Abri a janela e ele não disse nada, apenas me abraçou o que só fez com que eu chorasse mais e mais e mais.
– Agora me conta por que você está assim.
– Você viu. A minha mãe tem um namorado.
– E o que tem demais nisso? - eu respirei fundo. Sentei na cama e ele sentou ao meu lado, sem tirar seus olhos dos meus.
– Já faz um ano... - comecei, mas as palavras simplesmente não saiam. Eu não queria reviver tudo de novo.
– O que aconteceu?
– Eu, meu pai e minha mãe sempre fomos os típicos Três Mosqueteiros, fazíamos tudo juntos e eu era muito apegada aos dois. Principalmente ao meu pai, até que ano passado... - eu dei uma pausa, não sabia se conseguia continuar. Mas Nathan pegou a minha mão forte e eu respirei fundo.
– Vai você consegue.
– No ano passado, teve um acidente. Uma rodovia molhada e um motorista bêbado, meu pai morreu na hora. Eu não sabia como encarar aquilo, nem a minha mãe. Mas prometemos uma a outra que esse ano ia ser diferente.
Nathan me encarava sem saber o que dizer, e eu entendia essa incerteza, é realmente algo que ninguém espera.
– Jessie, eu... é... sinto muito.
– O problema da minha mãe arrumar um namorado é que só faz um ano. Apenas um ano que eu perdi meu pai e ela o marido, mas parece que ela já conseguiu esquecer. - eu recomecei a chorar como uma menininha frágil, afinal era assim que eu me sentia.
– Jessie, eu não posso dizer que sei o que vocês passaram, mas posso tentar entender a sua mãe e você deveria fazer o mesmo.
– Tentar entender?
– Isso mesmo. Sua mãe ainda é nova e no ano que vem você vai embora deixando ela sozinha. Sua mãe quer ter alguém que cuide dela enquanto você estiver fora. Você não acha que depois de tanto sofrer ela não mereça ser feliz? - eu não respondi, tentei assimilar o que ele dizia na minha mente.
– Você acha que eu devo concordar com isso?
– Acho. Se ela estiver feliz, por que você não pode ficar feliz por ela?
– Mas por que ela não me contou?
– Acho que ela achava que você ainda não estava pronta. E definitivamente parece não estar. - eu não respondi. Tentei entender a minha mãe de acordo com o que Nathan dizia.
Fechei os olhos e as lágrimas começaram a rolar livremente, passei o começo todo do ano tentando esquecer o que tinha acontecido ou pelo menos tentar não pensar nisso o tempo todo. Mas agora as imagens do enterro dele apareciam constantemente na minha cabeça. A cena do caixão sendo baixado e a terra o engolindo...
E foi quando eu desabei. Chorei por todos os meses que eu ainda não tinha chorado, chorei de soluçar, eu simplesmente não conseguia parar. Nathan me abraçou e eu enterrei meu rosto na curva do seu pescoço, eu encharquei a camisa dele com as minhas lágrimas.
– Quer que eu fique com você até dormir? - perguntou e eu aceitei sem pensar duas vezes.
Então nós deitamos um de frente para o outro, ele ainda me abraçava e eu chorava. Talvez se fosse em outra situação eu curtisse o seu abraço e carinho, mas não era o momento para isso. Eu ainda estava com a cabeça na curva do seu pescoço, eu agarrava a sua camisa com força. E eu dormi assim, nos braços de Nathan.
>>o
Eu acordei, mas não abri os olhos. Queria entender o porquê de estar me sentindo tão confortável como se estivesse abraçada com alguém e foi esse pensamento que fez a minha mente clarear. Abri os olhos.
Para minha enorme surpresa, Nathan ainda estava lá. Ele ainda dormia, respirava tranquilamente e tinha um sorriso leve nos lábios como se estivesse sonhando com algo bom. Eu não conseguia acreditar que ele ainda estava lá.
Seus braços ainda estavam em volta da minha cintura e eu ainda estava agarrada a sua camisa, a gente quase não tinha se mexido desde que dormimos. Eu não queria me mexer, mas tinha que levantar para pelo menos escovar os dentes.
– Bom dia. - falou Nathan antes que eu pudesse me mexer muito.
– Bom dia. - respondi meio sem jeito.
– Acho que eu acabei dormindo aqui. - eu sorri.
– Eu percebi. - olhei para como estávamos meio constrangida e ele percebeu porque tirou as mãos do meu corpo.
– Como você está? - perguntou.
– Eu estou bem melhor. Obrigada por ficar.
– Foi um prazer, afinal você precisava de mim. - eu sorri e levantei.
– Você espera um minuto? - ele assentiu e eu caminhei para o banheiro. Lavei o rosto, ajeitei o cabelo e escovei os dentes, respirei fundo e saí do quarto.
Nathan estava parado em frente ao espelho, parecia confuso e pensativo, mas sorriu quando me viu.
– Posso usar o banheiro agora?
– Claro.
Enquanto ele estava no banheiro eu troquei de roupa, coloquei um short e moletom, minha roupa de sábado. Eu tentei imaginar a minha mãe entrando no meu quarto e me vendo dormindo com o Nathan, o que será que ela pensaria?
– Jessie? - chamou Nathan que saía do banheiro.
– Olá. - assim que me viu não falou nada, apenas me encarou. - Está tudo bem?
– É... Sim... Você está bonita. - eu pisquei confusa.
– Eu estou usando moletom, nada bonito.
– Eu não estava olhando para o moletom. - sorri sem jeito.
– Então, quer comer alguma coisa?
– Não precisa, acho que eu vou pra casa.
– Ah vai, eu faço um chocolate quente... - ele sorriu.
– Tudo bem, me convenceu.
Descemos as escadas em silêncio, a porta do quarto da minha mãe estava fechada, provavelmente ela ainda estava dormindo. Apontei a mesa para o Nathan enquanto pegava as coisas para fazer o chocolate quente.
– Então, vai conversar com a sua mãe hoje?
– Acho que sim, eu não vou conseguir guardar isso pra mim.
– E você vai julgá-la? - eu demorei pra responder.
– Acho que não. Eu comecei a entende-la um pouco mais.
– Ótimo. Tudo vai ficar bem. - a sua confiança me assustava.
– Espero que sim.
Não nos falamos mais enquanto eu terminava o chocolate quente, fiquei pensando em como contar a Charlotte que eu tinha dormido com o Nathan. No sentido mais inocente da palavra, bem literal. Coloquei as canecas na mesa e peguei alguns biscoitos, um bolo e alguns pãezinhos.
– Você realmente sabe fazer chocolate quente. - falou e eu sorri.
– Obrigada, na verdade é uma das poucas coisa que eu sei fazer.
– Não gosta de cozinhar?
– Não muito, prefiro comer. - ele riu.
– Gosto de cozinhar, mas minha mãe gosta de monopolizar a cozinha.
– Que mãe não gosta?
Rimos um pouco antes do silêncio reinar, bebemos nossa bebida calmamente e eu comi alguns biscoitos recheados, enquanto Nathan destruia o bolo de laranja. Vez ou outra nos encaravamos meio sem graça, afinal tínhamos dormido juntos, não aconteceu nada mas mesmo assim...
– Depois que você conversar com a sua mãe, quer assistir um filme lá em casa?
– Claro. Que horas eu posso ir?
– A hora que quiser.
– Tudo bem. - tínhamos acabado de comer, a nossa caneca estava vazia e as coisas estavam menos estranhas.
– Jessie, você se importa se eu for embora pelo seu quarto? Porque eu não quero entrar pela porta da frente e ter que dar explicações.
– Claro, eu entendo totalmente.
Nathan me seguiu pelas escadas e eu abri a janela pra ele como sempre, só que dessa vez era de manhã. E como sempre, ele se aproximou e beijou a minha bochecha.
– Bom dia, Jessica.
– Bom dia, Nathan.
Antes que pudesse pensar em o que fazer já que ele tinha ido embora, ouvi barulhos na porta do quarto da minha mãe. Respirei fundo, estava na hora de esclarecer algumas coisas.
Mal abri a porta e dei de cara com a minha mãe, pelo jeito ela estava vindo para o meu quarto e para surpresa dela não esperava que eu tivesse acordada.
– Bom dia. - falou ela.
– Bom dia.
– Jessica, eu... é... fui no seu quarto quando cheguei... - eu gelei.
– Ah... hum... sei...
– E o Nathan estava lá.
– Sim, estava. - ela levantou uma sobrancelha.
– Você pode me explicar por que ele estava lá?
– Antes, a gente precisa conversar. - minha mãe pareceu entender a seriedade do assunto porque juntou as sobrancelhas.
– Ah, claro. Vamos pra cozinha. - a primeira coisa que ela viu foram as canecas, ela apontou pra elas com um sorrisinho.
– Nós tomamos chocolate quente.
– Sei... - minha mãe foi fazer o café e eu a esperei calada.
Enquanto ela não sentou com a xícara na mão eu não falei nada, aguardei pacientemente. Era o tipo de assunto que a gente conversa olhando nos olhos.
– Então filha, o que queria falar comigo?
– Com quem você saiu ontem? - fui direto ao ponto, sem enrolação. Nunca tinha visto minha mãe tão sem jeito, ela ficou vermelha na hora e eu esperei a resposta.
– Eu já disse que...
– Mãe, não mente pra mim. Eu vi. Ontem a noite, você saiu de casa com um homem, você o beijou na porta de casa. Eu vi. Um ano, mãe. Apenas um ano. - o rosto dela se transformou em um misto de confusão e surpresa.
– Como você...
– Eu estava voltando pra casa com Nathan e eu vi. Agora você pode, por favor, me falar a verdade? Do começo? - minha mãe encarou a xícara.
– O nome dele é Richard. Richard Corrigan. Nós trabalhamos juntos há muito tempo, nós nos aproximamos no último ano. Ele também é viúvo e foi ótimo conversar com ele, porque ele me entendia. Depois de um tempo eu voltei a me sentir viva e feliz, Jessie, feliz. Eu queria te contar, mas achei que não fosse aceitar, que você fosse gritar e discutir comigo, então resolvi não contar nada por enquanto. Mas as coisas começaram a ficar sérias de verdade e eu estava vendo que estava chegando a hora de te contar.
Eu pensei em gritar com ela, pensei em chamá-la de traíra e sair da cozinha batendo o pé, mas eu olhei para os olhos dela. Eles brilhavam de um jeito que não brilhava a muito tempo e eu percebi que simplesmente não podia tirar isso dela.
– Jessie, por favor, tente entender. Eu não quero terminar sozinha nesse casa, eu não quero que você fique, afinal você tem sonhos e eu não posso impedi-la de realiza-los. Eu te amo, mas eu também quero viver a minha vida. Filha, o seu pai sempre será o grande amor da minha vida, mas a gente pode amar duas vezes, por que não? Os momentos que tive com seu pai jamais serão esquecidos e ele nunca deixará de ser seu pai. - pensei um pouco antes de responder.
– Mãe, eu... Bom, ontem eu fiquei com raiva, gritei e pensei o quanto você estava traindo o papai, até porque era só um ano. Mas eu conversei com o Nathan e ele me fez perceber que você merece ser feliz, já sofreu demais por uma vida inteira. E por isso que ele dormiu aqui, eu comecei a chorar muito e ele se ofereceu para ficar comigo até que eu conseguisse dormir e acabou que ele dormiu também.
– Eu não estava preocupada, eu só quero saber se isso é um sim para Richard?
– Na verdade é um pode ser. - ela abriu um sorriso enorme.
– Você tem que conhecê-lo, e ele tem um filho mais ou menos da sua idade. Você vai adorá-lo.
– O Richard ou o filho? - ela riu.
– Eu espero que os dois.
– Gosto de te ver feliz mãe.
– Eu também.
Não tinha muito mais o que falar, eu via um brilho na minha mãe que me contagiava. Acho que a felicidade faz isso com a gente.
– Então, quando vou conhecer o Mr. Perfect? - ela riu com gosto.
– Ainda não sei, vou conversar com ele. Mas espero que logo.
– Você podia fazer um jantar aqui em casa, quem sabe eu te ajude a cozinhar? - se a minha mãe queria impressionar, era a minha obrigação ajudá-la.
– Tudo bem, só espero que a gente ainda saiba usar as panelas.
– Eu nem sabia que a gente ainda tinha panelas.
– Você é uma filha maravilhosa. - eu sorri.
– Obrigada, você também não é uma mãe de todo ruim.
– E você não é muito boa com elogios.
– Acho que é um dom. - levantei em direção ao meu quarto. Eu queria contar para o Nathan como foi a conversa, acho que depois da última noite seria ótimo acabar tudo bem.
>>o
– Então está tudo bem agora? - perguntou Nathan com um sorriso.
Eu estava no quarto dele, experimentei a árvore pela primeira vez. Sinceramente, não sei como ele conseguia fazer aquilo todas as noites, tive um medo doido de cair dali.
– Acho que sim, a minha mãe está feliz e eu percebi que não posso tirar isso dela.
– Fico feliz por vocês duas. Isso quer dizer que eu não preciso mais dormir na casa de ninguém. - eu sorri meio sem graça, ainda tinha vergonha disso.
– Eu sinto muito mesmo por fazer você ficar.
– Eu me ofereci, lembra? Estou só brincando. Quando quiser. - eu pensei a respeito da última frase. "Quando quiser" é uma frase tão relativa.
– Obrigada. - disse apenas.
– Voltou a usar roupas largas? - dei de ombros.
– Por que se importa?
– Isso não é uma resposta.
– E você está parecendo a Charlotte. Por acaso é gay? - ele deu "aquele" sorriso e olhou nos meus olhos.
– Você deveria saber que eu não sou gay. - eu fiquei levemente constrangida. - Mas já mudei de assunto. Que horas quer ver o filme?
– Ah não sei, a hora que quiser. A gente ainda nem almoçou.
– Hoje é sábado, não precisamos almoçar.
– Fala isso pra minha mãe.
– Só se você implorar... - eu revirei os olhos e levantei da cama. Caminhei em direção a sua estante de livros, tinha muito Agatha Christie e Sir. Arthur Conan Doyle. Praticamente todos os exemplares desses autores.
– Acho que alguém gosta de livros de mistério.
– E casos policiais. Sim, gosto.
– E não tem mais nada?
– Tem um livro de poesia. - eu sorri.
– Sei, mas ele não pode ficar aqui na estante. - ele encarou o chão.
– Ainda não. - não respondi. Virei para olhar as fotografias no mapa e pensei se algum dia iríamos juntos para esses lugares. Antes que eu pudesse falar alguma coisa, meu celular tocou, era a Charlotte
– Alô?
– Oi, Jessie. Tudo bem?
– Tudo sim e você?
– As mil maravilhas. Está em casa?
– Na casa de Nathan, mas se quiser vir eu vou pra casa.
– Está fazendo o que aí?
– Conversando apenas. Pode vir, eu tenho mesmo que te contar algumas coisas.
– Então tá. Chego aí em 15 minutos.
– Estarei te esperando. Vai almoçar comigo?
– Claro, por que não?
– Combinado, até daqui a pouco.
– Até, honey.
Sempre me divirto quando Charlie aparece na minha casa, ela já chega ligando a música e dançando.
– Então a menina que não gosta de mim está vindo? - eu revirei os olhos.
– Não que é ela não gosta de você, ela só... não gosta de você.
– Sei, muito esclarecedor.
– Tente entender o lado dela. O Nathan Gilbert que ela conhece é o garoto que só anda com os bonitos e populares da escola, não enfrenta filas e nunca tinha me visto na sala durante cinco anos. - ele suspirou.
– Você falando assim eu me sinto até meio mal.
– Ah não se preocupe com isso, estamos no último ano. Não tem que mudar a sua vida por causa da minha amiga.
– Não seria por causa dela e sim por minha causa.
– Você quem sabe, eu confesso que gosto muito mais do meu Nathan Gilbert. - ele deu um sorriso de canto de boca.
– Seu? - eu fiquei sem fala, totalmente constrangida.
– Hum... É... Digo, o Nathan que eu conheço, né? Ah, você entendeu.
– Na verdade, eu tinha entendido mesmo, mas fazer você ficar vermelha não tem preço. - dei um soco leve no seu braço.
– Hora de ir, darling.
– Tudo bem, honey. - dei um beijo na sua bochecha e saí pela janela (Dica: se quiser ir a casa do garoto que você gosta ou de um amigo, utilize a porta da frente e não a árvore na janela).
>>o
– Cheguei, mundo. Todos já podem sorrir. - falou Charlotte assim que eu abri a porta.
– Olá para você também. Entra, temos que conversar.
– Por isso estou aqui. Onde sua mãe está? - eu olhei pra cozinha e vi que minha mãe falava ao telefone com um sorriso no rosto, automaticamente eu soube.
– Está na cozinha falando ao telefone. Vamos para meu quarto, tenho novidades.
Subimos as escadas em silêncio, eu pensei em como Charlie iria reagir ao fato de Nathan ter passado a noite no meu quarto, tinha uma coisa que ela era muito boa: drama.
– Então, comece. O que aconteceu?
– Primeiro vai ter que se sentar. - ela obedeceu surpresa.
– Aí vem problema. Comece do começo.
– Minha mãe tem um namorado e Nathan dormiu comigo. - Charlotte engasgou, tossiu e arregalou os olhos.
– Como é?

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