Na manhã seguinte levantei-me e fui em direção à cozinha, onde Kadam e Kelsey tomavam o café da manhã. Ouvi-os falando sobre o selo da minha família.

—O Selo na verdade foi feito na China, não na Índia. Foi um presente dado ao avô de Ren. Selos antigos assim são bem raros. É feito de pedra Shoushan, que, contrariando a crença popular, não é um tipo de jade. Os chineses acreditavam que Shoushans eram ovos de fênix de cores vivas encontrados em ninhos no alto das montanhas. Homens que arriscavam a vida para localizá-los e capturá-los recebiam honras, glória e riqueza. Somente os homens mais ricos tinham objetos entalhados nesse tipo de pedra. Receber um de presente foi uma grande honra para o avô de Ren. Este é um tesouro de família de valor inestimável. A boa notícia para você é: dizem que ter ou usar alguma coisa feita desse tipo de pedra dá sorte. Talvez a ajude na jornada mais do que você imagina.

— Parece que a família de Ren era muito especial.

— De fato era, Srta. Kelsey.

Entrei sem que eles notassem e coloquei a cabeça no colo de Kelsey. Ela coçou minha orelha enquanto falava comigo.

— Que bom que você se juntou a nós. Está ansioso para pôr o pé na estrada? Deve estar empolgado por se ver tão perto de quebrar a maldição.

Ela não fazia ideia. Olhei para ela intensamente, tentando fazê-la entender o quanto eu desejava quebrar aquela maldição.

Ela me ofereceu um pedaço da manga que estava comendo. Eu a peguei e comecei a lamber o sumo de suas mãos. Ela riu, dizendo que aquilo lhe fazia cócegas. Não resisti e continuei lambendo as mãos e os braços.

O que eu queria mesmo era sentir meus lábios em sua pele, beijá-la de verdade. Mas por hora, aqueles beijos de tigre ajudavam.

Ela reclamou que eu a estava lambuzando, levantou-se e foi lavar as mãos. Saímos em seguida.

Kadam orientou Kelsey a ter cuidado. Ele achou que não precisava nos acompanhar, pois a caverna não ficava muito longe e Kelsey poderia ir dirigindo até lá.

Após algumas horas de viagem, nós deixamos o carro e seguimos a pé pelo parque. Pegamos uma trilha pela mata, para que os turistas não nos vissem. Nós caminhamos por duas horas e meia até chegarmos à caverna e ficamos escondidos esperando anoitecer para que os turistas e funcionários deixassem o local.

Eu me deitei na grama e Kelsey se encostou em mim. Ela começou a falar de sua vida, sua família. E eu ouvia atentamente.

— Mamãe era enfermeira em uma instituição para idosos, mas depois resolveu ficar em casa e cuidar de mim — expliquei, voltando ao passado e às doces lembranças. — Ela fazia o melhor cookie com gotas de chocolate e creme de amendoim do mundo. Achava que demonstrar amor significava fazer cookies em casa e provavelmente foi esse o motivo de eu ter sido uma criança gorducha.

Fiquei imaginando como ela devia ser uma criança bonitinha. Imaginei como seriam nossos filhos. "Quero ter muitos bebês gordinhos com você, Kelsey."

— Papai era o típico pai que faz churrasco no quintal. Era professor de matemática e acho que passou parte disso para mim, pois também gosto de matemática. Todos nós adorávamos ler e tínhamos uma pequena biblioteca em casa. Os livros do Dr. Seuss eram os meus preferidos. Mesmo agora eu quase posso sentir a presença dos meus pais quando pego um livro

Ela pareceu estar emocionada. Percebi que sua voz ia saindo com dificuldades, como se ela quisesse chorar, mas ela continuou falando.

— Quando viajávamos, eles gostavam de se hospedar em pousadas simples, e eu ficava com um quarto só para mim. Viajamos praticamente por todo o estado e conhecemos fazendas de maçãs e minas antigas, cidades inspiradas na Bavária que serviam panquecas alemãs no café da manhã, o mar e as montanhas. Acho que você se apaixonaria facilmente pelo Oregon. Não viajei tanto quanto você, mas não posso imaginar um lugar mais bonito do que o estado onde nasci.

Ela falou sobre a escola e seu sonho de ir para a universidade, embora não pudesse pagar mais do que uma faculdade comunitária. Falou do acidente com seus pais, de como se sentiu sozinha quando aconteceu e de como era viver com uma família adotiva.

Fiquei emocionado com o relato de Kelsey. Eu a compreendia. Sabia como era estar sozinho. Ela era tão jovem quando perdeu sua família. Decidi que nunca mais a deixaria ficar só.

Também compreendi o tamanho da força de Kelsey. Apesar de tudo o que ela perdeu, ela ainda mantinha a doçura e a capacidade de amar. Apesar de todas as dificuldades ela continuava sonhando. Eu a ajudaria em tudo o que estivesse a meu alcance. Não deixaria que nada faltasse a ela.

A voz dela foi diminuindo aos poucos, até que ela dormiu. Fiquei acordado pensando em como eu tinha sorte por encontrar alguém tão especial. Parecia impossível, mas a cada dia eu a amava mais. Não conseguia mais pensar em minha vida sem tê-la comigo.

Quando começou a escurecer, levantei-me acordando-a. Ela se espreguiçou, levantou-se e começamos a caminhar pelo parque.

Havia muitos animais ali, inclusive predadores potencialmente perigosos. Andei perto dela tranquilamente, para que ela não ficasse com medo. Mas me mantinha atento a qualquer ameaça.

Depois de duas horas de caminhada, chegamos perto da caverna Kanheri, nos limites da selva. A floresta havia se tornado mais esparsa, abrindo-se para uma colina sem árvores. Degraus de pedra levavam colina acima, até a entrada, mas ainda estávamos muito distantes para ter mais do que um simples vislumbre da caverna.

Kelsey dirigiu-se aos degraus, mas eu pulei na frente dela, impedindo-a de continuar. Ainda havia turistas e funcionários dentro da caverna. Tínhamos que esperar mais um pouco.

Finalmente o sol se pôs e as pessoas se foram. Saí do meio das árvores cautelosamente e farejei o ar, para saber se ainda havia pessoas na caverna.

Satisfeito, dirigi-me aos degraus de pedra entalhados na colina pedregosa, sendo seguido por Kelsey.

Entramos na caverna e começamos a explorá-la. Eu entrei em uma das câmaras, Kelsey veio atrás de mim. A fim de me certificar que Kelsey soubesse o que procurar, me transformei em homem e toquei seu ombros, assustando-a sem querer.

— Não faça isso! Não pode me avisar antes?

— Desculpe, Kells. Precisamos procurar em cada uma das cavernas um símbolo que pareça o Selo. Você procura em cima e eu, embaixo. Transformei-me em tigre novamente.

Explorarmos as 5 primeiras cavernas sem obtermos sucesso. Na sexta encontramos o símbolo. Eu o vi apesar, da escuridão. Essa é uma vantagem de ser um tigre, Kelsey jamais o encontraria sem minha visão noturna.

O selo estava pendurado no pescoço de Kelsey. Ela o retirou e colocou sobre o entalhe, encaixando-o. No início nada aconteceu. Ela então girou o selo, o que fez com que uma passagem se abrisse. Ela retirou o selo do entalhe e o colocou de volta no pescoço. Passei a sua frente e seguimos para dentro.

Encontramos uma tocha. Ela pegou e acendeu. Ouvimos a porta se fechar às nossas costas. Aproximei-me dela, para lhe dar segurança. Ela massageou os pelos da minha nuca e então seguimos descendo as escada.

Ao fim da escada havia uma bifurcação. Farejei e senti o cheiro da flor de Lótus, a favorita da Deusa Durga. Segui o cheiro e Kelsey me acompanhou.

Em um determinado ponto, percebi que estávamos em um labirinto cheio de armadilhas. Mas tínhamos que seguir. Fiquei perto o bastante para que Kelsey segurasse meu pescoço.

Chegamos a um corredor repleto de besouros. Seguimos por ele. Os besouros se agarravam à minha pele e às roupas de Kelsey. Quando chegamos ao fim do corredor, Kelsey me ajudou a retirar alguns besouros que estavam presos em minhas patas.

—Acho que usar roupas ajuda, Ren. Eles acabam beliscando as roupas em vez da pele. Pobre tigre. Você tem besouros esmagados em todas as patas. Eca! Pelo menos eu tenho a vantagem das botas.

Cerca de 10 curvas depois, Kelsey pisou em uma pedra que afundou no chão. Esperamos que a próxima armadilha fosse acionada. As paredes começaram a se sacudir e pequenos painéis de metal se projetaram delas, fazendo com que lanças de metal, pontudas e afiadas, surgissem de ambos os lados Ouvi quando Kelsey gemeu baixinho.

Além das lanças, a armadilha também consistia em um óleo negro e viscoso que jorrava de canos de pedra, cobrindo o chão. Transformei-me em homem.

— Tem veneno na ponta das lanças, Kelsey. Posso sentir o cheiro. Fique no meio. Tem espaço suficiente para passarmos, mas não se deixe nem mesmo arranhar por estas pontas.

— Mas e se eu escorregar?

— Segure com força o meu pelo. Vou usar minhas garras como âncoras enquanto avançamos bem devagar. Não corra agora.

Comecei a avançar bem devagar, com minhas garras cravadas no chão e Kelsey segurando-se em mim. De repente ela escorregou e uma ponta passou muito perto de seu braço, acertando a mochila.

Quando chegamos ao fim daquele corredor, estávamos trêmulos pelo esforço, mas aliviados.

— Depois das lanças, os besouros não parecem assim tão ruins. Acho que eu prefiro passar por eles de novo a enfrentar essas aí.

Lambi o braço de Kelsey e ela me fez um carinho na cabeça. Estava aliviado por termos conseguido e por ela estar bem.

Descansamos um pouco e seguimos. Atravessamos várias passagens sem qualquer armadilha.

Já estávamos mais relaxados quando uma porta afundou atrás de nós. Outra começou a descer à frente, e corremos para atravessá-la. Eu consegui alcançá-la, mas Kelsey não foi tão rápida. Eu não iria deixá-la, então, voltei em sua direção e a porta se fechou.

Um painel se abriu sobre nós e fomos jogados ao chão por uma forte corrente de água que começou a preencher a sala.

— O que vamos fazer? Você sabe nadar? Vai cobrir sua cabeça primeiro!

Eu me transformei em homem.

— Os tigres sabem nadar. Posso prender a respiração mais tempo como tigre do que como homem.

A água agora estava na nossa cintura e eu rapidamente puxei Kelsey para além do cano de onde ela jorrava até a porta à nossa frente. Quando a alcançamos, Kelsey já estava flutuando. Mergulhei, procurando uma saída. Encontrei uma marca na porta e pedi para Kelsey inserir o selo e girá-lo.

Ela teve dificuldades para conseguir. Na primeira tentativa, ela demorou a achar a marca e quase perdeu o fôlego. Eu agarrei a mochila que estava em suas costas e a puxei para a superfície. Não tínhamos muito tempo. Já estávamos flutuando perto do teto.

Eu estava tão nervoso que nem pensei em pegar o selo e tentar eu mesmo. Me transformei em tigre enquanto Kelsey tornava a mergulhar e nadei em sua direção.

Ela parecia apavorada. Olhou para mim e voltou a tentar. Desta vez deu certo. A porta se abriu e fomos jogados junto com a água através dela.

Foi aterrorizante. Apesar de tudo aquilo, Kelsey ainda mantinha o bom humor

— Ren — riso-tosse — você está parecendo um — tosse-tosse-riso — gato afogado!

Feliz por estarmos bem, também recuperei meu bom humor e me aproximei dela, bufando e me sacudindo, espalhando água para todos os lados

— Ei! Muito obrigada! Ah, não tem problema. Ainda assim é engraçado

Após algum tempo, nós retomamos o caminho através dos corredores. Chegamos a um corredor muito comprido e começamos a seguir por ele. Então eu ouvi um estrondo e parei.

Kelsey ainda não podia ouvir. Saltei a sua frente, empurrando seu corpo para trás.

— Que ótimo! O que foi agora? Escorpiões?

Naquele momento, um grande estrondo sacudiu o túnel. O chão arenoso sobre o qual estivéramos

instantes antes, ruiu. Recuamos enquanto o chão se abria.

Os tremores pararam e nos vimos na borda de um buraco. Kelsey se abaixou e começou a engatinhar.

— Quem você pensa que eu sou? Indiana Jones? Acho melhor saber que não tem nenhum chicote nesta mochila!

"Quem é Indiana Jones?" Pensei

Indicando o caminho do outro lado do abismo, ela disse:

— Suponho que é nesta direção que devemos ir, certo?

Tínhamos que transpor aquela barreira para alcançarmos o outro lado. Após examinar a situação, me transformei em homem e toquei levemente sua mão para que ela não se assustasse desta vez.

— Precisamos encontrar uma forma de transpor o abismo.

— Fique à vontade para tentar.

Fui até a borda e espiei do outro lado, avaliando a distância. Mudando para a forma de tigre, voltei alguns passos na direção de onde viéramos, virei para a frente e disparei a toda velocidade na direção do buraco.

— Ren, não!

Consegui pular com facilidade e pousar levemente do outro lado. Agora precisava descobrir como fazer com que Kelsey atravessasse. Pulei de volta e transformei-me novamente.

— Kells, tenho uma ideia.

— Só espero que você não me inclua nela. Ah, já sei. Você quer amarrar uma corda na sua cauda, saltar, amarrá-la do lado de lá e então me fazer atravessar pela corda, certo?

Até que aquela seria uma boa ideia.

— Não, você não tem força para fazer algo assim. Além disso, não temos corda nem nada em que amarrar uma corda.

— Certo. Então qual é o plano?

Segurei as mão delas, olhei em seus olhos, esperando que ela confiasse em mim.

— O que vou propor vai ser muito mais fácil. Confia em mim?

— Confio em você. Só que… — Olhando em meus olhos preocupados ela suspirou. — Está bem. O que eu tenho que fazer

— Você viu que eu pude transpor esse espaço muito bem como tigre, certo? Então, quero que fique parada bem na beira do abismo e espere por mim. Vou correr até o fim do túnel, ganhar velocidade e saltar como tigre. Ao mesmo tempo, quero que você salte e agarre meu pescoço. Vou mudar para a forma humana em pleno ar para poder segurá-la e cairemos juntos do outro lado.

— Você está brincando?

— Vamos precisar cronometrar com precisão e você terá que saltar também, na mesma direção, porque, se não fizer isso, eu simplesmente vou atingi-la com toda a força e arremessar nós dois lá no fundo.

— Está falando sério? Quer mesmo que eu faça isso?

— Estou falando sério. Venha. Fique aqui enquanto eu pratico algumas vezes.

— Não podemos simplesmente encontrar outro corredor ou coisa parecida?

— Não tem outro. Este é o caminho certo.

Pratiquei algumas vezes, até que parei em frente a ela.

— Não posso acreditar que você me convenceu a fazer isso. Tem certeza?

— Sim, tenho certeza. Está pronta?

— Não! Preciso de um minuto para escrever mentalmente meu testamento.

— Kells, vai dar tudo certo.

— Claro que vai. Muito bem, deixe-me olhar o lugar em que estamos. Quero ter certeza de que posso registrar cada minuto dessa experiência em meu diário. Se bem que essa deve ser uma atitude inútil, porque com certeza vou morrer na queda.

Ela estava com medo, mas eu não deixaria nada de mau lhe acontecer. Eu estava certo de que daria tudo certo. Coloquei a mão em seu rosto e a olhei nos olhos, para lhe dar confiança. Respondi com firmeza.

— Kelsey, confie em mim. Eu não vou deixar você cair.

Eu me transformei em tigre e corri até o fim do corredor. Ela ajustou a mochila nas costas e respirou fundo. Então se aproximou do abismo e eu corri em sua direção. Ela saltou e eu a alcancei. Fiquei aliviado ao sentir suas mãos agarrarem firmemente o meu pescoço.

Quando estávamos quase do outro lado, Kelsey começou a entrar em pânico e agarrar meu pelo desesperadamente.

Como tigre, eu tinha dado um impulso forte o suficiente para alcançarmos o outro lado. Assim, me transformei em homem e agarrei a cintura dela, abraçando-a com força. Consegui girar para ficar por baixo enquanto aterrissávamos.

Kelsey, que esteve segurando o ar até aquele momento, voltou a respirar aliviada e começou a olhar as minhas costas machucadas, ainda em meus braços.

Ela começou a limpar meus machucados com uma camiseta molhada que tirou da mochila. A sensação de tê-la assim em meus braços era mais do que eu podia sonhar. Tê-la cuidando de mim daquela forma era maravilhoso. Valeu por todo o sofrimento que havíamos passado.

Quando terminou ela me agarrou pela cintura em um abraço forte. Eu retribui puxando-a para mais perto de mim. Ela encostou a cabeça no meu peito e eu pude sentir e calor saindo de sua boca enquanto ela sussurrava:

— Obrigada. Mas nunca… nunca… nunca mais faça isso!

— Se eu causar efeitos como este, com certeza vou fazer – Respondi sorrindo.

— Não vai, não!

"Ah, priya, depois de ter você em meus braços, nunca mais vou deixá-la sair" — Pensei enquanto a segurava mais forte.


Eu estava muito satisfeito por termos conseguido, mas principalmente pela oportunidade de ficar tão junto dela por algum tempo.

Passados alguns segundo, precisei soltá-la para continuarmos nossa busca. Ela percebeu minha relutância e levantou-se murmurando algo sobre tigres, homens e besouros. Transformei-me em tigre e fomos andando, comigo à frente.

Finalmente chegamos a uma porta com símbolos e uma mão gravados. Kelsey observou que os desenhos na porta eram iguais aos símbolos que Phet havia feito em sua mão. Ela encaixou a própria mão naquela gravada.

Ao retirar a mão dali, sua palma estava brilhando. Ela tornou a colocar a mão no desenho. Centelhas elétricas começaram a crepitar entre a porta e a mão dela. A porta se abriu. Entramos.

Lá dentro encontramos mais duas marcas de mãos. Kelsey encaixou as mãos nas marcas e novamente os símbolos começaram a brilhar.

Ouvimos um ronco grave no topo de um monólito e um ruído de algo sendo sorvido. Um líquido dourado transbordou sobre o topo da construção e começou a jorrar pelos quatro lados, reunindo-se em uma bacia na base. A solução reagia a alguma coisa na pedra, que sibilava e fumegava enquanto o líquido espumava, borbulhava e chiava, e por fim gotejava na bacia.

Depois que os silvos cessaram e o vapor clareou, e os entalhes de glifos haviam aparecido nos quatro lados da pedra, onde antes não havia nada.

— Acho que é isto, Ren. A profecia de Durga! Era o que estávamos procurando!

Kelsey começou a fotografar os grifos. Em seguida, usando papel e o carvão, fez uma cópia das gravuras das mãos na pedra e na porta, colocando o papel sobre elas e cobrindo-as com o carvão.

Enquanto ela fazia aquilo, o líquido dourado começava a se espalhar pelo piso. Quando encostou em minha pata, eu a senti queimar e urrei de dor.

Kelsey olhou enquanto eu tentava sair dali. O tal liquido era ácido e já estava alcançando os tênis dela, queimando os cadarços. Nós pulamos para a parte arenosa do piso, quando pedras começaram a se soltar do teto.

Empurrei Kelsey usando meu focinho, fazendo com que ela encostasse na parede. Ela se abaixou para se proteger. O ácido estava quase nos alcançando e não tínhamos para onde fugir.

Eu farejei o ar, tentando encontrar uma saída. Senti um cheiro leve da mata lá fora, vindo através de um pequeno orifício na parede. Comecei a arranhar aquele local, conseguindo abrir mais o buraco.

Ao perceber o que eu estava fazendo, Kelsey veio ajudar. Quando o buraco estava grande o suficiente, eu passei por ele e fiquei esperando por ela do lado de fora. Ela jogou a mochila saindo em seguida.

Naquele momento, uma rocha imensa caiu com estardalhaço, fechando o buraco. Os tremores diminuíram até cessarem de todo. O silêncio desceu sobre a selva escura, onde ficamos parados, enquanto uma poeira fina e leve pairava no ar e caía suavemente sobre nós.

Kelsey levantou-se rapidamente e pegou a lanterna. Me transformei em homem e comecei a examiná-la:

— Kelsey, você está bem? Você se machucou?

— Não. Estou bem. Então, acabamos aqui? A caverna de Kanheri foi divertida e tudo o mais, só que agora eu queria ir para casa.

— Sim — Vamos voltar para o carro. Fique bem perto de mim. Animais que estavam dormindo quando atravessamos a selva estão acordados agora, e caçando. Precisamos ter cuidado.

Me transformei em tigre e comecei a guiá-la pela floresta. Estávamos do outro lado da caverna, mas eu conseguiria chegar até o carro usando o meu faro.

No entanto, eu sabia que era perigoso e precisaria estar atento a qualquer ameaça contra Kelsey.

Ela estava com sono e cansada e mal conseguia caminhar. Eu pensei em pararmos para que ela pudesse descansar, mas achei mais prudente sairmos dali o quanto antes.

De repente eu senti um cheiro. Algum animal estava à espreita. Não parecia ser outro tigre, mas era um felino. Me transformei em homem para avisar a Kelsey, mas continuei de olho na selva

— Estamos sendo caçados. Quando eu disser corra, vá por ali e não olhe para trás… Corra!

Apontei para a esquerda, que era para onde ela devia correr e me transformei em tigre. Entrei na mata para procurar o predador. Soltei um rugido para fazê-la correr.

Kelsey saiu em disparada para onde eu havia apontado. Encontrei uma pantera e lutei com ela. Ela era grande e forte, mas eu consegui dominá-la. Então eu ouvi, ao longe a voz de Kelsey:

— Ren? É você?

Não, não pode ser. Outro animal estava à espreita de Kelsey.

Corri o mais rápido que eu pude. Cheguei a tempo de ver outra pantera saltar em direção ao Kelsey.

Usei todas as minhas forças para tentar interceptá-la, impedindo-a de atacar. Consegui lançá-la para longe de Kelsey, rosnei alto para afugentá-la. Ela tentou me encarar, mas desistiu, percebendo que eu era maior e mais forte.

Eu estava ferido e cansado, mas naquele momento, a única coisa que me importava era que Kelsey estivesse bem. Caminhei mancando até ela e me transformei em homem, mas não consegui ficar de pé.

Caí a seus pés, segurei sua mão e perguntei se ela estava bem. Ela se abaixou e me abraçou forte.

— Estou bem. Obrigada por me salvar. Estou tão feliz que você esteja vivo. Consegue andar?

Aliviado, eu sorri, me transformei em tigre e começamos a caminhar lentamente para fora da selva. Chegamos ao jipe, bebemos água e dormimos profundamente.