— Bom dia, Yuu-chan!

Kouyou adentrou o quarto quase saltitando de tanta alegria. Yuu riu da animação do maior, mas também não estava muito diferente. Seu sorriso ia de uma orelha a outra e parecia estar pregado em seu rosto:

— Bom dia, Kou.

— E então, animado?

— O que você acha?

— Eu acho que você devia sair logo dessa cama.

O mais alto segurou a mão do outro e o puxou para fora dali, ainda que com algum cuidado. Yuu não estava totalmente recuperado afinal:

— Você parece animado. - Yutaka comentou escorando-se ao batente da porta.

— É claro que estou animado. - o outro moreno o respondeu. - Não aguentava mais ficar nesse quarto.

— E eu não aguentava mais te ver nessa cama. - Kouyou disse fazendo uma careta ao encarar a dita cuja. - Não sentirei falta dela.

Os dois morenos riram da atitude do loiro e Yuu bagunçou seus cabelos num gesto carinhoso:

— Não se preocupe, Kou. Pretendo manter distância de hospitais de agora em diante.

— Nada disso. - Takanori falou ao adentrar o quarto seguido por Akira. - Não se esqueça que ainda precisa continuar com as seções de fisioterapia.

— Não me esquecerei. - o moreno sorriu. - Obrigado por tudo, Matsumoto-sensei.

— Não me agradeça. Apenas fique bem.

— Parem com isso antes que o Kou acabe chorando. - Akira brincou indo pegar as duas pequenas malas de Yuu. - A despedida é só do hospital. Matsumoto-sensei ainda nos deve um barzinho com a Nessa-chan.

— Ah, ela com certeza vai gostar disso. - o médico afirmou com um sorriso. - E por falar nela, ela mandou melhoras pro Shiroyama-san.

O moreno sorriu amplamente. A namorada do Dr. Matsumoto com certeza havia sido uma boa companhia pra ele durante o tempo em que esteve internado e não pretendia perder o contato com ela. Yutaka e Akira também pareciam gostar da moça e o único que não aparentava muito feliz com a conversa era Kouyou. Não que não gostasse dela. Pelo contrário, ele sempre a achou muito simpática, porém desde que a garota fizera amizade com Yuu ele vivia se contorcendo de ciúmes. Akira sempre dizia que era besteira dele e realmente o devia ser, mas não conseguia evitar. Aquele sorriso do Yuu deveria ser só seu, mas não é como se tivesse o direito de reclamar de alguma coisa depois de tudo que aconteceu, ainda que o moreno não se lembrasse:

— Agradeça a ela, por favor. - Yuu pediu antes de despedir-se do médico.

Finalmente sairia dali. Foram cinco meses de recuperação. Para Yuu pareceu uma eternidade. Há quanto tempo não colocava os pés pra fora daquele hospital? Mal podia acreditar que estava finalmente saindo dali. A simples brisa em seu rosto e o contato dos raios de sol em sua pele eram algo incrivelmente agradável para si. Com certeza havia aprendido a dar valor nessas pequenas coisas:

— Você vai chegar em casa e descansar, entendeu? – Yutaka ordenava enquanto o táxi seguia rumo a sua casa. – A gente vai sair à noite e eu não quero saber de desculpas.

— Pode deixar, mamãe.

O moreno de covinhas fez uma careta com a resposta de Yuu, aumentando ainda mais a risada dos outros três. Realmente, Yutaka sempre agia como uma mãe cuidando de todos eles:

— Nós ficamos por aqui. – Akira avisou ao motorista, que logo parou o táxi no acostamento. – Amor, cuide bem do nosso bebê. – brincou bagunçando os cabelos de Yuu como se ele fosse mesmo uma criança.

— Claro que vou cuidar. – Yutaka respondeu do banco do passageiro, virando-se para se despedir do namorado com um rápido beijo. – E você cuide do nosso patinho.

— Eu estou escutando isso, Tanabe. – Kouyou reclamou fazendo inconscientemente o bico que todos ali adoravam e que era o motivo do apelido “carinhoso” que ele tanto detestava.

— Desculpa, patinho. Ops. Quer dizer, Kouyou.

— Vai te fuder, Yutaka.

Kouyou mostrou dedo, fazendo o sorriso de covinhas aumentar ainda mais:

— Também te amo, Kou.

— Que lindo, todos nos amamos, agora sai logo. – Akira ordenou empurrando Kouyou para fora do carro e saindo também. – Tchau amor, tchau Yuu, até mais tarde.

— Tchau. – os morenos responderam juntos sorrindo pros dois loiros.

Akira sorriu de volta e Kouyou apenas ergueu a mão despedindo-se ainda com o bico que não sairia dali tão cedo. Sempre fora birrento e isso não havia mudado. O loiro mais baixo, por sua vez, sempre ria da cara emburrada do amigo e o irritava ainda mais. Achava Kouyou adorável quando estava bravo... Ou talvez simplesmente gostasse de irritá-lo mesmo.

Depois que se formaram, Akira tinha pensado em ir morar com o namorado no andar de cima do restaurante que o moreno estava abrindo, mas estava tão preocupado com Kouyou que acabou decidindo por alugar um apartamento no mesmo prédio do amigo, assim estaria por perto caso o mais alto precisasse. Não que tenha adiantado muito, já que o outro mais ficava no hospital do que em seu apartamento, mas Akira havia adquirido o hábito de importunar Kouyou sempre que este estava em casa. Sabia que aquilo o distraía e, mesmo que agora o loiro mais alto não precisasse mais de tamanha preocupação por parte do amigo, o mais baixo não perderia aquele costume tão fácil:

— Filme lá em casa?

Kouyou o encarou ainda com a cara fechada, mas a verdade é que adorava passar o tempo com o Akira e sabia que ficaria entediado se fosse pra casa, pois não teria nada pra fazer:

— Eu vou buscar a pipoca. - resmungou e seguiu rumo ao seu apartamento.

— Se quiser beber, traz o sakê também. Você acabou com o meu da última vez.

[...]

Yuu estava deitado na cama de Yutaka encarando o teto. Permanecera daquela forma por praticamente toda a tarde enquanto o amigo tentava terminar de organizar a contabilidade do restaurante. Acabara deixando o trabalho acumulado para poder passar mais tempo no hospital, coisa que ambos agradeciam por não precisarem mais fazer.

Mas não era em sua saída do hospital que Yuu pensava. Ele não sabia o que fazer de sua vida e isso o preocupava. Afinal, passaram-se sete anos desde que se lembrava e as coisas haviam mudado. Seus pais, com quem sempre esteve acostumado a contar, já não estavam ali para aconselhá-lo.

Ainda pensava em ir atrás deles e tentar fazer às pazes, afinal sequer se lembrava de terem brigado, mas não saberia o que dizer. Mesmo que pra ele o tempo não tivesse passado, pros seus pais tinha e ele temia não ser recebido por ambos. Não saberia suportar a rejeição de seus próprios pais. Ainda que tivesse escutado de Yutaka que os dois não falam com ele, não queria tirar a prova com seus olhos.

Como se não bastasse ainda tinha Kouyou para confundir ainda mais sua cabeça. Desde o dia em que resolveram recomeçar o loiro agia como se tivessem acabado de se conhecer e não voltou a tocar no assunto “namoro”, mas, por mais que quisesse, Yuu não conseguia tirar aquilo da cabeça. Desejava que Kouyou não fosse tão malditamente adorável a ponto de deixá-lo incapaz de sequer cogitar a possibilidade de se afastar dele.

Tinha que confessar que se afeiçoara ao maior muito mais do que gostaria. Os últimos cinco meses foram difíceis para Yuu e por vezes pensou em desistir, mas em todas elas Kouyou estava lá para apoiá-lo. Permanecera ao seu lado em todas as seções de fisioterapia, o encorajara a cada dificuldade e sorrira com ele a cada obstáculo superado. Yuu encontrara em Kouyou seu porto seguro e aprendera a confiar nele. Mais do que isso... Sentia que havia se tornado dependente do loiro e isso o assustava. Não estava certo. Estava?

[...]

— Um brinde ao Yuu! – Akira berrou no meio do bar, em parte por gostar de fazer barulho e em parte por já estar bêbado.

— Amor, não precisa quase subir na mesa pra brindar. – Yutaka brincou, porém também erguendo seu copo para o brinde.

— E que mais ninguém aqui sofra acidentes de carro, ou eu mato. – Kouyou completou o brinde arrancando risadas de todos.

— Sinto muito por quase ter morrido. – Yuu suplicou sem conseguir conter as risadas.

— É bom não me dar outro susto desses, mocinho!

— Não pretendo fazer isso, pode ficar tranqüilo.

Ficaram ali por mais algumas horas bebendo, conversando amenidades e principalmente rindo muito uns dos outros, especialmente de Akira que a todo minuto falava alguma besteira ou derrubava alguma coisa. Ele tinha a mania de sempre querer acompanhar Kouyou na bebida, mas não era nem de longe resistente como o amigo e Yutaka já pensava na longa noite que teria cuidando do namorado.

Yuu por sua vez ria apenas para acompanhar os amigos, mas não estava realmente prestando atenção. Seus pensamentos estavam longe e isso não passou despercebido por Kouyou:

— Yuu-chan, está tudo bem? - perguntou assim que saíram do bar.

— O que?

— Você está distraído.

— Ah, não é nada.

— Não mente pra mim, Yuu. – ordenou sério, porém com a mágoa visível em seus olhos embora quisesse escondê-la. – Eu te conheço. Sabe que pode contar comigo, não sabe?

— Sei, Kou.

Yuu suspirou. Apesar de tudo ainda não tinha se acostumado com a ideia de Kouyou conhecê-lo tão bem assim a ponto de não conseguir mentir pra ele. Não que não confiasse no loiro, mas era exatamente essa sua preocupação. Não queria confiar tanto assim em alguém que conhecia há cinco meses e não queria se ver tão dependente dele. No fundo talvez fosse apenas medo. Será que ele realmente estava apenas contando com um amigo ou estaria se apaixonando por ele pela segunda vez? Não podia acreditar em si mesmo quando pensava nisso:

— E então? – Kouyou o tirou de seu devaneio.

— Só estava pensando nos meus pais. – acabou confessando. – No que eles me diriam pra fazer agora.

— Você sente muita falta deles né?

— Acho que sempre fui um garotinho mimado. – Yuu sorriu sem graça. – Não sei o que fazer sem eles.

— Vocês dois podiam parar de fuxico e andar mais rápido! – Yutaka berrou já bem mais a frente que os dois e praticamente carregando o namorado. – O Aki é magro, mas é pesado!

— Pode ir na frente, nós vamos passar em um lugar primeiro! – Kouyou gritou de volta e segurou a mão de Yuu. – Vem comigo.

Tanto Yutaka quanto Yuu ficaram sem entender, mas Kouyou não deu tempo pra nenhum dos dois fazer perguntas. Saiu arrastando Yuu até a estação de metrô que não ficava muito distante dali e logo estavam a caminho de seu destino. Destino esse sobre o qual Yuu esperava estar errado:

— Onde estamos indo?

— Não me diga que não viu qual metrô pegamos.

— É, eu vi, mas quero acreditar que não esteja fazendo a burrice que eu penso que está.

— Eu não sei como seus pais vão reagir, mas se você não tentar nunca vamos saber.

Yuu engoliu em seco. No fundo estava morrendo de vontade de correr pra casa de seus pais, mas o medo de ser rejeitado ainda falava mais alto:

— E se eles não me escutarem?

— Aí as coisas vão continuar como estão. Você não tem nada a perder, Yuu.

Kouyou estava certo. Yuu sabia disso e ainda assim... Por que tinha tanto medo? Encarar o passado do qual não se lembrava ainda era doloroso para si:

— Mas... – tentou argumentar, mas o loiro o interrompeu.

— Você sofreu um acidente. Que tipo de pais não se preocupariam com isso?

Embora dissesse isso Kouyou não estava certo de que eles se importariam. Não tinha boas recordações dos pais do moreno, mas queria acreditar que eles não seriam tão frios assim. Afinal, eles se importavam com Yuu antes de ele entrar em sua vida e estragar tudo, não é? No fundo eles ainda tinham que se importar:

— O Yukkun disse que meu pai me deserdou... Ele não é do tipo que volta atrás.

— A briga toda foi por minha causa. Você não está mais comigo e nem se lembra de nada. As coisas mudaram. Vocês não precisam mais estar brigados.

No fundo nenhum dos dois sabia se isso faria diferença, mas ambos queriam acreditar que sim. Yuu desejava com todas as suas forças que seus pais voltassem a falar consigo e Kouyou... Por mais que sentisse que aquela seria sua separação definitiva do moreno, queria que desse certo. Se Yuu pudesse voltar a ser feliz como era antes do namoro dos dois, Kouyou não atrapalharia. Ainda se culpava pelo acidente e depois de tudo só queria ver seu moreno feliz, ainda que não fosse ao seu lado. Era justo. No fundo sabia que não merecia Yuu de volta.

[...]

Andavam juntos pela rua, mais próximos do que Yuu gostaria e menos do que Kouyou estava acostumado, mas nenhum dos dois estava realmente preocupado com isso. O loiro parou na esquina, duas casas antes de seu alvo, e respirou fundo. Estava feito. Levara Yuu até ali, onde poderiam acabar se afastando mais ainda, e já não podia voltar atrás:

— É melhor eu esperar aqui. Eles não vão te ouvir se me virem.

O moreno apenas concordou com um aceno de cabeça e seguiu para a casa onde morara por dezessete anos. Nunca fora tão difícil subir aqueles degraus. Estava com medo e pegou-se desejando que Kouyou pudesse estar ali com ele. No que estava pensando afinal? Era um problema seu e tinha que resolvê-lo sozinho. Respirou fundo, fechou os olhos e tocou logo a maldita campainha. Não tinha mais volta.

Para si a grande porta de madeira aparentava ser aberta em câmera lenta. Seu coração parecia que ia saltar de sua garganta a qualquer momento tamanha a aflição e mesmo assim quando viu o rosto de sua mãe tudo que pôde fazer foi sorrir. A maquiagem bem feita e os cabelos bem pintados e arrumados... Parecia a mesma de antes. A pessoa que sempre esteve ao seu lado. Sentira tanta falta dela durante os cinco meses que passara no hospital que mal podia conter o impulso de abraçá-la:

— Mamãe...

— O que está fazendo aqui? – respondeu ríspida fazendo o sorriso do moreno morrer. – Não é bem vindo nessa casa.

— É, eu soube... – disse sem graça abaixando a cabeça. Nem sabia por onde começar.

— Vá embora.

A mulher ia fechar a porta, mas Yuu a impediu. Ele precisava falar com ela. Precisava ao menos tentar:

— Mãe, eu preciso falar com a senhora. Por favor.

— Não temos nada pra falar. Saia daqui ou eu chamo a polícia.

— Quem é, querida?

A voz grave vinda do corredor deixou Yuu ainda mais aflito do que já estava. Se não conseguia falar nem com sua mãe, com certeza o pai o expulsaria dali no braço:

— Não é ninguém.

A senhora Shiroyama tentou novamente fechar a porta e dessa vez o moreno não só impediu, como também abriu espaço para poder encarar seu progenitor. Não desistiria ali:

— Tadaima, papai.

A face antes calma do senhor tornou-se irritada em questão de segundos. Yuu sentiu um frio percorrer a espinha ao ver seu pai se aproximar a passos largos e pesados de si, porém não se moveu. Mesmo que aquele homem parecesse assustador, ainda era o seu pai. Ele não o faria mal, não é? Era o seu pai... Ainda que os cabelos estivessem mais grisalhos e as rugas o envelhecessem, não havia mudado tanto assim. Ainda era e sempre seria seu querido pai:

— Suma da minha frente ou eu te boto pra fora na marra!

— Pai, eu só...

— NÃO OUSE ME CHAMAR ASSIM! – berrou pra quem quisesse ouvir. – EU NÃO TENHO FILHO!

— Querido, seu coração... – a mulher advertiu. – Não abuse.

— Esse maldito é que voltou pra me atormentar! Não basta a vergonha, quer me matar também?!

— Pai, eu não...

— JÁ DISSE PRA NÃO ME CHAMAR ASSIM!

O Shiroyama mais velho agarrou a gola da camisa do filho e o empurrou para fora da casa, sendo seguido pela esposa:

— Querido, por favor, se acalme.

— Meu filho está morto. – disse sério em alto e bom som ao encarar Yuu. – Nada nem ninguém vai mudar isso.

Acabou por soltar o garoto e deixar-se sentar na escadaria. Não queria se mostrar fraco na frente de Yuu, mas seu peito doía e já não podia lidar com os problemas da idade. Talvez devesse aprender a controlar melhor seus nervos, mas não poderia com aquele fantasma do passado em sua frente o assombrando:

— Por favor, vá embora, Yuu. – sua mãe pediu agachando-se ao lado do marido para verificar se ele estava bem.

— Eu não me lembro de nada dos últimos sete anos. – falou logo de uma vez. Não queria dizer isso assim, mas pelo jeito não o escutariam de outra forma.

— Como? – a senhora Shiroyama perguntou surpresa levantando-se para encarar o filho.

— Me disseram que meu carro caiu de uma ponte. Eu realmente não me lembro de nada e... Não me lembro do que aconteceu entre nós. Não sei como fomos acabar assim, mas enquanto estive no hospital eu senti tanto a sua falta – não pode conter as lágrimas e nem conseguia encarar seus pais nos olhos, mas não pararia. Não até que conseguisse sua família de volta. – Eu sinto muito, mãe... Pai... Eu... Mesmo sem saber o que aconteceu realmente, eu sinto muito. Não queria que as coisas acabassem assim. Por favor, me perdoem. Eu não quero perder vocês.

Sua mãe estava com o coração na mão. Ver seu filho chorando na sua frente e implorando por perdão era demais para o coração já despedaçado de uma mãe. Sentira tanta falta de seu menino, porém ainda não seria capaz de aceitar o que ele fez de forma alguma, mas vê-lo daquele jeito e saber que ele não se lembrava de nada não poderia deixar de comovê-la. Queria acreditar que seu pequeno não cometeria o mesmo erro de novo, porém... A última palavra nunca fora sua:

— Já disse que meu filho está morto. Suma daqui, moleque!

— Querido... Ele está confuso. Deixe-o ao menos ficar por esta noite.

— Eu não sustento vagabundo! – a voz imponente dera o juízo final e seu dono levantou-se disposto a dar fim a tudo aquilo ali. – Ele pode não se lembrar, mas eu me lembro muito bem. Não vai demorar pra que faça a mesma coisa de novo e eu não vou pagar pra ver.

— Pai...

Yuu foi surpreendido por um soco que sem dificuldade alguma o levara ao chão. Ainda não estava totalmente recuperado e seu pai ainda possuía bastante força apesar da idade:

— Você não tem mais pai. Se aparecer aqui de novo, atiro em você. Se não sumir em cinco minutos, atiro em você. Saia logo da minha casa.

O moreno permaneceu apático no chão observando seu pai se afastar. Viu o olhar terno de sua mãe para si pouco antes que ela seguisse o marido e seu peito doeu por saber que não conseguiria mais do que aquilo dela. Os dois entraram na casa e a porta foi fechada. Vazio... Era como se sentia. Totalmente vazio.

Viu seu pai com um olhar sério da janela de seu quarto. Sabia que ele não estava brincando sobre atirar e isso só fazia a dor aumentar. Seu crime era tão grandioso assim pra que seu pai o odiasse daquela forma? Tudo que fez foi amar quem não devia. Ele apenas se apaixonou. Isso é tão grave assim? Não é como se tivesse culpa. Ninguém pode mandar no próprio coração.

Levantou-se e saiu das vistas de seu pai. Não suportava mais ver seu olhar de total desprezo dirigido a si e não se importou em tentar conter as lágrimas. Apenas queria que elas caíssem e levassem toda sua dor consigo:

— Yuu-chan... – Kouyou calou-se ao ver as lágrimas do moreno. Era a última coisa que desejava ver. – Desculpe. – pediu ao abraçar o outro com todas as suas forças. Queria ser capaz de mantê-lo protegido de qualquer dor em seus braços para todo o sempre. – Eu não devia ter te trazido aqui.

— Não. Eu precisava vir, ou passaria o resto da vida imaginando se as coisas podiam ter sido diferentes. Agora ao menos eu sei que tentei.

Apesar de toda a dor que sentia, podia acreditar que tudo ficaria bem enquanto estava envolvido por aqueles braços. Seria eternamente grato por Kouyou estar ali. Por ele sempre estar ali... A quem queria enganar afinal? Cinco meses foram o suficiente para que não conseguisse mais imaginar sua vida sem o loiro. Precisava dele... Sempre precisou:

— Talvez tenha sido melhor assim. Não teria dado certo mesmo.

Kouyou não entendeu o que Yuu quis dizer com aquilo, mas não fez nenhuma pergunta. Apenas permaneceu abraçado ao moreno e pretendia continuar assim até que suas lágrimas cessassem.

Yuu por sua vez tentava se conformar com sua própria decisão. Pensara realmente em abrir mão de qualquer coisa para ter seus pais de volta, mas de que adiantaria? No fundo devia saber que não saberia viver longe daquele maldito loiro que pelo jeito roubara seu coração sem pedir permissão mais uma vez. Tudo aquilo era tão estranho para si. Há cinco meses atrás queria poder afastar o loiro de qualquer jeito e agora... Não podia aceitar e ao mesmo tempo já não aguentava mais negar:

— Acho que mesmo que meu pai tivesse me perdoado eu o teria decepcionado de novo.

— O que quer dizer com isso, Yuu?

O mais velho desvencilhou-se do abraço de Kouyou e o encarou por alguns segundos. Não havia dúvida... Era realmente o que sentia:

— Eu quero dizer que eu te amo.

Kouyou sequer conseguiu processar a informação antes que seus lábios se colassem e tudo que pôde fazer fora corresponder ao beijo. Uma tímida lágrima escorreu por seu rosto e um sorriso se desenhou em seus lábios. Aquele beijo tão calmo e doce fora tudo que mais desejara nos últimos três anos. Era sua segunda chance, tudo com o qual sonhou, e dessa vez faria Yuu feliz a qualquer custo:

— Eu também te amo.

Deixou que aquelas palavras há tanto entaladas em sua garganta escapassem por seus lábios pela primeira vez em sua vida e se certificaria de que não fosse a última.