De acordo com Elisabeth Kubler-Ross, existem 5 estágios do luto: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. São etapas transitórias e não lineares que podem ir e voltar, mas possuem apenas um desfecho: aceitação.

Aceitar não significa esquecer. É apenas não se permitir cair em desgraça novamente. É entender que precisa seguir em frente e conseguir forças para isso.

Quando meu pai morreu, sinto que devo ter vivido todas as etapas de uma vez ou talvez tenha pulado a maioria delas. Na terapia, a psicóloga disse certa vez que seria difícil mensurar já que a situação me colocou em posição de crescer cedo demais. Cogitou algo que eu jamais imaginei: talvez eu nunca tivesse superado a perda do meu pai. Neguei, óbvio.

Entretanto, pensando nisso, sinto que mesmo após um ano da morte de Sasuke, ainda não consigo sair de fato do limbo que estou. Sua morte deixou um buraco em nossa família que não consigo reparar, que eu não quero, não posso ou sequer ousaria tentar.

Minha mãe chorou muito e eu fiz o mesmo. Dane-se querer parecer forte. Eu não queria nem podia. Sasuke merecia todas as lágrimas do mundo, mas nem isso estaria páreo a falta que nos faz.

Até o dia que ela parou. Seu estilo de vida mudou. Começou a correr de manhã bem cedo todos os dias, faça chuva ou faça sol. Adotou cães. Escuta música clássica. Arruma a casa. Borda e tricota durante a noite. Todos os dias, a mesma rotina. Não sabia dizer se isso estava salvando-a da depressão ou seria sua forma de afundar nela.

Seu sorriso era pequeno sempre, porém seus olhos mostravam o quão consternada estava. Sua maneira de manter-se firme durante o dia, enquanto rendia-se a abafar o som das lágrimas no travesseiro a noite, especialmente em datas comemorativas, como dia das mães e aniversários. Ela tentava esconder, mas ainda conseguia ouvir do meu quarto às vezes.

As fotos de família nunca deixaram o lugar, mas ela nunca olha mais de dois segundos ao limpar os porta-retratos. E a maior de todas as mudanças: ela nunca mais falou.

Tive medo por ela, todavia não podia simplesmente obrigá-la a fazer diferente. Tranquei a faculdade por um período para estar junto dela antes de retornar para meu último. Na verdade, eu também precisava desse tempo, de tentar recolocar as ideias no lugar.

No dia que completou um ano do acidente, refiz pela primeira vez o trajeto marcado no mapa. Dessa vez, sem paradas ou conversas. Apenas senti que, talvez, de alguma maneira, aquilo pudesse me conectar de novo a Sasuke. Torcia para que pudesse encontrá-lo no caminho, dizer para entrar e irmos para casa juntos.

Era impossível. Eu sei.

Até que... O impossível aconteceu.

Eu abastecia quando vi meu irmão saindo de uma lanchonete acompanhado de um rapaz loiro. O mesmo que estampara os jornais junto à foto do carro destruído, agora intacto. Entraram no veículo e deram partida.

Como podia ser real? Eu estava enlouquecendo. Era fato. Não tinha outra explicação.

No entanto, decidi seguir essa alucinação.

Fiquei parado, distante, vendo-os num piquenique. Depois os pingos grossos, como num déjà vu, anunciando a chuva torrencial que chegava.

Eu podia estar louco, mas não permitiria que aquilo acontecesse. Não de novo.

Joguei-me em frente ao carro.

Pude ver Sasuke se exasperar. Acusou-me de ser louco, estar seguindo-o e disse outras mil e uma atrocidades que não me feriram nenhum pouco naquele instante. Apenas puxei-o para um abraço, antes de ser empurrado para longe e vê-lo entrar no carro e ordenar que o loiro partisse.

Eu o tive em meus braços. Eu o senti. Ele era real. Não era?!

Corri até meu carro e tentei segui-los de alguma maneira, contudo parecia ter quebrado. Tentei repetidas vezes. Nada. A chuva que despencou impediu que eu ligasse para um reboque. Quando diminuiu, todavia, corri.

Devia ser uma distância de quase dez quilômetros. Senti meus músculos arderem e os pulmões suplicarem por oxigênio. Acompanhar mamãe nas corridas matinais proporcionou que eu chegasse a tempo de ver o carro ainda soltando fumaça, como se tivesse acabado de se chocar contra a árvore.

Então, gritos de horror. Ruídos selvagens e guturais floresta adentro.

Som de corrida. Algo acertou minha cabeça e despenquei. Consegui apenas ver os fios loiros antes de desfalecer.

Acordei dentro de meu carro na manhã seguinte. Não demorei para perceber qual o motivo de ele não funcionar. Um dos fios fora cortado.

No local do acidente, não havia mais nenhum sinal de que estiveram ali. Deixei um buquê de flores e parti.

Não falei sobre aquele dia com ninguém. Nem com minha mãe, muito menos com a psicóloga. Temi alegasse um surto psicótico e recomendasse uma internação. Seria um problema a mais que minha mãe não precisava. Bastava os ansiolíticos que eu estava tomando.