P.O.V – KangIn on

Tomei rapidamente o pulso direito do mais novo, para ter certeza que seu coração ainda batia. Embora fraco, consegui senti-lo, mas a velocidade com que o sangue bombeava, era rápida demais em comparação a força. Aquilo não era bom. Ignorei o desesperado do hyung ao meu lado e espreitei os olhos para o corpo de Siwon. Posso garantir que nenhuma máquina de raio-X consegue ser tão boa quanto eu. Minha visão borbulhou de uma forma prazerosa, enquanto meus olhos ganham uma tonalidade diferente. Penetrei com os olhos seus tecidos e rapidamente eu conseguia ter uma visão clara dos seus órgãos. O pulmão esquerdo estava claramente ferido e se erguia de ar e um pouco de sangue. Aquilo não era bom, pensei novamente piscando os olhos diversas vezes para que minha visão voltasse ao normal.

– Siwon – chamou o Cinderela se desesperando – Por favor Siwon – disse agitando ao maknae com calma, mas vivacidade – Você não pode nos deixar agora! Abra os olhos – pediu ele mais uma vez, com os olhos lagrimejando. Diante daquela cena dramática, apenas o orientei que levantasse um pouco a caixa torácica de Siwon e embora abatido, o mais velho fez o que eu pedi, mas então ele pousou seus olhos úmidos em minha face e pediu com seu tom autoritário – Leve-o para o Leeteuk.

Eu rasgava a manga comprida da minha camiseta escura quando ouvi aquele pedido absurdo.

– O que? - perguntei contrariado – Você sabe a quanto tempo estou sem beber e a quantos quilômetros estamos de casa? - questionei sentindo a brisa fria atingir minha face. O sol desaparecia completamente no horizonte, sobrando apenas a penumbra do escurecer.

– Não podemos deixar o Siwon aqui – retrucou a Cinderela.

– Aish – soltei olhando para os lados encabulado. Embora Siwon tivesse perdido a coinsciência e ainda sangrava pelo local do ferimento, eu ainda podia sentir seu pulso, mas levá-lo até o líder, seria muito demorado e minha sobriedade, atrapalhava e muito em tal ato. Sorvendo o ar com força para os pulmãos, dobrei o tecido que a pouco fazia parte da minha roupa e repousei sobre o ferimento para evitar a entrada excessiva de ar, até que eu havia aprendido algumas coisas com o Leeteuk. Pressionando suavemente o local do ferimento, me levantei decidido – Coloque-o em minhas costas – ordenei sério para o mais velho.

– Vai levá-lo ao Leeteuk? - perguntou o Cinderela repousando o corpo do mais novo sobre a grama e também se levantando, para só então esticar a palma da mão direita para Siwon. No estado em que o maknae se encontrava, era melhor movimentá-lo pela telecinese do que com os braços.

Apenas para facilitar para o mais velho, me coloquei de costas e fiz uma careta ao sentir o peso de Siwon. O que aquele menino andava comendo? Chumbo? Piadinha sem graça, eu sei. Agarrei fortemente as cochas de Siwon para que ele não caísse, mas seus braços estavam soltos em volta do meu pescoço e isso me preocupava.

– Vou levá-lo para a última cidade por qual passamos, nos encontre lá – avisei a Cinderela sério e me concentrei nos braços do mais novo. Usando da telecinese, entrelacei seus braços em volta do meu pescoço e ignorei ao protesto do mais velho, me mandando ir para casa, não daria tempo.

Então simplesmente sai correndo o mais rápido que eu podia sem me desconcentrar dos braços de Siwon. Se eu perdesse o controle, ele poderia se machucar mais ainda. Eu tinha que ser objetivo. As árvores entediantes que eu encarava até a pouco tempo atrás, passando zumbindo pelos meus olhos. O vento tomando conta dos meus fios curtos, me extasiavam e a sensação de libertade, era a melhor coisa do mundo. Eu podia ir a qualquer lugar, no horário que eu quisesse, mas havia algo de muitos quilos pesando nas minhas costas, que faziam-me voltar a realidade. Embora estivemos em alta velocidade, meu corpo cortava o vento sozinho, facilitando no carregamento do mais novo e segundos depois estavamos na cidade. Aquele percurso de carro, demoraria minutos, mas eu estava empenhado o bastante para conseguir aquela façanha. Na entrada da cidade, olhei em volta buscando com os olhos um hospital. Por menor que a cidade fosse, não tinha como não haver um pronto-socorro e ajeitando Siwon nas costas, voltei a correr com ele pela cidade, deixando para trás, apenas o vento. Quando finalmente encontrei um hospital, não me preocupei em saber se era público ou particular, simplesmente parei de correr e entrei aos berros no local.

– Homem ferido, homem ferido – disse algumas vezes atraindo a atenção para mim.

Primeiramente fui repreendido pela recepcionista, mas logo um grupo de enfermeiros veio ajudar e pude finalmente soltar os braços de Siwon que me sufocavam em um aperto forte. Ao notar o estado do paciente, os homens de verde claro saíram com ele na cadeira de rodas, indo provavelmente para a sala de cirurgia. Vendo que o mais novo seria bem cuidado, me joguei em uma das cadeiras azuis da sala de espera e fiquei por ali absorto em meus pensamentos até que o hyung afemidado chegasse.

– Como o Siwon está? - perguntou ele caminhando afobado em minha direção.

– Bem... - respondi simplesmente. Embora eu não quisesse admitir, aquela corrida havia me cansado, eu sentia meu coração pulsar intensamente no meu peito e olha que eu tivera um bom tempo de descanso, mas passado a adrenalina, me restava a falta de ar e indisposição.

– Onde ele está? - perguntou o hyung me espreitando com seus olhos vermelhos e inchados, ele com toda a certeza devia ter chorado o percurso inteiro e de certa forma, seu abatimento era satisfatório. Eu sei, pareço um monstro dizendo isso, mas são os meus sentimentos tudo bem? Não posso lutar contra eles.

– Está sendo muito bem cuidado Cinderela, então sente-se e espere - disse em tom grave, arqueando levemente uma sobrancelha para ele.

Em resposta, ele me espreitou mais ainda com os olhos, mas não ousou me obedecer. Ele simplesmente deu de ombros e meteu a mão esquerda no bolso do jeans à procura de algo. Antes que ele desaparecesse na entrada do hospital, reconheci seu celular deixando o bolso. Ele ligaria para o líder ou quem sabe para o seu cabeleireiro, não sei ao certo o que se passa na cabeça de um ser afemidado. Alguns instantes depois e ele voltou reclamando, dizendo que o sinal era muito ruim e que não conseguirá falar com o líder. Embora achesse que fosse realmente uma boa falar com o Leeteuk, não dei muita importância ao fato, apenas tentei me concentrar em ignorar a presença da Cinderela na mesma sala que eu.

Depois de algum tempo de espera veio a notícia de que Siwon passava bem, que o sangramento havia sido contido e o ferimento havia sido fechado, mas havia ar no pulmão esquerdo e por isso ele teria que fazer uma radiografia para depois colocar o dreno no tórax. Sem ter muitas opções, apenas concordamos e permanecemos no hospital sem poder vê-lo durante o resto do anoitecer. Apenas duas horas depois que fomos liberados para visitá-lo na enfermaria. Entre dois ossos de sua costela esquerda, estava fixado um tubo de látex conectado a um frasco coletor de ar. Um mecanismo muito estranho. Heechul entrou primeiro com um doce sorriso adornando-lhe os lábios e eu entrei logo após, com a cabeça baixa e uma careta na face. Às vezes eu me sentia tão deslocado dentro daquele quarteto, que chegava a ser incomodo estar no mesmo cômodo que eles.

– Como você está dongsaeng? – perguntou o hyung com sua voz mansa e preocupada.

– Já estive melhor – respondeu o maknae musculoso entortando os lábios e passando os olhos sutilmente pelo tubo.

– É bom que esteja bem – comentei expressando um sorriso torto e enterrei as mãos nos bolsos da minha calça, enquanto recebia um fraco sorriso do maior.

– Vou pedir que seja transferido para Seoul – disse o hyung seguindo de volta para a porta.

Siwon não respondeu e eu preferi não me intrometer. Livre da Cinderela, me aproximei do mais novo com animação. Eu não havia mentido em minhas palavras.

P.O.V – KangIn off


P.O.V – Pedro on

Acordei sentindo o calor do sol na minha face. Gentilmente ele brincava com a minha pele e fui estimulado a abrir os olhos. Piscando com as pálpebras, procurei pelo líder ainda com a visão embaçada, mas ele simplesmente havia desaparecido. Franzi o cenho em uma carranca irritada no mesmo instante, então ele havia me abandonado durante a noite? Pensei que ele se preocupasse comigo. Ainda irritado com aquele abandono e fazendo um enorme bico com o lábio inferior, me esgueirei até a ponta da cama e toquei suavemente o tapete com a ponta dos pés. Sua temperatura era agradável e com o cabelo todo bagunçado, segui para o banheiro.

Depois de minha higiene matinal, percebi o quão silenciosa estava o sobrado. Não havia absolutamente nenhum som. Era o puro e simples silêncio. Estranhando aquela calmaria, segui para o quarto do Leeteuk e abriu a porta cautelosamente, esperando encontrá-lo dormindo, mas tudo que havia era sua cama bagunçada. Coçando levemente minha cabeleira castanha que fiz questão de deixar na bagunça que estava, desci para o andar de baixo, pisando pesadamente nos degraus para chamar a atenção e acabar com o silêncio. Cheguei à sala, mas também não havia nada. A cozinha, a sala de jantar, o banheiro, o quarto do tio KangIn, a varanda, tudo estava no mais suspeito silêncio.

Parado no meio da varanda, olhei floresta adentro e percebi o quão macabra ela parecia. Embora fosse manhã e o sol brilhasse intensamente dando um belo ‘bom dia’, a floresta estava escura e soltava uma neblina sombria. Senti meu coração acelerar e a garganta ficar seca, o que estava acontecendo? Dei meia volta bruscamente, buscando o aconchego da minha cama, mas trombei em uma coisa alta e esguia que estava exatamente na passagem entreaberta da porta. Recuei alguns passos e notei que subitamente o céu ganhou uma coloração arroxeada e a coisa na qualquer eu havia trombado, se tratava de um homem alto e vestido negro da cabeça aos pés.

Seu cabelo conseguia ser mais comprido que o de Heechul e sua face estava escondida na sombra de seu enorme chapéu negro, mas eu conseguia sentir seu olhar frio na minha face e seu sorriso doentio direcionado a mim. Recuei mais alguns passos vendo aquela figura alta de sobretudo negro e tropecei sem quebrar nas escadas, caindo de costas no gramado. Sentia a dor do impacto soltando um baixo grunhido de dor, mas nada foi mais aterrador do que a voz daquele homem.

– Você não pode fugir Pedro – disse ele com sua voz rouca e maquiavélica erguendo levemente a cabeça, permitindo-me fitar de relance metade de sua face direita que era composta com uma gigantesca cicatriz. Seu olho direito era tomado em um branco estranho e leitoso.

Sua risada sádica tomou conta do ambiente, se tornando tão estridente a ponto de ser obrigado a tampar aos ouvidos com ambas as mãos, mas isso calou sua risada em segundos, transformando sua face em um poço de amargura e frieza. Sua mão direita calçada em uma luva de couro negro se esticou para mim espalmada e com um movimento rápido, ele me afastou do chão, me deixando flutuar no ar. Aquela sensação de vôo era estranha e inacreditável, mas não tive tempo de apreciá-la, pois meu corpo foi brutalmente arremessado para a floresta. Choquei-me contra uma árvore e instantaneamente senti meu braço direito explodir em dor. Meu corpo afundou com força para chão, fazendo-me sentir mais dor ainda. A neblina macabra que devia ser apenas uma fumaça, se solificava a minha volta, puxando meu corpo para si. Fechei os olhos desesperado, soltando um grunhido baixo e tentando afastar com os braços a neblina fria que tomava conta do meu corpo, mas quando abri os olhos gritando pelo medo, eu não estava mais na floresta.

– Você está bem? – perguntou o líder tocando o meu braço direito suavemente, como se estivesse me agitando para que eu acordasse.

Sua voz e imagem me traziam conforto e sem hesitar, me aninhei ao seu peitoral. Ainda tomado pelo torpor do momento, ele demorou alguns segundos para tocar minhas costas, mas quando o fez, me apertei mais ainda junto ao seu peitoral, buscando a proteção que ele representava. Delicadamente ele tocou meus cabelos, alisando-os daquela forma paternal e preocupada e perguntou em tom calmo.

– Você estava tendo outro pesadelo?

Não quis responder com palavras, apenas agitei a cabeça positivamente sem me mover do meu lugar.

– Tudo bem, eu estou aqui com você. Não a nada que possa ameaçá-lo comigo – disse o líder parando momentaneamente de alisar meus cabelos e me apertando mais ainda em seus braços para dar mais veracidade as suas palavras. Ele não precisava de nada daquilo, mas não recusei a proteção extra.

– Também quero ser abraçado pela manhã – escutei a voz de tio KangIn falar animada, fazendo-me rapidamente soltar do líder e procurá-lo com os olhos.

Ele caminhava calmamente em minha direção com uma garrafa grande de vodka e sentou-se no braço do sofá ao meu lado, exibindo um animado sorriso e bagunçado minhas mechas já bagunçadas. Foi então que eu reparei no local em que estávamos. O cômodo era inteiramente branco com alguns adornos como o sofá em que eu estava e uma mesinha de centro na qual se concentrava diversos tipos de revistas. No sofá ao lado, reconheci a imagem adormecida de Heechul e sorri de canto ao notar Kyuhyun ao lado do mais velho, tentando consertar a câmera daquele menino da praça. Ele parecia mais confiante, mas exibia uma careta confusa, enquanto seguia fielmente um manual que estava sob sua perna esquerda.

– Se eu fosse você, pedia um café da manhã caprichado na conta do hyung, tem cada comida na cantina que... Nossa Senhora, aqui devia virar restaurante – comentou KangIn animado ao meu lado e deu um gole generoso na vodka.

– Onde estamos? – perguntei afagando meus próprios cabelos e bocejei levemente, mas desisti ao sentir o incomodo de estar sem escovar os dentes.

– Em um hospital – disse o Park puxando minha atenção de volta para a sua face – O Siwon se machucou durante a viagem deles e estava sob observação, mas logo ele recebe alta – disse o líder passando os olhos sob o relógio de pulso – De qualquer forma eles vieram para esse hospital e ligaram para me avisar. Como você estava dormindo e eu não podia deixá-lo sozinho, te trouxe comigo, mas se quiser voltar a dormir tudo bem, ainda são sete da manhã, daqui a pouco voltamos para casa.

Apenas entortei os lábios para o líder e me encolhi no sofá, trazendo as pernas para cima do mesmo. Leeteuk movimentou suavemente meus cabelos com a mão direita em meio a um sorriso paternal, no qual ele estava se tornando especialista, e se levantou indo em direção a porta localizada na parede da direita. Só então reparei que ele usava um jaleco branco e a história de Kyuhyun veio a minha mente. Não estávamos em um hospital qualquer, estávamos no hospital do líder. Fiquei curioso em conhecê-lo, mas minutos depois, Simão recebeu alta e fomos direto para o estacionamento.

Seguimos em dois carros para um enorme prédio no centro movimentado da cidade. Aquele prédio não se comparava a nada que eu tivesse visto antes. Ele era completamente diferente e magnífico, como uma fortaleza da nobreza, e quem morava naquele gigantesco prédio branco com quatro enormes faixas, duas vermelhas e duas cinzas? Heechul. Para mim todos eles moravam juntos, mas pelo jeito, eu estava enganado. Fomos os seis no elevador sofisticado e enquanto subíamos, eu e Kyu ficamos fazendo caretas para o espelho. Aquilo sim era um exagero de espelho e o nerd precisava descansar um pouco de ficar tentando consertar uma câmera sem conserto.

O apartamento de Heechul era igualmente luxuoso, com móveis modernos e de cores variadas, mas em especial combinando com a fachada do prédio. Ainda sendo a companhia de Kyuhyun, notei quando Simão se dispersou para o enorme sofá vermelho. Chegava a ser doloroso aos olhos, a intensidade da cor do móvel, mas ignorei pela harmonia que ele formava com os outros móveis de tons claros e fui em direção ao mais velho. Sentei timidamente ao seu lado e fitei a mesa de centro, que era feita de madeira clara e vidro.

– Tudo bem com você Simão? – perguntei passando os olhos rapidamente por sua face, mas voltando a fitar a mesa, fingindo pouco interesse.

– Por que o interesse? – perguntou o mais velho friamente, mas não se esqueceu de completar – E meu nome não é Simão.

– Ok Simon, não errarei mais seu nome – respondi também dando um toque de frieza em meu tom e notei com o canto dos olhos, que ele revirou os seus.

– Tio Siwon, conserte isso para mim – pediu Kyu esticando a câmera profissional para o mais velho, fazendo-me soltar sem querer, um sorriso maroto. Seria divertido quebrá-la de novo, mas por enquanto eu me concentraria em ser um bom menino.

Com uma carranca entediada, Simon pediu que Kyu distribuísse as peças sobre a mesinha de centro. Esperei que ele sentasse a beira do sofá e se inclinasse sobre a mesa, para buscar algo de mais útil para observar. No outro sofá de cor berrante, estava tio KangIn e sua garrafa de vodka. Leeteuk e Heechul haviam desaparecido em outro cômodo, mas não me preocupei em procurá-los. Pouco depois, eles nos chamaram para o café da manhã e para a felicidade de Kyu, a câmera havia sido perfeitamente consertada por Siwon.

– Mas como eles sabiam que vocês iam para o instituto? – escutei o líder perguntar, assim que entrei na cozinha, que seguia a mesma linha da luxuosa sala.

– Quem comanda aquele grupo devia saber da minha ligação com o instituto e isso o que me preocupa. Nós dois somos pessoas públicas, não podemos nos dar o luxo de sermos reconhecidos por incomuns revoltosos – devolveu Heechul passando delicadamente geléia em sua torrada.

– Mas por que alguém teria tanto interesse no Pedro? – perguntou o Leeteuk fazendo-me prestar mais atenção as suas palavras, agora eu havia virado o assunto – Tudo bem que ele é um diferente, mas sem ao menos saber os poderes dele... Isso não faz sentido.

– Você devia ir ao instituto verificar o estado dele, aquelas paredes embora abandonas, devem ter tantas histórias para contar... – disse Heechul deixando suas palavras voarem soltas pelo ar – Mas temos que nos focar no treinamento do Donghae, se ele continuar nesse descontrole, daqui a pouco ele irá atravessar andar por andar até chegar ao térreo.

Suas palavras me causaram um frio na espinha, em momento algum eu havia me lembrado disso. Se meu corpo simplesmente afundasse no piso, seriam inúmeros andares até que eu chegasse a uma base realmente sólida. Tentei me esquecer disso o mais rápido que eu podia. Havia algumas conversas paralelas pairando sobre a mesa, mas apenas uma me interessou.

– Não podemos nos esquecer do jantar beneficente de sexta-feira – avisou Heechul ao líder, que simplesmente fez uma careta cansada, pousando seus olhos cabisbaixos na mesa de vidro e deixando a boca semi-aberta, para que um suspiro lhe escapasse.

– Não quero ir.

– Me leva junto tio Heechul – pediu Kyu, que até pouco tempo atrás conversava com tio KangIn, pelo jeito eu não era o único interessado em conversa alheia. Ajeitei-me em minha banqueta alta e mordiquei meu enorme baguete repleto de geléia de morango. A variedade de comidas sobre a mesa de Heechul era tão grande, que minha barriga estava dilatada.

– E por que eu o levaria? – retrucou o mais velho friamente.

– Porque conhecendo-os como eu os conheço, creio que não deixaram o Pedro sozinho com o tio KangIn ou o tio Siwon, então nada melhor que levar a todos, e inclusive a mim, que posso fazer companhia ao Pedro. E pense bem tio Heechul, o senhor poderá invejar o seu doce afilhado para os seus amigos – fiz uma careta no momento em que Kyu disse a palavra ‘afilhado’ acompanhado de um passar de olhos sobre a minha face. De mãe Heechul ia ser promovido a padrinho.

– Até que não é má idéia – comentou o líder passando os olhos por mim.

– Mas antes, vamos dar um jeito nesse cabelo – completou Heechul rapidamente.

Larguei o pão sobre a mesa no mesmo instante, levando a mão cheia de farelo e um pouco de geléia para a cabeça. Ninguém ia tocar no meu cabelo. Depois que eu, o líder e KangIn voltamos para a casa do Park, tomei um banho demorado e fui assistir televisão, mas eu mal havia me esparramado no sofá e o Park parou atrás de mim e me mandou me levantar.

– Por quê? – perguntei sem fazer menção de me levantar.

– Vamos treinar um pouco – respondeu ele soltando um sorriso malicioso.

Eu sentia que ia apanhar. Demonstrando preguiça, me ergui do sofá e segui com o líder para o gramado. Enquanto descia os poucos degraus da varanda, prestei atenção na floresta de fundo. Ela não era nada sombria como no meu sonho, na verdade, ela era bem verde e interminável. Até onde a visão alcançava, eu conseguia ver o aglomerado de troncos. Parei defronte com o líder no gramado e observei tio KangIn com o canto dos olhos. Como um bom telespectador, ele já estava sentado na cadeira de balanço e se movia lentamente entretido com o jornal ou pelo menos fingia lê-lo.

– Primeiramente devo dizer que sei muito bem do que você é capaz, assim como você sabe o meu nível de seriedade, então sem gracinhas, ou... – bruscamente ele ergueu a palma da mão esquerda para a varanda e o taco de madeira que ele havia usado para me espancar no outro dia, voou velozmente para si. Recuei lentamente afagando aos braços – Que bom que estamos entendidos – completou ele com um sorriso cínico, apoiando o taco no ombro esquerdo, para onde havia ido todo o seu instinto paternal? – Vamos começar com um exercício simples, quando o Siwon estiver aqui ele treinará sua intangibilidade, mas enquanto, vamos nos focar na telecinese.

– Isso me deixa menos preocupado – respondi rapidamente arrancando um sorriso de tio KangIn, mas recebendo um espreitar de olhos do líder.

Leeteuk pigarreou alto e mudou o taco de madeira de mão, o apoiando no ombro direito.

– Movimentar as coisas você já se tornou mestre, mas parar as coisas no ar que é sua dificuldade, então vamos treinar isso de forma sutil. Não deixe cair – avisou o líder girando o taco agilmente na mão e o lançou em minha direção com força, acertando minha testa em cheio – Por Deus Pedro! – resmungou o líder enquanto eu fazia uma careta de dor. Protegi o local do impacto com a palma da mão esquerda, curvando um pouco as costas, mas fui ordenado que voltasse a posição inicial – Uma coisa em domínio do ar, não significa que não pode ser controlado por você – disse ele sério e puxou o taco de volta para a mão esquerda, enquanto eu ainda sentia minha testa arder – Vamos de novo, mas com algo menor - enterrando a mão direita no bolso do jeans, ele puxou o molho de chaves falso e sorriu para mim o agitando lentamente - Só avisando, você não pode o tocar e cada vez que o fizer ou o molho de chaves tocar o chão, você vai... – ele simplesmente se interrompeu jogando o molho de chaves para mim.

No momento de afobação, não consegui pensar direito e simplesmente estiquei meus braços para pegar o objeto. De primeiro instante, sorri aliviado por ter pego, mas então me arrependi amargamente por tê-lo o feito. Leeteuk atingiu meu antebraço direito com toda a força que ele colocou no taco, arrancando estridente grito de dor. Levei a mão esquerda ao braço, encolhendo sobre ele e me esquecendo do molho de chaves. Aquele momento foi tão intenso, que observei o molho de chave despencar suavemente para o chão em câmera lenta. Cerrando os dentes com força para evitar que mais gritos saíssem sem serem avisados, ainda tentei parar as chaves antes que elas tocassem o solo, mas minha tentativa foi em vão e nos segundos que elas tocaram o chão, dando um pequeno salto pela velocidade, o taco explodiu no meu braço direito fazendo-o latejar.

Que método de ensino era aquele? Me questionei encolhendo meu corpo, mas eu não ficaria sofrendo sozinho.