Alice

Esperamos aproximadamente uma hora para que a chuva passasse e pudéssemos voltar para Scarlet.

Harry continuava estranho e calado, parecia que tínhamos trocado papéis. Mais cedo, eu estava em meu mundo particular e agora parecia ser a vez dele.

Paramos para abastecer e aproveitamos para trocar nossas roupas molhadas. Eu já estava dentro da kombi novamente com minhas roupas quentinhas quando meu celular tocou.

Surpreendentemente, era uma pessoa que eu pensei que não entraria em contato comigo por um bom tempo.

Alice, a menina de cabelos claros, com uma pele ainda mais clara, e praticamente uma réplica da Alice de Lewis, era minha — one and only — melhor amiga. Bem, isso até poucos dias antes de eu me mudar para New Hampshire.

"Por favor, não desliga o telefone na minha cara!" ela implorou assim que eu atendi a ligação.

"Ali! Por que eu faria isso?" eu disse feliz por ouvir a sua voz depois de alguns meses.

Eu conheci Alice quando tinha 7 anos, pois éramos da mesma sala, mas éramos apenas isso. Ela tinha seu grupinho de amigos e eu tinha o meu. Começamos a ficar próximas quando eu estava eme um estado traumático depois que minha mãe faleceu. Minhas "amigas" não pareciam perceber o estado em que eu me encontrava. Meu pai tinha seu próprio sofrimento para apaziguar e Alice foi a única pessoa que estava ali para me ouvir e entender o que eu estava passando já que ela morava com a avó desde a morte de seus pais.

Aos poucos, depois de alguns anos nossa amizade se consolidou e apenas tínhamos uma a outra. Alice era o oposto de mim. Extrovertida, atraente, engraçada e acima de tudo, namoradeira.

Ela nunca apoiou meu namoro com o Tom. Ela achava que era uma perda de tempo esse negócio de primeiro amor perfeito e que eu ia viver boa parte da minha vida presa a essa ilusão. Segundo Alice, era necessário ter seu coração partido uma ou duas vezes — no mínimo — até encontrar a pessoa certa. Isso se houvesse uma pessoa certa. Eu achava isso uma visão muito pessimista vindo da parte dela.

Brigamos porque ela não compreendia o fato de eu ir para o outro extremo do país e continuar presa ao Thomas.

"Ah, que bom que eu ainda tenho você. Como está minha autora preferida?" ela disse aliviada e eu ri.

"Estou bem, aliás, estou a caminho da Califórnia." ela deu um grito do outro lado e eu caí na gargalhada. Como eu sentia falta da Alice.

"Eu soube, sua chata. Pelos outros." ela fingiu irritação. "Me senti excluída da sua vida. Não acredito que seu pai deixou você viajar sozinha." ela disse surpresa e eu cocei a cabeça.

"Bem, na verdade, não estou viajando sozinha." eu murmurei e ela puxou o ar surpresa.

"Seu pai está vindo também? Pensei que ele estava em lua-de-mel e..." ela parou um instante. "Espera...Não acredito, Aster! Você finalmente mandou o Brams pastar!"

"Alice!" eu a repreendi e rolei os olhos "Não é nada disso. Lembra da Anne, minha madrasta, certo? Então, lembra que ela tinha um filho?"

"Lembro, mas eu não o conheci."

"Nem eu o conhecia" eu suspirei.

"Hm, que suspiro é esse, dona Aster? Ele é bonito?" ela perguntou de repente.

"O quê?"

"Eu perguntei se ele é bonito. Qual é, Aster? Okay, eu sei que você já tem alguém, mas não custa nada arranjar alguém para sua amiguinha aqui ser feliz para sempre" ela riu.

"Como se você acreditasse nisso." eu rolei os olhos um pouco incomodada por imaginar Alice e Harry juntos.

"Responde logo!" ela berrou no momento em que Harry abriu a porta do lado do motorista usando uma camiseta preta, calça jeans escura e botas.

"Sim." eu disse baixinho.

"Sim o quê?" Alice pressionou e eu aposto que o meu rosto estava da cor de um tomate.

"Está tudo bem?"Harry perguntou me entregando uma das duas balinhas em sua mão e eu apenas assenti com a cabeça.

"Sim para sua pergunta." eu disse um pouco sem paciência para Alice.

"Ah, ele está aí, entendi." podia jurar que tinha um tom malicioso em sua voz. "Quando eu terminar a ligação, já que você não quer responder vai ter que mandar uma foto dele."

"O quê? Não!" eu disse rapidamente. Ela só podia estar louca

"Sim, senhora! Você quis assim."

Eu bufei impaciente:

"É pra caramba!" eu esperava que ela entendesse o que eu queria dizer.

"Ah, viu? Não tirou pedaço. Porém, agora eu estou ainda mais curiosa. Vou querer foto."

"Alice!"

"Estarei esperando, beijos." ela não esperou uma resposta e desligou.

Eu fiquei olhando para o meu celular, sabendo que ela não me deixaria em paz até eu mandar a maldita foto, mas eu não tinha a mínima ideia de como faria isso.

"Estou esperando ansiosamente." a mensagem saltou na tela.

Não tinha a menor condição de tirar uma foto dele discretamente.

"Manda logo!"

Foi então que eu me lembrei da foto que eu tirei dele em Manhattan quando seu celular estava descarregado e ele queria tirar mais uma foto da Estátua da Liberdade.

Mandei a foto e Alice não respondeu,

"Morreu?"

"Sim, não sei o que dizer." eu ri com sua resposta.

" Como assim?"

"Estou com inveja e raiva de você."

"Por quê?"

"Inveja porque você está com um deus desses viajando com você e raiva porque você ainda não o agarrou."

"Alice! Você entendeu que ele é meu meio-irmão? Por que todo mundo acha que eu teria algo com ele? Isso é impossível."

"Apenas se você acreditar que é." eu rolei os olhos com sua citação. "Eu acho isso porque talvez ele seja gostoso pra caralho, mas o que eu quero saber é quem mais teve a ideia dessa possibilidade antes de mim"

"Tom."

"Nãaaao creio. Sério? O que ele disse?"

"Ele quase surtou quando eu contei que estava viajando com o Harry. Eles são ex-amigos de infância."

"Jura? Como esse mundo é pequeno, não?"

"Pequeno, não. Minúsculo."

"Eu tenho que ir ajudar minha avó agora. Depois eu volto. Beijinhos"

"Beijos, Ali."

Suspirei fundo e Harry olhou para mim.

"Quem era?" ele perguntou enquanto tamborilava os dedos no volante.

"Minha amiga Alice. Ela está um pouco ansiosa pra me ver"

"E para conhecer você também" completei mentalmente e no mesmo segundo me repreendi.

*******

Já passava das sete horas da noite quando chegamos em Ohio e o ócio crescia de forma proporcional ao meu cansaço.

"É impressão minha ou estamos afundando no tédio?" Harry leu meus pensamentos e eu sorri.

"Queria dizer que é impressão, mas infelizmente não é. Além disso, não dá pra fazer muita coisa sem dinheiro." eu respirei fundo por um momento arrependida de não ter convencido meu pai de me dar mais alguns dólares.

"Quer parar para descansar?" ele perguntou quando eu bocejei.

"Vamos em frente mais um pouco." Harry concordou e se focou na pista.

Passamos por várias cidades de Ohio e todas elas eram super agradáveis, principalmente Ravenna que era onde estávamos no momento.

Minhas pálpebras estavam pesadas quando eu avistei um drive-in do outro lado da rua.

Sim! Um drive-in como naqueles filmes antigos. Eu iria adorar contar para o Tom sobre um lugar desses. Eu tinha ficado animada num piscar de olhos.

Ponderei entre pedir para pararmos ali ou não. Da última vez que sugeri alguma coisa para fazermos, acabamos encharcados e sem poder ir a lugar algum por uma hora.

"Sem falar do clima que rolou entre vocês dois." balancei a cabeça, tentando punir meu cérebro de pensar uma coisa assim.

Voltando a dúvida entre pedir ou não, até que não era nada absurdo considerando que o próprio Harry tinha comentado que estava afundando no tédio. Além disso, acho que não conseguiria esconder minha empolgação apenas com a possibilidade de irmos ali, já que ele alternou um olhar confuso entre mim e o convidativo drive-in.

Eu olhei para ele e ele me olhou de volta.

"Eu não quero nem imaginar o que você está planejando dessa vez." ele disse sério e eu apenas sorri como uma criancinha de 10 anos querendo ir num parquinho. "Qual é a graça disso? Com certeza é mais desconfortável do que um cinema convencional."

"Ah, Styles, vai me dizer que nunca teve vontade de ir num desses quando assiste aqueles filmes antigos?"

"Não." ele disse simplesmente dando de ombros.

Eu bufei —como uma criancinha de 10 anos de novo — decepcionada.

"Você não queria ir ao banheiro? Aproveita e vai lá enquanto eu apenas olho como é." eu sugeri e ele respirou fundo derrotado.

"Tá bem, tá bem"

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