Daniela estava sonolenta naquela manha, seu corpo parecia pesar mais do que o normal e seus olhos estavam pesados.

Caminhou lentamente até o banheiro de seu quarto e olhou-se no espelho. Seus olhos estavam levemente inchados e uma pequena olheira se formava abaixo de seus olhos. Imaginou que era pela hora em que fora dormir na noite anterior, pensando na viagem.

Retirou sua roupa e entrou no Box recebendo um jato de água fria antes de a mesma esquentar. Daniela lavou os cabelos, o rosto e lembrou se da noite anterior, onde os meninos estiveram ali brincando com ela.

Pouco antes de desligar o chuveiro, passou a mão novamente pelo cabelo e quando puxou, viu que vários fios estavam grudados em seus dedos.

Engoliu em seco.

Desligou a água e secou-se, vestindo-se logo depois.

Não pensaria nisso, não agora.

Vestiu uma saia com pregas preta e uma blusinha com estampa de tigre e passou uma leve maquiagem e tomou os medicamentos de costume.

Saiu do quarto e foi para a cozinha, parando na mesa para tomar o café da manhã, sozinha.

Seus pais haviam feito uma viajem há três dias, e Daniela não quisera ir. Ficara sozinha.

Dissolveu um chá em uma xícara e pegou um pãozinho que comprara com Carlos no dia anterior. Sentou-se a mesa e comeu ouvindo os passarinhos no jardim cantarem.

Quase nunca havia ficado sozinha desde que descobrira a doença e ainda era meio estranho para a menina isso, mas sabia que caso sentisse mal, poderia ligar para qualquer um dos meninos visto que eles eram praticamente vizinhos.

Carlos morava na mesma rua que ela. Mesmo quando se tornara cantor, não quisera se mudar, apenas reformou e aumentou a casa de seus pais. James, Kendall e Logan moravam a duas quadras, em apartamentos. Embora já fossem bem famosos, eles não deixaram as origens por assim dizer. Daniela após comer, resolveu dar uma volta pela rua, pensar um pouco. Vestiu um casaquinho por cima da blusa e colocou uma sapatilha. O tempo estava bom, não estava muito quente nem frio, mas numa temperatura ideal. A brisa soprava trazendo o aroma das flores e deixando o dia ainda mais lindo.

Daniela começou a caminhar pela rua, em sentido contrario a casa de Carlos e quando percebeu já estava a uma longa distancia de casa. Olhou ao redor das enormes casas e viu ao longe uma garotinha, brincando na grama de casa, sorrindo. Daniela ficou olhando-a. Nunca pudera brincar daquela maneira e uma parte de si queria ter aproveitado essa fase.

A menina olhou para Daniela e sorriu. Abaixou novamente a cabeça e voltou a brincar. Daniela ficou observando a menina. A casa da menina era grande, provavelmente era filha de alguém importante. A casa era toda em tons de lilás e envolta da casa havia cercas vivas, dividindo os quintais. Depois de um tempo a menina ergueu a cabeça novamente e olhou na direção de Daniela. Ela se levantou e foi indo em direção ao portão.

- Oi moça, você quer brincar comigo? - Ela perguntou.

Daniela sorriu e a menina sorriu ainda mais.

- Sua mãe não vai brigar? - Daniela perguntou chegando mais perto do portão.

- Não, minha mãe não está, estou sozinha com a empregada. Você quer brincar? - ela novamente perguntou com os olhinhos brilhando intensamente.

- Sim. - Daniela respondeu.

A menina abriu o portão e deixou Daniela passar, fechando logo depois.

- Qual o seu nome moça? - a garotinha perguntou segurando na mão de Daniela.

- Eu me chamo Daniela e você?

- Eu sou a Bianca. Mamãe disse que meu nome é bonito e por isso ela o colocou em mim. - a menina disse feliz.

- Seu nome é mesmo muito bonito. - Daniela disse.

- Eu tenho sete anos e você? - Bianca perguntou-lhe.

- Eu tenho Vinte e Um. - Daniela respondeu-lhe.

- Mamãe fala que não posso chamar a todos para dentro de casa, porque as vezes as pessoas não querem só brincar, mas você não vai fazer nada né? - Bianca disse inocentemente.

- Bianca, sua mãe esta certa, mas eu não vou fazer nada tudo bem? Quando eu era pequena, eu não podia brincar assim como você. - Daniela contou.

- Porque não?

- Porque desde pequena eu descobri que eu tinha uma doença e eu não podia brincar, quando eu brincava cansava muito, e tudo me fazia mal.

- O que você tinha? - Bianca continuava a perguntar após sentarem-se na toalha que estava no jardim com as bonecas em cima.

- Eu tinha Leucemia. É uma doença que deixa o sangue liquido e você fica fraco. - Daniela tentou explicar.

- Eu sei o que é Leucemia Daniela, meu irmão tinha isso e ele morreu. Faz tempo já, eu me lembro bem pouco dele. Mamãe tentou achar alguém para doar o que meu irmão precisava mas ninguém quis doar. Ele morreu com a minha idade. Eu tenho uma foto dele aqui. - Ela puxou uma corrente do pescoço e mostrou um coração. Ela abriu e tinha uma foto dela e de um menininho. O menino estava careca, mas sorria.

- O nome dele era Jonah. - Bianca contou.

- Eu sinto muito Bia. - Daniela disse e abraçou a menina.

- Às vezes eu sinto falta dele, ele brincava comigo. - Bianca disse abraçada a Daniela.

- Sua mãe saiu? - Daniela disse. Queria conversar com ela.

- Sim, ela foi ao mercado, mas logo ela chega. Você quer brincar com a Barbie ou a Tereza? - Bianca esticou as bonecas para Daniela. Ela sorriu.

- Eu quero a Tereza. - Daniela pegou a boneca e ficou ali, brincando com Bianca. Hora com as bonecas, hora com as panelinhas da menina, e depois de um longo tempo, Daniela pegou um livro para ler para ela. Começou a historia de A Bela e a Fera e viu que Bianca foi sentando-se mais e mais próxima a ela até que dormiu com a cabeça em seu colo.

Daniela fechou o livro e suspirou. Estava cansada. Ajeitou a menina em seus braços e segurou-a delicadamente ali, embaixo da arvore. Viu um carro se aproximar e entrar na casa, mas não prestou muita atenção.

- Olá? - Uma mulher de cabelos pretos e lisos se aproximou dela.

- Oh, oi. - Daniela disse assustada.

- Bianca dormir?

- Sim, estava lendo para ela. - Daniela apontou para o livro.

- Ah sim, ela gosta dessa história. Eu sou a Kimberly, mas pode me chamar de Kim. Sou a mãe da Bianca. - A mulher falou e abaixou-se perto de Daniela.

- Eu sou a Daniela, moro nesta rua ali mais para frente. Estava andando quando vi a Bia e ela me convidou para brincar. - Daniela contou.

- Eu imaginei. - Kim disse sorrindo. - Ela sempre chama as pessoas para brincar com ela, as vezes temo por isso mas não posso brigar com ela. Ela sente muito a falta do irmão, Jonah.

- Ela me contou. Eu sinto muito.

- Às vezes é bem difícil para eu cuidar disso sozinha. Meu marido vive trabalhando e fazendo viagens longas e a Bia sente falta de Jonah e do Pai. Para ela, só eu não é o suficiente. Mas que bom que ela te convidou. E pelo jeito brincaram bastante, olhe como ela dorme. - Kim apontou para a filha maravilhada.

- Bia é um anjo. - Daniela falou sorrindo. A menina era realmente muito fofa e querida, e pelos olhos dela davam para ver como ela sentia falta do irmão.

- Mamãe... - Bia abriu os olhos lentamente e chamou por Kim.

- Oi meu amor, estou aqui falando com sua amiga. - Kim disse.

- Daniela? - a menina abriu os olhos pulando. - Você ainda esta aqui! - Ela abraçou Daniela fortemente.

- Sim Bia, ainda estou aqui.

- Geralmente quando eu durmo as pessoas vão embora. - Bia fez uma carinha triste.

- Mas eu não fui.

- Você vai almoçar comigo não é Dani? Diz que sim, por favor! - Bianca estava agitada.

- Por favor, almoce conosco. Será um prazer tê-la conosco. - Kim convidou-a.

- Tudo bem então, eu almoço com você! - Daniela disse e começou a fazer cócegas em Bianca que ria sem parar.

- Vamos entrar? Lavar as mãos para almoçar! - Kim disse e Bianca pulou.

- Vem Dani, vamos lavar as mãos! - Bianca puxou Daniela pela mão guiando-a calçada até uma área antes da cozinha.

Elas lavaram as mãos e foram para a cozinha.

Kim já as aguardava.

- Podem servir-se. Marta fez só coisas gostosas hoje! Bianca espero que coma bastante hein? Olha que temos uma convidada hoje!

- Mamãe, sabia que a Daniela tem a mesma doença que o mano? Ela também tem leucemia. - Bianca estava sentada de frente para Daniela com a mão na ponta da mesa.

- É mesmo Daniela? Mas você parece tão bem, tão saudável. - Kim disse ficando seria.

- Agora eu estou bem, mas já fiz tantos tratamentos, e como sabe a ALA é instável, então tive que aprender a viver com isso. - Daniela disse calmamente. Ela sabia que ela já não estava tão bem quando o mês anterior ou até mesmo o ano anterior.

- Quantos anos você tinha quando descobriu a ALA?

- Eu tinha nove anos. Faz Doze anos que eu faço tratamento. - Contou Daniela.

- Você já fez transplante de medula óssea? - Continuava a perguntar Kim.

- Não, nunca achei ninguém que fosse compatível.

- Eu sei como é. Jonah tinha dois anos quando descobrimos que ele tinha ALA, dai eu tive a Bia na esperança de eles serem compatíveis por serem irmãos, mas não eram, e quando encontramos um doador, no Brasil, para Jonah, ele não tinha mais força para aguentar. Ele faleceu dormindo em casa, com apenas sete anos. - Kim contou e uma lagrima saiu de seus olhos.

- Mamãe, não chora! - Bianca foi correndo abraçar a mãe quando a viu chorar.

Daniela sentiu um nó se formar em sua garganta.

- Eu sinto muito... - falou num sussurro, a voz não saia.

- Está tudo bem. Faz dois anos que ele faleceu, e as vezes quando me lembro do quanto ele sofreu, me dói sabe? Hoje se eu soubesse que haveria outros meios de ajuda-lo ou de conseguir um doador, eu fazia tudo para que ele conseguisse. Depois que Jonah morreu todos nós nos tornamos doadores de medula óssea. Acho que, para muitos é necessário passar pela dor para se conscientizar de que é necessário. Não faz falta para alguém saudável retirar algumas ml e doar para alguém que precisa. É um processo tão simples, como levar tirar sangue, a única diferença é que em vez de ser no braço geralmente é na bacia ou espinha. Mas é algo tão gratificante Daniela, que olha, acho que tudo o que já fiz até hoje, essa foi a melhor coisa. Após Jonah ir, eu tirei um pouco da minha e deixei para testes de compatibilidade. Ano passado, um homem era compatível comigo e eu pude doar a ele. Agora, ele pode brincar novamente com os filhos e levar uma vida quase normal de novo. Eu fiquei tão feliz em poder ajudar. - Kim sorriu segurando Bianca no colo. - Sabia que até a pequena Bia é doadora? E não fomos nós que a mandemos doar, ela quis. Ela conheceu varias crianças no hospital quando Jonah estava lá e ela queria ajudar, não é minha princesa? - Kim disse olhando para a menina.

- Não dói Dani, é só uma picadinha não é mamãe? - a menina disse e a mãe assentiu.

Daniela sorriu para a pequena.

- Que bom que você pensa assim Bia, talvez um dia você possa ajudar alguém que você goste muito. - Daniela incentivou-a.

Kim colocou Bianca em sua cadeira novamente e todos começaram a almoçar.

Depois do almoço, Daniela sentiu-se um pouco cansada, mas não disse nada. Ficou ali com Kim e Bianca a tarde toda e apenas no inicio da noite voltou para casa.

Estava exausta.

Brincara tanto com Bianca que até esquecera-se do ocorrido pela manhã.

Prometera a menina que voltaria no dia seguinte para brincarem mais, mas durante a noite estava cansada de mais.

Voltara a pensas na viagem com os meninos, seria legal. Ferias. Mas ponderara sobre a saúde naquele momento.

“Não olhe para longe, eu estarei onde você estiver”

Lembrou-se das palavras de Carlos na noite anterior e pensou sobre isso. O medo sempre fora uma constante na vida de Daniela, mas talvez ela não devesse mesmo 'Olhar para longe', talvez pudesse apenas viver o presente e contar que seu amigo estaria ali com ela. Deitou-se na cama e rapidamente adormeceu, o cansaço era grande e Daniela sabia que as coisas não estavam bem