Aang sentou-se na sala da casa no templo do ar. Katara estava sumida em algum lugar curando alguém que havia se machucado, ele não tinha entendido direito quando ela saiu e pediu que ele ficasse de olho nas crianças.

Bumi já era um garoto de quase 7 anos agora e cada dia lembrava mais o homem de quem recebera o nome, era um pouco maluca aquela criança, mas era brilhante. E a pequena Kya estava se aproximando do segundo aniversário, era a menina mais doce e encantadora que Aang tivera a chance de conhecer, ou de mau conhecer.

Sentia-se culpado por dizer isso, mas mau conhecia seus filhos. Os via toda a noite e lhes beijava a testa antes de ir deitar, mas os deveres de Avatar sempre o mantinham longe e todo o tempo livre era consumido cuidado dos acólitos do ar. Se o último dominador de ar nunca fora tão pesado como agora.

Ele era o último elo de uma cultura milenar, o único responsável por passar seus ensinamentos adiante o único responsável por trazer mais dominadores de ar ao mundo.

— Talvez uma acólita não-dominadora tenha mais sorte que mestra Katara — aquelas palavras ainda ecoavam na cabeça dele.

Agradeceu por Sokka não estar naquela reunião específica. Era uma reunião para discutir a dominação e por mais que Katara tivesse de ficar com as crianças, Zuko e Toph se sentavam por perto e não era difícil sentir a raiva Beifong emanando em ondas pela terra sob seus pés e piorava toda a vez que não dizia nada contra isso.

A verdade era uma só: Katara era uma dominadora poderosa demais e isso se sobrepunha e dificultava a concepção de um dominador de ar. Ao menos era isso que supunham os sábios e estudiosos. Ela nunca discutiu, concordava que era verdade, mas difícil não era impossível.

— Papa, ó que se fazé eu — Kya estava naquela fase de cortar palavras e falar errado.

Ele amava essa fase, Bumi insistia nas palavras erradas quando via que isso fazia o pai rir, já Kya ficava emburrada e parava de falar, então Aang tentava se controlar, mesmo que a vontade fosse agarrar a filha e apertá-la com toda a força.

Aang fixou os olhos cinzentos na pequena dominadora de água. Sabiam que ela seria no segundo mês de gravidez. Katara brincava que a garota dominava todos os fluidos em sua barriga. Eles estavam tão felizes na época.

A menina tomou uma posição base e então dobrou a água de um copo de água e brincou com ela por um minuto, satisfeita com seu feito simples até que caiu na cabeça de Bumi do outro lado da sala.

— ‘Culpa eu — pediu com os olhinhos azuis brilhando e mesmo Bumi não parecia capaz de ficar irritado com ela quando se aproximou e a segurou pela barriga antes de soprar os cabelos castanhos.

— Você tem que tomar cuidado com a água mágica, maninha

Aang sorriu tentando lembrar quantas vezes vira Sokka tratar Katara daquela mesma maneira. Era lindo que seus filhos se entendessem tão bem, mas havia algo o incomodando.

Kya havia aprendido a dobrar sozinha. Katara não ensinar nada a ela ainda, era puro instinto e habilidade, Aang sabia que devia estar orgulhoso e queria realmente estar e até pareceu orgulhoso quando a puxou para o colo e beijou pescocinho exposto enquanto fazia cócegas na barriga da pequena. Mas aquela demonstração só tornara a amargura pior.

“É preferível um não-dominador que pode ser criado como um acólito do que um dominador de água. Como se as tribos precisassem do avatar para terem mais dobradores.”. Sua pequena e doce Kya era tudo que os sábios queriam evitar. Sem mais sorrisos banguelas e olhares brilhante de desculpa, sem mais beijinhos na testa e no pescoço ou cosquinhas na barriga.

— É uma escolha difícil — Zuko havia dito com a mão em seus ombro depois que Toph deixou a sala, fazendo o chão de pedra tremer — O meu conselho é que deve escolher o que é mais importante agora.

Que diabo de conselho era aquele no fim das contas?

Se ao menos ela fosse uma dobradora de ar, eu estaria mais orgulhoso.

Mas se reprimiu no mesmo momento em que o pensamento vinha. Ele não jogaria o jogo dos sábios enrugados da lótus branca. Sua filha era o que era e era perfeita, assim como Bumi e nenhum dos dois seguiria um caminho decidido por outros.

— Querido? — A voz de Katara soou do átrio.

— Na sala, docinho! — respondeu dominando a água para fora dos cabelos do filho mais velho e os desgrenhando com uma lufada de ar em seguida.

— Você devia conversar com os tratadores sobre as baias dos bisões, qualquer dia uma criança vai acabar esmaga… — começou, pronta para começar a contar a história do que havia ido fazer, então reclamaria que precisava relaxar, beberiam um vinho entre beijos na sala e terminaram no quarto, mas seus planos foram frustrados pelos dois pares de olhos azuis sentados junto ao marido. — O que vocês dois ainda estão fazendo acordados?

— Papai! — responderam em uníssono.

Seus filhos eram dois dedo duros sem vergonha, mas ainda eram os mais fofos dedo duros sem vergonhas que conhecera. E não podia culpá-los, ninguém podia resistir ao olhar irritado de mãezona que era normalmente dedicado apenas a Toph.

— Nós estávamos esperando a mamãe para um beijinho de boa noite.

Aang se levantou com as crianças, Kya no colo e Bumi na mão. Katara se abaixou e beijou o menino para depois beijar a pequena, o marido esticou o rosto para receber um beijo nos lábios, mas ao invés disso a esposa apenas enroscou o dedo no tecido alaranjado da roupa do avatar.

— Você não — ela disse se aproximando dele para sussurrar no ouvido dele — Só quando as crianças estiverem dormindo, como castigo.

— Você virou uma mãe malvada.

Ele tentou roubar um beijo da esposa enquanto levava as crianças para o quarto.

Levou quase 1 hora inteira e uma história dos Nômades do Ar para as crianças finalmente pegarem no sono e ele ficar liberado para encontrar a esposa.

Estavam juntos há quase vinte anos e ainda ficava sem ar quando a encontrava deitada daquela forma, o que significava muito quando se tratava de um mestre de ar. As pernas relaxadas e nuas sobre a coberta, a camisola não passando da altura dos joelhos enquanto lia um pergaminho.

Seu coração ainda disparava por ela, como poderia traí-la assim?

— Vai ficar só olhando a noite inteira? — perguntou, baixando a pele para poder olhar o marido emoldurado pelo batente da porta — Você anda tão estranho ultimamente, meu amor.

— Estranho? — perguntou se deitando ao lado dela e envolvendo-a num abraçando carinhoso, puxando-a para mais perto e beijando a dobra do pescoço exposta.

— É, desde a reunião com os sábios — ela comentou, se virando sobre o marido, se sentando sobre seus quadris sem quebrar o contato entre eles — Você parece distante, até um pouco frio.

Aquele comentário o lembrara de tudo que estava tentando esquecer com as carícias no corpo da mulher que mais amava, mas agora havia até perdido a animação de estarem juntos.

— Os sábios estão pensando que a melhor forma de ter um dominador de ar é…

Ele não conseguiu completar o pensamento e nem precisou. Katara já havia se levantado e voltado para o próprio lado da cama, um olhar chateado passando pela feição compreensiva que ela tentava manter no rosto bonito.

— Nṍs sabemos que eles tem razão — quase podia vê-la abraçando as pernas como uma criança desamparada, queria abraçá-la, mas sabia que seria afastado. — Talvez seja melhor terminar o nosso casamento.

Aang só conhecia duas pessoas que haviam se separado em mais de 129 anos. Um deles era a Senhora do Fogo Ursa, mas o marido dela era um psicopata que teria matado o próprio filho e a outra era Poppy Beifong, mas já havia se acertado com o marido e o casamento estava ainda mais forte há quase 12 anos quando reafirmaram os votos de casamento.

— Katara, não — ele tentou se aproximar, mas ela virou o rosto para fora do alcance dele.

— O que você respondeu? — perguntou sem o encarar.

— Nada ainda — balbuciou — Eu precisava falar com você antes.

— Eu nunca poderia dizer não para isso — respondeu, balançando a cabeça em negação — Eu sei como isso é importante para o mundo, para o equilíbrio do mundo. — ela o olhou pela primeira vez desde então, o rosto marcado pelas lágrimas — Importante para você, como avatar e como dobrador de ar.

Não tinha nada que ele podia dizer. Realmente era importante ter um filho dobrador de ar, não que não amasse os outros dois, não que não amasse a família que haviam feito juntos, mas era maior que ele.

— Eu vou com as crianças para o Sokka amanhã — respondeu, se enrolando no cobertor, dando as costas a ele — Eu sinto muito Aang.

Não houve um “boa noite”, não havia um beijo e tão pouco um “querido”. Não parecia que haviam estado ao ponto de transar há pouco mais de alguns minutos.

— Eu amo você, Katara — ele sussurrou, colocando um beijo na testa da esposa — Eu amo muito.