejávamos nos mudar no final daquele ano, mas é claro que ele não pagaria sozinho. — Não acho que Speedy vá conseguir segurar muito dinheiro, embora ela esteja se controlando, mas você deveria pensar no seu futuro, Henry.

— E-eu — tentei dizer qualquer coisa, mas não consegui. Minha garganta estava fechada. Eu queria socar alguma coisa.

— Ei, ei — meu irmão me cutucou, e sorriu. — Não tem problema. Você merecia alguma coisa para si, e temos um ano inteiro ainda. Pelo menos gastou em um baixo, que você já queria faz séculos.

— Eu sei, mas —

— Olha, se você quiser, conversamos mais tarde. Moony pode ser um tanto impaciente às vezes — ele sorriu, e eu tentei sorrir de volta. — Ok, então. Devo voltar às seis.

Forcei um sorriso enquanto o meu irmão me despenteava o cabelo antes de sair andando até onde seu carro estava estacionado. Eu fiquei de pé ali, na soleira da porta, por algum tempo, encarando o nada e me sentindo mal. Teria sido melhor se Tristan tivesse gritado comigo e não mantido o seu permanente estado de irmão compreensivo. Pelo menos eu estaria estressado de verdade, não dividido entre sentir-me desiludido ou com raiva de mim próprio.

Pisquei e sacudi minha cabeça. Se eu queria realmente sair daquele lugar, tinha de tomar alguma atitude. Entrei em casa, decidido a resolver a situação – mesmo tendo plena consciência de que estava agindo pelo impulso. Mas bem, não era como se minha irmã tivesse alguma coisa a ver com isso. Eu podia muito bem ter meus momentos. E aquele definitivamente era um deles.

Amir Nahan Ali

Paro em frente à casa de James e pressiono a buzina de leve duas vezes, para chamá-lo. Eu já havia feito isso tantas vezes nos últimos dois anos que todos os Bezerra sabiam quando era eu à porta. Uriah colocou a cabeça para fora da janela e acenou, gesto que eu retribuí, segundos antes de James abrir a porta para que ele e Azaleh pudessem sair. Eu havia pedido à ela que esperasse junto com ele, para não ter de pegar a rodovia e ir até a casa dos Haddock, o que tomaria algum tempo. James vem dizendo algo enquanto se dirigem ao carro, e Azaleh retribui com um franzir de sobrolho(***) duvidoso. Ambos se dirigem ao banco da frente, o que faz os dois pararem e encararem um ao outro como se pudessem se matar ali mesmo. Eu previ os dois iniciando uma discussão, então interrompi:

— Hum, gente – disse, e os dois olharam para mim ao mesmo tempo. – Vocês poderiam só entrar no carro logo?

— Que seja – Azaleh cedeu. – Eu vou atrás com a Catelyn.

Sorri para ela em agradecimento, ao passo que James abriu a porta para ela e em seguida se jogou no banco do passageiro enquanto Azaleh se sentou atrás de meu amigo, perto da janela, e ambos puseram os cintos.

Coloquei meus óculos escuros para que a luz do sol poente não acabasse com minha visão e pisei no acelerador para que voltássemos a descer a rua, vagarosamente me recordando de como ir até a casa dos Bjorgman.

— Hum, Nahan? – James me chamou, olhando os CD's em meu estojo, provavelmente procurando um para colocar.

— Sim? – eu perguntei de volta, e pude ver ele levantando um deles e analisando a superfície.

— Por que você tem um CD escrito "Mix da Cat"?— meu melhor amigo indaga divertido e interessado, e eu asseguro-me que meus olhos ainda estão na estrada.

— Ahn… eu levei ela e a irmã para casa ontem – explico, sorrindo amarelo embora fosse a verdade. – Caiu da mochila dela e eu pedi pra ouvir, mas esquecemos de tirar do som quando as deixei em casa, então guardei no estojo.

— E por que você ficou todo sem-graça? – Azaleh pergunta, e eu devo ter corado, porque sua próxima fala é: – Ai, meu Odin! Você está corando.– com um tom muito mais dócil do que lhe é natural.

— Eu estava pra devolver hoje, de qualquer jeito– ignoro-a.

— Por que levou as Bjorgman para casa, de qualquer jeito?— James devolve, desistindo dos CD's e colocando na rádio local. – Pensei que elas gostassem de ir de ônibus.

— Ninguém gosta de ir de ônibus para os lugares, James. Tinha de ver antes de Finn ganhar o carro, era o inferno ir pra casa – Azaleh contra-argumenta.

— Até pode ser, mas as duas foram de ônibus todos os dias dessa semana. A Catelyn inclusive recusou as ofertas do Nahan nos últimos dias – meu amigo coloca, e vejo Azaleh menear a cabeça em concordância pelo retrovisor.

— Acho que elas só queriam sair da escola logo – dou de ombros.

— Por quê? – a Haddock indaga, parecendo preocupada, e só então me lembro que ela e James já tinham deixado a escola com seus irmãos quando Catelyn viu a cena entre Spencer e Aria. – Aconteceu algo depois que fomos embora?

Suspiro antes de perguntar.

— Sabem quem é a Spencer Smith?

— A irmã de Malik e Tristan Smith? – James pergunta, e eu assinto.

— Finn é o melhor amigo de Malik e Lanna odeia Spencer – Azaleh adiciona. – Ela é relativamente falada lá em casa.

Eu narro aos dois o que tinha acontecido no dia anterior, o que deixa James com uma cara estranha, que mais se parece com a sua cara de doente, e Azaleh parece ser capaz de soltar fumaça por seus ouvidos. Ela abre e fecha a boca várias vezes indignada, antes de conseguir falar alguma coisa.

— Eu não acredito – ela disse, embora claramente acreditasse – Ela é tão ruim assim?

— Não é como se fosse tão surpreendente – James considerou – Ela tem uma família disfuncional. Todo mundo sabe que os Smith são cheio das brigas e tal.

— É, mas veja Tristan – eu apontei. Conhecia-o desde menor, já que éramos da mesma idade e da mesma escola, e Tristan nunca teve nem de longe, atitudes parecidas com as da irmã. Muito pelo contrário – Ele é tão de boa.

Azaleh balançou a cabeça em concordância.

— Sair pisando nas pessoas para se encaixar definitivamente não é a única reação para uma vida familiar ruim – ela ponderou – Malik também é da família e embora seja lá meio agressivo, Finn nunca me disse nada sobre ele tentar sufocar garotas quietas pela gola de seu suéter do nada.

— Talvez ela esteja passando por muito – James continuou.

— Está realmente defendendo o que ela fez, James? – eu indaguei, pasmado – Não é como se fosse um ato de violência justificável.

— Ou como se qualquer ato de violência fosse justificável – Azaleh adicionou.

— Primeiro, você mesma me bateu no rosto faz uma semana, Azaleh. – James argumentou – Mas, bem, eu mereci – meu amigo brincou, mas seu sorriso vacila depois de ele ver a cara de Azaleh e adicionar sua última sentença. – E eu não disse isso. Não acho certo o que ela fez, mas alguém provavelmente deveria levar aquela menina à um psicólogo – ele opinou, na defensiva.

— Um psiquiatra especialista em psicopatas seria melhor – Azaleh resmungou e James ainda abre a boca para responder, mas o carro para em frente à casa de dois andares marrom dos Bjorgman antes que ele possa fazê-lo. Pude ver Catelyn sentada no parapeito da janela do segundo andar, e senti que já não me deveria espantar quando ela joga as duas mãos para frente e cria uma escadaria de gelo até a grama logo após de dizer para alguém que estava saindo, mas ainda assim sinto minhas sobrancelhas subindo. A ruiva se dirigiu direto à porta de trás, sentando-se ao lado de uma sorridente Azaleh, e dando-nos um pequeno sorriso.

— Hey – disse – Poderiam parar de me encarar, por favor? Meus pais já fazem isso o suficiente para uma vida. – ela ironizou, com a sua expressão fechada de sempre, fazendo-me segurar uma risada. Realmente estávamos encarando ela. Não pude ver, mas acho que ela sorriu quando me voltei para o volante.

— Então. – disse eu, pisando no acelerador e arrancando enquanto Catelyn fala para James sintonizar algo melhor com um tom brincalhão – Vocês estão com fome? Porque eu não jantei ainda, e não me importaria nem um pouco de comer antes de ir para onde vamos.

— Por algum motivo, eu não sei aonde vamos. – Azaleh disse, num tom contestador.

— Nem eu. – Cat emendou.

— E estou começando a achar que vocês estão nos sequestrando. – a morena finalizou.

— Se eu fosse te sequestrar, amordaçaria primeiro. – James brincou, só para receber um olhar de desdenho de Azaleh.

— Vocês não nos responderam. – Catelyn nos lembrou.

— É uma surpresa. – expliquei, olhos no asfalto. – Mas eu acho que vocês vão gostar. Não é mesmo, James?

— Vão adorar – falou, mal-humorado.

— Eu poderia usar uma parada em alguma lanchonete. – Azaleh disse. – Talvez uma pizzaria. Minha barriga está roncando.

— Por mim tanto faz. – disse, e James levantou as mãos em rendição.

— Vamos logo, antes que eles comecem a discutir sobre isso também, Nahan. – disse Catelyn rapidamente. – Eu conheço uma perto da sorveteria dos meus pais, é ótima. E podíamos tomar sorvete depois, por conta da casa.

— Ótimo, então. Em qual rua eu viro?

Ouço Catelyn no banco de trás desapertar o cinto, e inclinar-se para o meu banco, apontando e falando as direções até à pizzaria.

●●●

Mais ou menos uma hora, duas pizzas e seis sorvetes depois, já é de noite. Estamos os quatro sentados no meio-fio da calçada em frente à sorveteria, esperando que Azaleh finalmente acabe seu segundo pote – o qual James a desafiou a comer. Quando ela finalmente engole tudo o que podia e mais um pouco, Cat diz que precisa ir lá dentro e pedir ao funcionário para anotar que ela estivera ali, ou seus pais estranhariam a falta do sorvete. Ela pede-me para lhe fazer companhia, então jogo as chaves para James antes de me levantar e entrar na loja atrás dela.

— Eu achei que eles te conhecessem por aqui. – digo, depois que a porta se fecha, e reparo em uma Cat com as duas mãos nos quadris e o único funcionário ali dentro sorrateiramente entrando no freezer deles. – O que houve?

— Você falou para eles. – ela acusa com um olhar desiludido.

— Falei do quê?

— Sobre Aria e Spencer. Na escola.

Coloco as mãos nos bolsos, desconfortável.

— Sim, falei. Vocês não pediram que eu não o fizesse ou nada assim. E como você reparou?

— Não achei que você fosse fofoqueiro. Eles nem citaram o nome de Aria durante duas horas inteiras, Nahan. E aquela conversa sobre não gostarem da Spencer, porque ‘‘ouviram dizer’’ que ela mal tratou alguém na antiga escola? Como é que eu não ia reparar?

— É importante que as pessoas saibam quão ruim essa menina é – digo tanto para me defender, quanto por achar que é verdade.

— Sim, mas isso implica que as pessoas saibam que minha irmã foi agredida e humilhada! – Catelyn explode, e então fecha os olhos e massageia as têmporas. Eu dou um passo à frente, pensando em como confortá-la, mas nada me vem à mente. – Olha, eu concordo com você. Se essa menina não for exposta, nada vai mudar. Mas a Aria... Ela odeia ser o centro das atenções. Não gosta que saibam sobre o quê está passando. E com certeza não precisa da pena dos outros! – diz esta última frase olhando para mim significativamente.

— Cat, eu…

Não sei como continuar, e ela também não fala por uns momentos.

— Só... Faça com que eles não contem à ninguém, ok? Eu não poderia viver comigo mesma. – ela olha para cima, com os olhos azuis preocupados e um pouco mais suaves. Eu queria abraçá-la, mas Catelyn não é exatamente a pessoa que mais gosta de contato na face da Terra, então coloco um mão em seu ombro – o que só torna a situação ainda mais desconfortável e entranha, fazendo-me recuar com a minha mão rapidamente.

— Me desculpa.

— Você não sabia. – diz, tão mais controlada que me surpreende. – Vamos logo, eles vão ficar preocupados. Quando perguntarem o porquê da demora, só deixe que eu responda. – a mudança de humor é tão repentina, que parece que há uma pessoa totalmente diferente à minha frente.

Eu assinto ao seu pedido, e sigo-a até a porta lado a lado. Quando chegamos ao carro, James e Azaleh já se acomodaram ambos no banco de trás, enquanto ele mostra algo em seu celular à ela. Cat simplesmente dá de ombros e se coloca no banco da frente, e eu a imito até o banco do motorista. Algo como cinco minutos depois, chegamos ao nosso destino, que deixa os olhos das duas garotas arregalados de maneiras diferentes mas parecidas.

— Um parque itinerante? – perguntam em simultâneo, e eu engulo em seco.

— Eu não vou num desses desde o aniversário de nove anos de Aria. – Cat constata simplesmente, ainda no modo tenso com que saiu da sorveteria.

— Exatamente por isso, você tem de aproveitar tudo e mais um pouco. – Azaleh replica, animada, abrindo sua porta e praticamente pulando para fora do veículo. – Vem, Catelyn! E a montanha-russa primeiro!

Ela faz uma cara meio estranha, como se não soubesse o que fazer, e me mira de relance, já que sou a única pessoa que também não saiu do carro. Eu tento dar meu sorriso mais suave, tentando tranquilizá-la, e ela inspira profundamente antes de descer do carro. Eu a sigo e o tranco, ainda que porque eu não tinha nenhuma outra opção. Sentia-me na obrigação de achar um jeito de colocá-la para cima de novo, já que era parcialmente minha culpa que estivesse chateada.

Mas, no final das contas, eu sequer me lembro de como conseguimos animá-la. Só sei que, quem visse as fotos das câmeras nos brinquedos, veria uma Catelyn divertida e descontraída que até então me era desconhecida, mas que sempre desconfiei que existisse.