Mudanças de Vida

Naquela época eu não sabia, mas Charlie escondia um segredo, que escondia um passado doloroso. Ele era a pessoa que podia me entender, mas como eu já disse, eu não sabia disso. Perguntei-me como ele podia me carregar com tanta facilidade usando apenas um braço, durante a descida pela escada fiquei com aquela cara de: Fala sério, mãe! Durante esse meio tempo deduzi que Charlie era um cara barulhento que podia parecer ter dezessete anos, mas tinha a mentalidade de um cara de doze.

Quando chegamos ao pé da escadaria, Charlie me pós cuidadosamente no chão, como se pudesse me quebrar ou... Quebrar o chão?

– Pronto, madame – ele apontou para o cômodo a minha frente – Bem vinda a mansão Foster.

Eu deveria estar realmente longe de casa e como se lesse meus pensamentos ele acrescentou:

– Não se desespere, você ainda está em Forks.

Olhei ao redor, a sala também não estava livre da decoração japonesa. Não era nada antiquado, mas nada muito moderno. A primeira coisa que vi foi a lareira, as laterais da lareira eram curvadas e havia dois lobos esculpidos de cada lado. Uma chama baixa crepitava na lenha.

– Ah, isso é coisa do Xavier – disse Charlie surgindo atrás de mim... Talvez perto de mais, mas ele não parecia se importar (Mas eu sim!) – Ele é adorador da cultura japonesa, ele é descendente de japoneses, sabe? Ele enche o saco com isso, então pense bem se é isso o que você quer aturar pela sua eternidade, ele diz que os lobos são muito endeusados no Japão e na mansão Foster pelo velhote.

Deus, como esse garoto fala!

– Minha eternidade? – eu repeti.

Charlie sorriu debochado.

– O que? Não achou que podia morrer duas vezes não é? – perguntou ele – Posso dizer que nos encontramos em uma segunda vida.

O jeito como ele disse aquilo era tão despreocupado que eu dei de ombros como se ele tivesse acabado de dizer algo parcialmente normal.

As paredes revezavam entre o vermelho e o branco, portanto dava uma combinação legal. Uma TV de tela plana estava pendurada defronte ara um sofá de couro marrom escuro, com algumas almofadas brancas de seda e... Olhe! Mais kanjis.

Diante da lareira dos lobos sagrados havia duas poltronas vermelhas. Eu podia ver meu próprio reflexo no chão de mármore. Na entrada da mansão havia portas de correr de vidro, e em ambos os lados havia cerejeiras em vasos tão delicados que eu imaginei se quebrariam se eu respirasse neles.

Tudo silencioso até o momento em que eu ouço algo quebrar, Charlie coloca seu braço ao redor do meu pescoço e sorri.

– Vamos, Alexandra, vamos conhecer sua nova família.

Eu me senti um cachorrinho pronto para ser adotado, fiz careta, mas deixei que ele me guiasse até o outro cômodo da mansão. Passamos por uma abertura que levava até o lugar que eu imaginei ser a cozinha, mas era apenas o resto da sala, mas nesse tinha mais sinal de vida – ou não, depende do seu ponto de vista.

Charlie me empurrou para baixo antes que uma cadeira levasse minha cabeça embora... Isso mesmo, eu disse cadeira.

– Liam, seu maldito, olhe aonde joga essas cadeiras! – gritou Charlie, recebendo em resposta uma almofada bem no rosto.

O garoto chamado Liam – um garoto de cabelos em um castanho pálido que parecia ter uns dezoito anos – fez um gesto nada bonito para Charlie.

– Eu olhei, Charles, pode apostar! – gritou de volta e começou a pular e falar algo para um garoto igual a ele que apenas suspirava. Ou o cara era naturalmente hiperativo ou tinha aparentemente se entupido de cafeína. Ele virou-se de novo e acenou para mim piscando.

Charlie bateu na própria testa e suspirou.

– Desculpe minha família, os Foster não são de fazer uma recepção muito formal...

Foi exatamente o que eu não imaginei.

Havia pessoas dançando, jogando xadrez e claro... Jogando cadeiras e almofadas para todo lado.

Charlie se afastou de mim e subiu em uma poltrona que antes estava caída de costas no chão.

– Escutem aqui, seus animais! – gritou ele – Temos uma novata aqui, será que poderíamos ser um pouco mais...

– ATAQUE SURPRESA!

Uma garota de cabelos azuis – a que eu tinha visto no quarto há algumas horas... Eu acho que foram horas pelo menos – pulou em cima de Charlie o lançando no chão e o prendendo em uma chave de braço e logo em seguida forçando seu cotovelo no ouvido de Charlie que gemia de dor.

– Wow! – gritou o garoto chamado Liam que ainda estava pulando e jogando almofadas de seda e cadeiras nas pessoas. – Técnica de tortura quarenta e oito! Essa dói...

Um garoto idêntico a Liam, que jogava xadrez com uma garotinha de cabelos pálidos que parecia ter sete anos, suspirou:

– “Sobre-Afinação Auditiva” – disse ele.

A garotinha albina não desviou os olhos do tabuleiro.

– Que mente limitada... – disse ela fazendo um... – xeque-mate. Leon, passe a grana, perdeu playboy!

– Você sabe que não apostamos nada, não é? – disse o clone de Liam.

– Seja homem e arque com as conseqüências, Leon – disse um homem-armário de cabeça raspada.

Liam deu um soco no ar.

– Agora é a técnica vinte e sete, Afinação Espinhal! – ele apontou para a azulada que apenas tinha trocado a posição do cotovelo para a espinha.

– Ah... Você aceita cartão de crédito? – perguntou Leon para a menina albina.

– Que mente limitada... – repetiu a garotinha.

– Vocês não aprendem nunca... – suspirou uma garota que parecia ter um pouco mais da minha idade, ela era alta com a pele escura e olhos dourados. A primeira que parecia ter finalmente me dado atenção. – Desculpe minha família, com o tempo você se acostuma – disse ela agarrando uma cadeira no ar, sem nem mesmo olhar – Liam! Você quer que eu quebre suas costelas?

Liam apenas deu um sorriso debochado.

A garota voltou-se para mim com um sorriso gentil.

– Eu sou Claire, qual o seu nome?

– Ah... Alex – eu disse – Eles são sempre assim?

– Uma dor de cabeça não? – ela disse – Ainda bem que não temos isso.

– Na verdade... Eu achei bem legal. – admiti e então apontei para Charlie e a garota de cabelos azuis. – Mas... Ela não vai acabar quebrando ele?

Claire deu de ombros.

– Pam? Ah, ela faz isso até hoje e Charlie ainda está bem – disse ela despreocupada – Só mais um dia comum na mansão Foster... – ela bloqueou outra cadeira com o braço e essa se partiu no meio – LIAM! Só um momento... EU VOU AI TE QUEBRAR!

Me senti deslocada, claro, quem não se sentiria, mas ai uma cadeira veio voando em minha direção e não sei como, mas eu a peguei pela perna como se fosse um lápis. O garoto chamado Liam olhava para mim, esperando uma reação e eu fiz o que Alex Tanner faria. Lancei a cadeira de volta e ele desviou, sorrindo para mim, mas seu sorriso se desfez no momento em que Claire começou a lhe dar uma bronca.

– Olhe isso, Kyle! – a garota de cabelos azuis apontou para mim, largando Charlie que gritou algo como “Liberdade!” – A novata está pegando o jeito da coisa.

O homem de cabeça raspada, que parecia o Vin Diesel, assentiu.

– Isso facilita as coisas não? – ele sorriu.

– Liberdade! Liberdade! Liberdade! – exclamava Charlie correndo de um lado para o outro.

– Charles! – gritou Liam – Isso me lembra, eu não acabei de te dar uma surra!

Como um borrão – literalmente -, Charlie surgiu atrás de mim e apoiou o braço na minha cabeça – esqueci de dizer... Mas ou ele é muito alto ou eu sou muito baixa.

– Fica pra próxima, loira oxigenada, eu estou...

– É CASTANHO PÁLIDO, LACRAIA DE OLHO DOURADO!

Charlie riu.

– Como quiser, loirinha. – disse ele debochado – Vamos Alex Tanner, Xavier vai querer ver...

Outra cadeira, dessa vez em alta velocidade. Arregalei os olhos e antes que a cadeira nos atingisse ela parou no ar como se tivesse congelado e então caiu aos meus pés.

Charlie abriu um sorriso de orelha a orelha.

– Acho que descobrimos o seu dom.

– Dom? – eu repeti.

– Ah claro... – ironizou Claire – Não acredito que se esqueceu de mencionar uma das partes mais legais, Charlie.

Charlie deu de ombros.

– Cada vampiro tem um dom em especial – disse uma nova voz. Um mulher alta e magra com os cabelos albinos batendo nas costas como os da garotinha – Por exemplo, eu posso ver o passado de um pessoa apenas ao tocar nela.

Ela aproximou seu dedo do meu rosto, tocou minha testa, mas nada aconteceu.

– Por isso uso essas luvas – ela ergueu as mãos mostrando duas luvas brancas que cobriam suas finas mãos – Eu sou Mirajane. Você... – ela tirou uma das luvas e tocou diretamente na minha bochecha e cenas do meu passado voltaram para mim, repetindo como um terrível replay travado. Até o último segundo de vida que eu tive - ... Alexandra.

– Alex – eu disse – Por favor, só Alex.

Ela assentiu e colocou suas luvas, sem dizer nada, agora ela sabia de tudo. De Edgar, de Bree, da minha mãe e do meu pai, dos dias em que eu fiquei chorando trancada no quarto, da noite em que Bree desapareceu e daquelas pessoas que a mataram a sangue frio.

Ela sorriu.

– Você tem um passado interessante – ela disse – Imagino o que o futuro lhe aguarda.

Silêncio e então, Pam, a garota de cabelos azuis, bufou.

– Sempre tão enigmática, Mira – disse ela – Não ligue pra ela, ela fez isso com todos nós. Eu sou Pamela, mas me chame apenas de Pam, ok?

– Pam pode ler emoções – disse Charlie. – Lucy... – ele apontou para a garotinha albina que acenou para mim com a cabeça – tem o dom da inteligência. Liam pode acelerar a velocidade das coisas e a própria velocidade e seu irmão gêmeo, Leon... Cadê aquele filho da...

– Olhe a boca, Charles – disse a voz de Leon atrás de nós. – Eu posso ficar invisível. Legal, não?

– E irritante – disse Charlie.

– Ele só está com inveja – disse Liam – Porque você tem um dom e ele não.

– Liam – vociferou Claire encarando Liam nos olhos.

– Ok... Foi mal – disse Liam – Tem o talento ainda adormecido.

– Liam! – repetiu Claire, mas Liam não disse mais nada.

Charlie pigarreou.

– Voltando... Claire pode causar ilusões e confusões na mente das pessoas. Kyle é o mais forte de nós, então... Seria a força. Pronto, estou me esquecendo de alguém?

– Apenas uma pessoa – disse uma voz grave surgindo da sala.

Um homem de cabelos grisalhos em uma cadeira de rodas motorizada que vestia um kimono, tinha uma barba branca rala nascendo do queixo e possuía olhos puxados e dourados por trás de óculos pequenos e redondos. Como o tio do Jackie Chan em uma cadeira de rodas... – Certo, ele não era bem assim.

Xavier Foster atraíra todos os olhares da sala, e as cadeiras pararam de voar.