Vidas Em Guerra - O Falcão e o Lobo

Despedida; apenas um “Até Logo”


POV Sarah

Contra suas vontades Tommy e Aria saíram da sala junto com Rendon deixando para trás apenas a mim e Elizabeth. Eu havia mandado meus filhos arrumarem as minhas coisas para a minha partida. Então me viro para encarar a Rainha. Ela estava atrás de sua mesa com um olhar triste nos olhos verdes direcionados a mim.

–-Preciso de papel e tinta – pedi deixando meus ombros caírem em cansaço.

Ela se levantou e veio até mim me fazendo sentar numa das cadeiras que havia ali. Então trouxe-me papel e tinta. Sentou-se de volta em seu lugar e apensa esperou. Eu escrevi três folhas, cada uma era uma carta. Ao terminar eu peguei uma vela branca que estava num canto da mesa, acendi o pavio e dobrei as folhas. Elizabeth me alcançou três envelopes que eu aceitei e selei com a cera branca depois de colocar dentro deles as cartas. Antes que a cera secasse eu usei a pena para riscar a letra “H” em cima de cada selo.

Depois escrevi abaixo dos selos “Eliot Hawkey”, “John” e no ultimo “Aria”. Durante esse tempo todo Elizabeth apenas assistiu a tudo sem opinar nem perguntar nada. Quando terminei encarei-a com um olhar cansado e preocupado.

–-Não esta se preparando para voltar – ela afirmou me encarando com um olhar duro.

–-Ao contrário, estou me preparando para caso não volte – respondo sustentando o olhar dela ao estender as cartas – Guarde-as pra mim, se tudo der certo eu chegarei aqui de volta em algumas semanas e eu mesma as jogarei ao fogo. Mas, se algo der errado.....Bem, então peço que entregue-as aos seus destinatários.

–-Sarah....porque disso tudo?? – ela me pergunta guardando as cartas numa gaveta – Pelos céus eu te conheço, isso não é o tipo de coisa que você faria....Deixar cartas.....Sarah o que você pretende fazer????

–-Resgatar o pai dos meus filhos, é o que pretendo fazer – respondi calmamente recebendo um olhar ameaçador em troca – Elizabeth...eu nunca acreditei muito nesse tipo de coisa, mas....Por tudo o que me é sagrado eu já tive maus pressentimentos antes. Nenhum deles acabou bem.

–-Sarah....Você não acha que vai voltar não é? – ela me pergunta num tom de voz tão baixo que eu quase não escuto.

–-Eu vou fazer o que tiver que fazer Elizabeth....O que tiver de acontecer vai acontecer – respondi suspirando e me levantando para sair – Vou me arrumar. Volto aqui antes de sair.

POV Narradora

A Hawkey caminhou com seu costumeiro jeito ameaçador até seu quarto. Aria deveria estar arrumando as coisas dela, mas não estava no lugar. Suas coisas, no entanto, já estavam devidamente organizadas e dispostas sobre os pés da cama. Ela se vestiu para a viagem em poucos minutos; a capa cinza escuro, as mesmas botas pretas de couro macio, calças pretas grossas de algodão, uma camisa de mangas compridas cinza claro e por cima dela um peitoral de couro curtido e macio que era a única forma de proteção que ela usava.

Depois de pronta ela voltou para a sala da Rainha entrando sem se preocupar com cortesias. Elizabeth estava de frente para a janela e não se moveu quando ela entrou. Por um tempo ficaram assim: ela encarando a janela e a Hawkey encarando a rainha. Então Sarah se sentou num das cadeiras em frente a mesa e Elizabeth se dirigiu a seu lugar atrás da mesa de mogno. Sarah encarou a borda da mesa com um olhar distante, pensando.

–-“Interesses vão a guerra prolongar até que nasça a pessoa destinada a ela por fim. Quando, pela mão do ferreiro se quebrarem as espadas, do sangue de feras selvagens surgirá o definitivo protetor do Reino. Aquele cuja lâmina vai liderar exércitos, cuja bravura vai inspirar guerreiros e cujos ideais vão unir pessoas” – recitou ela como se fosse um trecho de um livro qualquer, então os olhos cinzas se encontraram com os verdes, que estavam confusos – Logo depois de eu me descobrir grávida, alguns dias depois de eu ter a suspeita na verdade, eu ajudei um grupo de andarilhos na estrada. Havia uma velha mulher entre eles – disse Sarah calmamente como se lembrando das cenas descritas – Chamavam-na Cigana e assim ela se apresentou a mim. De alguma forma ela sabia que eu estava grávida, mesmo sem que eu tivesse verbalizado minhas suspeitas sequer uma única vez. Ela me disse que seria uma menina e que nasceria um pouco depois do tempo. Então me pediu para me acompanhar por algum tempo.

–-Isso parece algum tipo de truque ou.... – começou Elizabeth, mas Sarah sorriu e continuou.

–-Pensei o mesmo. Mas ninguém sabia sobre minhas suspeitas de estar grávida – falou a Hawkey voltando a encarar a borda da mesa, com um olhar distante agora – Eu não acreditava realmente, mas a deixei me acompanhar. Tive a confirmação da minha gravidez com ela viajando comigo, mas ainda não acreditava. Então um dia ela me disse essas palavras como se fosse outra pessoa usando do corpo dela para falar. Num tom inflexível e sem emoção, de um jeito que pessoas não falam.

–-Uma profecia – sussurrou Elizabeth – Nunca acreditei nelas. Nunca vi uma que fosse realmente real.

–-Eu não acreditei nessas palavras, Elizabeth – disse a Hawkey voltando a encarar a amiga – Minha tia mandou ao meu pai uma carta onde dizia a ele que eu seria tudo o que um Hawkey de verdade deveria ser. E pedindo a ele para me chamar de Sarah, assim como a primeira rainha do Reino se chamou – ela sorriu antes de completar – A carta foi escrita, enviada e chegou antes de eu nascer. E ela estava certa. Eu sou o que ela disse que seria.

–-Isso.... – Elizabeth ficou sem palavras.

–-Eu não acreditei nas palavras da Cigana, não no começo. E mesmo depois custei a acreditar. Mas ela acertou. Aria nasceu duas semanas depois do que seria o tempo certo e era uma menina, saudável e forte como ela havia me dito que seria.

–-Você acredita nas palavras dela agora não é? – questionou a Rainha mesmo já sabendo a resposta.

–-Até você acredita agora – disse Sarah calmamente – Eu tive e tenho medo pela minha filha Elizabeth. Hawkey’s são feras selvagens; assim como são ferreiros. E olhando pra ela eu vejo isso. Vejo uma Hawkey.

–-Acha que a profecia fala dela – murmurou Elizabeth – Porque esta me contando isso??????

–-Porque alguém tem que saber – Sarah diz se levantando – O que tiver de ser será, não é minha Rainha – sorriu a Hawkey.

–-Volte viva Hawkey; eu ainda preciso dos seus conselhos.

–-Farei o impossível para isso, Majestade.

E assim ela saiu da sala com passos firmes e decididos como sempre deixando para trás uma Elizabeth surpresa e preocupada. O começo daquelas palavras, daquela profecia, já estava se cumprindo. Jogos de interesses provavelmente criaram traidores que impediam a guerra de ter um desfecho mais rápido.

POV Rendon

Ela estava sentada ali, na beira do lago dentro do pequeno bosque, desde que havíamos saído dos aposentos da mãe dela. Eu a ajudei a arrumar as coisas que a Senhora Hawkey precisaria e vim com Aria até aqui. E, desde então, ela encarava as águas com um olhar perdido.

–-Porque ele Rend???? – ela finalmente murmurou usando o apelido bobo que havia colocado em mim por brincadeira, mas num tom sério dessa vez que não era o normal para ser usado com esse nome.

–-Eu não sei – respondo triste – Eu realmente não sei.

–-Nem sequer posso pedir para ir junto – ela continuou no mesmo tom murmurado e triste; eu nunca a tinha visto daquele jeito e não sabia o que fazer, o que me deixava angustiado – Ela vai para a guerra....Nem que eu treinasse a anos seria boa o bastante pra acompanhar ela.

–-Ela deve estar saindo agora, Aria – digo colocando uma mão sobre um ombro dela.

–-Eu não sei se quero vê-la partir, Rendon.

–-Quer sim – respondo num tom firme raro em mim; isso a faz me encarar – Antes do meu pai...ir. Disseram-me que não seria bom uma criança ver ele naquela situação. Eu não insisti para entrar e me arrependo disso até hoje – dou um meio sorriso a ela e seguro sua mão que era menor que a minha – Vamos nos despedir da sua mãe – falo me levantando e levando ela junto comigo – Vá dizer até logo a ela – falo a levando pela mão para dentro do castelo.

Sinto os dedos dela apertarem minha mão com uma certa força. Olho para trás e vejo a mesma expressão de sempre no seu rosto. Vejo o olhar decidido que era próprio dela no lugar daquele triste e perdido de antes. Isso me faz sorrir. Então começamos a correr pelos corredores em direção ao pátio principal em frente ao portão.

Quando chegamos lá a mão dela ainda está na minha e eu não queria soltar. Vemos uma multidão reunida em torno de algumas pessoas. Minha mãe no centro; sei disso por causa das lanças da Guarda-Real posicionadas de forma a manter um lugar no centro do pátio. A mão de Aria aperta a minha com força de novo e eu olho em volta.

–-Deixem-me passar, por favor! – peço calmamente, mas num tom firme como raramente era obrigado a usar, o tom de comando que meus professores sempre diziam que um rei deve ter, um tom que eu odiava ter de usar, mas funcionou.

Alguns poucos me viram e reconheceram o brasão dos GrayWolf’s bordado em meu colete de linho, outros reconheceram a mim como o príncipe. Não importa realmente o que eles reconheceram, importa que abriram espaço e eu puxei Aria para o meu lado ainda segurando a mão dela na minha. Caminhamos entre os curiosos que saiam da nossa frente quando nos aproximávamos e finalmente chegamos ao centro do pátio onde os Guardas também saíram da nossa frente.

Tommy estava ali, segurando as rédeas da égua da Senhora Hawkey. Minha mãe e ela estavam próximas conversando, se despedindo acredito eu. Foram os olhos cinzas dela os primeiros a nos notar. Puxei Aria pela mão até que ela desse um passo na minha frente e então a soltei.

POV Narradora

A pequena Hawkey caminhou até a mãe com passos firmes e um olhar igualmente firme. Sarah sorriu de leve quando a filha parou em frente a ela. A mais velha se abaixou e a menor abraçou o pescoço da mãe. Elas ficaram abraçadas por alguns instantes antes de dizerem qualquer coisa.

–-Continue seus treinos da forma que tem feito até agora – disse Sarah ainda com a filha nos braços.

–-Vou continuar – a garota responde num sussurro apertando os braços em volta da mãe.

–-Você sempre foi uma guerreira, não é minha menina? – disse a mais velha num sussurro de forma que apenas Aria pode ouvir – Me perdoe por não ter aceitado isso antes.

–-Só se prometer que vai voltar – disse Aria afastando o rosto para encarar a mãe – Prometa que isso não vai ser um adeus, mamãe.

Sarah coloca a filha no chão e se abaixa até estar na mesma altura dela. Os dois pares de olhos cinzas se encarando de perto. Ela encosta a testa das duas com um pequeno sorriso.

–-Eu vou vê-la outra vez minha menina – diz a mais velha – Juro que vou vê-la de novo; à você e ao seu irmão. Até lá fique firme como você sempre foi.

Depois disso Sarah abraçou Aria e Tommy num abraço apertado e longo. Só então ela montou sua égua e saiu. Rendon e Elizabeth ficaram atrás de Tommy e Aria enquanto assistiam a Hawkey sair. Sarah não olhou para trás, não era de seu feitio olhar para trás. Mas os filhos sabiam disso e não chegaram nem a acenar, apenas deram as mãos e ficaram encarando a figura sumir na curva da estrada.