Sakura terminou a escola na Primavera e depois partiu com Tomoyo para França. Mais tarde, iriam para a Holanda, depois Bélgica e, talvez, Estados Unidos, a fim de continuarem os seus estudos. Os pais de Tomoyo desfizeram-se em agradecimentos aos pais de Sakura por terem permitido que a filha continuasse a estudar e que conhecesse outros países. O comboio partiu com todos emocionados.

O carro parou junto a um portão de ferro forjado. Do outro lado, podia vislumbrar-se a silhueta de uma casa antiga. Todo o terreno estava cercado por um muro de pedra. Shaoran saiu do carro acompanhado por Sebastian que abriu o portão e ambos entraram. A casa parecia vinda de um livro de Edgar Allan Poe, um escritor de terror cujos livros lhe causavam arrepios. Aproximaram-se da porta que se abriu quase automaticamente.

O hall de entrada estava cheio de teias de aranha e o pó era tão espesso que mal se conseguia ver o chão. Atravessaram-no até um pequeno corredor, igualmente cheio de pó, e chegaram a uma porta de madeira muito parecida com a da entrada mas mais estreita. Sebastian rodou a maçaneta. Do outro lado, estava uma secretária com um amontoado de papéis. Entraram e Sebastian sentou-se na cadeira atrás da secretária, indicando outra em frente a Shaoran.

A luz trémula do candeeiro da secretária projetava as sombras dos papéis na parede fazendo com que parecessem maiores do que realmente eram.

Sebastian pegou numa folha onde apareciam os dados de Shaoran. Olhou para ele e disse:

— Sê bem-vindo ao lar Alfred for Children. O melhor orfanato de Inglaterra para crianças desprotegidas.-

O seu sorriso era tão irónico como o do seu pai. Entregou-lhe a folha para ele assinar e guardar. Depois, saíram do gabinete, passaram novamente pelo corredor até chegarem a um lance de escadas. Subiram. Os degraus rangiam a cada passada. Quando chegaram lá acima, havia outro corredor que os levou até mais uma porta. Do outro lado, ouviam-se murmúrios de criança.

A porta abriu-se. Era uma camarata enorme. Com filas de camas de um lado e do outro. Em todas elas, havia um rapaz de pijama sujo e olhar vazio. Sentiu arrepios quando o olharam. Atravessou a divisão até chegar a uma cama no canto. Sebastian pousou o saco de Shaoran e disse:

— Esta é a tua cama.- Saiu e fechou a porta.

A partir daquele momento, o inferno começou: os outros rapazes desprezavam-no. Tratavam-no como se ele fosse uma aberração. Mas nem ele compreendia porquê. Só queria sair dali.

A sua única noite naquele lugar foi pior que as do hospital. Os pesadelos com o acidente ficaram mais fortes e assustadores. Sentia-se a enlouquecer outra vez. Aquele lugar não era para ele. Tinha de sair dali.

Uma noite, não aguentou mais. Arrumou as coisas á pressa num saco qualquer já que o que trouxera fora desfeito pelos outros rapazes. Depois, levantou-se da cama sem fazer barulho. Abriu a janela, a brisa suave da noite acariciou-lhe o rosto limpando o cheiro fétido e o pó da camarata e daquele lugar horrendo. Pôs as pernas para fora e depois o saco. Fechou a janela atrás de si sem fazer nenhum ruido. Deslizou pelo telhado até ao chão. Saltou o muro e, em poucos segundos, estava na rua.

Depois, começou a sua caminhada em direção à liberdade.

Continua…