Winds of Night

Esperança Erguida.


Lancelot despertou de madrugada, sentindo o frio se aprofundar nos ossos. Ele conseguiu dormir por cerca de 1 hora.
Embora ainda fosse o início do outono, as manhãs em Camelot já traziam um ar gelado. Vestindo a armadura negra, complementada com uma capa escura, ele fez o caminho pelo castelo. Próximo à masmorra, local onde muitos já haviam sido erroneamente encarcerados e torturados, ele conhecia um atalho.

Apenas cavaleiros do alta escalão sabiam deste segredo, uma passagem discreta, usada pelos Cavaleiros do Vento, agora sob o título de Rei Sonic. Sir Gawain, estava ali, a figura forte envolta em uma capa escarlate. Ele segurava Galatine, olhos fixos em algum ponto distante. A aura parecia carregada de preocupação e anseio.

"Sir Gawain", Lancelot chamou o nome dele, se aproximando.

Gawain virou-se lentamente ao som dos passos de Lancelot, olhos ametistas encontrando os dele. A voz dele também era estranha quando respondeu. "Você percebeu? O Rei não voltou desde ontem à noite."

“Ele sempre volta”, Lancelot tentou tranquilizá-lo, apesar da própria inquietude. "... Mas está atrasado."

"Sabe onde ele está?"

Ele tinha um palpite.

“... Caverna do Dragão.”

Lancelot não pôde conter estalar a língua. A notícia de uma ameaça vinda da caverna do dragão havia chegado aos ouvidos deles recentemente, mas a maneira de Sonic lidar com a situação era típica.

Lancelot suspirou, frustrado.

"Vamos lá."

“Tsk. Não me dê ordens!”

“Então pare de perder tempo.”

Eles caminharam até chegarem à beira do fosso, onde uma espécie de névoa se erguia em espirais e ocultava a ponte que conduzia ao Castelo de Camelot.

Antes que eles pudessem se afastar mais ainda do Castelo não demorou muito para que Lancelot avistasse, através da névoa, uma sombra tomando forma dando a visão de uma silhueta se movendo com lentidão. Era Sonic, ele estava voltando .... e ao lado dele, uma espada...

No entanto, algo estava errado.

"Vossa Majestade... Sonic!!", exclamou Lancelot.

Correndo ao encontro dele Lancelot agarrou Sonic momentos antes de deixá-lo atingir o chão. O aroma do sangue encheu o ar. O peito de Sonic exibia uma ferida profunda e a perna esquerda estava quase dilacerada. Olhando mais de perto, talvez até a névoa estivesse tingida de vermelho devido ao líquido vermelho.

Sir Gawain permanecia alerta, os olhos varrendo constantemente o ambiente em busca de perigos iminentes.

"Isso é terrivelmente grave."

Gawain chegou mais perto. “Vossa Graça... Você pode nos ouvir?”

"Isso é imprudente...! Ele pode morrer desse jeito ....!" Caliburn disse.

Uma energia tomou conta de todo o ambiente. Era escura, densa e raivosa, movendo-se em redemoinhos ao redor de Lancelot como se fossem tentáculos da noite. No entanto, a intenção não era violenta para com os aliados. Em vez disso, a penumbra parecia ter um propósito singular: proteger Sonic a todo custo.

”Contate os outros.”

Percebendo aquela aura assassina, Gawain deu um passo para trás. Ele nunca tinha visto algo assim vindo de Lancelot antes. Mas ele compreendia; era uma espécie de barreira contra qualquer ameaça que se atrevesse a se aproximar do rei dele.

Sonic, embora fraco e machucado, não ficou imune à sensação. Mesmo naquele estado debilitado, ele pôde sentir a força que emanava de Lancelot. O rosto do ouriço contorceu-se levemente, os lábios murmurando algo inaudível, uma resposta ao chamado mudo do cavaleiro.

Lancelot, por outro lado, mal reconheceu o que estava acontecendo. Ele estava tão concentrado nele, em chegar até ele, que não notou que Sir Gawain estava reagindo à isso.

"Lan..."

"Fique longe." Lancelot disse. "Deixe a tarefa de levar ele até lá comigo.

Gawain assentiu, e respondeu: "Eu irei na frente." Ele se voltou para a direção dos portões do castelo.

Certo, ele pensou.

Por ter o poder de curar todas as feridas e até levar à imortalidade, a bainha foi devolvida à Senhora do Lago para não repetir os erros do passado. Por isso foi prometido que Caliburn estaria lá quando necessário. Caliburn balbuciava perto dele.

“Vamos voltar agora”, disse Lancelot, envolvendo Sonic com sua capa. "Sonic, acorde!"

O importante era deixar ele consciente. Chamando-o repetidamente, tentando manter Sonic acordado, Lancelot viu a lucidez deixar o seu brilho esmeralda. Olhos desfocados. O ouriço murmurou algo...

"Shadow" ele conseguiu dizer, antes da voz dele se perder em um balbucio. "Você ... Está aqui..." E ele desmaiou nos braços do cavaleiro, o corpo pesado, como uma marionete cujas cordas foram cortadas.

Lancelot abraçou Sonic e correu de volta ao castelo, enquanto a névoa se dissipava na estrada sob o brilho do amanhecer - esmagando os sentimentos sombrios que surgiam no peito dele.

Afastando as luvas a mão de Sonic era segurada com cuidado, como se temesse quebrá-lo no aperto.

O rei estava deitado na cama, pálido, desmaiado com os ferimentos que ainda o afligia. Por pouco, ele saiu do estado crítico.

Com um suspiro silencioso, Lancelot abaixava a cabeça, os fios de ébano e vermelho caindo um pouco sobre os olhos. Ele sentia o calor fraco do toque de Sonic sob o seu, desejando que o ato pudesse curar o rei, mas sabia que não era tão poderoso assim.

Sentindo o ritmo lento, mas constante, das batidas do coração do rei, a preocupação que pesava internamente era como uma âncora, e ele não conseguia deixar de pensar nas palavras que trocaram antes dele desmaiar.

O cavaleiro se culpava por não ter estado lá. A visão do rei, gravemente ferido, assombrava os pensamentos dele.

“Sonic...”

Tirando de repente a mão depositada da pele de Sonic, Lancelot virou o rosto pra longe, o coração martelando.

Isso tudo é culpa dele.

Pela mesma janela que ele entrou, Lancelot partiu.

•••


O rugido do dragão ressoou pelas paredes da caverna, sacudindo o chão sob os pés de Sonic. Ele podia sentir o calor abrasador daquela respiração de fogo. Tudo parecia estar bem. Ele não iria exagerar, não iria demorar muito e tudo acabaria bem.

Até que alguma coisa estranha surgiu. O cenário se distorceu e tremeu diante do ouriço, e o rugido do dragão tornou-se um zumbido ensurdecedor. Sonic piscou, tentando entender o que estava acontecendo. Caliburn não parava de gritar ao lado dele.

E então o coração de Sonic acelerou. Eles surgiram diante dele. A visão o atingiu como um soco no estômago. Amy, Tails, céus, até Knuckles e Rouge estavam lá, e o mais surpreendente de todos, Shadow. Reunidos, como se estivessem esperando por ele, sorrindo e acenando. O peito de Sonic se encheu de alegria e saudade.

Até que as palavras saíram de seus lábios, inconscientemente. "Lance..." Ele chamou por.... Por... Por Lancelot....

Sonic piscou.

Contudo, em vez da resposta usual, ele viu a miragem de Shadow parecer confusa. "Com quem você está falando?" A voz Shadow soou nostálgica, fria e vazia. O brilho no olhar esverdeado do ouriço azul se perdeu. Era tarde demais.

Em segundos o rosto de Shadow se desfez, revelando uma forma monstruosa, e atacou Sonic ferozmente. A dor aguda e avassaladora, o trouxeram de volta à realidade – onde o mundo ao redor estava a desmoronando. Ele se viu de volta a Camelot, mas o dano já estava feito.

Ele olhou para a ferida no peito, o sangue se espalhando rapidamente. Ele não deveria ter ido ali 'sozinho'.

Logo ele estava sendo carregado. Ouvindo aquela voz, porém com um tom mais ardente do que a usual frieza que ele estava acostumado.

“Shadow...”


Uma semana inteira se passou. Ele acordou somente no sexto dia. Sonic suspirava, resignado.

Sir Gawain cuidou da sua escolta no início do dia. Mesmo ele estando temeroso sobre como agir perto do rei, Sonic relaxou perante seu comportamento hesitante - ‘você é um pequeno espinho cheio de ansiedade, como Knucklehead.’ Sonic brincou e riu, por mais que Gawain tenha respondido a isso com raiva.

“Você está bem?”

“Melhorando.”

“Aquelas ilusões devem ter ferrado com seu espírito de luta”

“… não” Sonic coçou a bochecha. “Eu tô bem, prometo.”

“Como eu odeio mentiras” Gawain se ergueu do seu assento em um pulo. “O que aconteceu lá? O que você viu?”

O rei ficou mudo, sem saber como encara-lo - ele mesmo não sabia o que tinha acontecido - nunca ele tinha fraquejado, não até ser imprudente de novo e desafiar a si mesmo.

“Lancelot é muito preocupado com você.” Ele se surpreendeu por Gawain ter iniciado aquele tópico. “Todos os seus servos, na verdade, como deveria ser. Mas como me disseste quando nos conhecemos: o propósito de ser um cavaleiro não significa somente servir ao rei.”

”Gawain…”

”E sim, cumprir com as outras devidas obrigações. Quando ele voltar esperarei pela chance de relembrar isso a Lancelot.” Gawain socou a parede atrás dele, o punho cerrado em impaciência.

Sonic agradeceu por isso. Era a própria maneira dele de confortá-lo - de dar a certeza que o ouriço azul precisava em meio a névoa de dor e fadiga. Knuckles bateria os punhos um no outro e prometeria uma luta de rivalidade.

“Antes de cavaleiro, antes de servo leal, você é um aliado importante - meu companheiro, Sir Gawain.” Sonic proferiu, sabendo que Gawain reagiria tímido e irritadiço com a palavra ‘amigo’. E mesmo assim as bochechas de Gawain foram pintadas de um rosa fraco. “Então obrigado pelas palavras.”

“Hunf.” Ele cruzou os braços, teimoso, fingindo estar concentrado nas espadas gêmeas - Galatine.

Sonic passou a se cuidar melhor com o tempo passando. Foi bom, ele conversou com Caliburn, desculpou-se com todos pela preocupação e o trabalho que deu. Sonic recebeu sorrisos calorosos e algumas advertências em troca. Nisso, o sol se pôs. E a noite veio.

O quarto permaneceu iluminado apenas pela luz suave de várias velas acesas. Cortinas de seda bordadas balançavam lentamente com a brisa que entrava pela janela aberta, revelando a noite escura e fria lá fora. Sonic permanecia inerte, deitado naquela cama majestosa, recebendo o tratamento adequado de acordo com o estado atual dele. Infelizmente, desta vez ele não teve como fugir de todo aquele luxo, trocar as almofadas fofinhas por um belo tronco de àrvore, tudo pela recuperação dele – envolto em lençóis aconchegantes e um enorme curativo branco cobrindo a ferida no peito e um maior no braço.

Alguém bateu à porta e Sonic murmurou 'entre' suavemente. “Vossa Majestade.” Blaz— Sir Percival se curvou à frente dele. Ela estava sem o elmo, deixando à mostra o rosto familiar a Sonic.

“Hey” Ele saudou com um aceno. “Não precisa ser tão formal, Bla-... Digo... você pode me chamar de Sonic.”

“Mas...”

“Estamos só nós dois aqui, Perci. O que pode dar errado?”

Ela pareceu surpresa pelo novo apelido, mas comprimiu os lábios, indecisa.

“Isso é uma ordem?”

Sonic quase revirou os olhos. “Se você me tratar com menos formalidade, então sim, é uma ordem”

“Oh. Entendido.”

“Não quero ser chato nem nada, mas o que te traz aqui?” perto da lareira presente no enorme quarto, Sonic avistou um banco de madeira e uma 'almofada real' no assento parecendo confortável o suficiente. Ele indicou-o com a cabeça na direção de Percival. “Sinta-se em casa, antes de responder.”

“Meu lorde–”

“Por favor, se vai tomar conta de mim, então deixa eu te dar menos trabalho de ficar parada fora do quarto, igual uma estátua na porta o tempo todo.”

Ela fez o que foi dito, parecendo desponfortável, até que ela tornou a falar. “De forma alguma. Me honra e me alegra tomar conta da guarda do rei por mais essa noite, e é o meu dever.”

“Vocês se preocupam demais, caras. Eu não quero dar trabalho pra mais ninguém ”

“De forma alguma, é um dever muito gratificante - ainda poder guardar pelo nosso rei. Sir Lancelot é quem faz isso pessoalmente, porém...”

“Ele ainda não voltou.” Sonic sussurrou, encarando as mãos calejadas da espada.

“... Isso.”

“...”

“...”

Sir Percival não era muito de conversa. É seguro dizer que nem Lancelot era fácil. Ou pior que Shadow, que mais parecia uma pedra às vezes. Mas, pouco a pouco, Sonic se alegrava de ouvir a voz dela. E para sorte dele ou não, ela provou estar bem disposta a falar mais do que o normal por aquela noite.

“Mas ele vai voltar, meu rei. Tenha certeza disso.

As palavras reconfortantes de Percival alcançaram Sonic. Por pelo menos aquela noite, ele usaria o tempo restante para refletir antes de tentar descansar.

‘Ele vai voltar por você.’

Ele vai?

Uma última reverência, Sir Percival se retirou. E ele ficou sozinho debaixo da luz da lua cheia.

Ele gostava de relembrar de quando chegou naquele mundo. As coisas foram difíceis, mas após a vitória do Rei Sonic, os tempos de comemoração chegaram graças as notícias do sucesso dele se espalhando por aquelas terras, as pessoas em todos os lugares começaram a celebrar a libertação do falso rei tirânico que desestruturou e enganou o povo. Posteriormente, as festividades se estenderam para homenagear aqueles que haviam conquistado essa vitória, e assim, os quatro, Sonic, Lancelot, Percival e o próprio Gawain, se viram imersos em um ciclo aparentemente interminável de festivais comemorativos e bailes reais, onde quer que passassem de volta ao serem conduzidos.

Longe de ser um fardo, essa atenção contínua era bem-vinda - Sonic amava atenção, contanto que não fosse venerado como um deus - e cada um dos aliados reagia de uma forma diferente.

A imagem de Lancelot passeou pela mente do ouriço. Recentemente tanto Caliburn quanto Lance o davam bronca pelas escapadas pra fora do castelo e por Sonic se livrar das vestes reais e da coroa em meio a elas.

Se Caliburn percebesse que Sonic dormia na sala do trono a espada o faria se acordar e Sonic reviraria os olhos. Se estivesse prestes a pular a janela do próprio quarto, Lance estaria lá para puxa-lo de volta pelo ombro e repreendê-lo pela imprudência - com sorte era possível convencer o cavaleiro se juntar a ele já que Lancelot se ofereceria para fazer sua escolta devido Sonic se mostrar teimoso - embora não fosse uma boa ideia provocar a paciência do ouriço negro.


[…]

Sonic começou a despertar. Olhos verdes agora carregavam a névoa do sono e da confusão. Ele se esforçou para se sentar, mas uma força invisível o manteve deitado.

"Lance...?"