Guardar coisas para si mesmo é um pouco complicado.

Você vai ser o único a carregar o peso de um problema, de uma situação ou de qualquer outra coisa.

Quando você passa cerca de 17 anos guardando o peso de um problema no seu peito, você já não sabe se aquilo é um problema ou a sua vida. E isso não deveria acontecer.

Mas tem algumas formas de lidar com esse problema...

*

-...A questão é que a Sayuri morreu na cirurgia, e eu nunca consegui cumprir com as expectativas da minha mãe. - eu falo finalizando toda a história que eu já havia contado na semana anterior para o Sasuke.

-Fico feliz que realmente tenha se aberto comigo, Sakura. - a Dra. fala abrindo um pequeno sorriso, como se fosse realização, ou algo do gênero, ela passou toda a história anotando coisas e mais coisas.

-É. Tudo bem. Agora resolve o meu problema, psicóloga. - eu falo voltando ao estado habitual.

-Não é bem assim que funciona, querida... - ela fala com um olhar divertido no rosto, achando graça da minha... exigência?

-Como assim? - eu pergunto confusa. - Não é para isso que vocês servem? Escutar problemas alheios e dizer como as pessoas fazem pra superar, ou alguma coisa assim? - pelo pouco que eu sabia, psicólogos ajudavam as pessoas, não é?

-Depois de algumas seções conversando sobre o assunto, sobre como você se sente, eu vou te dar dicas de como lidar com o problema, para você superá-lo, a parte principal quem faz é você. - ela diz me olhando com um olhar maternal, e aquilo me deixa sem paciência. Por algum motivo desconhecido, estou com vontade de ir embora.

Na verdade o motivo não é desconhecido, eu sei porque quero ir embora. Quero ir embora porque tinha a expectativa de que se eu contasse, eu teria a solução imediata. Mas isso não aconteceu. Eu preciso confessar que sou um tanto quanto ignorante quando o assunto são profissões. Fui treinada para saber tudo de administração, direito e coisas do gênero. Mas do resto... Não posso dizer que sou alguém culta.

-Espera. - eu falo chamando a atenção da Dra. Meredith, enquanto ela escreve. Eu me lembro de um detalhe que me deixou incomodada. Ela me observa esperando o que tenho a dizer, eu repenso se preciso realmente saber daquilo, eu preciso ou eu quero? - Você não ficou supresa, quando eu... Contei a história, eu quero saber se... Você já sabia? - eu quero saber, talvez não mude nada, mas queria saber se minha mãe conseguiu falar antes de mim.

-Bom... - ela faz uma cara de culpada, pensa se deve realmente me contar, na hora o sigilo absoluto me vem a cabeça. - Sua mãe me deixou contar, ela também quer saber quando você decidir contar. A resposta para a sua pergunta é sim, eu já sabia. - ela fala com um sorriso solidário que me deixa com uma vontade insana de pular encima daquela mesa e socar toda sua face.

Uma coisa que eu não quero agora é solidariedade. Eu preciso de um saco de pancadas, preciso me afastar das pessoas, preciso gastar todas as minhas energias em qualquer coisa. Ah, claro, uma solução também é bem vinda.

-Pode contar para ela. Sinta-se à vontade. - eu falo focando em outras coisas, evitando a todo custo seu sorriso irritante.

-Então tudo bem. Agora posso te fazer uma pergunta? - ela fala tentando lentamente avançar alguns sinais que antes eram vermelhos.

-Não. - Ela se enganou em pensar que eles estariam verdes agora. Ela fica um pouco surpresa, mas se recompõe, e é nesse instante que eu percebo que o meu "não", pode acabar não impedindo ela de fazer a pergunta. Ela está se acostumando a lidar comigo.

-Fiquei sabendo que você fugiu na semana passada. - ela fala cuidadosamente, essa mulher esta sabendo mais da minha vida do que eu.

-Eu não fugi, só corri para um lugar onde as pessoas não fossem me encontrar por um tempo. Eu ia voltar. - repito a mesma coisa que devo ter dito centenas de vezes para várias pessoas e para mim mesma naquele dia.

Eu fiquei pensando se eu realmente teria voltado, se o Sasuke não tivesse me encontrado, na hora eu tinha certeza de que iria voltar alguns minutos depois. Mas eu paro para olhar a situação um pouco, e se no momento eu tivesse decidido que era melhor desistir de tudo? Eu não sei se algum dia eu me arrependeria de ter realmente fugido, assim como eu não sei se vou me arrepender de NÃO ter fugido.

-Entendi. - ela diz anotando mais algumas coisas, tenho vontade de arrancar a caneta de suas mãos, jogar o objeto no chão e pisar nele. - Mas o que te levou a correr? - ela fala chegando no assunto que já era seu objetivo.

-Hum... - eu não finjo estar pensando, eu só viro minha cabeça em direção a janela e Meredith suspira, ela sabe que quando eu faço isso, eu pretendo não falar mais nada no resto da consulta, mas não dessa vez. Eu vim disposta a ter alguma solução, se isso significa contar tudo, eu conto. - Minha mãe... Ela...

-Ela... - ela fala me incentivando a continuar, eu ainda observo a janela, mas percebo a surpresa no seu olhar. Até eu estou surpresa, várias ações minhas vem me surpreendendo, esta é só mais uma delas.

-Ela estava conversando bastante comigo, semana passada. Agora ela está com medo de alguma coisa. Mas antes teve um momento em que ela... Bom ela disse "Nós podemos seguir em frente agora, sem deixar que ninguém nos atrapalhe, não é?". - eu falo e vejo a cara confusa da Dra. Até eu fiquei confusa na hora. - O problema, é que eu nunca esperei isso, então eu fiquei meio perdida! Qual é, ela passou minha vida inteira me culpando, se culpando e sempre exigindo... E de uma hora para outra, ela para de exigir e decidi perguntar? Perguntar a coisa que eu sempre quis ouvir, e ao mesmo tempo não queria? - eu falo e a surpresa no rosto de Meredith some, e tudo que eu posso ver é compreensão. Eu também não quero que ela me entenda!

-E aí você fugiu? - ela diz tentando ligar os pontos.

-Na verdade eu CORRI, porque eu simplesmente, tive uma vida baseada na minha irmã, que eu nem conheci! Se minha mãe parar com toda essa história, e decidir seguir em frente, o que é o certo a se fazer, eu não sei... O que EU faço? - se você tem a solução, uma conclusão, uma pista, uma dica, ou qualquer outra coisa, seria ótimo se você dissesse agora psicóloga! Quero dizer isso para ela, mais do que qualquer coisa, mas ela parece estar pensando em outras coisas, e eu decido não interromper.

-Sua mãe conseguiu Sakura. Agora você também precisa tentar. Comece uma nova história, mude sua perspectiva, recomece. - ela fala me olhando atentamente, eu estou encarando ela, no momento tenho coisas mais importantes do que a janela. - Esse é meu conselho para você, Sakura.

*

Pedir ajuda, familiar, profissional, ou uma simples conversa. Você pode progredir de diversas formas.

Sabe, não é tão difícil, depois que você começa, as coisas fluem melhor, você se sente mais leve, é como respirar novamente depois de prender o ar.

Não fujam. Ou melhor... Não corram.

Conversar pode ser tudo o que você precisa fazer, para mudar algumas coisas, para se curar, para ajudar alguém ou a si mesmo.

E para recomeçar.