- Eu sei, eu sei... - falei apoiando minha cabeça no armário da escola
- Não você não sabe, se soubesse não faria de novo. - falou Charlotte lixando a unha.
- Eu não consigo evitar. Ele é lindo! - falei e ela revirou os olhos.
- Sinceramente, Jessica, desiste dele. Vocês estudam juntos desde sempre e ele nem sabe que você existe. E você acha mesmo que agora que estamos no último ano do ensino médio, as coisas vão melhorar?
- Eu não posso ter esperanças? - Charlotte ficou de frente pra mim e olhou dentro dos meus olhos.
- Amiga, garotos como o Nathan nasceram para ficar com garotas como a Megan, por exemplo. - eu suspirei.
- Isso não é justo!
- A escola nunca é.
- Escute o que eu estou falando, eu sinto que vai ser diferente. - Charlie respirou fundo.
- Por que, Jessica, eu posso saber?
- Eu não sei, só sinto que o ensino médio vai ser incrível.
- E isso tem alguma coisa a ver com o Nathan?
- Tem tudo a ver com o Nathan.
- Ah, Jessie, eu só quero que você não se magoe.
- Eu não vou. Eu sei que não. - Charlotte me encarava como se estivesse com pena de mim e eu fingia que não via.
>>o
Eu não sei quando isso começou, quando eu comecei a ver que Nathan era diferente, mas aconteceu. Seus olhos castanhos penetrantes, seu cabelo também castanho que à luz do sol fica quase mel, seu sorriso que ilumina até a noite mais escura e sua confiança ao andar me conquistaram sem eu perceber.
Pensava em tudo isso enquanto caminhava para casa, meu cabelo estava preso com um lápis e meu óculos estava na ponta do nariz quando acordei do meu devaneio em frente a minha casa. Estranhei a porta aberta e entrei com desconfiança, minha mãe conversava com uma completa desconhecida como se conhecessem há anos.
- Oi mãe. - falei e ela virou pra mim sorrindo.
- Jessica, não tinha visto que já tinha chegado.
- Acabei de chegar. - falei olhando para a estranha sentada no meu sofá. Ela parecia ter uns 40 anos, seu cabelo estava preso em um coque e tinha um sorriso deslumbrante (um sorriso que eu tinha a leve impressão que conhecia).
- Ah que falta de educação a minha. Jessica, essa é a Samantha. Ela acaba de se mudar com a família para a casa do nosso lado.
- É um prazer conhecê-la. - falei andando até ela com um sorriso e a mão esticada.
- O prazer é meu. - apertou a minha mão de um jeito firme.
E foi nesse momento que eu gelei ao ouvir uma voz vinda da minha porta, uma voz que eu conhecia e amava, uma voz que fez todos os pêlos do meu corpo se arrepiarem e minhas pernas tremerem.
- Mãe, onde eu coloco essa caixa? - eu me virei devagar e lá estava ele, sem camisa (apenas com uma bermuda de moletom), segurando uma caixa de papelão.
- Deixe no meu quarto. Aliás você já escolheu o seu? - perguntou Samantha levantando.
- Sim, vai ser o da ponta. Aquele que a janela dá pra essa casa. - meu coração quase parou naquela hora. A janela do quarto dele ia dar para a janela do meu quarto.
- Ótimo. Ellie, esse é o meu filho, Nathan. - enquanto ele caminhava em direção a minha mãe, o tempo foi passando devagar, quase em câmera lenta. Eu imaginava essa cena de outra maneira.
- É um prazer conhecê-la. - disse ele com "aquele" sorriso.
- O prazer é meu, Nathan. - respondeu minha mãe com um sorriso simpático.
- E essa é Jessica, sua filha. - pela primeira vez desde que estudamos juntos, ele olhou pra mim.
- Olá, acho que eu te conheço de algum lugar. - eu tentei procurar a minha voz.
- Estudamos na mesma escola. - falei e ele apoiou a caixa no chão.
- Mas é claro. Você está na minha turma esse ano, não está? - Nesse e nos últimos cinco anos.
- Exatamente. - falei apenas.
- Ah, é um prazer conhecê-la finalmente, Jessica. - disse estendendo a mão.
- Igualmente. - falei apertando a sua mão, provavelmente demorando mais que o necessário.
- Ellie, foi um prazer conhecê-la. - disse Samantha. - Mas agora eu preciso ir, tenho que terminar a mudança.
- Precisam de ajuda? - perguntei rapidamente.
- Se você não se importar... - falou a mãe do amor da minha vida.
- De forma alguma, eu só vou trocar de roupa. - falei sorrindo.
- Tudo bem, estamos te esperando. - eu dei uma última olhada para Nathan que encarava a caixa pensativo e fui em direção as escadas.
>>o
Eu não podia acreditar no tamanho da minha sorte, ainda estava em choque e não sabia muito bem como agir diante dessa situação, mas eu tinha que resolver a situação "mudança" primeiro.
Encarei o meu closet com ansiedade, o que vestir? Eu não era muito estilosa e não podia ir muito arrumada porque eu ia ajudar na mudança. Resolvi colocar uma blusa branca lisa e uma calça de moletom nem muito larga nem muito justa. Talvez porque eu quisesse fingir que não me importava.
- Jessica, os vizinhos estão esperando. - gritou a minha mãe da escada.
- Estou descendo. - eu me encarei no espelho e não gostei do que vi. Mas era o meu rosto, meu corpo e no momento plástica não era uma opção.
>>o
- Com licença... - bati na porta e esperei.
- Jessica? - era a voz de Nathan de algum lugar da casa.
- Sim. - ele apareceu de trás da escada com um sorriso.
- Se você puder me ajudar a carregar essas caixas que estão no jardim para o meu quarto, eu agradeceria muito. - eu assenti sem jeito. Ele ainda estava sem camisa, ainda tinha "aquele" sorriso, "aqueles" olhos...
Peguei uma caixa de papelão que pelo jeito continha apenas livros (e ele ainda ama ler?). Fui andando atrás dele devagar tentando me equilibrar com a caixa pesada, mas sem querer deixei cair um livro na entrada do seu quarto. Apoei a caixa no chão devagar e peguei o livro, era de poesia. E o mais chocante: o meu preferido.
- Jessica, você... - Nathan parou de falar quando me viu encarando o livro, pelo incrível que pareça, ele ficou sem graça.
- Você gosta de poesia? - perguntei e ele trocou o apoio de um pé para outro.
- Hum...é...
- O que foi?
- Eu não costumo contar para as pessoas sobre isso.
- Por que não? É um livro maravilhoso, eu sou apaixonada por ele. Na verdade é o meu livro de poesia preferido. - ele veio andando na minha direção e pegou o livro, delicadamente, da minha mão.
- Jessica, você já tinha me visto pela escola?
- Sim.
- Pelo o que você viu, acha que eu faço o estilo de alguém que goste de poesia? - eu parei pra pensar.
- Não, não parece. Mas o que isso tem a ver?
- Meus amigos, bem, não entenderiam a poesia. Iam rir, fazer piadas... A poesia, acho que posso dizer, é um dos meus maiores segredos.
- Prometo não contar para ninguém. - ele sorriu e guardou debaixo do colchão.
- Obrigado, agora vem, vamos terminar isso aqui.
>>o
Carreguei caixas durante muito tempo, Nathan não comentou mais nada sobre o livro e conversamos apenas o necessário. No final do dia, eu estava quebrada e ele também, sentamos no chão do quarto dele com copos de suco e sanduíches de manteiga de amendoim com geléia.
- Obrigado pela ajuda. - falou ele.
- Tudo bem, quando precisar. - Nathan sorriu e encarou a janela do quarto dele com curiosidade.
- A janela do meu quarto dá para a janela do seu? - eu olhei para onde ele olhava.
- Parece que sim... - eu falei com uma certa ansiedade, mas sem deixar transparecer.
- Assim fica mais fácil da gente conversar...
- Sim, acho que sim. Antigamente, eu usava aquela árvore para ir do meu quarto ao quarto da Charlotte, que era quem morava aqui.
- Isso é um convite? - eu fiquei tão sem graça que não sabia o que dizer.
- Não, eu não... - Nathan começou a rir e eu parei de falar.
- Fica tranquila, eu estava brincando. Mas quem sabe qualquer dia eu não invada seu quarto? - ele me olhava com ar de divertimento e eu não soube se ele estava brincando ou não. Então apenas voltei a comer.
Ficamos novamente em silêncio por um tempo, eu fiquei encarando as paredes presa nos meus próprios pensamentos e ele parecia fazer o mesmo.
- Jessie? Posso te chamar assim?
- Pode sim.
- Então, Jessie será que você poderia me ajudar com o meu quarto. Eu tenho que desfazer caixas e vou realmente precisar de ajuda.
- Claro, sem problemas.
- Obrigado, de verdade. Amanhã depois da escola podemos vir juntos e você vem direto pra cá.
- Combinado.
Eu não conseguia acreditar no que estava acontecendo naquele momento, quando a mãe do Nathan, Samantha, apareceu na porta.
- Jessica, sua mãe está te chamando.
- Ah sim, obrigada pelo lanche. - falei
- Obrigada você pela ajuda. - falou ela saindo do quarto.
- Então é isso. - falei e Nathan me abraçou.
- Obrigado por me ajudar. - no começo, confesso, que fiquei sem ação. Mas logo me recompôs e o abracei de volta.
- Nada, que isso.
- Até daqui a pouco. - falou apontando pra janela, eu sorri e assenti.
Saí da casa dele sem reação, sem saber o que fazer diante da minha repentina amizade com o amor da minha vida. Ah se ele soubesse...
- Jessica, tudo bem? Você está com uma cara engraçada.
- Estou ótima, mãe. Eu vou subir pro meu quarto, tá? Vou ligar para Charlotte.
- Só não demora no telefone. - eu olhei pra ela e sorri.
- Como se fosse possível eu falar rápido.
- Eu sei, foi um comentário automático. - dei um beijo nela e subi as escadas correndo para o meu quarto.
Queria falar com Charlotte sobre tudo o que aconteceu hoje e como o meu dia foi surpreendente. E ela disse que eu jamais iria conseguir a amizade dele (ou o amor dele, mas isso ainda podia esperar).
- Alô?
- Você não sabe o que aconteceu.
- Saberei assim que você me contar. - pelo jeito da voz ela estava comendo e quando Charlotte está comendo, qualquer coisa no mundo que atrapalhe podia deixá-la mal humorada.
- Nathan é o meu mais novo vizinho. - silêncio na linha, ela nem respirava.
- Mentira.
- Verdade! E não é só isso...
Eu contei tudo o que aconteceu (menos sobre a poesia, achei isso pessoal demais) em detalhes, desde que eu cheguei em casa e ela, surpreendentemente, escutou tudo calada.
- E agora ainda não somos amigos, mas já estamos quase lá.
- Realmente chocante. Nem sei o que falar. Acha que agora vocês vão...
- Não sei, mas espero que sim.
- Jessica, vem jantar. - gritou a minha mãe, provavelmente da cozinha.
- Já vou.
- Charlie, eu vou desligar. Amanhã a gente se fala na escola.
- Tudo bem, até amanhã. E oh, não comete nenhuma loucura. - ignorei a última parte.
- Até!
>>o
O jantar na minha casa era sempre quieto, sem muita conversa, falamos rapidamente sobre os nossos novos vizinhos. Engoli a comida e subi para dormir, não falei em voz alta, mas estava ansiosa para deitar e pensar no meu inusitado dia. Dei um beijo de boa noite na minha mãe e fui tomar banho.
Se tem uma coisa que me relaxa e me ajudar a pensar, isso é a água quente. Relaxa cada músculo do meu corpo e me ajuda a refletir, e especificadamente hoje eu precisava desse tempo.
Coloquei o meu moletom mais confortável, peguei o meu livro de poesia e deitei na cama pronta para descansar quando me assustei com uma batida na janela.

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