Você Me Tem

Novamente rei Shariar


Tentou esticar a mão o máximo que podia para alcançar a pedra. Porém, não conseguiu, precisou se contentar com uma que estava mais próxima. Tentou novamente alcançar a maldita pedra. Falhou, o que resultou em uma queda. Estava terrivelmente desconcentrada, a parede nem era tão difícil assim, já havia a escalado diversas vezes. Além disso, era pequena e leve o que facilitava a subida, era uma ótima escaladora. No entanto, naquele dia estava parecendo uma principiante.

Respirou fundo e começou a subir novamente. Já perdera as contas de quantas vezes havia caído naquele dia. A verdade era que sua falta de concentração possuía nome e sobrenome, Peeta Mellark. Aquela confissão não saia de sua cabeça por mais que desejasse apagar cada palavra. Por que ele tinha que estragar tudo? Ela já não estava confusa o suficiente para ele trazer ainda mais conflitos? O que havia de errado com Peeta para ele se apaixonar justamente naquele momento, e ainda mais por ela?

Peeta era um daqueles Don Juan que conquistam todo mundo, mas que nunca amam ninguém. Ela já cansara de ver garotas chorando por ele. E ele parecia não se comover com nenhuma. Uma vez comparara Peeta ao rei Shariar de “Mil e uma noites” que tomava uma mulher por noite e depois as decapitava, no caso de Peeta, as descartava sem dó nem piedade. O amor para Peeta era algo completamente distante. E ela gostava disso nele. Peeta não enganava ninguém como Gale, fingindo algo que não era, nem era hipócrita. As garotas sabiam que não podiam esperar nada além de sexo vindo dele. Mesmo assim, muitas não conseguiam se controlar e deixavam aquele estúpido sentimento chamado amor as dominar.

Por que justamente com ela tinha que ser diferente? Ela que não suportava o amor, que não queria se apaixonar em toda a sua vida. Conhecia o lado mais negro daquele sentimento. E olha só, ela era a consequência deste amor destrutivo. A mãe amava tanto o pai que para agradá-lo teve filhos, filhos que ela nunca quisera ter. O amor fazia as pessoas deixarem de serem racionais. As pessoas realizam coisas estúpidas em nome daquele sentimento.

Tentou alcançar a maldita pedra. E outra vez a queda. Desta vez não tentou subir novamente. Apenas ficou lá deitada de costas, observando o enorme paredão.

Peeta. Peeta. Peeta. Por que não conseguia tirá-lo da cabeça? O que ela sentia por ele? Bem, não podia negar que o sexo era incrível. Os dois na cama eram verdadeiros vulcões e ele lhe dava um prazer que nunca desfrutara antes com nenhum outro. Combinavam perfeitamente nesta área.

Mas... sempre havia um “mas”, também havia aquela outra coisa. Aquela outra coisa que tentava não pensar, que sentia ao ver o sorriso de Peeta. Aquela coisa estranha que tentava extinguir com todas as suas forças. Além disso, havia o fato de Peeta a fazer revelar coisas que não gostaria de revelar para ninguém. Ele a fazia demonstrar seu lado mais vulnerável. Não gostava daquilo.

O que era aquilo tudo? Não, não importava. Nada daquilo importava.

Mas o que faria com aqueles sentimentos de Peeta? Que droga! Ele ferrara com tudo. Ele complicara tudo. Não gostava de coisas complicadas, e aquilo estava ficando complicado demais.

— Uma gata como você não deveria ficar aí deitada no chão, merece coisa melhor como minha cama — a voz rouca de Gale chegara até ela.

Olhou em direção de onde vinha a voz. Gale também praticava escalada. Aliás, os dois haviam ido muitas vezes naquele local para praticarem juntos. Por isso, não era nenhuma surpresa o encontrar naquele local. Ele estava de pé a observando com os braços cruzados. Como estava distraída não havia percebido sua presença. Há quanto tempo ele estaria ali? Desviou os olhos dele com desdém. Mais uma coisa que Peeta ferrara. Como agora iria fazer aquele cretino pagar?

Katniss levantou-se imediatamente do chão e o ignorou. Gale não merecia sua atenção.

— Ei, volte aqui! — falou, a seguindo. — Você está cada dia mais gostosa, hein!

Era o que faltava o babaca de seu ex-namorado dar em cima dela. Não estava com a mínima paciência para aturá-lo. Virou-se para ele.

— Não seja ridículo!

— Calma! — deu dois passos em sua direção. — Apenas estava fazendo um elogio. Além disso, era que eu que deveria estar zangado. Sabe que tive muitos problemas depois de nosso encontro...

Katniss sorriu ao pensar no chute bem dado no meio das pernas daquele cretino.

— É uma pena que se recuperou tão depressa — disse sarcasticamente.

— Eu deveria era cobrar uma indenização... — os olhos de Gale passeavam por seu corpo de maneira penetrante, querendo despir cada peça de roupa. Teve ódio daquele olhar. Aquilo era repugnante.

Gale deu mais dois passos em sua direção.

— Se você der mais um passo, desta vez recebera bem mais que um chute em suas bolas — ameaçou. Mas ele não ligou para sua ameaça.

— Você fica muito tentadora quando está brava.

Ele estava pedindo por aquilo. Gale estava prevenido, não poderia chutar aquelas bolas. Porém, isso não significava que não podia bater nele. Sem aviso prévio, deu um soco bem no adorável nariz do babaca. Ele urrou de dor.

— Eu avisei!

— Vadia, você quebrou meu nariz!

— Assim espero! — deu as costas para ele.

— Volta aqui, vagabunda! — gritou.

Aquele cara era extremamente ridículo. O imbecil gritava várias palavras obscenas para ela. Já estava preste a voltar lá e fazê-lo se calar, e ele não ganharia apenas um soco no nariz. Já se preparava para virar-se. Entretanto, não chegou a executar o movimento.

— Algum problema, Katniss? — os olhos verdes inconfundíveis de Stefan a fitavam.

— Não, nenhum, eu já dei um jeito nele... — sorriu.

— Tem certeza? — duvidou.

— Tenho, não se preocupe. Eu posso dar um jeito em babacas como ele — afirmou. — Mas o que está fazendo aqui?

— Eu gosto de escalar, me ajuda com o alpinismo. Não sabia que você também escalava! — disse surpreso.

— Digamos que gosto de esportes mais radicais, e adoro tudo que envolve altura. A maioria das pessoas não gosta de lugares altos, mas eu os adoro!

— Talvez, eu devesse te convidar para escalarmos alguma coisa juntos — disse brincalhão. — Meu irmãozinho Finnick, nunca se deu bem com a altura, nem mesmo Annie gosta muito de altura. A altura e o mar são minhas grandes paixões! Enfim, sou uma mistura de peixe e águia. Uma combinação inusitada, não?

Katniss riu com aquela afirmação de Stefan. Ele também riu.

— Mudando de assunto... Finnick anda um pouco estranho... Você sabe se alguma coisa está acontecendo com ele?

— Não... — é claro que sabia. Mas não iria falar que Finnick amava a noiva do irmão desde os quinze anos, e até fora para a cama com ela no ano passado. E depois disso sempre convivia com a culpa de ter traído o seu próprio irmão.

— Ele não quer voltar para a casa, sempre encontra uma desculpa qualquer... Annie também está preocupada com ele. Ela até pensou que com o convite para ser nosso padrinho de casamento, Finnick se animaria para voltar para a casa. Mas foi o contrário — aí estava o problema. — Eu não entendo. Pode ser coisa da minha cabeça... Talvez, eu esteja vendo coisa onde não tem... Porém, ultimamente parece que Finnick tem criado uma verdadeira inimizade com Annie. Os dois sempre foram tão amigos, quase irmãos...

O que poderia dizer para Stefan? Não havia absolutamente nada o que falar.

— As pessoas mudam... — disse simplesmente, sem saber o que falar ao certo.

— Você parece um tanto... distraída — disse Stefan a analisando.

— Não — negou, detestava quando as pessoas viam seus sentimentos. — Não é nada — sorriu. Era o momento de colocar sua máscara impenetrável, que não permitia que ninguém soubesse o que estava sentindo ou pensando. — Preciso ir. Hoje tem uma pequena festa em Panem, algo para arrecadar fundos para o grupo de eventos de caridade. Talvez, outro dia possamos escalar algo juntos... — falou se referindo a proposta que Stefan fizera há instantes.

Ele assentiu com um gentil sorriso.

— Não se esqueça de que aceitou meu convite! — disse Stefan.

Ela riu.

A festa era realizada em um grande salão, que Panem construíra especialmente para estas ocasiões. Quando Katniss chegou, já havia muitas pessoas. Ela procurou por uma bebida. Teoricamente, bebidas alcoólicas estavam proibidas. Porém, sempre havia uma forma de se conseguir bebidas em festas assim, e Panem podia muito bem cobrir os olhos, já que seus alunos eram todos pertencentes a famílias ricas e importantes da sociedade.

Encontrou-se com Rue e Johanna.

— Katniss, pensei que não vinha mais! — falou Johanna.

— E perder uma festa? Acho que vocês não me conhecem! E me passem esta bebida! — apontou para o copo que Rue segurava.

Rue o entregou. Deu um bom trago na bebida, era vodka.

Percorreu os olhos pelo imenso salão. Uma banda formada por alguns alunos do colégio tocava. A música não era lá estas coisas, porém dava para se ouvir. Algumas pessoas dançam ao som da música. Era o que deveria fazer, ir para a pista, dançar. A sessão de escalada não fora suficiente para fazer seu corpo ficar cansado. E era o que mais desejava, talvez assim, aqueles pensamentos estranhos não viriam a atormentar novamente.

Foi o que fez. Quando estava indo para a pista de dança, avistou Delly em um dos cantos do salão. Foi o suficiente para lembrar-se do desagradável encontro com Gale naquela tarde. Com certeza, ele iria aparecer. Hipócrita como sempre, não permitiria que a namorada ficasse muito tempo sozinha.

Era melhor não se importar com Delly. No entanto, não ouviu seu próprio conselho. Notou que a garota tinha uma expressão triste no rosto, como se estivesse ao ponto de chorar. Aquilo a deixou intrigada. Ela olhava para algum ponto do salão. Seguiu o olhar de Delly. Era fácil compreender o motivo daquela expressão. Peeta estava aos beijos com uma garota.