Lana esfregou o olho esquerdo com a costa da mão, bocejando com a boca aberta ao máximo e encarou seu reflexo no espelho. Estava com uma rodela escura de rímel borrado em cada olho e a boca já estava quase sem nada do batom vermelho que havia passado noite passada. Seu cabelo escuro e cuidadosamente alisado era praticamente um ninho de passarinho agora.
Se não fosse pela tremedeira e leves pontadas de dor na cabeça, ela estaria sorrindo agora. Definitivamente ela havia se divertido ontem à noite. Ela então se levantou da cama e tropeçou na garota deitada no chão.
— Ai, caralho! — Danielle se sentou esfregando a lateral da cabeça com uma mão.
Lana continuou tropeçando até cair sentada na cama de frente para a sua, encostada na parede oposta. A janela na parede perpendicular estava meio aberta com a cortina por cima, deixando o quarto todo iluminado ,porém, com sombra o suficiente para não doer os olhos.
— Foi mal, Dany. — Lana deu um meio sorriso e suspirou alto. Mesmo com a porta fechada, ela sentiu o cheiro de carne sendo cozida na cozinha. Deveria ser próximo do meio-dia.
— Tanto faz, perua.
— Piranha.
— Sentiu esse cheiro? Sua mãe está cozinhando carne de novo. Ótimo. — Dany se levantou e, se guiando pelas paredes, foi até o banheiro e fechou a porta. O chuveiro ligou logo em seguida.
Lana revirou os olhos. Só havia uma coisa que Dany gostava mais do que bandas, e isso era comer. Comer ouvindo bandas tocarem.
Ela se levantou e procurou a garrafa caída no chão. Desenroscou a tampa e deu dois longos goles. Em seguida foi até o toca-discos no pé de sua cama e baixou a agulha no disco já encaixado. ‘’Back in the USSR’’ começou a tocar. Lana jogou a cabeça para trás e começou a bater o pé no ritmo.
No pé da escada que dá para o corredor do seu quarto, sua mãe parou e perguntou — berrou — se ela e Dany estavam com fome.
— Claro, mãe. Já vamos descer. — Ela gritou de volta.
Dany saiu do banheiro com uma toalha enrolada no cabelo e um vestido azul simples na mão. Ela havia trocado sua calcinha rosa de ''ROCKSTARS ONLY'' para sua calcinha preta de ''ROCKSTARS ONLY''.
— Tem roupa limpa do banheiro? — Lana perguntou.
— Meu guarda-roupa inteiro, praticamente. — Dany pegou a garrafa da mão de Lana e deu um gole, dançando enquanto se vestia — Agora vamos que eu estou com fome. — Ela bateu palma e abriu a porta do quarto, descendo em pulos da escada até a cozinha.
Lana foi até a outra cama e jogou os lençóis no chão. Enfiou os braços em baixo dos três travesseiros amontoados e tirou o saquinho mágico. Ela guardou bem no fundo do bolso da calça e desceu as escadas sorrindo.

*******

— Tem certeza que ninguém vai nos ver aqui? — Dany parou e deu uma, duas, três voltas com o corpo — porque eu não sei se aguento sair correndo se alguém aparecer de novo.
— Relaxa. — Lana puxou o saquinho do bolso e se recostou no tronco da árvore ali perto. Dany se sentou ao seu lado. A copa da árvore produzia sombra sobre elas e, junto com a área estrategicamente mais escondida do que o resto, mantinha um clima mais fresco.
Depois das duas almoçarem — e Dany se empanturrar de costela de porco — elas seguiram caminho sobre o Sol quente até seu destino. A praça onde elas estavam agora ficava à uns dez minutos da casa de Lana. Era o local Nº 1 para passar a tarde de quem morava perto ou naquele bairro. Claro, se você não se importasse com o calor até chegar lá. Praticamente uma pequena floresta cobria toda a área, com alguns pontos aqui e ali de áreas abertas. Os pais levavam as crianças para brincarem mais nas bordas de ladrilhos coloridos da praça, onde estava sempre presente uma variedade enorme de carrocinhas de comida e brinquedos: algodão-doce, pipoca salgada, pipoca doce, pipoca doce e salgada — para os mais aventureiros, palitinhos açucarados, balões coloridos balões prateados de tubarões — que as crianças precisavam tomar muito cuidado para não soltar e corda e perder o balão — e bichinhos de pelúcia de todos os tamanhos — alguns tão grandes que os pais tinham que carregar. Nas partes mais internas era comum adultos em grupo ou sozinhos praticando esportes como corrida, caminhada, andar de bicicleta ou de patins; alguns simplesmente gostavam de andar até se cansarem e irem embora. Mas havia uma área em especial, conhecida por alguns grupos de adolescentes, que ficava quase no centro da praça, e era conhecida popularmente como o ''lugar da diversão''. Lá você ia, fazia o que quisesse fazer e ia embora como se nada tivesse acontecido. Se você não fosse ''do grupo'' ou estivesse com alguém conhecido de lá, você era expulso dali na hora, além de ser ótimo para fugir em todas as direções se alguém que não deveria estar ali aparecesse. Alguns dias o lugar ficava cheio de adolescentes, já em outros ficava vazio. Hoje estava vazio.
Lana colocou um baseado na boca e deu o outro na mão de Dany, que fez o mesmo. Tirou o isqueiro do outro bolso e abriu a tampa, fazendo subir a chama.
— Você sabe que mamãe não gosta disso. — Disse a voz atrás delas.
As duas pularam de susto — Dany quase deu um grito — e se viraram para darem de cara com James as encarando com uma cara um tanto engraçada de repreensão. Lana apenas revirou os olhos e voltou a se recostar na árvore. Ela dobrou os joelhos e apoiou a cabeça sobre eles.
— Primeiro: noventa por cento das coisas que eu faço nossa mãe não gosta, não é por isso que eu deixo de fazê-las. — Ela ouviu James dar passos apressados até onde elas estavam e parar em sua frente. — Segundo: Quem mandou você vir aqui? Eu, claramente, não foi. — Ela ergueu a cabeça para ver seu irmão com o rosto todo vermelho e um pouco soado na linha do cabelo.
— O-oi, Danielle. — James balbuciou quase engasgando com a própria saliva e não sabendo para onde olhar.
Dany deu um risinho — Boa tarde para você também, James.
— Ei, idiota — Lana ergueu o braço esquerdo e estalou os dedos, chamando a atenção de James para ela. Ele voltou a fazer a expressão de repreensão de antes. — Eu te fiz uma pergunta. Por que me seguiu, de novo?
— Para te proteger.
Lana então riu debochada e Dany prendeu os lábios para não fazer o mesmo.
— Eu sou quatro anos mais velha do que você, palhaço. Se é para alguém proteger, sou eu com você e não o contrário. Nem eu sei se faria isso, pensou Lana. Claro, ele era seu irmão e toda aquela história de amor fraternal, mas ele só sabia encher o saco. Lana o odiava em duas situações: quando ele ficava a seguindo em todos os lugares listando o que mamãe queria e o que não queria que ela fizesse e quando ele ficava correndo atrás de Dany, mesmo estando na cara que ele nunca teria chance alguma com ela. Para a infelicidade de Lana, James estava fazendo as duas coisas agora.
— Eu vou contar à mamãe que você vem até aqui para fumar maconha. — ames cruzou os braços sobre o peito — Vamos ver o que ela acha disso.
Lana colocou as mãos no peito fingindo estar indignada — Você vai ter que contar que Dany estava aqui também. Vai ter dedurado a garota que você gosta, vamos ver o que ela acha disso. Por que não? Eu vou dizer que você estava fumando junto com a gente também.
— Ei! — Danielle exclamou encarando Lana bem brava.
— Eu...B-bem eu n-n-nunca faria i-isso com v-v-você, Dany. — James junto as mãos suadas e vermelhas de tanto apertar atrás do corpo e moveu o peso do corpo de um pé para o outro, várias vezes. — E ma-mamãe s-s-sabe que eu não f-fumo i-i-isso. Lana, sua...
— Sua o quê? — Lana arrancou a grama do chão e jogou na direção do irmão — Vaza daqui, moleque.
James balançou a cabeça e se virou, segurando o choro e andando rápido na direção oposta.
Lana então se virou para uma Danielle a encarando com uma expressão duvidosa.
— Ele não vai contar, Dany. Ainda mais depois de eu falar que ia contar de você. James morre se descobrir que existe mais um motivo para você não beijá-lo.
— Você é má.
— Disse a garota que deixa meu irmão na friendzone há anos.
— Mas eu nunca fiz nada para ele começar a gostar de mim. — Dany então recolocou o papel enrolado na boca — Vai, acende logo o meu.
— Viu só. — Lana reabriu o isqueiro e acendeu seu baseado. Passou para Dany que fez o mesmo. — Não é culpa de ninguém no final. Ela tragou uma, duas, três, quatro vezes, já começando a sentir uma leveza no corpo.
— Por falar nisso, você vai na festa hoje à noite, certo?
Dany soltou um risinho — O que a festa tem a ver com o resto?
— Você vai ou não?
— Onde você for, saiba que eu estarei lá. — Dany cantarolou e soltou a fumaça pelo nariz. — Só que eu meio que esqueci onde fica.
— Passa na minha casa que nós vamos juntas.
Dany murmurou concordando.
As duas ficaram ali deitadas quase a tarde toda, até que Danielle teve que voltar para casa e avisar sua mãe de que ela estava viva. Lana guardou o plástico agora vazio dentro da calça e também voltou para casa. Ela precisava urgentemente de um banho.


*******

Danielle acabou aparecendo e tocando a campainha da casa de Lana faltando poucos minutos para as nove horas da noite. Lana abriu a porta e se deparou com a amiga cheia de glitter dos pés à cabeça.
— Sua louca, se você demorasse mais um pouco eu iria sem você.
— Foi mal, eu acabei dormindo demais depois que cheguei em casa. — Dany deu de ombros.
— Vamos então. — Lana ajustou o colar no pescoço e, depois de garantir à mãe que voltaria mais cedo dessa vez, saiu de casa e fechou a porta. As duas andaram pouco até chamarem um táxi. Entraram e disseram ''Queen’s Gang, por favor'' em uníssono ao motorista.
— Gostei do seu vestido. É aquele que você comprou semana passada, não é? — Perguntou Dany se remexendo no bando ao seu lado.
— É sim. — Lana olhou para baixo. Ela estava com um vestido verde sem mangas e com franjinhas na barra, e completou o look com uma plataforma vermelha, brincos de argola e colar dourados. Pouco tempo depois elas chegaram ao seu destino. Lana pagou o motorista e as duas saíram do carro.
O ''Queen’s Gang'' não era o ''Studio 54'' de Los Angeles, mas ainda sim era uma boate até que popular em sua área. Você não encontraria a elite de rockstars constantemente ali, mas ainda valia a pena por alguns aspirantes até que interessantes que você poderia conhecer. Por que as duas haviam escolhido aquele lugar? Ninguém tinha real certeza. Falta de expectativa? Talvez.
Dany havia entrado logo que teve oportunidade, mas Lana ficou para trás, aliás, ficou em baixo da placa enorme de luz neon ao lado da entrada da boate, se pegando com Paul St. Jones. Paul era um dos muitos aspirantes à fama que estavam ali hoje à noite. Ele era vocalista de uma banda chamada ''Troy Horse’s Nephews'', o que fazia Lana gargalhar toda vez que ouvia. ''Ainda vamos ser grandes um dia'' ele dizia e ela retrucava ''Não com esse nome''. A banda já havia feito algumas entrevistas nas rádios locais e tocava quase todo fim de semana em algum lugar. Lana havia conhecido o ''Troy Horse’s Nephews'' há uns três anos atrás enquanto eles estavam a caminho de uma dessas entrevistas. Rapidamente eles se tornaram amigos e começaram a frequentar vários lugares juntos. Eventualmente, Lana transou com cada um dos membros da banda, até que decidiu que o vocalista era seu favorito.
Lana e Paul estavam agora um grudado no outro e Lana com as costas grudadas na parede. Ela sentiu sua calcinha sendo empurrada para o lado por dedos hábeis e virou a cabeça para o lado arfando. Foi quando o viu, e congelou onde estava. Paul também parou quando sentiu a garota congelar no lugar onde eles estavam.
— Está tudo bem? — Ele afastou os lábios do pescoço de Lana e a encarou preocupado, mas ela nem ao menos olhava para ele mais.
Lana já havia visto aquele homem antes. É claro, eu já li uma entrevista dele no jornal, e sempre havia os panfletos colados pela rua. Ele estava ali perto conversando com outro homem que ela não sabia quem era. Os dois homens estavam de perfil olhando por onde ela estava, mas ela reconheceu o rosto do da esquerda mesmo assim. Ela afastou Paul com o braço, murmurou um ''me desculpa, mas eu preciso ir'' desleixado e começou a andar com passos apressados até o homem não muito longe deles. Seus olhos brilhavam, tinha certeza disso.
Ela parou abruptamente e pigarreou com a garganta. Ok Lana, fica calma, não estraga tudo, fica calma...
Os dois homens pararam de conversar e a encararam de baixo a cima.
— Posso ajudar? — O homem da esquerda perguntou.
— Você é ele, não é? O empresário? — Lana perguntou de volta — Eu já li uma entrevista sua no jornal.
— E daí? — Ele retrucou, parecendo completamente entediado com a presença dela ali.
Tem que ser ele, agora mais do que nunca, pensou Lana, eu li na entrevista que ele era grosso com quase todo mundo.
— Sou Lana Summers — Ela esticou o braço para cumprimentá-lo — e tenho uma amiga lá dentro — ela gesticulou com o ombro na direção da boate.
— E daí? — Ele revirou os olhos, ignorando a mão estendida em sua frente.
— Nós duas sempre quisemos montar uma banda. E como você é empresário, bom... Talvez poderia nos ajudar.
— E porquê eu faria isso?
—Porque somos ótimas, muito boas. Sério. — Lana havia abaixado o braço e agora apertava as duas mãos atrás das costas. Fica calma, porra, relaxa. Não começa a prender a respiração agora, você vai ficar toda vermelha. Calma, foco. Você consegue, você consegue...
— Sério? — Ele perguntou com a cabeça levemente abaixada na direção dela. A linha do lábio se movendo levemente para cima.
— Sério.
— O que você toca?
— Guitarra.
— E a outra?
— Também.
— As duas sabem cantar?
— Sim.
O homem suspirou alto e enfiou a mão no bolso da calça. Tirou um papel dobrado em dois e entregou para Lana. — Esteja você e sua amiga nesse endereço amanhã no horário marcado. Não precisam trazer nada, só o talento, se tiverem mesmo.
— Muito, muito, muito obrigada! — Lana estava quase rindo de alegria, tanta que nem ouviu o último comentário do empresário.
— Tanto faz. — Ele murmurou, dispensando-a com o braço.
Lana se virou e refez seu caminho com passos apressados, dessa vez de alegria. Paul St. Jones estava longe de ser visto.
Dany, sua doida. Vamos conseguir, vamos conseguir...

*******


— Tem certeza de que é aqui? — Dany perguntou, coçando a cabeça. — Parece tão... Simples.
— Claro que é aqui. — Lana revirou os olhos. — O que você queria, afinal? Uma piscina de neon na entrada? — Ela deu mais uma olhada rápida para conferir se estava no lugar certo mesmo e guardou o pedaço de papel no bolso de trás do shorts jeans vermelho.
Lana e Dany estavam ambas paradas na calçada em frente a um gramado perfeitamente aparado que levava à uma casa de paredes brancas de dois andares. Só isso e nada mais. De fato, as duas ficaram surpresas quando saíram do táxi e se depararam com uma casa simples e comum. Apesar da casa ser igual à todas as outras dos dois lados da rua daquela área residual, pelo fato de ser um empresário, elas realmente esperavam pelo menos umas cores mais chamativa na entrada. Talvez ''discrição'' fosse o que ele queria.
As duas se entreolharam e começaram a andar pela grama. Era próximo da uma da tarde, e a luz do Sol estava quase insuportável de aguentar. Do seu lado direito Lana reparou o único carro parado na rua inteira refletindo a luz dolorosamente do capô, e do seu lado esquerdo o brilho perolado no pescoço de Dany.
— Você está com o colar que Jimmy Page te deu no natal de dois anos atrás de novo?
— Claro que eu estou. — Dan segurou o colar na mão. — Pode nos dar até sorte hoje.
— Vocês não se falam há mais de um ano.
Danielle bufou — Estamos dando um tempo. Só isso.
Elas pararam em frente a porta alta de madeira que tinha, graças a todos os Deuses do universo, uma cobertura fresca contra a luz do Sol. Lana esticou o braço e tocou a campainha.
— Com ele estava até semana passa? Eu acho que vi uma foto dele com...
— Elle G. — Dany completou, o maxilar travado de raiva.
Lana balançou a cabeça. — Dany, isso é obsessão doentia...
— Não é obsessão.
— Não, que isso...
— Qual é o nome desse empresário mesmo? — Perguntou Dany, claramente querendo mudar de assunto.
— Ares. Ares Greekan.
Dany abriu a boca para fazer mais uma pergunta quando a porta se abriu, revelando o homem sem camisa e descalço. Por um segundo Lana prendeu a respiração e sentiu uma fraqueza nos joelhos.
— Então você veio mesmo. — Ele a olhou dos pés a cabeça, demorando mais tempo nas pernas descobertas, então virou a cabeça em direção à Dany. — Essa deve ser a amiga de dentro da boate, presumo.
— Quem?
— Entrem. — Ares abriu mais a porta e deu um passo para o lado para as duas garotas entrarem.
Logo de frente para a porta ficava uma escada que levava ao segundo andar, e á esquerda ficava a sala, que era incrivelmente grande. O chão e as paredes também eram brancas, e os móveis, tapetes e cortinas na cor laranja. Haviam dois ambientes praticamente, um tapete grande com um sofá grande e duas poltronas perto da janela do lado esquerdo, e mais para o centro, um tapete maior ainda com outro sofá e três poltronas na frente de uma lareira. O ambiente todo era fresco, claro e jovem. Na outra ponta, na parede com uma porta de correr de vidro que Lana presumiu que deveria levar até a cozinha, estavam duas guitarras, um violão e um baixo apoiados, uma bateria e dois apoios de microfone.
Ares passou pelas duas ainda paradas atônitas na entrada e andou até lá, puxou uma poltrona e se sentou em frente aos instrumentos. Ele havia misteriosamente achado e vestido uma camisa agora, e, para a não total infelicidade de Lana, a camisa deixava os músculos do peito e braços em evidencia. E que músculos... Ele virou a cabeça e chamou Lana e Dany com o dedo. As duas foram até lá e pararam abruptamente de novo.
— Vai vir alguém para tocar a bateria e o baixo? Porque eu e a Lana não...
— É, é... Sei disso. — Ares interrompeu. — Minhas garotas já chegam daqui a pouco. Antes só quero ver como vocês duas se saem. Você primeiro. — Ele apontou o dedo para Lana e depois para o violão.
Lana pegou o violão e passou a alça pelo ombro, indo até um dos microfones. Ela preparou o acorde inicial e começou a tocar e cantar ‘’Blackbird’’. Já no começo ela sentiu o nervosismo que estava formando indo embora, ela se sentiu mais leve e despreocupada, algo que acontecei toda vez que ela tocava ou ouvia música. Quando terminou, Ares bateu palma com um meio sorriso nos lábios. — Agora a loura.
Danielle foi até o outro microfone ao lado e pegou o violão da mão de Lana. Dany respirou fundo, fechou os olhos e contou até três, os abriu e começou a tocar ''Yesterday''. Quando ela terminou, Ares também estava batendo palmas. — Lana Summers e... Qual é o seu nome mesmo?
— Dany... Danielle Maddox.
— Lana Summers e Dany Maddox. Vocês servem.
Lana apenas olhou para Dany — que já havia colocado o violão apoiado no chão de novo — e deu de ombros. Melhor do que nada.
Ares então se levantou e se aproximou das duas. Agora que ela não estava mais nervosa, Lana pôde perceber os detalhes nele, os lábios rosados no tom certo, a linha do maxilar, os olhos grandes, negros e perigosos, a barba e cavanhaque contornando o queixo, o cabelo negro e quase tocando os ombros. Ele poderia ser o empresário, mas parecia mais um membro de uma banda. Meu Deus, ele é tão sexy... Lana mordeu os lábios involuntariamente. Ele pareceu perceber, pois a olhou intensamente nos olhos e deu uma piscadela.
Foi quando a campainha tocou.
Ares se virou e foi até a porta. Lana e Dany então ouviram duas vozes femininas distintas e alguém fechando a porta. Ares voltou para a sala segurando pela mão uma garota de cada lado.
— Lana Summers e Dany Maddox. — Esta é Candy BB — Lana analisou a garota de cabelos loiro-claro, tão claro que quase pareciam brancos. Ela estava inteira vestida de rosa, desde o macacão jeans e a blusa por baixo, a plataforma brilhante e os anéis nos dedos. O cabelo estava bem armado e amarrado para trás por presilhas também na cor rosa. Ela usava sombra azul nos olhos, e parecia muito ter cheirado uma fileira de cocaína antes de ter chegado ali. — e esta é Elle G. — Lana ouviu esse nome e, antes mesmo de olhar para a outra garota, arregalou os olhos em pânico, e sentiu Dany ao seu lado congelar. Droga...
Dany agarrou o braço de Lana com força, fincando a unhas na carne. Lana teve que morder a língua para não xingar a amiga ali mesmo.
Elle G. era linda, Lana tinha que admitir. A garota tinha a pele bem clara, enfatizada com o batom vermelho, e os cabelos bem negros (tão escuros quanto os de Lana) amarrados num rabo de cavalo simples. Usava uma blusa larga verde, um shorts jeans e botas brancas acima dos joelhos. Mas apesar de tudo, o que mais chamou a atenção de Lana foi sorriso dela. Elle G. tinha o tipo de sorriso que toda groupie no mundo sonhava em ter, o tipo de sorriso que mostrava perigo e confiança, te convidava a se aproximar, com a certeza de que não seria um tempo perdido. Os olhos dela brilhavam marotos.
Os cinco ficaram em silêncio por alguns segundos, até que Candy BB se pronunciou.
— Viu só, L. Eu disse que elas não seriam feias. — Ela riu para si mesma e estendeu a mão. Ela tinha uma voz fina, quase ao ponto de ser irritante. Quase. — Muito prazer.
Nem Lana ou Dany tiveram tempo de se aproximarem para retribuir, já que Elle G. levantou o braço e deu um tapinha na mão de Candy, fazendo-a abaixar sua mão.
— Eu conheço você. — Elle disse, olhando para Lana. Ela sorriu e se aproximou. — Lana Summers... Ah , claro! Eu já li muito sobre você. ''A Groupie oficial dos Rolling Stones'', tenho que admitir, não é um título fácil de ganhar, e muito menos de manter. Mick e Keith são loucos por você, te seguem para todo lado, até nas poucas vezes em que eu estive com eles, eles estavam sempre falando de você. Eu quase fiquei com ciúmes. — e alternou entre fazer um biquinho com a boca e segurar a risada de brincadeira.
Lana não pôde deixar e sorrir ao ouvir aquilo. — Eles me amam. Ao seu lado, Dany havia soltado seu braço — o que seu sistema nervoso tinha agradecido —, e agora a encarava brava. Lana deu um sorriso amarelo. Qual é... Ela só disse verdades.
— E você... — Elle se virou para Dany, que a encarava com um olhar enojado. — Você era a garota de Jimmy. — ela baixou o olhar até o pescoço de Dany — Hm...Era sim. Ele te deu esse colar, não deu? Eu lembro que Jimmy queria me dar um igual, mas eu recusei. Não fazem meu tipo.
Lana se apressou em abraçar a amiga de lado, dando atenção aos braços dela. Eles precisavam ficar bem abaixados e colados ao lado do corpo. Pelo amor ao Rock n’ Roll, Dany, se controla.
Elle percebeu, e pareceu se divertir com aquilo.
— Qual o problema?
— Bom, ela... Danielle ainda não se recuperou da separação.
— Um tempo. — Dany murmurou, quase bufando, ao lado. — Estamos dando um tempo. — Nesse momento, ela nem fazia mais questão de esconder o quanto estava odiando toda aquela situação. Seu rosto estava um pouco vermelho e suado, e ela tinha uma expressão de quem queria chorar e gritar ao mesmo tempo. Lana a segurou mais forte contra o peito.
— Claro. — Elle soltou um risinho irônico e se virou indo até Candy, que também não disfarçava que estava achando graça naquilo tudo. — Nunca leve nada à sério. Assim você sempre se diverte e não se machuca. Siga esse conselho para a vida, e vai se divertir mais eu garanto. — Ela abraçou Candy por trás, apoiando a cabeça no ombro da amiga. — Candy tem uma coisa para falar sobre o Sr. Page. Candy, faça as honras.
— Bom... — Candy revirou os olhos e gargalhou. — Não que eu não goste de Jimmy, é só que Robert é muito mais... Selvagem, se é que vocês me entendem. — e cobriu a boca com a mão. Ela parecia uma criança que ouviu a palavra ''sexo'' pela primeira vez.
— Todo mundo entendeu o que você quis dizer, Candy. — Elle retrucou divertida, ela parecia já estar acostumada com esse tipo de comportamento da amiga. — E você só prefere o Sr. Plant por causa desse seu fetiche por louros de cabelo cacheado.
— Talvez.
— Lana — Dany sussurrou para a amiga — eu juro que eu vou...
— Já entendi, já entendi. — Lana soltou a amiga e a segurou pelos ombros de frente a ela. — Mas se controla. Pensa na banda, pensa no Rock. Por favor, vai, se acalma. Ela vai parar com isso.
Dany resmungou algo inaudível, mas balançou a cabeça meio a contra gosto, concordando.
Lana então se virou para Ares, que estava encostado na parede com os braços cruzados sobre o peito. Ele assim como Elle e Candy, estava achando graça naquilo tudo, e, também como as garotas, não fazia questão de disfarçar. Ele devia estar vendo todas elas como um bando de crianças. Ele sorria, os dentes brancos se destacando na pele bronzeada. Lana suspirou.
— Tudo bem então. — Ele disse, quebrando o silêncio e clima tenso que havia se instalado ali, bem, quase. Ele esfregou as mãos uma na outra a apontou para Elle e Candy, depois para a bateria e o baixo — Façam a gentileza. Temos uma banda para formar ainda. E vocês duas. — Ele se virou para Lana e Dany. — Peguem as guitarras. Vamos começar ensaiando já algumas músicas.
Lana e Dany fizeram como foi dito, e se posicionaram novamente na frente dos microfones. Candy BB pegou o baixo e passou a alça sobre os ombros, já se familiarizando com as cordas. Elle G. foi até a bateria — que, para o alívio de Lana, ficava afastada de onde Dany estava —, pegou o par de baquetas e começou a batucar num ritmo constante. Lana reparou que Dany estava muito mais calma, só de estar segurando a guitarra, pronta para tocar qualquer música que pedissem a ela. Até as outras pareciam diferentes, de minutor atrás, todas concentradas, namorando seus instrumentos. Meu Deus, como eu amo Rock n’ Roll.
— Vamos lá. — Ares voltou a se sentar na poltrona. — Toquem para mim.
Foi então que a mágica aconteceu.
Elas começaram com ''Gimme Shelter'', seguida de ''Yer Blues'', depois ''Layla'', terminando com ''Dear Prudence''.
Apesar da voz de Lana se diferenciar do original, óbvio, ela conseguiu alcançar notas altas com perfeição. Elle e Candy tocavam tão bem e com sintonia perfeita com as outras,e nos solos de Dany, ela parecia ter incorporado Eric Clapton ali mesmo. Foi lindo do começo ao fim. Quando elas terminaram, e, dessa vez, Ares aplaudia de pé, sem ironia ou risinhos irônicos, Lana olhou para as outras três meninas, que também tinham expressões de orgulho estampadas no rosto, e soube: estavam prontas. Era isso.
— Agora só falta o nome da banda. — Ares comentou, depois de um tempo ainda as aplaudindo.
Depois de quase uma hora revendo possíveis nomes, estava decidido — pelo menos por hora: ''The Crazy Squad''.

*******

O Começo da banda foi... Difícil. Apesar de durante as quatro estarem tocando juntas, não haver nada além de harmonia e união, quando elas não estavam tocando, a situação era bem diferente.
O primeiro passo foi encontrar os primeiros lugares para ''The Crazy Squad'' começar a tocar.
— Encontrei o lugar perfeito. — Ares disse, no dia seguinte à formação da banda, apoiando na mesa da cozinha de sua casa sua terceira garrafa de Coca-Cola — Próxima semana, na festa beneficente, ''The Crazy Squad'' vai tocar pela primeira vez.
As quatro garotas trocaram olhares, mas continuaram quietas. Ares percebeu e ergueu os braços.
— O quê? Não gostaram ou o quê?
— Bom... — Dany cruzou os braços e encarou os pés. — Não acho que... Essa show,a festa e tal, fosse o que esperávamos. Quero dizer, nada contra esse povo que adora ir nisso aí, só que... — Então ela ergueu a cabeça, procurando apoio de Lana, Candy e Elle — Não acho que seja bem o nosso estilo.
As outras três garotas concordaram com a cabeça. Ares viu e revirou os olhos.
— O que vocês queriam? Outro Woodstock? — e deu uma risada forçada e alta para o alto — Pouco tarde para isso agora, querida. Além do mais, não é como se vocês fossem grande coisa agora. Além disso, isso vai ser ótimo para a reputação de vocês, pelo menos por hora.
— Nossa... Reputação? — Lana coçou a lateral da cabeça. — Como assim?
— Não é nada pessoal, ok, até é, mas vocês juntas parecem que acabaram de sair de uma festa e ainda estão de ressaca e larica, da semana passada. — Ele abriu outra garrafa — Além, é claro, de vocês não parecerem muito normais. Principalmente vocês duas — e apontou com o dedo para Elle e Candy.
Dany, que estava ao lado de Lana, ouviu aquilo e deu um risinho baixo maldoso.
— Já que o nome da banda é ''Crazy Squad'', acho que é exatamente a imagem que nós queremos passar. — Elle retrucou, dando ênfase no ''Crazy''.
— Não quando o seu tipo de louca faz as pessoas ficarem com medo. — Agora — Ares se levantou, segurando a garrafa e encarando Lena fixamente — Vamos ensaiar de novo.
Quando as quatro garotas terminaram de ensaiar e estavam de saída, Lana tentou disfarçar que não sentiu Ares segurando sua cintura com as duas mãos, dando um aperto firme durante alguns segundos.
— O que foi aquilo? — Dany sussurrou em seu ouvido quando elas estavam quase chegando em casa. Ela também havia percebido.
— Nada de mais, que saco Danielle, não começa a agir como uma criança.
Dany revirou os olhos e se afastou de Lana, balançando a cabeça, metade desaprovando, e metade achando graça naquilo tudo.

*******

No dia do primeiro show da banda, na tal festa beneficente, aconteceu algo que Lana nunca achou que fosse acontecer, ela ficou nervosa de verdade, e falhou miseravelmente ao tentar esconder isso. Ela já havia vomitado duas vezes — Não porque estava passando mal ou com intoxicação alimentícia, mas porque ela sempre vomitava quando ficava nervosa —, quando terminou de beber a garrafa de cerveja e se dirigiu até onde a banda estava.
O camarim mais se parecia com um barraco abandonado por fora. Eram quase onze horas da manhã, e Lana atravessou o gramado já meio lotado de pessoas indo e vindo de um lado para o outro e abriu a porta de madeira. Lá dentro, Lana encontrou Dany sentada tunando sua guitarra, ela ergueu a cabeça e deu um pequeno sorriso, voltando à tarefa logo em seguida, sua mão tremia ligeiramente. Tudo bem, Eu não sou a única... Isso é bom ou ruim? Candy estava em frente ao espelho, tentando, com um pente rosa, deixar seu cabelo incrivelmente já armado mais armado ainda para trás. Elle estava andando de um lado para o outro com uma garrafa quase vazia de Jack Daniels na mão — ela mantinha, claro, uma certa distância de Dany. As quatro garotas haviam decidido usar macacões colados na pele que cobriam todo o corpo,e com um decote quadrado que passava do umbigo, cada um de uma cor: Dany estava de azul, Candy estava de rosa, Elle estava de verde e Lana usava um macacão vermelho.
Ela foi até a cadeira ao lado de Dany e pegou sua guitarra, colocando a alça sobre o ombro, e pigarreou com a garganta. As três levantaram o olhar e a encararam.
— É isso, peruas, vamos lá.
A banda subiu no palco. Lana foi até um dos microfones — Dany estava ao seu lado, em frente ao outro — e encarou a multidão, que agora estava maior. Foi quando ela sentiu uma euforia tomar conta dela, uma vontade enorme de começar a tocar e cantar no mesmo instante. Para o inferno esse nervosismo...
— Senhoras e senhores dessa respeitável festa — Ela gritou ao microfone, sorrindo — Bom dia!
A multidão gritou de volta. Então Dany ergueu e desceu o braço na guitarra, produzindo um som maravilho, o que levou a multidão a gritar mais alto. Lana olhou para ela e riu mais ainda. Ela voltou a aproximar a boca do microfone.
— É, vocês ouviram! Dany Maddox na guitarra. — A multidão gritou. — Candy BB no baixo — Mais gritaria — Elle G. na bateria — de novo a gritaria — e eu sou Lana Summers, caso ainda não saibam disso — mais gritaria e algumas risadas perdidas.
— Somos as ''The Crazy Squad'' e hoje viemos tocar para vocês. — Lana olhou para as três companheiras de banda e acenou com a cabeça — 1,2,3,4...
Elas começaram a tocar, e a resposta do público foi imediata: 100% aprovadas. Elas tocaram covers — óbvio — de várias bandas, e quando terminaram,a multidão pedia por ''mais, mais, mais, mais...''
Lana e Dany agradeceram nos microfones, depois Elle e Candy se aproximaram e saudaram o público. Ela saíram de lá sorrindo e rindo iguais loucas, entraram de novo no camarim. A melhor notícia veio depois de cinco minutos, quando Ares entrou no camarim, eufórico, dizendo o quanto elas foram excepcionais, e que já tinha vários outros lugares onde elas estavam confirmadas para tocar. Era música de novo para os ouvidos delas.


*******

Quase um mês de ''The Crazy Squad'' tocando aqui e acolá em pequenos eventos — e em todos, deixando o público eufórico e pedindo sempre por mais — a banda começou a tocar em pubs de qualidade,e com um camarim descente. Todas as noites, elas tocavam até quase a exaustão a noite inteira, só parando quando estava quase amanhecendo. Claro que elas tomavam substância para aguentar tudo isso sem desmaiar no chão — Candy BB gostava de chamá-las de ''balinhas da alegria'', o que fazia Dany rir toda vez que ouvia esse nome.
Em uma dessas noites, finalmente aconteceu o inevitável: Lana e Ares transaram pela primeira vez.
Ele havia entrado no camarim quando estava só ela lá dentro, terminado de se arrumar., e ofereceu mescalina. Quando os dois já estavam sem nada e grudados um no outro, Lana estava muito eufórica para pensar no que estava fazendo. Ela só lembra de Dany parada na porta,encarando a situação de olhos arregalados, e depois desaparecer de vista. Elas não se falaram mais naquela noite, e no outros dia Dany não mencionou nada, então Lana resolveu não tocar mais no assunto. A partir daquele dia, era uma questão de onde e quando Lana e Ares se encontravam para transar de novo, e ele sempre trazia mais mescalina.
Mais duas semanas se passaram, e houve o convite para a primeira entrevista na rádio.
Todas elas estavam bastante animadas, claro, e então demoraram horas se arrumando na frente do espelho — apesar de que, depois elas se deram conta, as pessoas ouvindo à rádio não veriam como elas de fato estavam; mas o importante era que elas se sentiam bem.
Quando a van que as levou até onde ocorreria a entrevista parou e as quatro garotas desceram na calçada, Lana deu de cara com alguém que ela já não via há algum tempo: Paul St. Jones. Ele estava encostado na parede com os braços cruzados sobre o peito, a olhando de cima a baixo, mas ele não pareci estar gostando, ao contrário, ele olhava para todas elas como se alguma coisa estivesse muito errada.
— Olá, Paul — Lana disse se aproximando, enquanto as outras ficaram observando a situação alguns passos atrás — já faz um tempo desde a ultima vez.
— Pois é. — ele respondeu, as palavras amargas na boca. — Lana, que porra é essa?
— Como?
— O engraçado é que... — Paul deu uma risada sarcástica e coçou atrás da cabeça, fingindo ignorar a pergunta de Lana — se eu soubesse que você andava comigo só pra ficar famosa também eu nem tinha perdido o meu tempo.
— Você quer repetir isso, filho da puta fracassado? — Dany interveio, encarando Paul com um olhar predatório.
Lana fez sinal com a mão para ela ficar onde estava, e não tentar bater em Paul — porque ela tinha a mania de fazer isso às vezes.
— Eu sou fracassado, sua loirinha de farmácia? — Ela retrucou, nervoso, apontando com a mão para ele mesmo.
— Lana...
— Quem disse que eu ficava com você por fama? E que fama?
— É isso aí, imbecil! Conseguimos em um mês o que você a porcaria da sua banda passaram anos para conseguir. Fracassado mesmo! Eu nem acredito que Lana chupava esse cara...
— Escuta aqui, sua...
— Não, escuta você! — Lana exclamou, erguendo o braço — Você perdeu o tempo vindo aqui só para isso? Sério?
— Eu vim aqui para ver vocês, se isso era sério e...
— Bom, agora que você já viu, vaza.
Paul St. Jones encarou Lana durante alguns segundos, depois Dany atrás dela — que Lana sabia que estava encarando ele de volta com raiva —, então se virou sem falar mais nada e foi embora, bufando alto.
Lana se virou e viu uma cena um tanto que hilária: Dany estava com tanta raiva de Paul, que nem percebeu que estava praticamente encostada em Elle G.
Lana deu de ombros — Vamos?
A entrevista foi um sucesso. Todo mundo por quem elas passavam nos corredores da rádio — e na sala de entrevista — as elogiaram por seus looks: as incrivelmente compridas e brilhantes botas douradas de Elle G., a maquiagem toda em tons azuis de Candy BB, o vestido todo amarelo e de penas de Dany e os brincos de argolas enormes de Lana. Elas nem se chatearam quando o entrevistador tocou na ''palavra com g''; claro que elas não se importavam, mas elas estavam ali para falarem sobre a banda delas, e não de outras — não importava o quanto elas as amassem.

*******

Outra noite, aconteceu o que Lana já estava esperando — e preparada — que acontecesse. O show no pub tinha terminado já faziam alguns minutos. Dany, Candy e Elle tinha ido direto para o camarim, enquanto Lana preferiu ficar na frente da entrada fumando. Ela estava na metade do seu quarto cigarro quando o dono, Sr. Angels, saiu e agarrou o seu braço, nervoso, gritando para ela resolver ''a confusão que duas amigas delas estavam fazendo no camarim''. Lana jogou o cigarro no chão, amassando com a sola do sapato, e entrou correndo para dentro.
Lana abriu a porta com força, e quase caiu para trás de raiva.
O camarim estava, no mínimo, uma bagunça. Haviam cabides e roupas — algumas rasgadas — jogadas no chão, junto com pedaços de vidro e maquiagem. A penteadeira estava caída de lado no chão, o espelho no meio, quebrado com o salto de um sapato vermelho fincado no lugar. Á sua direita, havia uma Candy caída no chão, vestindo um casaco de pelo preto e nada mais. Ela olhava para o teto e ria descontroladamente, a pupila dilatada, e mal conseguia se levantar, apenas rastejar com o braço em sua volta. Á sua esquerda, Dany e Elle estavam uma tentando socar a outra. Dany estava com um par de sapato vermelho na mão — que Lana presumiu ser o par do outro fincado no espelho — e um corte vermelho no antebraço. Elle estava toda descabelada, com a maquiagem borrada, sua roupa estava rasgada nas duas mangas, e ela segurava uma garrafa vazia quebrada ao meio. Quando a porta aberta bateu forte na parede, as duas pararam de andar em círculos e olharam para Lana.
— Que porra é essa? — Lana exclamou, olhando para as duas como se estivesse olhando para duas loucas no meio da sala. — Perderam o juízo.
— Ela que começou. — Elle apontou para Dany.
— O que foi que eu comecei? — Dany gritou e deu um passo em direção a Elle, erguendo o braço que segurava o sapato.
Lana foi rápida em correr até onde elas estavam e ficar no meio das duas.
— Parem com isso já! Soltem isso que vocês tão segurando, ou estão a fim de serem presas? Tão cedo.
Elle largou e garrafa no chão e se afastou.
— Você também, Dany.
Danielle relutou, mas acabou abaixando o braço e largando o sapato ao seu lado.
— Vão me dizer porquê estavam tentando se matar?
— Eu já disse, foi ela que começou.
— Olha aqui, você... — Dany deu mais um passo, brava, mas Lana a segurou pelos ombros.
— Começou o quê?
— O que você acha? — Elle revirou os olhos. — seu amado Jimmy Page. Eu só quis ajudá-la, mas parece que a sua amiguinha não é muito boa em aceitar verdades.
— Dany... Já conversamos sobre isso. — Lana olhou para a amiga, que estava com os olhos vermelhos.
— Eu não vou ficar aqui ouvindo essa aí. Lana, temos que conversar com Ares, pede você, para ele trocar ela por...
— Ninguém vai me trocar aqui não, querida. — Elle agachou perto de Candy, puxando a amiga pelos braços até ela ficar de pé.
Lana fechou os olhos por um momento, tentando se acalmar e querendo bater nas duas.
— Mudança de planos. — Elas encarou as duas — Eu ligo e trago o Senhor James até aqui, e vocês três se resolvem, ou melhor ainda, ao invés de baterem uma na outra, vocês duas batem nele. Gostaram?
Nenhuma das duas garotas disse nada.
— Agora, limpem essa bagunça. Vou trazer alguma coisa para Candy melhorar para voltar para casa e a mãe dela não mata-la.

*******

No dia seguinte, Ares passou pelo menos uma hora só gritando com elas — apesar de terem parecido cinco horas. O dono do pub, Sr. Angels, havia expulsado todas elas depois da briga, e temporariamente proibido elas de se apresentarem lá, então Ares tinha que procurar outro local para elas preencherem nesses dias.
Ambas, Dany e Elle, estavam com um olho roxo e manchas roxas no braço, Dany estava com o antebraço enfaixado no local do corte. Ares até que gostou do novo look das duas.
Nem Dany e nem Elle olharam uma para a outra durante uma semana, até que Lana trouxe, um dia quando ela havia chamado todas para o parque perto de casa, no ''Lugar da diversão'', o ''pó dos Deuses''. Tinha sido fácil encontrar o melhor vendedor de Los Angeles, já que Lana tinha dois nomes e dois endereços no papel que Keith havia dado para ela, e Keith Richards sempre sabe o que há de melhor. Pode se dizer que as quatro se tornaram colegas naquele dia, e amigáveis depois de alguns dias — principalmente Dany e Elle.
Ares havia decidido que era hora delas começarem a compor algumas músicas de própria autoria, e elas concordaram. Toda tarde elas se reuniam na casa do empresário, e testavam letras e alguns acordes.
Hoje Ares havia saído e avisado que iria demorar um pouco a voltar, então, assim que ela ouviu a porta se fechar, ela tirou o saco plástico do bolso, contendo duas pedrinhas, uma agulha, uma colher, um algodão e um maçarico.
— É heroína? — Candy perguntou.
— Não, não, é bala. — Elle respondeu, se aproximando de Lana e se sentando. — Claro que é heroína, Candy. Onde você conseguiu?
— Keith. Bom, com o endereço que ele me deu. O melhor que existe.
Lana segurou a colherem sua frente, com as duas pedrinhas dentro, e acendeu o maçarico em baixo, assim que derreteu tudo, ela apoiou a colher com cuidado no chão e guardou o maçarico no saco plástico.
Elas estavam todas agora sentadas no chão da sala, formando uma roda em cima do tapete laranja. Dany estava ao lado esquerdo e Elle do direito, com Candy em sua frente. Ao fundo, eles tinha colocado ''Revolver'' para tocar.
— Dany, pega um gelo na cozinha, por favor?
Dany se levantou e andou rápido até a cozinha, voltando com um bloquinho de gelo na mão, ela o entregou a Lana e voltou a se sentar. Lana pegou o gelo e colocou dentro da colher, observando aquilo derreter rapidamente. Depois arrancou um pedaço de algodão e colocou dentro da colher também. Pegou a agulha e, apoiando a ponta sobre o algodão, puxou quase todo o líquido para dentro.
— Agora — ela disse, dando leves batidas na lateral da agulha — eu sei que eu e Dany somos completamente limpas, já vocês... — e ela encarou Elle e Candy.
— Eu sou limpa, claro. — Disse Elle.
— Eu também. — Disse Candy.
— De qualquer forma, Dany vai primeiro. — então desatou o cinto da calça com uma mão e pediu para Dany prender firme ao redor do seu braço, para fazer pressão. — agora vocês três, anda.
As três também desataram o cinto e uma ajudou a outra a amarrar firme ao redor do braço, acima de onde Lana enfiaria a agulha. Lana primeiro enfiou a agulha no braço de Dany, apenas a quantidade certa, e tirou. Dany então desamarrou o cinto e fechou os olhos, se preparando para sentir o efeito. Lana então passou para Candy e depois para Elle, que fizeram o mesmo. Com o que sobrou, Lana mirou em seu braço, afrouxando o cinto logo e seguida.
Lana largou a agulha — agora vazia — no chão ao seu lado e se deitou de lado no chão. Tudo a sua volta começou a emitir um brilho intenso, o branco das paredes, as almofadas estampadas em cima do sofá, os detalhes geométricos das estampas, cada um dos anéis coloridos nos dedos de Candy, o tapete parecia lava correndo ladeira a baixo. Lana sentiu o corpo todo ficar leve, incrível e deliciosamente leve. Ela flutuava... Flutuava... Flutuava...

*******

Xena acordou com leves pontadas na cabeça, e com uma dor enorme no pescoço. Ela se apoiou com um braço e se sentou ereta no chão. Ela estava em uma sala com paredes todas brancas e o resto dos móveis todos na cor laranja. Ela observou a lareira, os instrumentos musicais ao fundo, a música ainda tocando. Foi então que se deu conta. Estou em outra reencarnação, maravilha. A outra foi... Bom, foi pouco tempo atrás...
Ela olhou para o lado esquerdo e viu Gabrielle deitada no chão. Ela estava diferente, vestindo tudo na cor roxa, uma calça engraçada e com o cabelo comprido. Xena chamou seu nome, mas ela só resmungou. Ao olhar para frente, levou outro susto. Callisto estava deitada também, com a mesma calça engraçada de Gabrielle. Do seu lado direito, estava Eve, também deitada de lado. Filha? Mas o que...
Xena se levantou e olhou para baixo. Ela estava vestindo uma calça brilhante, uma sandalha com saltos incrivelmente altos e um pedaço de tecido que cobris os seios. Que ano é esse? E que música é essa tocando? Hm... Até que é boa.
Xena estava prestes a começar a olhar pelos cantos daquele lugar em busca de alguma resposta quando a porta da frente se abriu.
— Lana, amor, eu trouxe comida. E para as outras também. — Disse a voz.
Lana achou aquela voz bem familiar, e franziu o cenho. Aquela voz a lembrava de... De... De Ares... Ares? ARES!
Xena viu Ares caminhar até a entrada da sala com uma sacola marrom no braço, e fechou o punho com força. Ares parou quando viu as três garotas caídas no chão e Xena em pé no meio da sala, e suspirou alto.
— Vocês se drogaram de novo? O que foi dessa vez? Lana?
Mas Xena não estava prestando muita atenção no que ele dizia.
— Você não consegue me deixar em paz nunca, não é mesmo? — Ela disse bem devagar, com ódio, cada palavra.
— Lana? O que...— ele a fitou, primeiro confuso, depois pareceu entender o que aconteceu. — Xena? Droga, como foi que... — ele largou a sacola no chão e ergueu os braços pra cima em defesa. — Como conseguiu dessa vez? — ele parecia apenas curioso, nem um pouco assustado.
— Dessa vez, você diz? O que fez comigo dessa vez? Com elas? — ela disse se aproximando, até estar a poucos metros de frente com ele.
— Ei, nada que eu... Do que eu estou falando? Claro que eu me diverti, e você também, várias vezes se eu me lembro. — e piscou para ela.
Xena ficou confusa por um segundo então imagens começaram a surgir em sua mente. Dela e Ares... Ela e Ares... Fazendo...
— Seu desgraçado! — Xena gritou e avançou na direção dele com o punho preparado para um soco. Ares se esquivou e desapareceu, aparecendo atrás dela, e acertando um chute em suas costas. Xena se recuperou e se virou, acertando três socos na cabeça de Ares, que foi parar na parede aposta, sorrindo.
— Você não ouviu a parte que eu disse que você se divertiu também? Eu não sou um Deus egoísta.
— Cala a boca. — Xena pulou e preparou um chute no ar, mas Ares a segurou pelos pés e a jogou para cima. Xena deu uma pirueta e aterrissou ao lado de uma planta alta dentro um vaso perto da janela. Ela arrancou a planta e usou o corpo como bastão, girando na altura no chão para tentar derrubar Ares. Ele evitou o primeiro golpe, mas não quando Xena o acertou com o outro lado do bastão forte na lateral na perna, o fazendo cair de costas no chão. Xena correu e parou em cima dele, com a ponta do bastão pressionado contra a garganta.
— Parece que eu ainda sou a melhor. — Ela disse, e reparou que estava um pouco ofegante. Estranho, talvez essa reencarnação não fosse tão saudável.
Ares conseguiu apenas sorrir para ela. — Você é perfeita, Xena, perfeita. — e desapareceu num piscar de olhos.
Xena se virou, temendo um ataque nas costas, mas ele havia desaparecido de fato. Ela largou o bastão no chão e foi até onde as outras três mulheres estavam.
— Gabrielle — ela chacoalhou a amiga, segurando-a pelos ombros — Gabrielle, acorda.
Gabrielle resmungou mais alguma coisa e abriu os olhos.
— Xena?
Xena sorriu e a abraçou.
— O que aconteceu? Por que eu estou vestindo isso? — Gabrielle estava tão confusa que Xena quase riu de toda essa situação.
— Outra reencarnação, aparentemente.
Gabrielle então se sentou, e encarou Callisto e Eve deitadas no chão.
— Ah, não.
— Pois é. — Xena foi até a filha, e depois até Callisto, acordando as duas.
— Mãe?
— Onde eu estou?
Todas estavam também com dor de cabeça e pescoço. Foi quando Xena ouviu a porta se abrir novamente, e se levantou pronta para lutar de novo, mas parou quando reconheceu a voz do intruso.
— Irmã, você está aqui? Eu estava passando por aqui quando ouvi uns barulhos e resolvi entrar. O que aconteceu aqui? A.. A Dany está bem? Só por perguntar...
Xena sorriu quando Joxer apareceu na sala, vendo toda aquela bagunça com preocupação no olhar.
— Joxer! — Xena sorriu para ele.
— Joxer! — Gabrielle exclamou atrás dela.
Joxer as encarou confuso.
— Quem é Joxer? — então olhou para Gabrielle — Não é algum m-menino que v-v-você g-g-gosta, não é, Danielle?
Xena e Gabrielle se entreolharam, antes de caírem na gargalhada.