Zodíaco
0.14 Prypat — Crânios quebrados
Podemos facilmente perdoar uma criança
Que tem medo do escuro;
A verdadeira tragédia da vida é quando
Os homens têm medo da luz
— Delírio Insignificante, Pauline Morris (e Jordan Packson)
Dois dominadores investiram contra o desconhecido, e o primeiro morreu em seguida, com uma faca de cozinha entre os olhos. O segundo hesitou, pisou em falso e foi derrubado por um salto do estranho, que subiu em seu peito com os joelhos. O dominador sentiu um agarro firme trancando o braço – para que não exercesse sua dominação -, os ossos do pulso quebrado e uma dor aguda; mordida na garganta. O intruso se levantou, a boca e o peito encharcados de vermelho, e olhou á sua volta.
Estava cercado. Seis outros guardas – poucos eram os dominadores visíveis, isso era uma ótima noticia - á sua volta, o senhor que gritara e dois jovens, mas o o intruso não contou quantos eram. Talvez não se importasse, ou talvez não conseguisse. Certamente não entendia por completo o que estava acontecendo. O intruso era mais animal do que gente.
— Ethan, chame o Garcia do setor 6. — disse o homem calvo para o menor dos rapazes. — Diga-lhe que precisamos de reforços.
O intruso entrara na casa porque sentira fome, lá havia cheiro de comida. Dois dois homens haviam tentado barrar sua passagem, matara apenas um; não se importava, contando que chegasse ao seu objetivo. A casa tinha dois andares, era cheia de cômodos e móveis, mas ele achara logo a origem do cheiro.
Seu corpo todo tenso, esperando os guardas atacarem. O intruso sabia que o homem calvo, embora fosse o mais fraco, era o líder por ali.
E então, dois dos seis guardas atacaram.
O estranho girou o corpo, tentando esquivar-se, mas foi atingido. Duas espadas atravessaram seu estômago e peito, entrando pelas costas e ainda antes de seus olhos capitarem o movimento. Ele terminou o giro, voltando-se de novo para os inimigos. As mãos enormes agarraram os rostos dos dois guardas. Um som nauseante de ossos se quebrando enquanto o estranho apertava as duas mãos, estralhaçando os dois crânios. Um dos inimigos sobreviventes não conteve o vômito. Os corpos foram arremessados, derrubando um dos guardas restantes, enquanto outro escorregava em uma farta poça de sangue. O único em condições de lutar foi atacado pelo intruso, que agarrou-o em um abraço, perfurando-o com as pontas de espadas que brotavam de seu próprio corpo.
Desencilhou-se com dificuldade do cadáver e partiu em direção ao homem calvo e ao rapaz. Eles voltaram a gritar, e correram, mas os braços longos do intruso pegaram-nos pelas roupas, e trouxeram-nos para junto de si.
— Só. Embora. — disse o intruso, com dificuldade. Tropeçava nas palavras, era difícil lembrar de todas elas.
— Vá. Por favor. — disse o homem calvo. — Apenas vá.
Talvez o estranho não tenha entendido o que o homem dizia, ou talvez tenha decidido que não valia mais a pena. Com um gesto violento, bateu a cabeça do homem na parede, e mais três vezes, até que um riacho vermelho se despejasse. De novo, gritos do menino. O estranho, sem paciência, largou o corpo do homem calvo e quebrou o pescoço do rapaz. Olhou os guardas, mas nenhum deles ousava enfrenta-lo. De repente, ouviu atrás de si uma voz fina, e sentiu a picada de muitas flechas em suas costas.
O primeiro dos meninos havia voltado, com vários outros guardas e o tal “Garcia”, que apontava furiosamente a flecha em sua cabeça. Estes não queriam chegar perto, atiravam com arcos e bestas. O intruso olhou diretamente para o rapaz, sorriu com dentes vermelhos de sangue e decidiu começar por ele.
...
Achila não viu sua mãe ser morta, apenas encontrou o corpo na cozinha. Não conseguiu gritar. Ao lado, também estirada no chão, uma criada. A garota espiou tudo, oculta no escuro de um armário, enquanto o intruso matava vários guardas do setor. Um deles tinha quase a sua idade, e já havia, de maneira tímida, flertado com ela. Morreu. Outro, ela saba, amigo de Frederick que tinha uma filho de dois anos. Morreu. Claro, muitas pessoas morreram, e eram tantas.
Havia algo bom dentro dela, ao ver Fred enfiar uma flecha prateada no crânio do inimigo, após mortes e gritos de dor. O Garcia sabia ser vingativo quando queria, mas era difícil saber quando o mesmo sorria dócil.
Ele a achou, muitas horas depois, ainda dentro do armário. Tentou explicar o que tinha acontecido, mas Achila já sabia.
— Minha família morreu. Eu sei, eu vi.
Ela percebera o quanto Frederick estava arrasado por ter de lhe dar a notícia. Achou melhor simplificar tudo. O capitão também disse que o intruso havia morrido, e que alguns grupos de dominadores ainda achava que haviam mais, então, foram procurar pela floresta.
Relutante, mandou recolher todos os corpos e organizou próximas caçadas. Dez de seus homens haviam sidos mortos naquela noite. Todos estavam em silêncio. Aquele era Frederick Garcia, sua história, todos conheciam, mas ninguém queria contar.
...
— Minha irmã deve estar afrentando essas mesmas... coisas. — Garcia resmunga, bebericando mais sua bebida. Olhando para o comandante.
— E meu filho está lá, fingindo ser um guarda de Collinwood. — ele reclama, revirando os olhos enquanto enfiava um enorme pedaço de torta dentro da boca. — Pare de reclamar, Frederick.
Os dois estavam sentados nos enormes bancos de metal, perto do balcão de vidro da cozinha. Os olhos do comandante fitavam o nada, enfiando em alguns segundos mais uma colherada na boca. Depressivo.
— Charlie deve estar bem lá, não se preocupe.
— Ele não é muito bom em seguir regras, Garcia. Na verdade, ele nunca seguiu regras. Provavelmente já deve estar esmurrando a cara de alguém ou morto, já se faz três meses. Não devo mais ter que esperar uma carta. — desabou, por fim.
— Talvez Selene o conheça, e tenha colocado juízo na cabeça deste adolescente rebelde. — Fred ri, sem-humor algum. — Ou talvez não, ela não deve estar muito feliz numa ala de doentes e...
— Eles iriam se matar se fossem amigos. — o comandante faz uma careta.
— Relaxe, Steven. O que poderia ser pior do que morar em uma ala psiquiátrica?
— Sair dela. Há vários perigos a mais do que enfermeiras demoníacas por aí, meu rapaz
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