Kouyou velava o sono de Yuu permitindo-se acariciar os cabelos do moreno. Pelo menos enquanto dormia ele ainda parecia o mesmo. O loiro se perguntava se um dia as coisas voltariam a ser como antes. Se um dia poderia se aproximar de Yuu daquela maneira sem ter medo de que ele acordasse e o afastasse.

Tivera sorte na noite anterior por Akira e Yutaka adentrarem o quarto na hora certa e acabarem por encerrar aquele assunto. Ele não saberia o que responder ao moreno e ainda temia que Yuu voltasse a fazer aquela pergunta. A pergunta que ele queria poder dizer que não fazia sentido, mas a verdade é que o namorado tinha motivos pra não confiar nele. Não mais:

— Me desculpe, Yuu.

A tímida lágrima que escapou por seus olhos foi rapidamente capturada por seus dedos. Ele não tinha o direito de chorar por aquilo. Sempre fora o errado afinal. Aquela era a sua culpa e jamais iria deixá-lo. Sequer poderia implorar por perdão uma vez que o moreno não se lembrava de nada. Era sua punição:

— Se você se lembrasse... Yuu... Será que você poderia me perdoar?

FLASH BACK

Kouyou amava passear por aquele parque durante a primavera e sempre arrastava Akira e Yuu para lhe fazerem companhia. As sakuras floridas eram algo que agradava aos olhos do loiro e por ele aquela estação podia durar para sempre. Mas as coisas não funcionavam bem assim e as outras estações sempre vinham destruir sua paisagem perfeita. A estação da vez era o inverno, a mais detestável na opinião de Kouyou. O frio não lhe agradava nenhum pouco e o branco que cobria toda a cidade era algo melancólico para si.

Se dependesse do loiro ele hibernaria por todo o inverno esperando pela primavera, porém a faculdade e os amigos não lhe deixavam ficar em paz debaixo de suas cobertas. Yuu praticamente obrigara o maior a sair de casa e pela primeira vez foi ele quem levou Kouyou àquele parque e não o contrário:

— Até quando pretende continuar com esse bico, patinho?

O moreno questionou sorridente e isso fez com que o bico do loiro aumentasse ainda mais. Ele odiava ser chamado daquela forma, mas os amigos pareciam ter a necessidade de irritá-lo com aquele apelido idiota:

— Repita isso e vai ver o patinho quebrar seu pescoço, Shiroyama.

— Nossa... Quanta violência, patinho.

— Corre, Yuu!

E foi o que o moreno fez. Correu por todo o parque com o maior em sua cola tentando alcançá-lo. Kouyou estava vermelho de raiva enquanto perseguia o menor, que parecia se divertir imensamente com tudo aquilo, rindo sem parar. É claro que era imprudente da parte deles correr daquela forma com o parque coberto de gelo e, como esperado, o moreno acabou por escorregar e cair. Kouyou, que vinha correndo atrás, não conseguiu parar a tempo, tropeçando no outro e indo ao chão também.

Se o moreno já estava morrendo de rir antes, agora então mal conseguia respirar e colocava as mãos na barriga tentando conter as gargalhadas, inutilmente, diga-se de passagem. Kouyou encarava o céu sem acreditar naquilo. Como fora arrumar um amigo tão idiota? Agora seu cabelo estava cheio de neve e ele morreria congelado, e como se não bastasse a hiena ao seu lado não conseguia parar de rir:

— Você é um babaca, Yuu. – resmungou.

O moreno finalmente parou de rir, levando um tempo pra recuperar o fôlego antes de virar-se para o loiro apoiando o cotovelo no chão e deixando a cabeça pender sobre a mão:

— Sou seu babaca preferido. – zombou.

— Não. Você é só um babaca mesmo.

Kouyou sentou-se e fez menção de se levantar, mas foi surpreendido por uma bola de neve. Virou-se com um olhar repreendedor pro moreno que sorria como uma criança que acabara de aprontar:

— Abusado. – o loiro reclamou virando-se pra ir embora e sendo mais uma vez atingido pelo moreno.

— Retire o que disse. – Yuu ordenou com um sorriso sapeca no rosto, mas tudo que conseguiu foi uma bola de neve na cara. – Ah, agora você vai ver, Kou! – ralhou já juntando mais um punhado de neve entre suas mãos.

— Não! Para, Yuu!

Kouyou saiu correndo tentando proteger seu cabelo. Sempre fora vaidoso e cuidava mais de seu cabelo do que de sua própria vida. Não que o menor se importasse com isso. Corria atrás do loiro jogando uma bola de neve atrás da outra e parecia até estar mirando na cabeça do outro:

— Porra, Yuu, para com isso, seu puto!

Kouyou vez ou outra conseguia fazer alguma bola no caminho e virava-se pra jogar no moreno, mas isso parecia servir apenas para incentivá-lo mais:

— Porra, meu cabelo, Yuu! Para!

— Você pediu por isso, Takashima!

— Eu?! Foi você quem começou!

— E você tacou neve na minha cara.

— E você já jogou um monte no meu cabelo, estamos quites.

Yuu acabou por ceder, não por estar realmente de acordo, mas sim porque já estava cansado. Deitou-se na neve ocupando o máximo de espaço que pôde e deixou-se respirar fundo tentando recuperar o fôlego. Não tivera muito tempo pra isso, já que um monte de neve despencara sobre si. Na verdade, não despencou, mas sim foi empurrado pelo loiro:

— Agora sim estamos quites. Isso é pelo meu cabelo.

O loiro ria, até Yuu segurar seus pés e os puxar, derrubando-o:

— Agora você vai ver, patinho.

Sentou-se sobre a cintura do outro e começou a encher-lhe de cócegas. Kouyou sequer conseguia pedir que ele parasse. Sempre fora muito sensível a cócegas e tudo que podia fazer era tentar, sem muito sucesso, segurar as mãos do moreno.

Qualquer um que passasse por ali olhava assustado para aquela cena, até porque Kouyou berrava como se Yuu o estivesse matando. Por fim conseguiu finalmente empurrar o moreno e tentou levantar-se pra se livrar do amigo, mas escorregou e acabou caindo sobre ele:

— Itai.

Reclamou erguendo o rosto e só então percebeu que estavam próximos demais. Yuu corou violentamente e o loiro acabou sorrindo com isso. Às vezes se esquecia que o amigo era hétero e devia ter certo receio sobre si:

— Calma gostoso, eu não vou te atacar. – zombou apertando o nariz do menor antes de sair de cima dele.

Yuu ficou ainda mais vermelho, não por se sentir desconfortável com um gay tão próximo, mas sim porque notara há algum tempo a forma que seu corpo reagia a cada movimento do loiro e como sua atenção parecia ser sempre tirada por ele. Tentara se convencer de que era apenas paranóia sua e escondeu o que sentia, mas já não estava mais conseguindo suportar aquilo. Estava malditamente apaixonado:

— Kou...

— Que foi?

O moreno não podia acreditar no que estava prestes a dizer. Estava morrendo de vergonha, mas ele precisava. Sabia que se não falasse naquele momento dificilmente teria coragem numa outra hora:

— Você ficaria comigo?

Foi direto ao ponto, mesmo que com o rosto completamente vermelho e encarando qualquer ponto que não fosse o loiro. Esse que por sua vez rira da pergunta do amigo, já que ela não parecia fazer muito sentido:

— Como assim, Yuu?

— Não ri. – o menor reclamou sentando-se também. – Você entendeu.

A expressão do loiro tornou-se séria. Onde Yuu queria chegar com aquilo afinal? Pensar nisso não o agradava:

— Isso tudo é medo que eu te agarre? Não se preocupe, Yuu, sei que você é hétero e eu respeito isso. Você é como se fosse uma mulher pra mim, ok?

— Mulher? - Yuu riu. - Você quem devia ser comparado a uma mulher, não eu.

— Não me leve a mal, Yuu-chan. – o maior zombou apertando as bochechas do outro. – É que você sabe que eu não pegaria uma mulher. Você pegaria, então é melhor você ser a mulher.

— Vai te fuder, Kouyou.

— Olha que eu vou.

O loiro riu deixando o outro mais uma vez corado. Yuu perguntava-se por que aquele idiota não podia cooperar. Como se o que estivesse fazendo já não fosse difícil o suficiente:

— Mas Kou, se eu não fosse hétero, você ficaria comigo?

— Tão jovem e já com crise existencial, Yuu?

O moreno revirou os olhos impaciente:

— Porra, você podia só responder logo, por favor?

O loiro suspirou encarando o amigo:

— Se quer saber se você é lindo, sim, você é, e sim, eu ficaria com você se fosse um cara que eu conhecesse em alguma festa.

— Mas?

— Mas você sabe que eu sou um filho da puta. Eu não ficaria com alguém que não quero magoar, Yuu, e como meu amigo você é uma dessas pessoas.

Era verdade, Yuu sabia que Kouyou nunca fora de ficar com uma pessoa só, mas não podia evitar o desejo de ter o loiro só para si. Não queria gostar do amigo daquela forma, mas aquele sentimento era mais forte que ele mesmo. Deixou-se deitar na neve mais uma vez e fechou os olhos sentindo o vento gélido em sua face. Buscava coragem dentro de si para continuar:

— Nem se eu te pedisse?

— Onde quer chegar com isso, Yuu?

— Eu acho que... Eu gosto de você, Kou. – mordeu o lábio se perguntando o quão idiota ele soava. – Mais do que como amigo.

O coração do loiro quase saiu pela boca ao ouvir aquilo. Não podia ser verdade:

— Do que você tá falando?

— Eu não sei. Eu só... Eu me apaixonei por você.

— Pensei que você fosse hétero.

— Eu também pensei. – suspirou e abriu os olhos mirando o céu. – Acho que eu sou bi? – nem ele mesmo tinha certeza do que pensar sobre aquilo. Nunca tinha olhado pra outro homem daquela forma antes. – Não sei como isso foi acontecer, Kou. Só... Aconteceu e eu não sei mais o que fazer com isso. Eu tentei lutar contra, mas não consigo mais. Não importa o quanto eu tente controlar meus pensamentos, basta você se aproximar e meu peito parece que vai explodir a qualquer momento.

— Yuu...

Kouyou não sabia o que fazer. Ele adorava Yuu, adorava estar em sua companhia, adorava fazer qualquer coisa simples ou ter qualquer conversa idiota com ele, adorava o seu jeito infantil e a forma como estava sempre sorrindo, mas... Era o Yuu. Seu amigo. Ele não o via como amante. Não negava que o moreno era extremamente atraente, além de ser adorável, mas Kouyou não o amava. Não como namorado, ao menos:

— Só uma chance, Kou. Me dá só uma chance.

— Yuu-chan, sabe que eu te adoro, mas...

— Eu sei que você não gosta de mim assim. Só estou te pedindo uma chance de tentar fazer você gostar. Qual é Kou, você dá chance pra todo rostinho bonito que aparece na sua frente. Só me deixa tentar.

— Os rostinhos bonitos ficam comigo por uma noite e depois nunca mais me vêem na vida, Yuu. Eu não posso ficar com você por um dia e fingir que nada aconteceu depois. É diferente.

— Então namora comigo.

— Yuu...

— Tem tanto medo assim de compromisso?

Sim, ele tinha. Sempre teve medo de se entregar de verdade. Parecia estúpido entregar seu coração para que alguém pudesse destruí-lo. Preferia mantê-lo em segurança trancado a sete chaves e bem distante de todos os caras com quem se envolvia:

— Não quero te magoar.

Não era mentira. Ele tinha medo de acabar machucando o menor que era alguém tão querido pra si, mas na verdade seu medo maior sempre foi de se magoar:

— Ao menos tente. Me dê um mês pra tentar te conquistar e se você se arrepender nós terminamos e eu não vou reclamar.

— Yuu-chan, isso não está certo. Sinto-me brincando com seus sentimentos.

— Não está. Eu sei que você não gosta de mim. Não é como se você estivesse me enganando.

— Ainda não me parece uma boa ideia.

— Por favor. Só por um mês, por favor.

Kouyou suspirou vencido. Não tinha mais com o que argumentar e odiava ver Yuu triste. Faria qualquer coisa pra ter seu sorriso de volta, e depois, o que era um mês? Apenas trinta dias sem suas noitadas. Podia sobreviver a isso. Não era o fim do mundo.

[...]

Demorou menos de uma semana pra que os pais de Yuu descobrissem e o deserdassem. Não antes de o insultarem de todas as formas possíveis e tentarem inclusive agredir o filho. O teriam feito se Kouyou não tivesse entrado no meio. Isso rendeu ao moreno muitas noites mal dormidas e uma dosagem alta de antidepressivos. O mais alto não conseguiria terminar com ele depois disso e assim os meses se passaram, tornaram-se um ano e os dois continuavam juntos.

Não que fosse de tudo ruim. Ele tinha que confessar que estar namorando tinha suas vantagens. Yuu era sempre atencioso consigo, o ajudava em tudo que podia e um pouco mais, nunca reclamava de nada, era uma boa companhia e aceitava ir com ele a qualquer evento que quisesse. Além disso, o menor tinha aquela mania de sempre arrumar o café da manhã pros dois e fora ele quem cuidara do loiro quando esse teve febre. Não era ruim ter o Yuu por perto, tinha que admitir que amava todos os mimos do moreno, mas também não podia negar que às vezes sentia falta da liberdade que tinha antes.

E fora numa noite em um bar, ao reclamar da falta que sentia dessa liberdade a um velho conhecido que encontrara por acaso, que acabara se deparando com uma solução pro seu problema. Nunca fora de recusar flertes como os que recebera naquela noite, mas nos últimos quinze meses tinha se segurado por não querer magoar Yuu:

— O que os olhos não vêem o coração não sente.

Fora isso que ouvira e pensando bem, fazia sentido. Yuu não se magoaria se não ficasse sabendo, então não tinha problema. E fora naquela noite que traíra o moreno pela primeira vez. Daí em diante não parou mais.

Yuu sentia que o namorado estava mais distante, mas repetia a si mesmo que era coisa de sua cabeça. Afinal, o loiro sempre fora desligado mesmo. Viva se atrasando pros compromissos, esquecia todas as datas importantes e nunca foi do tipo atencioso ou carinhoso. Yuu não se importava com isso. Sempre foi assim. Ele amava Kouyou independente disso e não exigiria que ele mudasse.

O relacionamento durou daquela forma durante quase nove meses. Kouyou era o único a ficar em casa sexta à noite, já que Akira e Yutaka sempre saíam juntos e Yuu tinha aula, por isso não se importava em levar companhia pro apartamento. Naquela sexta não foi diferente. O loiro gemia alto sem nenhum pudor enquanto seu corpo se chocava contra o do ruivo que conhecera em uma boate menos de duas horas antes.

Era só mais uma foda. O ruivo iria embora depois daquilo e os dois nunca mais voltariam a se ver. Kouyou arrumaria a cama e esperaria Yuu chegar pra recebê-lo com um sorriso, como sempre fazia. Mas as coisas não saíram como o planejado daquela vez.

Era o aniversário de dois anos de namoro deles e por isso Yuu resolveu fazer uma surpresa. Tinha certeza de que Kouyou não se lembraria da data, mas isso não importava. Pelo contrário, o fato de o loiro não saber de nada deixava Yuu ainda mais animado por poder pegá-lo de surpresa.

Ao invés de ir à aula o moreno entrou em uma joalheria. Desde o início do namoro quisera comprar aquela aliança prateada para Kouyou, mas tinha medo de estar sendo muito precipitado. Já fazia dois anos, então talvez fosse o momento de ter aquele objeto pra simbolizar o que sentiam um pelo outro.

Saiu sorridente da loja e passou em um restaurante para comprar a comida preferida do namorado. Preferia ele mesmo fazer o jantar, mas assim não seria surpresa. Não se esqueceu de comprar também a caixa de chocolates que Kouyou tanto amava e seguiu pra casa. Tudo pra encontrar a última cena que imaginara ver na vida.

Kouyou assustou-se ao ver o moreno ali. Será que havia perdido a hora? Não podia acreditar que Yuu estava ali por desconfiar de si. O moreno continuava apático na porta do quarto:

— Yuu-chan...

— Eu... Desculpa. Eu não sabia que estava ocupado.

Fora tudo que ele dissera antes de sair dali. Kouyou cobriu-se como pôde com um lençol e abandonou o ruivo em sua cama para ir atrás do moreno:

— Yuu, me desculpa, eu-

— Por que não me disse, Kou? – interrompeu o loiro mantendo-se de costas pra ele. Não queria que suas lágrimas fossem vistas e tentava controlar o tom de sua voz.

— O quê?

— Por que não me disse que não gostava de mim? Eu achei que... Achei que as coisas tivessem mudado entre a gente quando completamos um mês e mesmo assim você quis continuar comigo.

— Seus pais brigaram com você por minha causa. – foi sincero. – Eu não tive coragem de terminar.

As lágrimas do menor tornaram-se mais espessas. Como pudera ser tão burro? Como não percebera que Kouyou nunca o amou? Tinha sido apenas um estorvo na vida do maior por todo aquele tempo sem nem perceber e mesmo assim não conseguia deixar de sentir raiva. Sentia-se traído, não por haver outro homem em sua cama, mas sim porque Kouyou havia mentido pra ele:

— Devia ao menos ter me avisado que estava comigo só por isso. Eu teria te poupado desse problema.

— Yuu-chan, sabe que não é assim. Eu gosto de estar com você e você sabe disso. Eu te adoro, Yuu.

— Só não me ama.

— Não. Talvez devêssemos ter continuado sendo só amigos desde o começo. Eu te disse que aquilo estava errado.

Aquelas palavras doeram. Yuu não sabia como se livrar daquela onda de sentimentos que o destruía por dentro. Deixou que a caixinha de jóias em sua mão caísse e fora rumo à porta. Precisava sair dali:

— Aonde você vai? – o mais alto perguntou correndo atrás do moreno.

— Me deixa, Kou. Por favor, me deixa.

E fora o que o loiro fizera. Sabia que não tinha o direito de exigir nenhuma explicação do menor, então apenas deixou que ele fosse embora. Pegou a caixinha caída no chão e a abriu, deparando-se com o par de alianças:

— Droga, Yuu...

— Etto...

Kouyou virou-se pro ruivo seminu em sua sala e suspirou:

— Desculpe por isso. Acho melhor você ir embora.

O outro obedeceu a contra gosto, fazendo Kouyou jurar que o compensaria depois. O loiro sorria com a ideia, mas a lembrança de Yuu parado na porta do quarto insistia em assombrá-lo. Jogou-se no sofá olhando pro teto. O que o namorado faria? Não precisava realmente se preocupar. Não fazia questão de chamá-lo de namorado.

.~...~...~...~...~.

Fora idiota ao pensar que realmente não se importava. Ele havia sim se apaixonado por Yuu, mas não queria admitir pra si mesmo porque esse sentimento o fazia sentir-se vulnerável. A verdade é que estava tão acostumado a ter o moreno por perto que nunca se imaginou sem ele. Não pensou que um dia poderia perdê-lo. É aquela velha história, as pessoas só dão valor no que têm quando perdem. Kouyou demorou demais a se dar conta disso. Só queria poder ter uma segunda chance... Se a tivesse com certeza faria tudo diferente.

Yuu remexeu-se na cama e o loiro imediatamente se afastou. Tinha tanto medo de ser rejeitado pelo menor que preferia manter uma distância segura. Não que fosse fácil fazer isso. Sua vontade era de abraçar Yuu e não deixar que ele saísse de seus braços nunca mais. Não suportaria perdê-lo outra vez.

FLASH BACK

Acabara dormindo no sofá e caiu do mesmo ao escutar o celular tocar:

— Droga. – resmungou esticando-se para pegar o aparelho na mesinha de centro. – Moshi moshi.

— Desculpe por ligar a essa hora, mas esse número está como contato de emergência do Shiroyama Yuu-san. O senhor é o Takashima Kouyou?

— Sou. – revirou os olhos imaginando que o moreno devia estar bêbado em algum bar e ele precisaria buscá-lo. – O que ele aprontou?

— O senhor Shiroyama sofreu um acidente.

Kouyou sentiu seu coração falhar uma batida e mal percebeu quando começou a tremer:

— Que tipo de acidente?

— O senhor poderia vir até aqui? Ou entrar em contato com algum familiar.

— Eu estou indo. Me passa o endereço.

Nunca fora tão imprudente no trânsito em toda sua vida. Não importava se estava de moto, entrava na frente de carros, caminhões e o que fosse, furava todos os semáforos possíveis e pouco se importava com as buzinas. Chegou ao hospital na metade do tempo que gastaria normalmente e assim que se apresentou na recepção fora encaminhado a uma enfermeira que lhe explicaria o que estava acontecendo.

O carro de Yuu tinha capotado e caído em um rio. O coração do loiro se espremeu ao receber tal notícia. Não devia ter deixado o moreno sair daquele jeito de casa. Como pudera ser tão imprudente?

Apenas assinou todos os formulários que colocaram a sua frente sem ter condições de ler nada. Queria chorar, mas não se permitia fazê-lo. Sempre odiou chorar na frente de outras pessoas. Ao finalmente terminar de assinar toda a papelada fora questionado sobre o comportamento do moreno. Se ele tinha estado estranho ou depressivo:

— Ele tem depressão há algum tempo. – fora o que respondeu. – Mas ele costuma ficar bem quando toma os remédios. Por que a pergunta?

— É que... Uma das testemunhas acha que ele jogou o carro na baixada de propósito.

Kouyou ficara tão branco quanto um fantasma. Não esboçara nenhuma reação com aquele comentário. Ao menos não por fora. Por dentro a culpa o corroía e questionava-se como pudera ser tão idiota. Nunca devia ter traído Yuu. É verdade que o que os olhos não vêem o coração não sente, mas a única forma de garantir que os olhos não vejam é não acontecendo.

Não poderia descrever o ódio que sentia de si mesmo. Ele merecia sofrer um acidente, não Yuu. Jamais se perdoaria. Não saberia o que fazer se algo acontecesse com o moreno. Só queria ser capaz de trocar de lugar com ele e de acabar com toda a sua dor. Se ao menos pudesse voltar atrás... Mas não podia. Tudo que estava a seu alcance era ficar ali, apático em frente à sala de cirurgia esperando que o outro ficasse bem. A única certeza que tinha era que se Yuu morresse ele com certeza iria junto.

.~...~...~...~...~.

Yuu acordou, deparando-se mais uma vez com aquele loiro. Até quando aquilo continuaria? Não queria ficar a sós com ele. Era estranho. Principalmente se fosse pensar no que o outro dissera sobre ser seu namorado. Aquilo não fazia o menor sentido e não podia ser verdade. Tinha que ser uma brincadeira. Uma brincadeira de mau gosto:

— Yutaka saiu de novo? – perguntou tentando não demonstrar a leve irritação em sua voz.

— Ele foi dormir em casa e disse que volta pela manhã.

Yuu virou o rosto com um bico emburrado fazendo o loiro rir:

— Não se irrite com ele, Yuu. É desconfortável dormir em uma cadeira de hospital, sabia?

— Então por que você ficou?

Ele estava na defensiva e isso não passou despercebido pelo loiro. Kouyou suspirou desviando o olhar:

— Você não pode ficar sozinho. Vamos nos revezar pra ficar com você.

— E por que você ficou primeiro? – Yuu não conseguiu disfarçar seu tom irritado dessa vez.

Não queria magoar o loiro, mas aquela situação era realmente desconfortável para si. Não tivera tempo para se acostumar e queria que ao menos no primeiro dia o idiota do seu melhor amigo ficasse com ele:

— Eu já estou acostumado. – Kouyou respondeu sem muito entusiasmo. – Aqueles dois precisam se programar. Eles têm vida fora daqui.

— E você não tem?

— Não mais. – respondeu sincero.

Suas farras haviam realmente se findado naquele dia. Nunca mais saíra de perto do moreno depois daquilo:

— Minha vida está bem aqui.

Disse ainda que sem coragem de encarar Yuu. Esse por sua vez corou ao sentir seu peito pulsar com mais força. Por que diabos seu corpo tinha que reagir daquela forma? Ele odiava aquilo. Estava confuso e não precisava de mais aquilo pra lhe complicar a vida:

— Yuu-chan...

Kouyou permitiu-se chamar o menor daquela forma mais uma vez e ao ter a atenção desse voltada para si ousou aproximar-se, sentando-se no canto da cama:

— Não precisa ficar tão apreensivo assim. Sei que não se lembra de mim, mas pode contar comigo pra qualquer coisa.

Ainda que não encarasse Yuu, Kouyou falava com firmeza. Sua mão pousou sobre a do moreno tentando passar alguma confiança pra ele, mas o menor tirou a mão dali e se afastou:

— Me desculpe. – Yuu pediu pesaroso. – Sei que está se esforçando, mas... Não consigo confiar em você assim. Eu nem te conheço.

Kouyou sentiu-se completamente vazio por dentro:

— Tudo bem.

Fora tudo que dissera ao se afastar da cama e sentar-se na poltrona mais afastada do moreno:

— Me chame se precisar de algo.

Disse simplista cruzando os braços e fechando os olhos em seguida. Não conseguiria dormir de fato, mas preferia não ver o olhar de Yuu sobre si. Não daquela forma, como se fosse um completo estranho.

Yuu por sua vez sentia-se mal por aquilo. Não queria magoar o loiro, mas de alguma forma seus instintos pareciam dizer pra que se afastasse. Mesmo que seu coração disparasse e seu corpo parecesse arrepiar sempre que Takashima se aproximava, ele sentia que devia manter distância. Só não entendia o porquê daquilo.