dilúculo

Só amigos, então


Ao que parece, os alunos estão sempre muito animados na primeira festa da escola, porque todo mundo não tem problemas com notas ou qualquer cansaço com nada, ou seja, todo mundo dança muito ao som da música alta. Os calouros, são um pouco mais tímidos, mas, ainda assim, tentam se divertir ao máximo.

Não estou me sentindo muito deslocado porque estou com Sokka. Chegar sozinho em uma festa como essa me deixaria completamente maluco. Provavelmente eu nem viria. Estaria no quarto sozinho, lendo alguma HQ de Avatar. Mas quero que as coisas sejam diferentes a partir de agora, então vou me esforçar mais.

Enquanto caminhamos pela festa cheia — porque Sokka está procurando onde a sua namorada está, Katara segura em meu braço e me puxa em sua direção.

— Aang!

Eu sorrio quando a vejo.

— Nossa, uau, você está incrível! — ela grita por cima da música alta, enquanto se inclina em minha direção.

— E você também! — grito de volta, porque ela está realmente muito bonita. Está usando um vestido curtinho na cor azul que tem alças de babado e está usando saltos bem altos, o que a deixa ainda mais alta que eu. Ela está maquiada e ainda mais bonita do que estava pela manhã. — Eu adorei a sua make.

— Foi o Mako que fez! — grita ela de novo. — Ele é um ótimo artista, então, nada mais justo que me ajude com a maquiagem.

Sorrio mais um pouco, eu adoraria ter um namorado que me ajudasse nas minhas coisas também.

— Minha querida irmã, eu também estou aqui, não sei se você notou — Sokka resmunga.

— E está feio como sempre, não tenho nenhuma razão para te elogiar — ela debocha.

Sokka leva as mãos ao peito, como se tivesse acabado de tomar um tiro.

— Você é muito má.

Ela mostra a língua para o irmão e eu rio alto, me divertindo com a dinâmica deles dois.

— Ei, vocês viram o Mako? — ela pergunta, nos olhando. Eu balanço a cabeça em negativa.

— Não — Sokka diz. — E você viu a Toph?

— Ela está na mesa de cartas. Está tirando dinheiro de todo mundo — Katara diz, sorrindo. — Eu vou procurar o Mako.

— E eu vou procurar a Toph!

Os dois irmãos não demoram mais que alguns poucos segundos para darem no pé me deixam sozinho no meio daquele salão lotado. Eu olho para o local cheio de gente dançando e faço o que eu costumo fazer de melhor em festas. Me movo apressado em direção a mesa da comida.

Estou concentrado montando um prato de comida quando escuto alguém perguntar:

— Arte comestível?

Me assusto e acabo batendo a mão em uma bandeja cheia de maçãs do amor, caramelizada com açúcar e chocolate e derrubo a maçã do topo. Zuko é muito rápido e chuta a maçã antes que ela caia no chão diretamente para suas mãos.

Encaro sem jeito.

— Olá — diz ele, me olhando e sorrindo.

— Oi — falo meio sem jeito e estico a mão para pegar a fruta que ele estende na minha direção.

— Você está bonito. — Sinto as bochechas arderem e ele sorri e continua falando. — Gostei do boné com a flecha azul, me lembra aquele garoto do Avatar.

Sorrio. Não sabia que ele curtia Avatar.

— Eu vou te contar um negócio. Estou com a sensação de que eles estão tentando juntar a gente — diz Zuko.

Olho para ele, que observa a mesa, tentando decidir o que vai comer. Ele acaba pegando a maçã que acabei de devolver para a pilha e tira do saquinho e morde, fazendo um barulho.

— Não é uma sensação. É um fato.

Ele assente, mas não diz nada.

— Eu também vou te contar um negócio. Sokka está preocupado que a gente fique de vela.

Zuko ri.

— Katara também — ele completa.

— É...

— É... — Ele me imita. Então pensa por um tempo. — Como se eu precisasse disso...

O que ele quer dizer com isso?

— Então, deixa eu te contar outro negócio. Só para você ficar logo sabendo, eu não estou interessado — digo, desviando o olhar dele e da mesa também. — E não, não estou falando isso só para fingir desinteresse e esperar que você tente algo comigo, tipo em fanfic...

Não faço ideia do porquê estou falando isso. Acho que não gostei da forma como ele falou: Como se eu precisasse disso. Pelo que eu me lembro foi ele que ficou sorrindo quando me viu a primeira vez. Não eu.

— Eu não estou mesmo interessado, real.

Ele dá um sorrisinho.

— Eu não me lembro de ter expressado interesse em você — responde Zuko, segurando um risinho.

— Não expressou desinteresse quando ficou sorrindo para mim, então achei melhor avisar logo. Para não haver nenhuma confusão depois.

— Muito obrigado por explicar uma coisa que não estava nem confusa, para começo de conversa, Aang.

Ele me olha de perto e eu sinto a respiração ficar um pouco mais lenta.

Zuko é muito bonito, muito bonito, mas acabou de me dispensar depois que eu o dispensei. E para falar a verdade, não sei quando foi que criamos esse clima passivo-agressivo. A aura está um pouco pesada agora. O que é bem estranho, porque minutos atrás estávamos os dois trocando sorrisinhos que me pareciam flertes.

— Pelo visto, nós vamos decepcionar o pessoal e teremos duas velas agora... — digo.

— Você tem razão — diz ele.

Sinto meu rosto arder com o rubor e desvio os olhos depressa, sem saber ao certo como sair dessa agora.

Quando olho para Zuko novamente ele voltou a sorrir de forma simpática como fez ontem e de manhã.

— Eu vou dar uma volta — diz ele. — Foi bom ver você, Aang.

— Foi...

Ele sai e me deixa sozinho. Enquanto ele caminha apressado, cortando o caminho pelas pessoas eu começo a pensar que isso foi bem estranho e não sei ao certo se a culpa foi dele ou minha.

***

Zuko e eu não voltamos a nos esbarrar na festa. O que foi muito bom, porque depois do constrangimento não queria que ele me visse dançando com Katara e Toph como se fosse uma barata envenenada com Baygon, prestes a morrer.

Depois de muito dançar — me mover sem saber o que estava fazendo — decido sair do salão para procurar Sokka, que desapareceu há muito tempo.

Caminho por um tempo, ficando mais distantes da música alta que toca lá dentro, na festa, e vejo muitos casais se beijando — o que é um pouco constrangedor.

Quando finalmente encontro Sokka, ele está na beirada do pátio externo, olhando para o mar e bebendo alguma coisa que não parece refrigerante.

Encosto na amurada ao lado dele.

— Não conte para ninguém que me viu bebendo isso — diz ele. — Quer um gole?

Balanço a cabeça em negativa.

— Quer saber, quero sim — digo. Então pego a bebida da mão dele e dou um gole. Minha vontade é cuspir tudo. — Foi a minha primeira bebida e a última, isso é horrível.

— Foi um conhecido de Toph que fez.

— Em um vaso sanitário? — pergunto. — Porque é uma merda.

Meu novo amigo começa a rir.

— Então me devolve. — Ele toma a bebida da minha mão. — Eu vi você conversando com o Zuko mais cedo, pelo visto o meu plano está começando a dar certo.

— Nem me lembre disso, o seu plano não está dando nada certo... E eu nem queria que esse plano existisse.

— Por quê? — pergunta ele.

— Zuko me dispensou, então, eu o dispensei também, ou talvez, isso tenha acontecido na ordem inversa, não sei, não me lembro o que foi que aconteceu de fato, estava nervoso demais — digo, sem jeito. — E tipo, eu nem estava a fim dele, então não faço ideia do que aconteceu. Mas bom... Eu nunca tive um relacionamento antes. Mal beijei em toda a vida. Não sei lidar com isso e nem quero lidar com nada disso...

— Ei, então respira e confia no pai que eu vou te ajudar com essa situação toda — Sokka me interrompe.

— Não! — peço. — Eu estou de boas... eu não quero...

— A Katara está procurando por vocês! — Zuko, que eu nem vi chegando está procurando por vocês.

— Então eu vou buscar a galera e nós vamos terminar a noite aqui fora bebendo isso — diz Sokka, empurrando a garrafa para a mão de Zuko. — Enquanto eu não volto, conversem.

Ele sai.

Zuko cheira a bebida, mas não bebe.

Me mexo desconfortável e então me viro para a amurada. Ele coloca a garrafa no chão e faz o mesmo. Se vira e encosta o quadril na amurada. Nós ficamos os dois encarando a água, fingindo que a situação não é constrangedora depois de tudo que aconteceu. Mas a verdade é que é, pois eu não sei o que dizer agora. Nunca fui bom em dizer nada e não tenho nada em comum com esse cara. Ele também não tem nada em comum comigo. Nós mal nos conhecemos e mesmo assim tivemos uma péssima interação.

— Eu...

— Não tudo bem, não precisamos falar sobre o que aconteceu — interrompo.

— Mesmo?

Balanço a cabeça em afirmativa.

— E vamos ficar de boas com isso? — Zuko pergunta.

— Nós vamos sim.

— Certo.

Eu tento sorrir.

— Você tem certeza que vamos ficar de boas com isso? — pergunta ele mais uma vez.

— Eu tenho sim.

— Nós podemos ser amigos?

— Sim, mas só amigos — completo rapidamente.

Zuko ri.

— Só amigos, então?

— Aham.

Zuko me estende a mão.

— Vamos fazer um trato então...

Levo a minha própria mão até a dela, que é muito mais macia que a minha e aperto.

— Só amigos!

— Só amigos, então — confirmo.