O deserto era bem frio a noite então fiquei dentro do carro e dormi no banco do carona. Deixei o rádio tocando, pra preencher o silêncio do mundo a minha volta, o que foi um erro mas consegui relaxar e adormecer.

Naquele noite sonhei, e foi bem estranho. Sonhei que aquelas coisas, que chamei de mutantes para não usar a palavra com Z, me perseguiam no deserto e eu corria para lugar nenhum. Havia duas pessoas, segurando minhas mãos mas não deu tempo para ver quem eram. Nós corríamos e conseguimos chegar a um lugar que parecia ser um castelo todo rosa.

De repente, as duas pessoas que seguravam minhas mãos foram diminuindo o ritmo da corrida até estarem apenas caminhando e eu caminhei com eles, ainda sem poder ver seus rostos. Olhei para trás e vi que os mutantes não estavam mais atrás de nós. Deviam ter ficado no deserto.

Finalmente eu conseguira ver os rostos das pessoas que seguravam minhas mãos. A minha direita, um homem com cabelos castanhos, óculos, uma roupa de professor e uma coroa de ouro amarrada a sua cintura. Ele tinha um sorriso muito agradável e seus olhos pareciam cansados de tanto trabalhar.

Na minha esquerda, uma menininha de cabelos pretos, pele clara, quase pálida e olhos verdes iguais a mim. Ela estava toda suja e devia ter uns sete anos e segurava um ursinho que estava todo destruído. Ela sorriu para mim e pude ver as pequenhas presas que começaram a se formar onde eram seus caninos. Sorri para ela e lhe dei um abraço, e abracei também o homem. Quase chorando, murmurei para os dois:

– Onde vocês estavam? Por que me deixaram? Vocês prometeram que viriam por mim... Eu senti tanta a falta de vocês...

Quando me afastei para olhar em seus olhos, vi que o homem agora tinha a pele de cor azulada, como se estivesse morto e cabelos brancos e um nariz pontudo. Sua coroa não estava mais em sua cintura, agora estava em sua cabeça e em seus olhos, eu podia ver somente loucura. Agora estava tudo frio e escuro, como no meu sonho.

Quando olhei para a menininha, me assustei tanto que me joguei para trás. Ela agora tinha a aparência de um demônio e estava me olhando de um jeito aterrorizante. De sua boca, escorria sangue e ela olhava para mim como se fosse me matar. Eu não conseguia me mover e ela se aproximava cada vez mais. Ela foi chegando perto do meu rosto e lentamente foi furando a carne do meu pescoço com seus dentes de vampiro. A dor era terrível e antes que eu pudesse acordar, escutei sua risada alta, de pura satisfação e maldade...