V
- Sabia que isso não daria certo. – Fala William frustrado, para o homem que acabara de conhecer.
- Você não deve bloquear suas emoções. Apenas deixe as lembranças de sua vida encharcarem sua mente.
- Oliver, acho que você ainda não notou que eu não sou louco! Quando você disse que tinha um método de me fazer voltar a ter tudo o que tinha, eu não imaginava que eu ficaria aqui só lembrando momentos de minha vida.
- Está vendo aquele homem? – Oliver aponta para um homem velho que simulava uma arma com um pedaço de madeira em mãos.
- Aquele que ainda jura estar na Segunda Guerra Mundial? – William fala com um olhar enfadonho.
- E quem disse que ele não está? Quem irá desmentir a ele que aquilo que ele empunha em mãos não é uma arma? – questiona Oliver.
- Aquilo é um pé de uma mesa quebrada... – responde o garoto com um tom sarcástico.
- Já ouviu falar na Teoria da Representação de Freud, William?
- Sigmund Freud? Aquele psicanalista?
- Isso mesmo. Segundo essa sua teoria, um objeto representado na mente é constituído por seus vários aspectos sensoriais da realidade externa, como cores, cheiros, texturas e outras coisas relacionadas às suas lembranças. – explica Oliver, enquanto William observa o comportamento dos outros internos.
- E aonde você quer chegar com isso? – questiona o garoto.
- O que eu quero lhe dizer, é que qualquer elemento, seja ele tátil, acústico ou até mesmo um cheiro, que lhe tragam emoções de suas lembranças, pode representar imagens de seu subconsciente.
- Então quer dizer que aquele velho está realmente na Segunda Guerra Mundial, só que em seu subconsciente? – indagou William surpreso.
- Isso mesmo William. Nós o vemos como um louco, mas na verdade ele apenas está fora de nossa realidade, em um mundo que só ele tem acesso.
A concepção de loucura e lucidez acabara de mudar para William, que agora observava com outros olhos os devaneios dos outros internos. O anão que afirmava ser um duende. O velho veterano de guerra. Ou até mesmo o homem que falava com as plantas. Todos vivendo suas próprias realidades. Já era hora de viver a sua também.
- Eu estou pronto. – ressalta William. – Como eu começo?
- Fico feliz em ouvir isso, jovem William. – Oliver fala dando uma tapinha amigável nas costas do garoto. – Tudo que você precisa é de algo que incite boas recordações em sua mente.
Não bastou uma breve olhada ao seu redor para que William encontrasse o elemento perfeito para o seu devaneio: um pé de manga que havia no meio do pátio.
- Perfeito! – exclama o garoto enquanto anda em direção a árvore. – Isso me lembra a infância na fazenda de meu pai... – de olhos fechados, William afaga a árvore com suas mãos.
- Muito bem William, agora tente se imaginar na sua infância. Tente resgatar a melhor lembrança que essa árvore lhe traz e acredite intensamente que a está revivendo nesse exato momento.
“- Desça já daí William!
- Mas mãe... Só estamos pegando manga pra senhora...
- Estão? Não acredito que... Carlos! O que você está fazendo aí em cima?
- Er... Olá querida! – sorriso constrangedor. – É que o William queria dar umas mangas de presente a você...
- E tinha que subir na árvore com ele?
- Mas eu só... – barulho do galho se partindo. – Aaaaaah!
O homem cai em cima da esposa e lambuza seu rosto com a manga que ele estava comendo. O menino em cima da árvore gargalha incansavelmente até contagiar seus pais, que também acabam rindo de si mesmos...”
- Parabéns William. Isso foi um ótimo começo. – elucida Oliver com um sorriso no rosto, batendo leves palmas enquanto encara William que está em cima da árvore.
- Meu Deus! Como eu vim parar aqui?! – William, surpreso, pergunta a si mesmo ao perceber que estava em cima da árvore. – Não foi apenas uma lembrança. Aconteceu mesmo...
- Tudo o que vi foi você subindo na árvore, falando e rindo sozinho. Todo o resto, apenas você e seu subconsciente puderam presenciar.
William, ainda perplexo, acabava de começar a escalar o abismo...
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