A Caçada Começa

O retorno do inesperado


Minha energia era quase nula. Precisava de alimento, ou não conseguiria permanecer acordada por muito mais tempo. Com a ajuda de minha audição, pude facilmente localizar turistas, provavelmente perdidos, nos arredores. Sem paciência, aproximava-me cautelosamente de cada um e poucos segundos após, minha vítima já jazia ao chão, sem vida e sem sangue. E assim se foram três azarados. Precisava continuar minha busca por Jesse, apesar de não ter mínima idéia de onde ele poderia estar. Subia e descia as encostas das montanhas freneticamente, prestando atenção em qualquer tipo de ruído ou pista que pudesse me levar até Jesse.

O Sol parecia baixar cada vez mais rápido. Minha sombra crescia a cada hora que passava, e eu já estava começando a ficar sem tempo. Sou dotada de habilidades que nenhum ser humano jamais pensou em ter, porém nem eu consigo resistir ao frio intenso noturno das cordilheiras. Percebi que era obrigada e encontrar algum local para passar a noite. Devido ao cansaço de minha busca intensiva, demorei algum tempo até encontrar uma caverna. Depois de remover a neve que estava bloqueando a entrada, pude finalmente deitar para descansar. Apesar de ter conseguido adormecer seguidas vezes, não pude dormir em paz. Meu sono foi atrapalhado inúmeras vezes, diversos pesadelos me atormentaram ao longo da noite, fazendo-me acordar muitas vezes assustada ou mesmo suando frio.

Corria o mais rápido que podia, olhando para trás sempre que possível para checar se ainda estava sendo seguida. Aquele homem corria rápido demais, quase conseguia alcançar-me e parecia não fazer o mínimo esforço. Tropecei e caí de cara no chão. Levantei em desespero e voltei a correr. Sem fôlego, meu coração doía no peito enquanto meu pulmão implorava por mais ar. Meus músculos começavam a ficar rígidos e a tremer intensamente. O desespero me atrapalhava, e eu não conseguia de nenhuma forma manter a calma.

Senti algo perfurar minhas costas. Uma dor imensa me invadiu e eu não consegui ficar de pé. Fraquejei e caí no chão. Ao conseguir virar-me percebi aquela mesma sombra parada diante de mim, com sua faca curva manchada de vermelho, brilhando com a luz da lua. Sentia o sangue quente escorrendo pelas minhas costas e espalhando-se ao chão onde permanecia deitada, imóvel. Minha visão começava a ficar turva e eu não conseguia mover um músculo. O ser levantava a faca cada vez mais para o alta. Um movimento rápido na minha direção e...

Coloquei a mão em meu peito, sentindo meu coração que batia fortemente, enquanto eu sem fôlego arfava com força. Estava tendo muitos pesadelos naquela noite, um seguido do outro. Deitei de lado e procurei me acalmar. Pouco a pouco minha respiração e meus batimentos cardíacos voltaram ao normal e eu consegui me acalmar um pouco, suficiente para começar a ficar com sonolência.

Alguém vinha caminhando em minha direção. Eu estava encurralada em um desfiladeiro.

- Sua hora chegou – Disse com sua voz fria como gelo, fazendo-me tremer e gelar até os ossos. Tirava uma faca discretamente da lateral da cintura enquanto aproximava-se de mim. Segurou meu queixo, murmurou algumas palavras em latim, creio eu. Ergueu a faca ao meu alcance de vista e enttão...

Levantei gritando. Corri meu olhar em volta, mas ainda estava no mesmo local. A mesma sombra negra, com a voz fria e cortante. Vários pesadelos que não me deixavam dormir em paz. Eram sempre pesadelos semelhantes. Porque eles estavam acontecendo, e porque só agora? Já tinham sido mais de quatro. Tinha medo de adormecer e ter outro pesadelo, então resolvi esperar acordada até o sol nascer.

Voltei a caminhar sobre a neve, desta vez com mais dificuldade do que no dia anterior. Uma forte nevasca me forçava na direção contrária a qual eu tentava caminhar, enquanto a neve afundava sob meus pés.

Continuava minha procura incansavelmente, quando senti uma forte presença. Cambaleei e caí ao chão, enquanto sentia como se algo estivesse tentando esmagar-me. Arfei enquanto estava apoiada com as mãos do chão, aguardando a dor lentamente sumir.

- Aqui – Sussurrou subitamente em minha mente – Aqui, mi hermosa – Chamou com força. Eu sentia como se agora tivesse uma bússola. Jesse... Eu sabia onde Jesse estava, finalmente. Uma lágrima escorreu pelo meu rosto.

Uma caverna, escondida por uma floresta de pinheiros cobertos de neve, na base de uma das montanhas. Era escura e parecia ser muito funda. Enquanto caminhava, suas paredes ficavam cada vez mais largas e o teto mais alto a medida que avançava. Passei por abismos, lagos de águas termais, poços cheios de cobras e até mesmo rios lava quente escorrendo ao fundo de alguns desfiladeiros. A caverna era muito mais profunda do que pensei e tinha muitos túneis. Tentava localizar Jesse constantemente para não me perder naqueles túneis intermináveis. Avancei tanto que por um instante me perguntei se chegaria até o Brasil.

Cheguei a um penhasco com lava corrente ao fundo e uma pequena passagem, a qual parecia muito perigosa, pela lateral de uma das paredes. Não parecia ser firme, então dei um passo de cada vez. Acabei precipitando-me quando achei que já estava em segurança: Ao avançar mais um passo, o chão sob meu pé cedeu. Perdi o equilíbrio e num impulso consegui lançar-me e agarrar a borda do outro lado. Sentia o solo a esfarelar-se sob minhas mãos. Minha respiração pesava. Com dificuldade consegui erguer-me do precipício e voltar a colocar os pés no chão. Apenas alguns segundos depois de sair daquele lugar, todas as suas bordas cederam pelo menos um metro. Engoli em seco.

- Tive muita sorte – Murmurei, enquanto olhava em volta – Só espero que essa caverna tenha mais de uma saída.

Andei durante um tempo indeterminado, já que não tenho muita noção de tempo. Avistei uma parte mais clara, e pude ouvir sussurros ao longe. Eu sabia que estava chegando perto, podia sentir a forte presença de Jesse.

Estou chegando, pensei. Trinquei os dentes e corri na direção da fraca luminosidade. Era uma caverna que parecia ser como qualquer outra, tendo apenas a diferença de que dela eu ouvia ruídos frequentemente, misturado com vozes e outros sons. Agachei-me no chão e aproximei-me da entrada, apenas o suficiente para poder ouvir melhor, tentando não ser notada. Parei ao chegar não muito perto, arfando e com o coração acelerado. Permaneci imóvel enquanto escutava alguém tendo uma conversa nada amigável com Jesse. Primeiro consegui ouvir apenas ruídos, gemidos e gritos, seguidos de uma conversa que pude compreender.

- Diga-me onde se escondem! – Gritou uma voz que me parecia familiar.

- Nunca – Disse outro num sussurro forçado e rouco. Meu coração batia alto e forte. Era Jesse. Ele não parecia estar bem. Ouvi um som que pude familiarizar como um soco, seguido de gemidos baixos. Uma lágrima escapou e logo eu rapidamente a sequei com a manga de minha blusa.

Ouvi passos fortes de um lado para o outro.

- Sua última chance – Disse a voz familiar, firme e decidida. Aguardei alguns segundos, porém não consegui compreender se Jesse disse algo. Ouvi sons sufocantes, me provocando um aperto no peito. Eu sabia que alguém estava fazendo mal a Jesse, eu me sentia péssima só de pensar. Um silêncio tomou conta do lugar, um silêncio perturbador. Todas as coisas pareciam prender a respiração, apenas esperando uma próxima atitude. Não pude mais ouvir qualquer voz, apenas as fortes batidas do meu coração. Estava começando a ficar desesperada quando fui surpreendida. Senti um braço forte e frio sendo enroscado em meu pescoço, forçando-me a ficar de pé. Segurei-o com as duas mãos, tentando evitar que fosse sufocada.

- Então nos encontramos novamente – Sussurrou em meu ouvido – Estou tão surpreso em te encontrar quando acredito que você esteja – Sentia seu hálito batendo em meu pescoço, fazendo-me arrepiar por inteiro. Então acabei reconhecendo de onde vinha aquela voz fria, aquela voz e aquela sombra que me perseguiam incansavelmente, com sede por sangue. Aquela alma negra que não me deixava em paz.

- Victor.