Dois dias depois eu estava deitada na cama de Maxon, completamente “curada” e limpa de veneno assim como ele. Nós dois tivemos que passar por várias horas de desintoxicação no hospital e finalmente estávamos em casa.

Casa era exatamente o que eu sentia quando estava ali. Principalmente na cama dele. No quarto dele. Mas por algum motivo Maxon não estava ao meu lado e por hora, queria ficar ali me permitindo um pouco de descanso. Era começo da manhã, a brisa fria invadia o quarto deixando-o ainda mais agradável, me fazendo pensar que tudo terminou bem. Ou metade bem porque Daniel ainda estava solto por ai e nem mesmo o FBI ou a policia local havia conseguido achá-lo. E mesmo tendo confiança o suficiente em Louis, que era um policial disfarçado esse tempo todo, eu tinha minhas apreensões. Thomas considerou que eu deveria passar por algumas sessões de terapia, que eu precisava conversar sobre meus sentimentos e não guardá-los, mas quem disse que eu estava guardando? Só queria esquecer que tinha um irmão. Só queria esquecer o que ele havia falado e feito comigo, apenas isso.

E realmente tive tempo suficiente para conversar.

Contei tudo o que eu havia passado para todas minhas amigas. Contei sobre And me machucar, contei quando machuquei Adam deixando-as tão orgulhosa e por um instante me permiti sentir orgulho também. Conversei com Louis por longas horas enquanto estava no quarto de hospital, enquanto ele mais uma vez tentava me interrogar de um modo menos formal, o que me deixou mais relaxada. Conversei com Sebastian e Travis contando o que Maxon e eu havíamos passado. Conversei com Aaron e Jamie sobre meus sentimentos e isso foi realmente muito estranho, por que de repente os dois estavam interessados em mim? Mas no final, eis que surgiu a pergunta que os trouxeram até mim, “você acha que eu deveria tentar com Mylena?” Jamie perguntou. “Você acha que Larissa seria capaz de ficar comigo?” perguntou Aaron. Será que eles pensaram sobre tudo o que eu passei para virem me perguntar sobre isso? Mas não, não foi essa minha resposta e sim, tentei de todos os modos encorajá-los. Durantes dois dias no hospital, conversei e deixei transparecer meus sentimentos mas agora, era a hora de esquecê-los.

Eu não sabia ao certo como Maxon estava enfrentando a situação com o irmão mais velho na cidade, com o corpo da mãe servindo de prova. Assim como o corpo da minha. Foi um tanto perturbador saber sobre isso, por isso, está na fila do esquecimento.

Suspirei e me sentei na cama, a dor de cabeça havia passado completamente, meu corpo estava passando por uma grande renovação nos ossos ganhando mais força, mais agilidade. Olhei o relógio sob a cômoda e ainda nem eram dez da manhã. Respirei fundo e levantei, caminhando na ponta dos pés até corredor silencioso, passando rapidamente pela porta do quarto de Aaron – que provavelmente estava com Larissa – e fui em direção a sala.

Maxon estava deitado no sofá encarando a TV com certeza sem prestar atenção no que passava, era um programa culinário. Me aproximei – ainda na ponta dos pés – e sentei no sofá fazendo-o erguer a cabeça para mim, sorrir de lado e se sentar. Nos encaramos por alguns segundos e eu queria perguntar como ele estava, queria abraçá-lo e dizer “chore, meu amor. Tire isso de você” mas não tinha certeza se conseguiria ser forte, provavelmente choraria com ele. Maxon inclinou a cabeça para o lado e me analisou atentamente, era como se não importava quantos minutos se passassem, ele não tinha pressa, ele só queria me observar.

Mas não, eu não conseguiria aguentar muito tempo sem falar com ele.

— Está, tudo bem? – perguntei um pouco nervosa.

— Está. – Maxon respondeu mantendo a posição, o sorriso.

— Jura? – perguntei me aproximando dele. Maxon suspirou e passou uma mão em seus cabelos, jogando-os para trás.

— Estou um pouco cansado, mas estou bem. – ele abriu os braços e me deixou aconchegada em seu peito.

— Quer ir a terapia? – perguntei apertando os braços em volta dele.

— Fala sério, Thomas falou com você? – Maxon perguntou afastando o rosto o suficiente para me encarar. – Não preciso de terapia, estou muito bem.

Droga, ele não parecia bem.

— Maxon. – falei engolindo duro. – Se quiser falar comigo, estou aqui ok? Pode falar. – ele concordou com a cabeça mas não fez menção de que falaria algo e eu sabia que ele estava na defensiva e só poderia ser algo o incomodando. – Sabe, todo mundo aprendeu depois de tudo isso. Eu por exemplo, aprendi que não posso fazer nada sozinha e que, se vocês não me contarem, preciso descobrir com vocês e não com as pessoas que poderiam me fazer mal. – sorri amenizando as palavras e Maxon concordou com a cabeça, ainda sem dizer nada. – E você, todos vocês, aprenderam que não devem esconder nada de mim, porque sou curiosa demais.

Maxon apertou os lábios e me puxou novamente para seus braços.

Sim, estava acontecendo algo.

— Tudo bem, eu não devo esconder nada de você porque mesmo achando que não, você sempre descobre. – ai meu Deus, respirei fundo e esperei. – Daniel conseguiu manter contato comigo.

— O que? – exclamei alto demais, fazendo Maxon levar uma das mãos até minha boca. Ele olhou sob meus ombros, para o corredor e esperou que algum barulho informasse que Aaron – ou Larissa – haviam acordado. O silêncio permaneceu.

— Eu disse que Daniel conseguiu manter contato comigo. – Maxon repetiu em um sussurro. Tirei sua mão da minha boca e o encarei esperando vê-lo sorrir e dizer que era apenas uma brincadeira. Eu poderia muito bem aceitar ser uma brincadeira. Seria muito melhor.

— Como?

— Quando estava no hospital ele me mandou uma mensagem. – Maxon hesitou e respirou profundamente. – Disse que não estava terminado e que viria te procurar.

— Você falou com Thomas? – perguntei já arriscando uma resposta.

— Não posso Karlla, se ele fizer algo com você e nós sabemos que ele é capaz disso, eu não sei o que pode acontecer.

— Você precisa falar com seu irmão, ele vai descobrir aonde Daniel está.

— Não, ele não vai. – Maxon respondeu negando freneticamente com a cabeça, uma dúvida me ocorreu naquele instante. Porque ele tinha tanta certeza disso?

— Maxon, porque está dizendo isso? Você sabe onde ele está? - Maxon negou com a cabeça e desviou seu olhar para o chão, para as paredes e voltou para mim. Ergui uma sobrancelha esperando mais do que um gesto em resposta, eu queria palavras, queria mais do que um simples balançar de cabeça.

— Eu não sei, não faço ideia. Mas enquanto estávamos no hospital, com toda certeza ele estava por perto.

Um frio subiu em minha espinha, meu estômago deu voltas e o jantar da noite passada estava a caminho. Corri para o banheiro e no instante em que levantei a tampa do sanitário, a comida deslizou facilmente para fora. Minhas pernas tremeram, meu coração estava a um passo do ataque cardíaco e eu não poderia acreditar que Daniel estava perto demais. Perto o bastante para ter feito algo. Maxon apareceu na porta do banheiro e ao me ver, enrolou meus cabelos e esfregou minhas costas. Não era possível que Daniel estivesse de volta, quero dizer, ele tinha de ter fugido e para sempre. Por que voltou? Porque? Minha mente estava em um turbilhão de pensamentos até que me lembrei de quando Daniel disse me vigiar na faculdade. Será que ele estava lá? Será que ele esperava que eu fosse esperta ao ponto de deduzir que ele ficaria no meu antigo quarto?

Meu coração acelerou ainda mais e consegui me erguer ignorando os enjoos. Maxon pediu que eu ficasse ali, que ele buscaria remédio em seu quarto mas eu não poderia esperar. Não se Daniel estiver mesmo aonde penso está. Respirei fundo, lavei a boca e passei direto para o corredor, me enrolando em um casaco jogado sobre o balcão e saindo deixando a porta aberta.