O jantar foi preparado coletivamente.

Steve, Natasha e Rhodes ficaram com a comida. Thor e Theo fizeram um suco natural de laranja. Bruce ficou com a sobremesa.

Rocket - era esse o nome do guaxinim - optou só por observar. Parece que a forma como a comida era preparada aqui era diferente de como era preparada no espaço. Pepper e eu também ficamos de fora da preparação do rango.

O jantar foi silencioso, vez ou outra saiu algumas frases como "me passa a jarra de suco" ou "pode me passar o molho?" Mas tudo bem. Poderia ter sido pior.

Após o jantar, Rhodes mostrou a Bruce qual era o quarto dele e relembrou ao Thor qual era o dele - o Deus do Trovão já tinha esquecido desde a última vez que esteve no Complexo, logo quando foi construído. Colocamos Theo e Rocket nos quartos de hóspedes - acabei escolhendo o quarto de hóspedes mais próximo do meu para ser o do Theo. Pepper ficou no quarto do noivo, ela ficaria esses primeiros dias por aqui ajudando nas buscas pelo Tony no espaço.

Steve, Nat e eu voltamos aos nossos quartos que permaneciam os mesmos. Era bom estar de volta em casa.

Theo pediu para dormir comigo essa noite e eu deixei. Não podia negar isso a ele, não conseguiria dizer não para ele nem se pagassem. O garoto montou uma barreira entre mim e ele na cama com os travesseiros porque ele estava com medo de acabar me machucando enquanto dormia.

No entanto, eu não consegui dormir. Toda vez que eu fechava os olhos me vinha as cenas da batalha, a cena do Thanos chegando em Wakanda e da nossa luta, a qual eu sai toda machucada. E o pior: Wanda virando pó bem na minha frente.

Estava difícil pregar o olho. Toda vez que eu me movia o mínimo na cama, meu corpo reclamava de dor. Boa parte da noite eu apenas fiquei observando Theo dormindo, mas eu não aguentava mais ficar no quarto, deitada sem fazer nada.

Acabei afastando o cobertor para o lado e me sentando na cama com certa dificuldade. Caminhei com mais dificuldade ainda até o hobby longo preto de cetim que estava sobre a cadeira da penteadeira. Fui até a porta enquanto o vestia, mas ao abrir dei de cara com Thor passando pelo corredor.

—Baixinha, era para você estar em pé? — se aproximou.

—Eu divido o chocolate que vou comer com você se não contar a ninguém. — falei rápido.

—Se ia para cozinha era só me avisar que eu levava você. — Thor chegou mais perto, me pegando no colo.

—E como eu ia avisar? Gritando? — arqueei a sobrancelha.

—Talvez pudesse me mandar um correio eletrônico. — falou, começando a caminhar em direção a escada. — Se chama email. —

—Para isso você teria que ter um computador ou celular. — respondi. — E se minha opinião vale de alguma coisa, você devia ter um celular. Assim poderíamos finalmente te adicionar no grupo dos Vingadores. —

—Achei que eu já fizesse parte da equipe. — o semblante dele estava confuso.

—O grupo dos Vingadores no aplicativo de mensagens. — expliquei. — Por onde nos comunicamos, sabe? Avisamos onde estamos, se vamos demorar para voltar para casa, se vamos dormir aqui no Complexo, para mandar memes ou comentar coisas do dia a dia. —

—O que são memes? —

—É quando algo relacionado a humor viraliza. Pode ser uma imagem, um gif, um vídeo... eu te mostraria um se estivesse com meu celular, mas eu o deixei no quarto. — observei ele caminhar em direção a mesa. — Não, não, não. Me coloca sentada no balcão. Vou te ensinar a fazer brigadeiro. —

—O que é brigadeiro? —

—É um doce brasileiro. — ele me encarou assim que me colocou sentada no balcão. — Lembra de quando eu me mudei para a Torre e fizemos a noite de filmes? Tinha pizza, pipoca, sorvete, refrigerante e três panelas de brigadeiro. Aquele doce de panela era brigadeiro. —

—Ah, sim. Era o melhor doce midgardiano que eu já tinha comido. Ainda é, na verdade. — sorriu. — Mas, Baixinha, acho que você esqueceu que eu não sei cozinhar. Ainda mais comidas terranas. —

—Por isso que eu disse que vou te ajudar. Eu sou uma ótima cozinheira e também uma ótima mentora. Ensinei o Adam a fazer ravioli. Na primeira vez ele acabou queimando, na segunda errou na quantidade de sal, mas na terceira ficou bom. —

—Então eu vou ter que fazer três vezes para ficar bom? — soltei uma risada.

—Não, você vai acertar de primeira. E fazer brigadeiro é mais simples que fazer ravioli. As panelas ficam no armário daqui do balcão. Pegue uma panela média de cabo comprido. —

Thor fez o que eu pedi e logo estava pegando a manteiga, as caixas de leite condensado e o chocolate em pó.

—Três caixinhas dessa são suficiente mesmo? — ergueu uma caixa de leite condensado. Pressionei os lábios.

—Tem razão, não são suficientes. Pega mais uma. Quero muito chocolate. —

Thor colocou a manteiga, derramou as quatro caixas de leite condensado na panela e talvez tenha exagerado no chocolate em pó, mas tudo bem.

Ele mexeu tudo com uma colher de pau e quando a mistura estava homogênea, mandei ele levar ao fogo.

—Agora é só mexer até chegar no ponto do brigadeiro. — falei.

—E o que é esse ponto do brigadeiro? — perguntou confuso.

—Você vai saber quando chegar. Estarei observando daqui. — ele continuou mexendo. — É bom passar a colher pelas laterais da panela. —

—Certo. — falou determinado.

Sorri, o observando. Peguei uma das caixas vazias de leite condensado, rasgando ela e passando o dedo no que restou do leite condensado.

—Baixinha? —

—Hum? — ergui o olhar para o Deus do Trovão.

—Poderia me contar essa história dos Vingadores terem se separado? — tirei o dedo da boca.

—Claro. — pressionei os lábios. — Por onde eu começo? Hum, então, alguns meses depois que você partiu de Midgard, nós começamos a procurar por um ex agente da HYDRA que estava contrabandeando umas armas. O nome dele era Ossos Cruzados. Conseguimos pegar ele quando estava roubando uma arma biológica em Lagos... —

Continuei contando a Thor sobre toda história antes, durante e após o Tratado. Thor fez alguns comentários durante a história como, por exemplo, quando ele questionou sobre os poderes do Peter ou do Scott, como funcionavam e se era verdade mesmo que um midgardiano ficou maior que os prédios do aeroporto.

O Grandão acertou o ponto do brigadeiro. Queimou um pouco nas laterais, mas dá pra comer. Ele tinha colocado na geladeira depois que eu fui experimentar e acabei queimando a língua.

Quando eu terminei de contar sobre esses dois anos aqui na Terra, ele começou a contar sobre os dois anos dele no espaço.

Em alguns momentos ele parecia ter dificuldade para contar sobre certas coisas - o que era totalmente compreensivo - e quando eu dizia que se ele não se sentisse bem, não precisava falar. Porém, ele disse que precisava falar com alguém e que eu era uma boa ouvinte.

E eu ouvi. Ouvi sobre o tal Surtur, sobre a tal profecia do Ragnarok, de Loki se passando por Odin, do exílio do Chernodin na Noruega e a história da irmã dele, a Deusa da Morte.

Eu segurei minha língua para comentar sobre tudo só no final, quando Thor terminasse tudo.

E quando ele terminou de contar sobre o planeta Sakaar, a luta estilo gladiador com o Hulk - a qual disse que ele tinha ganhado (?) -, a nova amiga asgardiana Valquíria que era de um exército só de mulheres de Asgard, a luta contra Hela no planeta dourado para salvar os asgardianos e a profecia do Ragnarok sendo completa.

E aí ele falou da ideia de vir para Terra, construir a Nova Asgard e então a nave do Thanos interceptando a deles.

—E eu achando que tinha perdido muito nesses dois anos. — murmurei, levando minha mão até a dele, a segurando. — Você pode sentir que está sozinho, mas não está, ok? Seus amigos midgardianos estão aqui para você. Eu estou aqui para você. — sorri.

—Obrigado, Baixinha. — Thor apertou minha mão.

—O Loki... se fingiu de morto duas vezes. Você acha que... — engoli em seco.

—Não. Acho que dessa vez foi definitivo. — ergui minha mão até seu rosto, limpando a lágrima que escorreu.

—Queria que tivéssemos pelo menos a oportunidade de fazer um enterro para ele. — sorri minimamente.

—Eu também, Baixinha. — Thor suspirou, após um tempo. — O que acha de comermos o doce da massinha preta? —

Ele caminhou até a geladeira, pegando a panela com o brigadeiro e duas colheres.

—Então, ficou bom? — perguntou com expectativa após eu comer um pedaço do doce.

—Muito bom, na verdade. Para uma primeira vez fazendo um doce brasileiro você se saiu muito bem. — sorri. — Nota 9,5. Perdeu 5 décimos pelo leve gostinho de queimado. —

—Agradeço pelo elogio, amiga Melinda. — ele abriu um sorriso, comendo um pouco do doce. — Ele estava empolgado em te conhecer. Não queria admitir, mas eu sabia que estava. —

—Quem? O Loki? — arregalei os olhos quando o Deus do Trovão assentiu. — Espera. Você falou de mim para ele? —

—Falei, claro. Quando disse que estávamos a caminho da Terra ele... ele questionou se era uma boa ideia o trazer para cá. — explicou. — Aí falei sobre você, a única midgardiana que não guardava nenhum ressentimento dele por ter atacado New York. —

—Nenhum ressentimento também é um pouco demais. Falando assim parece que eu concordei com a ideia dele de querer governar a Terra. — ressaltei. — É só que... talvez eu tenha defendido ele porque sempre gostei desse lance de pegadinhas e quando soube que o Deus da Trapaça realmente existia... eu surtei. Digo, o pouco que eu sabia dele, e de você também, claro, era dos mitos e quando soube que esses mitos eram reais... bom, qualquer pessoa que curte esse negócio de super heróis surtaria, não? —

Encarei Thor que tinha um sorriso pequeno nos lábios enquanto comia mais um pouco do brigadeiro. Acho que a felicidade tomava conta do seu corpo quando ouvia alguém defendendo e falando bem do seu irmão.

—E, bem, depois que te conheci e você me contou histórias sobre Asgard, sobre você, o Loki e a relação de vocês dois, eu entendi o lado dele, entende? — suspirei. — Você me disse que Odin criou vocês dizendo que ambos nasceram para serem reis, mas apenas um poderia ser rei de Asgard. E você poderia ser o rei legítimo de Asgard, mas Loki também era rei de Jotunheim. Fora que, por mais que você negue que isso não aconteceu, Loki cresceu na sua sombra. — o olhei. — E o fato de saber sobre a Hela só me faz gostar menos do seu pai. Eu aposto todas as minhas fichas de que ela só ficou com aquela ambição toda por causa dele e quando o Loki apresentou os mesmo sinais da mesma personalidade dela Odin o condenou? Você mesmo disse que quando ele foi levado a Asgard após orquestrar o ataque a New York ouviu ele dizer ao grande Pai de Todos que só tentou ser um rei benevolente, como o próprio Odin era. —

—Melinda... —

—Se eu tivesse passado por tudo isso e muito mais quando criança ou adolescente, eu teria aceitado a proposta de um louco que me oferecesse um exército e dissesse que tinha um planeta que eu podia governar. — falei. — Acredito que para o Loki, ser rei era tão importante porque ele achava que era o único jeito das pessoas gostarem dele, porque ele achava que a família dele não o amava. E me desculpa, Grandão, mas eu sempre vou guardar um pouco de mágoa de você por não ter permitido que ele fosse ao enterro de Frigga. Antes de ser um prisioneiro ele era filho dela, e ele soube que ela morreu por um guarda. — ele abaixou a cabeça. — Sei que ele traiu você algumas várias vezes, mas... —

—Eu sei. — murmurou. — Eu sei, Baixinha. —

—Eu não estou falando tudo isso para que você se sinta mal, e se você estiver se sentindo, me desculpa. É só que... se eu estivesse no lugar dele, queria que alguém ouvisse minha história, o porquê de eu ter tomado certas decisões. Queria que alguém acreditasse que se houvesse outro jeito, teria escolhido outra opção. — estiquei minha mão pelo balcão, segurando a dele. — E saber que vocês conseguiram se acertar antes do Thanos aparecer me deixa feliz. Saber que vocês tiveram um momento de irmãos, sem se preocupar com quem ficaria com o trono de Asgard ou coisa do tipo. Só queria que aquela berinjela desgraçada não tivesse... — engoli em seco.

—Ele iria gostar de você, sério mesmo. — sorriu. — Eu conseguia imaginar vocês se tornando grandes amigos. —

—Eu seria a melhor amiga dele, com toda certeza. Iríamos pregar altas pegadinhas em você. — sorri.

—Eu não quero nem imaginar o terror que seria Loki e Melinda juntos. —

Thor e eu olhamos na direção da porta da cozinha, encontrando um Bruce um pouco descabelado, de pijama e descalço.

—Olá, amigo Banner. Já está acordado? Vem aqui e experimenta esse doce midgardiano que eu mesmo fiz. — Thor sorriu, estendendo a colher na direção do Verdão.

—Você que fez, Thor? — indagou, se aproximando e pegando a colher de Thor.

—Sim, a Baixinha me deu nota 9,5. — sorriu orgulhoso.

Bruce experimentou o brigadeiro sob o olhar cheio de expectativa de mim e do Thor. No final, ele pressionou os lábios encarando o asgardiano.

—Foi sua primeira tentativa? — Thor assentiu. — Bom, a Melinda é uma chef muito crítica, porque eu lhe daria um 10 só por ter acertado de primeira. —

Thor abriu um sorriso orgulhoso de si mesmo e eu soltei uma risada, desviando o olhar para o relógio preso na parede da cozinha.

Eram 04:46 am.

—Não conseguiu dormir, Bruce? — indaguei, pegando mais um pedaço do doce.

—Não consegui pregar o olho, e imagino que vocês também não. — nos encarou.

—E está certo. Então resolvemos vir até a cozinha comer doce enquanto colocávamos o papo em dia. — sorri pequeno. — E eu soube que o Hulk lutou contra um lobo de mais de 4 metros de altura. —

Bruce suspirou.

—Aquele lobo não morria de jeito nenhum. — falou. — Mas por que você não me atualiza sobre o que aconteceu durante esses dois anos aqui na Terra? —

—Vish, vou ter que contar tudo de novo? — murmurei, comendo mais brigadeiro.

—Deixa que eu conto, Baixinha. Sou ótimo contando histórias. — Thor se voluntariou.

Sorri.

—Vai lá, Grandão. O holofote é todo seu. Estarei aqui caso fizer algum comentário errado. —