O final daquela semana estava passando rápido. Lizzie saia para trabalhar bem cedo, quando geralmente apenas seu pai já estava acordado e a acompanhava em um rápido café da manhã. Depois, ela se despedia e corria para o hospital, que continuava cheio. Ela mal estava tendo tempo para respirar e aparentemente o resto da equipe também, porque sempre que ela via alguém conhecido, a pessoa apenas acenava e corria de volta para o que quer que estivesse fazendo. A exceção foi o dr. Bingley, com quem ela esbarrou quando estava voltando do almoço naquela tarde.

— Elizabeth! – Ele disse surpreso, ao que Liz retribuiu com um sorriso sem graça, ainda não tinha tido a oportunidade de conversar direito com ele depois do dia da discussão com Darcy. – Tudo bem? Faz tempo que eu não te vejo, e a sua irmã?

— Oi, dr. Bingley. Estou ótima, na correria, e minha irmã está se recuperando muito bem. – Elizabeth respondeu animada e tentou não ser grosseira ao dizer que estava com pressa e que precisava se retirar, mas Bingley estava meio estranho, como se quisesse dizer algo, mas não tivesse coragem. Isso a deixou muito curiosa.

— Ah, eu poderia te pedir, hum, o endereço da sua irmã?

Lizzie precisava voltar ao trabalho, mas claro que ela não negaria aquilo a ele. Pegou um pedaço de papel do bloquinho que sempre levava no bolso e anotou o endereço rapidamente.

— Toma, agora eu preciso voltar...

— Ah sim, - Ele continuou sem jeito. – É que eu estava pensando em fazer uma surpresa para ela, será que você se importa se eu...

— Ah, claro que não. – Elizabeth sorriu encorajando-o. Queria só ver a carinha de felicidade de Jane quando ela recebesse as flores ou o cartão que ele mandaria. – Agora eu preciso muito ir, ou o sr. Collins vai vir aqui puxar minha orelha.

O sr. Collins não iria aparecer para apressá-la, ele era um dos seres mais pacatos e enrolados que Lizzie já conhecera, mas mesmo assim, Lizzie não gostava de não fazer as coisas certas, por isso saiu correndo pelo corredor enquanto digitava uma mensagem para Jane em seu celular.

Sorte do dia: Em breve você receberá uma bela surpresa, quando isso acontecer, agradeça muito a sua irmã, Lizzie, de preferência com chocolate, ela adora chocolate ;)

Assim que saiu do trabalho, Lizzie foi direto para casa. Tudo o que ela precisava para se recuperar daquela semana de correria, era um banho demorado e um bom livro, mas infelizmente, seus desejos não seriam concedidos, já que era sexta e suas irmãs estavam muito animadas com a possibilidade de saírem para algum lugar legal. Então, ela guardou sua vontade de ler e, após um banho rápido, arrumou-se para sair.

Quando ela apareceu novamente na sala, havia algo estranho. Os Bennet estavam todos sentados, agindo de forma aparentemente comportada e dirigindo perguntas a um jovem um tanto encabulado, sentado ao lado de Jane. Elizabeth quase engasgou ao constatar que se tratava de Bingley.

— Dr. Bingley! – Lizzie exclamou surpresa.

A última pessoa que ela esperava encontrar sentada em sua sala respondendo às perguntas intrometidas de sua mãe, era ele. Só então a ficha caiu, quando Bingley pediu o endereço do apartamento e disse que queria fazer uma surpresa para Jane, não era sobre flores ou cartões que ele estava falando. Ele queria fazer uma visita para sua irmã e agora estava praticamente sendo pressionado a marcar a data do casamento com ela. Pobre alma, se Lizzie soubesse de seus planos, teria dito que aquele não era um bom dia para visitas, mas apesar de um pouco assustado, ele não parecia estar incomodado, apenas surpreso.

— Oi, srta. Bennet. – Ele cumprimentou-a com um sorriso. – Eu te procurei para oferecer uma carona, mas você já tinha ido.

— Ah, obrigada, mas estou de carro esses dias.

— Srta. Bennet? É tão estranho, parece que ele está falando com alguém tão mais velho. No nosso país ninguém se chama pelo sobrenome. – Lydia comentou com um tom zombeteiro, tentando puxar assunto. – É esquisito.

O dr. Bingley ergueu as sobrancelhas e pareceu interessado quando soube.

— Interessante. Eu não sabia, mas vamos fazer um trato, eu chamo vocês pelo primeiro nome e vocês também podem me chamar só de Charles. – Ele respondeu divertido. – E você também. – Acrescentou olhando para Jane que lhe deu um sorriso absurdamente encantador. Lizzie quis tirar uma foto daqueles dois e mandar colocar em um quadro de tão lindo que eles ficavam quando olhavam um para o outro. Será que eles tinham noção daquilo?

— O dr. Charles estava nos dizendo que foi ele quem tratou a Jane. – A sra. Bennet fingiu que queria colocar Lizzie a par da conversa anterior, mas não era sobre isso que eles estavam falando quando ela adentrara a sala. Ela ouviu muito bem a mãe perguntando se ele era nativo daquele país mesmo. Obviamente estava calculando as chances de Jane conseguir um visto de noiva ou algo do tipo. – Obviamente ele tem talento, não é? Deixou a sua irmã novinha em folha.

Ele agradeceu encabulado e Liz e Jane apenas sorriram sem graça. Ambas sabiam que agora que ele havia passado na pré-seleção da sra. Bennet, ela o encheria de elogios para conquista-lo, e logo passaria para a investigação de coisas mais importantes, como as posses do rapaz. Lizzie sabia que Jane estava rezando por alguns momentos em paz com ele.

— Mamãe, eu fiz reservas naquele restaurante que você adora, lembra? Mas temos que sair agora para chegar lá a tempo. – Ela mentiu descaradamente, não tinha reserva nenhuma, mas contaria com a sorte. Estava focada em tirar a família Bennet, que ficava encarando Bingley como se ele fosse um ser de outro planeta, dali.

— Que ótimo, Elizabeth. Você poderia ligar lá e pedir para incluir o nome do nosso amigo Charles, aqui. – Ela deu uma piscadela para ele. – Você nos acompanha, querido?

O tiro quase saíra pela culatra, mas antes que ele pudesse responder, Jane foi mais rápida e já entendendo a tática da irmã, adiantou-se.

— Mãe, eu vou ficar por aqui. Acho que ainda não estou muito bem para sair.

— E eu não posso deixar minha paciente sabendo que ela pode precisar de cuidados.

A sra. Bennet lançou um olhar desconfiado para eles e Jane respondeu com um sorriso amarelo. Quando a mulher ia se pronunciar, o sr. Bennet pigarreou e pela primeira vez em muito tempo, sua voz foi ouvida.

— Você não acha que eu vou deixar minha filha aqui sozinha com você, acha?

Bingley se espantou tanto com o comentário do sr. Bennet que quase engasgou. Seus olhos, se arregalaram e Lizzie teve vontade de rir da cena, mas tentou se concentrar e pensar em algo que pudesse ajudar o rapaz. Seu pai quase nunca se metia em nada, mas quando a “honra” de suas filhas estava “em perigo”, ele era curto e grosso. Aparentemente, ele esqueceu que Jane já tinha quase trinta anos e morava sozinha.

— Não estou a fim de sair, fico com eles. – Mary surpreendeu a todos com sua fala.

Jane e Lizzie pularam de alegria internamente. Mary não estava nem aí para o que suas irmãs faziam ou deixavam de fazer, ela era sempre na dela, então o arranjo seria perfeito. Ela provavelmente ficaria lendo um livro qualquer enquanto Jane poderia conversar um pouco com Bingley, sem aquela pressão toda.

Lizzie estacionou bem de frente a uma loja muito chamativa e enquanto suas duas irmãs e sua mãe ficavam babando na vitrine, ela deixou o pai com elas e apressou-se para dentro do restaurante. Quando todos se reuniram na porta do local, Lizzie saiu e informou a todos que houve um imprevisto e a mesa deles ainda demoraria mais um pouco para ser liberada.

Graças a Deus, a hostess não demorou muito para acomodá-los, em menos de quinze minutos eles já estavam sentados à mesa vendo o cardápio. Se tivesse demorado mais, sua mãe poderia ter desconfiado de que ela não tinha feito reserva alguma. Seu pai, com certeza, já havia percebido que foi tudo um esquema arquitetado para tirar eles de casa e dar um pouco de privacidade a Jane, mas a sorte estava ao lado das irmãs Bennet mais velhas, porque ele não pareceu se incomodar tanto. Mary havia ficado por lá, então ele estava tranquilo. Ou talvez ele nem ligasse, apenas achou que seria aquilo que um pai deveria ter feito em uma situação daquelas.

O jantar foi muito gostoso. A sra. Bennet adorava aquele lugar e toda vez que ela visitava o país, fazia questão de jantar lá uma ou duas vezes. Lizzie não era a maior fã de carne vermelha, especialidade da casa, e só ia ali quando estava com a família de visita, mas também achou a noite muito agradável. As garotas conversaram bastante e o sr. Bennet, como sempre, ficou mais na dele, soltando algumas palavras de tempos em tempos.

Depois do jantar, Lydia conseguiu convencer todos a entrarem na loja que elas viram mais cedo. Elizabeth concordou de primeira, assim como o resto das mulheres, porque para ela, além daquela parada render mais um pouco de sossego para Jane, ela gostava de ter companhia para ficar xeretando as lojas.

Algumas horas e uma quantidade razoável de sacolas depois, eles estavam adentrando novamente o apartamento. Mary estava esparramada em um dos sofás lendo um livro e Jane estava mexendo no celular com um sorriso bobo no rosto. Ao ver Elizabeth, ela sussurrou um obrigado e disse a todos que estava muito cansada e que já ia se deitar. Lizzie, é claro, foi correndo para o quarto atrás da irmã. Nada no mundo faria ela deixar Jane ir dormir sem antes contar para ela como havia sido a noite.

Quando questionada, ela apenas sorriu e mostrou a mensagem no celular.

Jane: Queria agradecer pela visita, foi realmente uma surpresa, e claro, pedir desculpas caso minha família tenha feito algo que o tenha deixado sem graça. Eles são bem espontâneos, se é que me entende, mas são gente boa. Juro para você J

Charles: Não se preocupe, gostei de conhecer sua família, mas gostei mais ainda de ter passado um tempo com você. Acho que deveríamos sair algum dia desses quando você já estiver se sentindo mais disposta. O que acha?

Lizzie riu alto, ela estava muito feliz, mas não perderia a oportunidade de caçoar da irmã.

— Acho que alguém vai acordar amanhã se sentindo 100% já.

Jane deu risada e mostrou a língua para ela que retribuiu o carinho jogando uma almofada na irmã. As coisas estavam tão leves e descomplicadas até aquele momento... Era uma pena que a calmaria não duraria muito.