A Razão do Rei

Capítulo 13


– Eu não me lembro de como saí daquela cela. – Syndel prosseguiu, depois de algum tempo. – Em meio à tortura, tudo o que me lembro era de pensar em Thranduil, em seu rosto, em suas palavras... E depois do que pareceu uma eternidade, senti o calor do sol tocando o meu rosto e ouvi uma voz diferente me chamando ao longe... Era Alassëa, a guarda.

“Abri os olhos de uma vez, assustada, e a luz me cegou. Eu os fechei de novo rapidamente.

– Ela está voltando a si! Syndel! – a voz continuava a me chamar.

Eu não conseguia pensar com clareza, tudo estava confuso. Era como se minha mente tivesse sumido, abandonado meu corpo por sabe-se lá quanto tempo, e estivesse acabando de retornar. Meu estômago estava embrulhado e havia gosto de sangue em minha boca.

– Onde está meu senhor Thranduil? – ela perguntou para alguém.

O nome foi o que me arrancou de meu torpor. Eu me sentei de uma vez na mesa de pedra sobre a qual tinham me colocado:

– Thranduil! – chamei, sem me preocupar em saber onde estava. – Thranduil!!

– Por Eru, fique quieta! – um guarda jovem me segurou, tapando minha boca. Eu comecei a me debater, tentando gritar mesmo com ele abafando a minha voz. – Fique quieta, nós estamos do seu lado! Ai! – ele me soltou rapidamente. – Ela me mordeu!

– Syndel, por favor...! – Alasseä pôs as mãos em meus ombros gentilmente, tentando me acalmar. – Ele está bem. Foi ele quem ordenou que nós a despertássemos e tomássemos conta de você.

Eu olhei para ela, tentando ler seus olhos. Parecia estar dizendo a verdade, mas eu continuava inquieta.

– Por que ele não está aqui? – senti as lágrimas chegando a meus olhos. – Thranduil! Thranduil!

– Ele está se preparando. O rei logo os chamará. Ele acabou de chegar. – ela afastou uma mecha do meu cabelo. – Está tudo bem. Eu e Airetauri estamos do lado de vocês. – eu olhei de relance para o outro guarda e ele sorriu de leve. – É impossível não ver o quanto meu senhor o príncipe te ama...

Ao ouvir aquilo, eu sosseguei um pouco, mas minha respiração estava acelerada, meu coração batia descontroladamente. A parte de trás da minha cabeça latejava, uma dor quieta e aguda que eu ainda não havia notado. Eu olhei ao redor. Estava no que parecia uma adega, numa mesa cercada por barris enormes. Foi então que eu percebi que estava agarrando as bordas do móvel com força com as duas mãos. Soltei e, num gesto mecânico, flexionei os dedos, olhando para eles como se tivesse acabado de descobrir que os possuía. Doeu. Os dois guardas apenas me olhavam em silêncio.

De repente, ouvi um barulho. Os dois guardas se aproximaram de mim, se colocando à minha frente e se voltaram para a porta. Eu tentei olhar por cima dos ombros deles, mas não conseguia ver nada. Só ouvi a voz:

– Amarrem-na e tragam-na à presença do rei.

– Mas...! Meu senhor Thranduil havia dito que...! – Alassëa começou a falar, mas foi interrompida.

– Sua Majestade tratará do príncipe mais tarde. Obedeçam!

– Não vamos fazer isso. Sua Alteza nos deu ordens explícitas para que esperássemos com ela aqui. Aliás, como você soube que ela estava aqui? – o tom de Airetauri era ameaçador. Eu queria saber com quem ele estava falando.

– Não seja tolo, Tauri. – o outro respondeu no mesmo tom. – As ordens do rei estão acima de qualquer outra coisa. Obedeça. – ele fez uma breve pausa e eu ouvi quando ele se aproximou. – Você é apenas mais um guardinha. Eu posso me livrar de você a qualquer momento. Não se esqueça.

Airetauri não respondeu, e o outro saiu.

– Tauri... – Alassëa colocou as mãos no ombro dele gentilmente.

– Está tudo bem. Nós não vamos a lugar algum. – ele se virou e olhou para mim. Pude ver tristeza e contrariedade em seus olhos. – Você está bem?

– Estou. – menti. – Onde está Thranduil? O que está acontecendo? Quem era aquele?

– É, pela quantidade de perguntas, vejo que já voltou a si. – ele riu, sem humor. – O rei chegou e trouxe convidados. Ele está furioso. Está esperando para dizer o que acontecerá a você. Ele diz que você é uma traidora, pensa que você seduziu o príncipe para sequestrá-lo. Ele quer vê-la antes de Thranduil, mas Vossa Alteza não quer deixá-la sozinha com ele. Ele nos pediu para trazê-la para cá em segredo e para não deixarmos que ninguém a leve daqui sem ele.

Eu ia responder, mas a voz vinda do fundo da adega me impediu:

– Syndel!

Eu me virei rápido demais e minhas costelas doeram. Apertei os olhos, tentando não gritar. Senti quando ele me abraçou e beijou o alto da minha cabeça.

– Obrigado, obrigado, obrigado... – ele murmurava baixinho. – Obrigado, Eru, Pai de Todos, obrigado, obrigado, obrigado...

Eu passei os braços em volta da cintura dele e o abracei com força, começando a chorar. Ele afrouxou o meu abraço com delicadeza e se abaixou, encostando o nariz ao meu, com os olhos fechados.

– Thranduil... – eu mexi a cabeça, roçando o nariz no dele. – É você mesmo, não é?

– Sim... – ele sussurrou, e eu ouvi a felicidade na voz dele. – Sim, meu amor. Você conseguiu...! – ele me abraçou, de repente. – Obrigado!

Eu retribuí o abraço. Não fazia ideia do que estava acontecendo, tudo parecia surreal demais para mim. Como se não fosse realidade, nada daquilo. A única certeza que eu tinha era a de que Thranduil estava ali comigo. E eu não me importava se era apenas uma ilusão, outra das artimanhas das masmorras de Oropher. Naquele momento, Thranduil era tudo que fazia sentido.

Até que ele me soltou e se levantou, virando para os guardas:

– Alguém esteve aqui?

– Sim. – Alässea respondeu. – Bainion.

Eu observei quando a mandíbula de Thranduil enrijeceu. Ele faz isso quando está contrariado, exatamente como seu avô, Legolas.

– Acho que não temos mais tempo, então. – ele se virou para mim. – Precisamos ir, Syndel. Você acha que consegue ficar de pé?

Tentei pular de uma vez de cima da mesa, mas fiquei tonta e teria caído se Airetauri não tivesse sido mais rápido e me segurado. Eu não tinha percebido que estava tão fraca. A sensação era estranha, como se meus membros fossem feitos de pergaminho.

– Opa! Vá com calma, Syndel! – o guarda me ajudou a me levantar e me soltou apenas quando teve certeza de que eu havia firmado os pés no chão.

– Obrigada. – eu me virei para Thranduil. – Eu estou bem agora.

Seu pai pareceu em dúvida e eu vi a preocupação em seus olhos. Mas não havia muito que ele pudesse fazer. Estávamos sem tempo.

– Tudo bem... – ele segurou minha mão com força. – Vamos.

– Alteza... Não querendo ser inconveniente, mas não seria melhor amarrá-la...? Talvez? – Airetauri estava visivelmente com medo de nos ofender.

Thranduil sorriu de leve, sem humor: – Não. Vamos. – e começou a andar, me levando com ele.

Os dois guardas se entreolharam e depois nos seguiram sem dizer nada. Nós saímos das adegas, e a luz forte dos amplos salões do palácio me cegou momentaneamente. Eu oscilei, mas Thranduil me segurou e continuou andando rápido e com determinação. Ele parecia nervoso. Eu podia ouvir sua respiração se acelerando conforme nos aproximávamos da sala do trono.

– Saquem suas espadas. – ele ordenou. – Pode ser que tenhamos alguma comoção aqui.

Enfim, nós nos vimos parados diante das portas do rei, que estavam fechadas. Um guarda estava parado à porta e pareceu surpreso ao ver Thranduil.

– Alteza? – ele olhava do seu pai para mim, e de mim para os guardas armados atrás de nós.

– Estamos aqui para nos colocarmos diante do rei. Syndel e eu.

– Meu senhor Oropher havia ordenado que apenas a prision...

Não há nenhum prisioneiro aqui. Faça como eu digo.

– Mas... Alteza... Eu nã...

– Se você não vai nos anunciar, então eu o farei. – dizendo isso, Thranduil empurrou o guarda para o lado e escancarou as portas da sala do trono com um chute. Eu estava apavorada, pensando que ele tivesse enlouquecido.

Lá dentro, um Oropher surpreso estava sentado com toda a majestade em seu grande trono de madeira entalhada. Ele pareceu chocado ao nos ver, mas logo ficou lívido de fúria, e eu observei enquanto ele trincava os dentes. Seus olhos azuis pareciam querer nos perfurar como flechas. Mas ele não estava sozinho. Além dos guardas que sempre ficavam ali e da rainha, havia dois convidados, sentados em poltronas que haviam sido postas uma de cada lado dos tronos reais. Eu os reconheci de um tempo distante, quando eu ainda era criança. Eles haviam estado presentes na festa de celebração do nascimento do príncipe.

– Mestre Elrond, Lady Arwen... – Thranduil fez uma leve reverência e eu o acompanhei, um pouco atrasada. Ele logo se reergueu, mas eu permaneci abaixada por mais alguns longos segundos. Quando ergui a cabeça, Mestre Elrond nos olhava com serenidade e Lady Arwen, com benevolência. Oropher, porém, parecia emudecido pela fúria. – Mandou chamar-nos, meu senhor?

Por alguns instantes de tensão, ninguém se moveu. Então Oropher falou, com uma calma fingida:

– Eu pensei ter ordenado a meus guardas que me trouxessem minha prisioneira... E no entanto eles vêm a mim de armas em punho, seguindo meu filho que a traz pela mão. O que significa isso?

– Perdão, senhor, mas eu acredito que está havendo um erro aqui. Não há prisioneira neste reino.

O rei apenas ergueu uma sobrancelha e não disse nada por um tempo. Depois, ele lentamente acenou com a cabeça, e de repente dois guardas estavam em cima de Thranduil. Alassëa e Airetauri tentaram lutar contra eles, mas foram impedidos por guardas que, do alto, apontavam flechas para todos nós. Eu não os havia notado antes, e nem Thranduil. Quando ele os viu, parou de resistir, por medo de que atirassem em mim ou nos outros dois, e lançou um olhar fulminante para o pai. Eu permaneci imóvel, mal respirando.

– Você realmente pensou que eu ia tolerar isso, Thranduil? – ele estalou os dedos e apontou para mim. Pela visão periférica, eu vi quando uma guarda se aproximou e não tentei resistir quando ela amarrou meus pulsos. Só quando ela se afastou, percebi que era minha mãe. Ela não olhou para mim em nenhum momento.

Procurei, e logo encontrei meu pai, parado ao lado dela. Ao contrário dela, ele olhava diretamente, fixamente para mim. Em seus olhos estavam estampadas a vergonha e uma pergunta: “Por que, minha filha?” Não consegui suportar aquilo e desviei o olhar, mas ainda podia sentir seus olhos em mim. Olhei para Oropher. Ele fez uma cara de desprezo e falou, aumentando o tom de voz:

Syndel Luz-lunar! Aproxime-se.

Eu olhei para Thranduil, mas dois guardas fortes o seguravam. Não havia nada que ele pudesse fazer, e nem eu. Então, eu obedeci. Tendo alguma dificuldade para me equilibrar com as mãos amarradas e as pernas fracas, eu cambaleei até ficar bem em frente ao trono.

– Ajoelhe-se.

Eu obedeci, trêmula. Ergui os olhos. De cima do trono, Oropher parecia um Vala* em sua majestade. A rainha não olhava para mim; tinha os olhos em algum ponto mais adiante. Provavelmente olhava para Thranduil.

Observei enquanto o rei desceu do trono e lentamente caminhou até parar à minha frente. Bem devagar, ele pôs os dedos sob meu queixo e ergueu meu rosto, fazendo-me olhar para ele. Sem escolhas, eu encarei aqueles olhos azuis que para mim pareceram muito mais frios e intimidadores que os do filho dele. Ficamos assim por alguns instantes, e eu vi como se fosse em câmera lenta quando ele ergueu a mão aberta.

Fechei os olhos, esperando pelo impacto que não veio. Houve apenas aquele barulho alto e forte. Eu abri os olhos imediatamente, e Thranduil estava lutando com um grupo de guardas. Em seu rosto, os dedos do rei estavam marcados em vermelho.

– Basta! – foi a rainha quem gritou, num tom agudo e um tanto histérico. Os guardas pararam imediatamente e Thranduil se desvencilhou dos braços deles, correndo para se colocar entre mim e o pai. – Meu senhor, eu tenho certeza de que nós podemos resolver isso de forma civilizada. – ela se aproximou e pôs as mãos nos ombros do marido delicadamente. Depois, sussurrou alguma coisa no ouvido dele.

Oropher olhou brevemente para a esposa, e depois para Thranduil, que estava parado à minha frente. Por fim, disse:

– Tem razão, minha querida. – ele se voltou para Mestre Elrond. – Perdoe-nos por esta cena lamentável, meu caro. Estamos passando por um momento delicado.

O elfo de sobrancelhas arqueadas olhou para Thranduil e depois para mim, antes de responder:

– Eu entendo perfeitamente, meu senhor.

De repente, senti que alguém me observava e olhei naquela direção. Era Lady Arwen, que olhava para mim com interesse. Seus grandes olhos verde-água estavam cheios de uma curiosidade quase infantil, como a de uma criança que vê algo bonito que lhe prende a atenção. Ela não parecia com raiva nem ressentida de qualquer forma, mas simplesmente intrigada a meu respeito.

Oropher e a rainha se sentaram novamente em seus tronos, e o rei deu ordens para que os guardas voltassem a seus lugares. Thranduil me ajudou a me levantar e ficou com o braço em minha cintura, me apoiando. Eu ainda me sentia terrivelmente fraca.

– Eu acredito... – Oropher recomeçou. –... que não preciso lembrá-lo, Thranduil, meu filho, da dívida de nossa casa à casa de Mestre Elrond.

– Eu me recuso a conversar enquanto Syndel permanecer amarrada, meu senhor. – o tom dele era de desafio.

Oropher trincou os dentes, mas fez um sinal com a mão. Imediatamente, meu pai se adiantou e me desamarrou.

– Você não tem nada a dizer a Mestre Elrond, Thranduil?

Seu pai olhou para mim antes de responder, Legolas, e eu confirmei com a cabeça que estava bem. Ele ia abrir a boca para falar, então, quando minha mãe se pronunciou:

– Se ele não tiver, eu tenho! Perdão, senhor, mas se permite... – ela falava muito rápido, num tom choroso que dificultava a compreensão de suas palavras. – Eu não sei o que Mestre Elrond e sua honrada filha fazem aqui, mas eu gostaria de pedir, de implorar o perdão para a minha família. O que Syndel fez é uma vergonh...

Calada! – Oropher cuspiu. – Não lhe foi dada a palavra!

Um silêncio constrangido tomou conta da sala do trono enquanto minha mãe caía num choro compulsivo e meu pai tentava acalmá-la. Ver aquilo doeu. Muito. Por fim, Thranduil começou:

– Eu estou ciente da aliança entre a minha casa e a sua, Mestre Elrond. – ele fez uma reverência. – E peço perdão se minhas ações recentes a desonraram. Nunca foi minha intenção faltar-lhe com o respeito de forma alguma, mas sou um desesperado. Sei do meu compromisso com a honrada Lady Arwen... – ele se curvou brevemente na direção dela, que lhe correspondeu docemente com a cabeça. –..., mas tal compromisso não foi firmado por mim. Eu era apenas recém-nascido quando o senhor e Oropher, meu pai, fizeram o acordo que decidiu o meu destino e o destino de nossos reinos. E embora Lady Arwen seja uma das damas mais belas e respeitáveis a caminharem por Arda**, eu não desejo casar-me com ela. Não seria digno, respeitoso nem justo, posto que meu coração sempre pertencerá a outra, até o fim dos tempos. Lady Arwen merece casar-se com um elfo honrado e que a ame incondicionalmente e que possa com todo o coração cantar a beleza dela por toda a Terra-Média, até o fim de seus dias. – Thranduil então se ajoelhou, apoiou o braço sobre o joelho, abaixou a cabeça e assim permaneceu, em submissão a Mestre Elrond e Lady Arwen.

Fez-se outro momento de silêncio enquanto Mestre Elrond ponderava aquelas palavras. Enfim, ele falou:

– Eu compreendo suas palavras, jovem Thranduil, e agradeço o respeito e os elogios à minha filha e a mim. – ele fez sinal para que seu pai se levantasse, e ele o fez. – Mas eu acredito que temos um problema a ser discutido aqui, neste caso.

– Mais uma vez, senhor, em nome de Greenwoods, eu peço seu perdão. E implorarei, se necessário for.

– Não é necessário implorar, meu jovem. Suas atitudes já foram perdoadas, em consideração aos longos séculos de amizade entre Greenwoods e Valfenda.

– Obrigado. – Thranduil se curvou novamente.

– No entanto... – Mestre Elrond levantou a mão. – Não me agradam nem um pouco os rumos que esta aliança está tomando. Não desejo liberá-lo de seu compromisso para com minha casa, nem me sinto de forma alguma inclinado a fazê-lo. Eu peço, majestade, por alguns momentos para que possamos refletir e deliberar a respeito, o senhor, eu e sua honrada esposa.

– Perfeitamente. – Oropher respondeu, e pela primeira vez eu pude ouvir o nervosismo em sua voz. – Thranduil, acompanhe Lady Arwen e aguardem na sala de visitas. – seu pai segurou minha mão, quase automaticamente. – Pode levá-la com você. – o rei nem tentou esconder o desprezo em sua voz ao se referir a mim, mas provavelmente permitiu que eu permanecesse com Thranduil por medo de que ele aprontasse mais uma cena, naquele momento tão delicado.

Thranduil se curvou mais uma vez:

– Obrigado. Eu só gostaria de lhe pedir, Mestre Elrond, que por favor pense com cuidado nas minhas palavras, em tudo o que eu disse. Eu só desejo o melhor, não apenas para mim, mas acima de tudo para Lady Arwen, por quem sempre tive muito respeito e afeto.

– Pode ter certeza, jovem Thranduil. Tudo o que me disse será levado em consideração e cuidadosamente ponderado.

– Obrigado.

Thranduil se adiantou e, com uma breve reverência, estendeu a mão direita para Lady Arwen, que pousou delicadamente a mão na dele, deixando-se conduzir. Eu, que ainda segurava a mão esquerda de dele, os segui em silêncio.

Seu pai nos levou por aquele longo corredor até a sala de visitas principal. Eu nunca havia estado ali antes, e teria ficando encantada com a bela decoração e os belos móveis, se não estivesse tão nervosa. Lady Arwen se dirigiu a um dos assentos e se sentou graciosamente. Thranduil e eu nos sentamos em outro, à frente dela, e não dissemos nada. Ele me abraçou, passando o braço sobre os meus ombros, e eu me aconcheguei a ele como um animalzinho ferido em busca de proteção.

Tão discretamente quanto possível, fiquei observando Lady Arwen. Ela era a elfa mais linda que eu já havia visto. E havia toda aquela aura em torno dela... Ela não parecia real. Sua presença me intimidava e eu me perguntava se Thranduil realmente não preferiria se casar com ela. Quero dizer, ela era perfeita, e além de tudo era uma princesa. E eu era... Apenas eu. Uma simples elfa da floresta. Eu abracei seu pai com mais força. Bem no fundo, eu temia que a qualquer momento ele percebesse o quanto ela era melhor que eu e decidisse me abandonar.

Até aquele momento, a princesa não olhava para nós e parecia distraída com seus próprios pensamentos. Mas aí ela olhou diretamente para nós, para mim, mais especificamente:

– Eu sinto muito por vocês estarem passando por isso. – seus olhos eram gentis e suas palavras, doces.

– Sou eu quem lhe deve desculpas, princesa... – Thranduil começou, mas ela balançou a cabeça e ele se calou.

– Não, absolutamente, meu senhor. Com todo o respeito, eu também não desejo me casar com o senhor. – ela sorriu de leve para mim, como se tivesse lido meus pensamentos, e eu retribui. – Eu jamais desejaria ser a responsável por oprimir um amor tão profundo e verdadeiro quanto o vosso. E mais do que isso... – ela franziu as sobrancelhas, e mesmo isso não afetou em nada sua beleza. – Mais do que isso... Eu posso não ter o dom da visão de meu pai, mas eu posso sentir... Posso sentir que não estamos destinados um ao outro, meu senhor. Vocês... – ela sorriu, trocando o pronome de tratamento. – Vocês se pertencem. Eternamente.

Thranduil olhou para mim e sorriu, parecendo infinitamente feliz. Eu estava um pouco assustada com tudo aquilo, mas sorri de volta.

– E quanto a você? – perguntei, timidamente. – Quero dizer, e quanto à senhora?

– Eu? – ela sorriu levemente. – Eu sei que meu marido ainda me espera em algum lugar no futuro. Talvez não nesta era, talvez ainda longe... Mas eu não me importo em esperar por ele. Esperarei mais dez mil anos se for necessário. Porque eu sei que quando eu encontrá-lo, eu irei amá-lo incondicionalmente, e toda a espera valerá a pena. – os olhos dela brilhavam ao falar, e eu pude ver que ela já amava esse alguém sem nome que esperava encontrar no futuro. Era como se ela já o conhecesse. E eu não tive mais medo, pois soube que ela só aceitaria esse alguém, e nenhum outro. Ela já pertencia a ele, assim como eu pertenceria para sempre a Thranduil.

Legolas fez uma pausa em sua narrativa e olhou para Aragorn, que lhe sorriu um tanto embaraçado. Frodo assistiu a tudo e sorriu também, compreendendo o que aquela troca de olhares significava. Boromir deu um muxoxo, como se dissesse “Me poupe dessa história melosa”, e Aragorn olhou para ele pelo canto dos olhos, se divertindo com a contrariedade dele. Gandalf continuava pacificamente soprando anéis de fumaça.

“Depois de um breve silêncio, em que Thranduil tinha ficado brincando nervosamente com meu cabelo, Lady Arwen falou novamente:

– O que você vai fazer, Thranduil, filho de Oropher?

– Hnm?

– Se o rei se recusar a aceitar seu casamento com Lady Syndel... – ela sorriu ao perceber meu espanto ao ser chamada de “Lady” –... ainda que meu pai o libere de seu compromisso?

Thranduil pensou um pouco.

– Eu acho que terei de renegar o meu reino. E partirei daqui com Syndel, com ou sem a permissão dele. – ele fez uma breve pausa, e eu senti seu coração se acelerando em seu peito. – Ele pode ser o meu rei, mas não pode mandar no meu coração.

Lady Arwen assentiu e se levantou bruscamente.

– Muito bem, basta.

– Minha senhora...?

– Eu vou pôr um fim nisto. – ela se dirigiu à porta, mas parou e olhou para trás. – Rei algum pode separar o que o destino uniu. – dizendo isso, ela correu pelo corredor em direção à sala do trono.