Todos em Paris conheciam os Marchand e todos invejavam sua fortuna completamente sem medidas. Os donos das lojas ficavam felizes, afinal, o que podia render mais lucros do que mulheres? Ainda mais se elas forem milionárias? Mas Gabrielle não estava ali para comprar mais coisas do que já tinha para si, e, sim, para comprar tudo o que Alina estava precisando.

E ela precisava de tudo. Gabrielle comprou diversos vestidos, sapatos, escovas, sabonetes, perfumes, joias, acessórios... Comprou roupas que encheriam um guarda-roupa inteiro.

Ela estava olhando um vestidinho em tom pastel quando sentiu mãos conhecidas na sua cintura.

— Você termin... – Nicolas se calou ao ver o monte de coisas que Gabrielle havia separado apenas em uma loja. – Que diabos é isso?

— Coisas para Alina. – ela disse, sem dar a mínima atenção para o marido.

— Alina tem tudo o que precisa. – ele disse friamente, enquanto Gabrielle continuava a examinar o vestido.

— Aí é que você se engana. Ela não tem nada, parece um menino. – ela disse com frieza. – Eu vou cuidar dela.

— Preste atenção – Nicolas cerrou os lábios por um momento e continuou – eu não sou o tipo de homem que volta atrás em uma decisão, então, não me importune.

O vendedor, que trazia uma pilha de coisas para onde Gabrielle estava, deu meia volta e sumiu para dentro do depósito.

— Jura? Pois deixa eu te contar uma novidade – Gabrielle jogou o vestido no monte de coisas que compraria e virou-se para se ele, erguendo a cabeça para encarar facilmente os olhos azuis de Nicolas – eu não sou o tipo de mulher que abaixa a cabeça, então, não me subestime. Eu vou levar as coisas para Alina, sim.

Nicolas retribuiu o olhar da esposa com outro ainda mais furioso, mas nem isso a fez abaixar a cabeça. Todos na loja percebiam que ambos estavam brigando pelo olhar, porém o olhar dele suavizou em um sorriso de deboche.

— Tudo bem. – ele disse e se virou para a pilha de coisas e pegou diversos vestidos de festa que estavam ali. – Mas isso, isso não vai.

O sorriso debochado continuava ali e Gabrielle empalideceu. Como assim não poderia levar os vestidos de festa? Nicolas era absurdo. Mas ela abriu um sorriso leve, tinha vindo preparada para alguma situação como aquela.

— Okay, os vestidos finos ficam. – ela tirou a “pequena” parte deles do enorme monte de roupas. – Podemos ir?

Nicolas a encarou, surpreso, mas achando graça de toda aquela situação. Ela foi até o caixa da loja, que teve um surto de prazer quando Nicolas lhe pagou tudo em dinheiro vivo. Ele voltou para o carro e Gabrielle fingiu estar conferindo as compras, mas, quando ele saiu, ela tirou um pequeno bolo de notas do decote e comprou os vestidos, misturando as sacolas.

Voltou para o carro sorrindo e eles seguiram em silêncio para casa, já que Nicolas fez questão de ir no mesmo carro que ela, já que tinha pedido que um funcionário da empresa fosse buscar o seu carro.

Quando chegaram à mansão, ele rumou ao escritório e Gabrielle rumou para o quarto de Alina, com diversos empregados carregando as caixas, pacotes e sacolas que estavam no carro atrás dela.

— Ali? – Gabrielle bateu levemente na porta do quarto da menina. – Posso entrar?

— Claro! – Alina já estava de pé e quase teve um ataque quando viu todas as caixas de presentes que abarrotavam o corredor.

A menina foi deixando os empregados entrarem e, aos poucos, o quarto foi se enchendo com todas aquelas coisas. Ela e Gabrielle se divertiram rasgando tudo de velho e cinza que a menina tinha: roupas, roupas de cama, cortinas, tudo.

Depois, elas começaram a reorganizar tudo com as coisas novas. O guarda-roupa ficou lotado e o quarto ficou com uma aparência romântica, delicada, completamente diferente do que era antes com aquela nuvem cinza por todo canto.

***

As semanas iam passando e Alina ia aprendendo cada vez mais. Já sabia comer corretamente e andar com os sapatos novos.

Num desses dias, Gabrielle estava com ela e começou falando enquanto se sentava:

— Verdadeiras damas nunca cruzam as pernas, deixam ficar gentilmente relaxadas. – Ela apontou para as pernas e Alina a imitou com delicadeza. Gabrielle sorriu e bateu palmas, a abraçando logo em seguida.

Ela não sabia, mas Nicolas estava observando a cena pela porta entreaberta. Ele revirou os olhos, balançou a cabeça negativamente e saiu dali rindo.

***

Logo passou um mês. Alina estava realmente uma dama, irreconhecível.

Em uma manhã imprevista, Elena e Louis voltaram para casa.

— Victor? – Nicolas perguntou quando percebeu que o irmão não estava lá.

— Melissa deu problemas, não quis que ele voltasse para casa conosco, então ele vem depois de amanhã. – Louis disse e Nicolas revirou os olhos, o que o fez rir.

— Já reparou como as mulheres tem uma incrível facilidade de trazerem má sorte? Além de trazerem muitos problemas. – Nicolas fitava Gabrielle de uma forma aterrorizadora.

— Eu já disse que você é insuportável hoje? – Gabrielle o encarou e perguntou, se fazendo de curiosa.

— Não, hoje ainda não. – Ele sorriu debochado.

— Pois você é. O ser mais absurdo e insuportável que eu conheço. – Ela sorriu falsamente. Elena arregalou os olhos, primeiro porque jamais falou ou falaria daquele jeito com Louis; segundo, pela coragem da amiga em desafiar o marido.

— Era por isso que não queria casar comigo? – ele sorriu, implicando ainda mais.

— Vai pro inferno, Nicolas! – Gabrielle puxou Elena pelo punho, arrastando a amiga para fora da sala junto com ela.

***

Após desfazerem a bagagem, os quatro almoçaram. Logo em seguida, Nicolas e Louis saíram, deixando as duas mulheres a sós.

— Fomos a Londres! – Elena começou animada. – Trouxe tantos presentes.

A ruiva sorria de orelha a orelha. Era meio doidinha, mas Gabrielle gostava que fosse assim, sua alegria contagiava a todos. Ouvia as histórias da amiga com atenção e com um sorriso no rosto. Sentia falta de ter alguém para conversar.

— Agora, me conte tudo! – Elena foi reduzindo o tom de voz. – Como foi a noite de núpcias? Nessa cama enorme... – ela encarou Gabrielle e se jogou na cama, abrindo os braços.

— Foi no chão da sala. - Gabrielle sorriu sem jeito e foi até a varanda do quarto.

— Não chão da sala? – Elena perguntou, confusa.

— Eu tentei fugir.

— Por quê? – Elena sentou e encarou a amiga. – Quero dizer, minha primeira vez foi difícil. Eu não tinha a menor ideia do que fazer e Diego era tímido demais. Mas conversamos e, quando estávamos calmos, aconteceu. Ele foi um amor comigo. – ela sorriu ao lembrar, mas seu sorriso foi dando lugar a cara de preocupação. – Por que você fugiu?

— Eu tinha medo. – Gabrielle confessou, lembrando o acontecido. – Me machucou muito, sangrou... – ela balançou a cabeça de um lado para o outro, tentando espantar as memórias.

— E depois? – Elena perguntou e Gabrielle a encarou, confusa. – Não aconteceu de novo? – Gabrielle negou com a cabeça. – Eu e Louis fazemos todo dia, eu gosto. – a ruiva sorriu radiante e Gabrielle se entristeceu.

— Sei que estou faltando com minhas obrigações de esposa, mas eu não faço a menor ideia de como agir perto dele. – ela franziu a sobrancelha e encarou a amiga. – Nicolas me assusta.

— Louis é ótimo. – Elena abre o maior sorriso novamente.

— Chega desta conversa! – Gabrielle atirou um dos travesseiros na amiga e outra vez lembrou-se do sorriso de Oliver. Elena percebeu o olhar distante que apareceu no rosto dela.

—E essa carinha? – ela apertou as bochechas de Gabrielle de leve. – Pensando naquele lindo do Oliver?

— Como você sabe? – Gabrielle arregalou os olhos.

— Eu te conheço.

***

O jantar foi normal, estavam os quatro à mesa novamente. Gabrielle, após algum tempo, pediu licença e saiu, deixando Louis e Nicolas conversando e Elena olhando um canal de compras. Passou no quarto de Alina e desejou boa noite a menina; em seguida, rumou para o seu quarto, tomou um banho e deitou, ficando encolhida em seu lado da cama.

Adormeceu antes de Nicolas deitar e, quando acordou, ele já havia saído. Agradeceu mentalmente por isso, não precisava de mais uma briga. Fez sua higiene, tomou banho e colocou um vestido rosa bebê soltinho; também deixou os cabelos soltos.

Foi até a cozinha e preparou uma bandeja para Alina. Todos os empregados da casa gostavam da menina, afinal, era delicada e tratava a todos com simpatia. Conversou com todos enquanto preparava o café da manhã da menina e logo subiu.

— Hora de acordar, Ali! – Gabrielle disse enquanto fazia um cafuné na pequena, que ainda dormia. Assim que acordou, sorriu ao ver Gabrielle ali.

— Bom dia.

O quarto de Alina ficou um sonho depois da transformação feita por Gabrielle. Ela usava uma camisola com estampas fofas. Estava tomando café quando ouviu uma movimentação além do normal no andar de baixo. Alina entalou na mesma hora.

— Victor! – Alina começou a levantar, mas Gabrielle a impediu.

— Não, Ali! Você não está apresentável. Fica aqui e termina o café que eu já trago ele aqui. – Gabrielle disse e a menina assentiu de má vontade, recomeçando a comer.

Gabrielle descobriu que estava curiosa sobre Victor, ele não havia ido ao seu casamento então fazia cerca de três anos que não o via; conversavam apenas por telefone mas as ligações eram raras.

Avançou pelo corredor, tentando lembrar o que sabia sobre ele. Olhar doce, olhos claros e cabelos extremamente negros, porém, ao chegar ao parapeito da escada, seu encanto pelo homem foi total.

Victor era menos forte que Nicolas e completamente diferente de Louis. Seus cabelos eram ainda mais pretos do que ela lembrava e sua pele era pálida. Ele era alto e esguio; usava um blazer preto aberto com uma camisa branca por dentro.

Ele sorriu para ela, revelando os dentes brancos e perfeitamente alinhados, deixando Gabrielle zonza a ponto de não lembrar o próprio nome.

— Você cresceu, Gabrielle. – Victor caminhou em direção a escada.

— Quem? – perguntou, mas logo a ficha caiu e ela se recompôs. – Ah, sim, claro.

Ela estava feliz e não fazia ideia do motivo.

A voz dele era firme, mas melódica; parecia música. Gabrielle ainda se perguntava como alguém podia ser tão lindo. Era ainda mais bonito que Louis e ela tinha raiva suficiente de Nicolas para colocá-lo na lista.

— Lembra-se de mim? – Victor sorria e Gabrielle se perguntava como pôde esquecer. Começou a se perguntar por que seu pai não havia lhe prometido a ele; se era para lhe arranjar um casamento, que pelo menos o noivo valesse a pena. Ele subia as escadas na direção dela. – Prazer em revê-la. – Beijou de leve a mão dela.

Ao contrário de Nicolas, que costumava ser quente, a pele e os lábios de Victor eram mornos, mas um morno bom. Como os três podiam ser tão diferentes?

— Pelo visto Louis e Nicolas não estão... – ele começou e Gabrielle abaixou a cabeça, o que fez ele sorrir.

— Ah, tiveram que sair logo.

— Já esperava por isso. – Victor riu. – Vou ver Ali. – disse gentilmente e começou a se afastar.

— EI! – Gabrielle gritou e Victor virou-se para encará-la. – Não pode vê-la agora.

— Por que não?

— Ela tem uma surpresa para você, mas só pode mostrar no jantar.

— Está tudo bem com ela? – Victor estava com uma expressão de preocupação e Gabrielle assentiu. – Tudo bem. – Ele passou uma das mãos pelo cabelo.

— Obrigada. Com licença. – Gabrielle sorriu mais uma vez para o homem a sua frente e saiu.

Victor não era imbecil, mas tinha que admitir que Gabrielle possuía belas curvas e tinha se transformado em uma linda mulher. Tinha pena dela, por saber do que Nicolas podia fazer se ela ao menos o desobedecesse. Riu do jeito dela e foi para seu quarto, com uma pontada de curiosidade sobre Alina.

— Fique quieta, você vai vê-lo daqui a pouco. – Gabrielle penteava Alina, que estava cada vez mais impaciente e louca para matar as saudades de Victor.

Era quase noite e elas estavam se arrumando; o cabelo de Alina estava perfeitamente penteado, deixando a menina quase irreconhecível. Estava com um vestido e, assim que ficou pronta, esperou Gabrielle terminar de se arrumar. Ela estava com um jeans e uma blusa de moletom branca, com uma sapatilha.

— Está atrasada. – Nicolas falou na frieza de sempre assim que Gabrielle entrou na sala. Ela deu de ombros e sentou.

A mesa retangular era enorme; as pontas eram ocupadas por Nicolas e Louis, um de cada lado. As esposas de ambos estavam sentadas na lateral direita dos maridos. Já Victor estava sentado a uma cadeira de distância de Gabrielle, de frente para ela, mexendo distraído em um dos talheres.

— Posso mandar servir o jantar? – um dos empregados perguntou.

— Pode. – Louis respondeu, distraído. Alisava a mão da esposa em cima da mesa.

— Espera! – Gabrielle interrompeu e o empregado retrocedeu de imediato. - Só mais um instante. – ela encarou Nicolas, sorridente.

— Por que, Gabrielle? Espera alguém para o jantar? – Nicolas ergueu a sobrancelha.

— Só mais um pouco, não vai demorar. – ela respondeu enquanto encarava o marido. – Sim, espero. Coloque mais um prato na mesa. – Gabrielle ordenou ao empregado, que logo trouxe mais um prato.

— Para quem? – a impaciência de Nicolas era outro fator que irritava Gabrielle profundamente.

— Ali... – Victor murmurou; seus olhos azuis encaravam a porta prazerosamente e um sorriso perfeito brotava dos seus lábios.

— Boa noite. – Alina disse com educação ao entrar na sala de jantar.

Todos ali se viraram para encarar a menina. Usava um vestido preto e uma sapatilha bege, parecia uma boneca.

— Victor! – a menina soltou um gritinho e correu para os braços do irmão, que já tinha ido até ela.

Gabrielle sorriu orgulhosa pelo trabalho.

Victor encheu a pequena de beijos e a menina ria com prazer. Nicolas tinha um sorriso debochado no rosto e revirou os olhos. Gabrielle o observava e se amargurou. Louis olhava a cena com um sorriso de canto e Elena parecia confusa.

Alina sentou na cadeira entre Victor e Gabrielle e, então, serviram o jantar. Victor a olhava encantado; a pequena comia com classe, acertando todos os talheres. Gabrielle sorria. Quando terminaram o jantar, seguiram para a sala de estar.

Ali começou a fazer uns bordados e Victor a olhava com carinho. Gabrielle percebia a ternura nos olhos dele, uma ternura que ela queria que o pai dos seus filhos os olhasse, uma ternura que ela sabia que Nicolas não era capaz de sentir. Estava pensando nisso quando ouviu um gritinho de Alina; ela havia espetado o dedo na agulha e olhava aturdida para o dedo, que começava a sangrar.

— Não coloca na boca! – Gabrielle disse, mas era tarde. Ali já havia colocado o dedinho furado na boca e ria olhando para ela. Victor riu e alisou o braço da menina. Gabrielle negou com a cabeça e riu.

Um tempo depois, todos se recolheram. Nicolas e Gabrielle foram dormir sem falar um com o outro.

Durante a madrugada, começou uma pequena tempestade, com raios, trovões e com vento forte; Gabrielle acordou assustada, desde pequena tinha medo de tempestades, um medo absurdo, mas um medo. Ao erguer a cabeça, viu que estava abraçada a Nicolas novamente.

O quarto era iluminado por dois abajures, um de cada lado da cama. Ela se apoio no braço, encarando o marido. Parecia tão humano quando dormia, era surreal que este Nicolas fosse o mesmo que a tratava mal. Um tempo depois, involuntariamente, ela passou as costas da mão pelo rosto dele. Era macio e agradável.

Um sentimento que ela havia tentando enterrar a muito tempo lhe açoitou dentro do peito. Como podia ter se apaixonado por aquele homem?