Há inúmeras semanas, Wanda tinha visitado a Montanha Wundagore numa ocasião desastrosa e foi mordida por criaturas das sombras. Só saiu viva pela intervenção de Ebony, que lhe trouxe Bucky Barnes atirando balas de prata e mais uma trupe de gatos mágicos. Era uma memória assustadora e, por mais que seu desfecho tenha sido feliz e se desenrolado ainda numa viagem à Bucareste, Wanda não queria contar com a sorte agora. E, na realidade, as coisas de fato estavam diferentes.

Agatha e Wanda adentraram a floresta escura e fria ao sopé da montanha, poucos quilômetros de distância de Novi Grad, a capital de Sokovia. A Feiticeira trajava suas vestes escarlates, uma roupa conjurada por magia e que acentuava seu poder. Com a tiara encaixada em seus cabelos e os olhos luminosos, ela poderia afirmar categoricamente que viera desintegrar uma entidade perversa sem nem hesitar.

Não necessitava mais da moeda para teletransporte. Não tinha mais medo de uma coruja maldita ou de sombras no chão. A floresta não pregaria mais peças para amedrontá-la, como portais, o cantarolar de Ultron ou a canção de ninar que Wanda escutava em seus sonhos. A Lua Cheia cintilava no horizonte, trazendo um brilho pálido para a pele da Feiticeira, da bruxa e também para o pelo do gato preto no chão. Era a proteção feérica.

— A floresta está incomodada com nossa presença. — A idosa declarou, seu rosto muito sério enquanto encarava os troncos e raízes adiante. Já era primavera no hemisfério norte, mas ali parecia ainda transitar entre o outono e o inverno. — Não se separem. Já sinto a magia das fadas, mas não é sábio ser imprudente.

Ebony e Wanda assentiram.

O bichano tinha a capacidade de ir e vir no ar de maneira graciosa e traiçoeira, o que era útil para escapar de possíveis agressores. Caso um combate fosse inevitável, poderia ainda se transfigurar numa criatura imensa, um felino grande e de músculos pesados, assim como a sokoviana testemunhou de relance quando o gato a defendeu no metrô na Romênia. Wanda tinha seus poderes, cada vez mais refinados… e Agatha contava com sua experiência vasta, feitiços antigos. A velha conferiu os pequenos frascos dentro de uma bolsa amarrada em sua cintura, sete recipientes no total: para a ida e a volta dos três, mais Natalya - quando a resgatassem de Chthon. Serviriam como uma troca para o tal sacrifício requisitado para entrar e sair na montanha, de acordo com as informações de Natalya. Assim que Agatha se certificou que estava tudo conforme o esperado, eles se puseram a andar entre os galhos e folhas da tão estranha floresta.

A sensação de ser observada atentamente voltava a arrepiar a pele da Feiticeira. Coisas, seres a acompanhavam de longe, sibilando e sussurrando entre as copas e arbustos. A vigilância constante fazia Wanda desviar seus olhos para a esquerda e para a direita, seus movimentos cautelosos enquanto acompanhava o ritmo da sua mestra. Independente disso, os três avançaram uma boa parte do trajeto, cada vez mais inclinado-se para cima e polvilhado de rochas e musgo da montanha.

Escutou o bater de asas em algum ponto dentro da escuridão. Piados, grunhidos, vozes mortas. Quase a mesma frase que escutara na outra ocasião, embora não estivesse vendo a coruja de olhos opacos e penas de tom de ossos:

“Bruxa”

“Bruxa”

“Bruxa”

“Morta”

“Morta”

“Morta”

Cruzaram com o esqueleto de cervo, ainda vagando sem vida e sem rumo pela floresta. A aura da Feiticeira cintilava, captando lapsos no ambiente. Franziu os cenhos, suor frio escorreu pela sua nuca. Havia algo de errado e o gato preto parecia perceber isso também, pois era possível enxergar, através de um facho do luar, seu pêlo preto inteiro arrepiado.

— Agatha. — Wanda murmurou. — Eles estão se aproximando.

— Eu notei.

— A proteção… Está fraca. — O felino rosnava, agora parado. Encarava o nada adiante de si. — Eles sabem disso. Sentem o cheiro.

A jovem sokoviana rangeu os dentes, sua expressão feroz. Sua pele já não brilhava tanto assim. A memória das palavras da fada Bruma invadiram seus ouvidos e ela poderia jurar que ouviu um riso debochado ao vento, naquela voz que não era humana e nem divina.

“Enquanto a lua brilhar no céu na primeira noite de lua cheia, tu e os teus estarão protegidos

Wanda olhou para o alto, através das árvores e seus troncos grossos que pareciam infinitos. Ira borbulhou em seu sangue quando afinal entendeu o que estava acontecendo:

— A Lua. Está coberta por nuvens.

A proteção feérica somente seria concedida se a Lua estivesse sozinha e cintilante no céu.

Fadas. — Agatha soltou um bafejo irritado, névoa lilás saindo das pontas de seus dedos, em antecipação pelo o que viria a seguir. Já havia compreendido o significado das palavras dúbias da fada e a posterior conclusão de sua aprendiz. — Wanda, Ebony… preparem-se para avançar o mais rápido que puderem.

A Lua foi completamente oculta por uma imensa nuvem e o breu tomou a floresta de volta. Apenas existia a luz vermelha das mãos de Wanda e roxa de Agatha.

As criaturas de sombras grunhiam próximas, circundando-as, e Wanda se recordava das suas fileiras de dentes pontiagudos e da dor de suas mordidas. Não tinha medo, apenas apreensão. Fúria, acima de tudo. Ela tinha que atravessar a floresta e essa ainda era a parte mais fácil. Não seria impedida por alguns demônios quase sem forma.

Seus pés levitaram alguns centímetros acima do solo, seus cabelos ondulavam mesmo sem vento.

E então Wanda pôs em prática todo seu treinamento.

Conjurou o caos vermelho para atingir as criaturas, lançando-as longe. Enquanto erguia um escudo para defender sua retaguarda, sua mão direita paralisava mais um grupo de sombras, estrangulando cada uma delas até que não passassem de fiapos escuros, quase líquidos, a se derramar nas pedras com um lamento fraco, derretido.

Seus olhos injetaram-se de ódio, já fulgurantes, e sua boca repetia encantamentos de ataque. Uma fenda se abriu e fechou no chão, engolindo mais um punhado de inimigos. Implodiu alguns, fatiou outros. O ritmo era incessante e Wanda mal conseguia formar pensamentos inteiros na cabeça. Seguia seu instinto, o rugido em seu peito e seu sangue quente. Mas fatos importantes não escaparam de sua atenção:

A floresta parecia uma entidade quase viva, ou então muito bem manipulada por outras forças. Galhos e raízes engrossaram de súbito, fechando caminhos e contraindo gradativamente o espaço em que Wanda, Agatha e Ebony estavam. A jovem podia ouvir a respiração ofegante de sua mestra entre seus feitiços e os rosnados altos do gato, que transfigurava-se vez ou outra numa criatura maior para atacar.

A questão não era a dificuldade de derrotá-los. Os três seguiam bem, mas… as sombras eram muitas e eles já não avançavam no percurso como antes. Se continuassem desse jeito, logo ficariam exaustos e a Feiticeira Escarlate teria problemas em cuidar de tudo ao mesmo tempo. Alterar a realidade naquele instante, sem pensar com exata nitidez e calma, talvez lhe cobrasse preços terríveis. Wanda poderia errar.

Um grito espremido a fez parar por um segundo.

Ebony, em sua forma imensa, foi fisgado pelo pescoço por uma raiz e logo o restante de galhos rastejou para imobilizá-lo. Ele rosnou, mordeu e arranhou em vão. Diminuiu até sua verdadeira e pequena figura, um doce gatinho preto que miava por ajuda. Wanda estava ocupada com uma horda de sombras, defendendo-se por meio de feitiços e escudos, e não tinha coordenação o suficiente para cuidar de duas frentes de ataque uma vez. Somente aquele segundo de distração quase lhe custou uma mordida no tornozelo, mas ela ainda foi capaz de se aproximar pelo ar.

Arremessou uma lança de energia psiônica, o que decepou a raiz que o estrangulava. Isso concedeu a Ebony um instante para respirar fundo, recuperando o fôlego, no entanto outro galho o agarrou no momento seguinte.

Agatha, que até então defendia-se com seus encantamentos roxos, aproximou-se da cena e gritou algo para Wanda, que não entendeu. Só viu a outra pegar um dos frascos na própria cintura e jogar contra os troncos adiante.

Não podia dizer que estava largamente acostumada com granadas de luz, mas Wanda já tinha visto uma ou outra durante a vida e essa era a exata sensação que tivera quando o frasco se chocou contra a madeira da árvore. Houve um momento de cegueira e ela sentiu um toque gentil puxando sua mão em direção ao solo. Era Agatha, e a bruxa a conduziu metros a frente, num caminho aberto pela explosão mágica do frasco.

Quando sua visão voltou a normal, podia enxergar que as sombras ainda a perseguiam naquele percurso tortuoso. Wanda, mesmo sem ter um mapa ou feitiço que confirmasse suas suspeitas, sentia que seguiam na direção correta através daquele labirinto e ficou aliviada de ver o gato preto no colo da bruxa, encolhido e a salvo em seu braço. Se recuperava. Ela, por sua vez, aproveitou para disparar rajadas de energia para trás, a fim de manter as criaturas longe.

A floresta revidava, fechando caminhos e levantando raízes, e a cada ocasião em que isso ocorria, Agatha retirava mais um frasco de sua bolsa lateral e jogava-o adiante.

Assim que os recipientes de vidro craquelavam, liberando seu poder, o caminho se abria num lampejo de luz. Wanda fechava as pálpebras nestes momentos, para não ficar a mercê da cegueira, e usava tais oportunidades para seguir com mais feitiços. Talvez a última coisa que sua mestra tenha dito era justamente para fechar os olhos, antes de usar um dos frascos pela primeira vez. A Feiticeira era grata por sair daquele sufoco, mas não tinha ideia de qual seria o plano quando chegassem afinal em seu destino.

As árvores e todos os demais bloqueios ficaram esparsos, o caminho mais íngreme. Silêncio e, por fim, uma clareira. Wanda ergueu um sólido e alto escudo de energia psiônica para proteger a si e seus companheiros de viagem e só depois disso foi capaz de respirar com mais calma. Encarou o resto da montanha adiante, uma visão ligeiramente coberta por névoa e cortada pela escuridão.

Era quase igual ao sonho, de modo que a jovem quase ouviu a antiga e morna canção de ninar polonesa. Ao olhar no céu, porém, seu rosto saiu de uma expressão contemplativa para puro ódio: a Lua Cheia livrara-se da grossa nuvem que lhe cobria. A pele dos três voltou a cintilar numa camada de proteção feérica, agora um tanto inútil.

Seus lábios entortaram-se, desgostosos. Murmurou:

Fadas.

— Salve sua energia para reclamar delas depois, querida. — Agatha suspirou, colocando o gato preto no chão. O felino espreguiçou-se, testando as articulações de seu corpo miúdo e macio. — Estamos quase em nosso objetivo.

Ela indicou um ponto no horizonte, um local mais próximo das pedras. Entre o nevoeiro, o esboço de uma construção estranha, suas formas indistintas na rocha. Wanda assentiu e, ajudando a velha e acompanhada pelo gato, subiu pela trilha que começava a se abrir no chão.

Após alguns minutos caminhando no frio da noite, depararam-se afinal com uma construção há muito tempo abandonada. Não era parecido com nada que Wanda já tinha visto na vida ou imaginado em seus sonhos e pesadelos. Pedaços projetavam-se para frente, em estruturas sólidas, algum tipo de cimento. Havia partes de metal, tubulações e tudo era coberto por uma camada de gelo, de neve. Talvez Steve pudesse caracterizar melhor o tipo de arquitetura usada ali, mas naquele momento Wanda não tinha as palavras certas. Não era nada semelhante ao que o trecho do Bestiário Amarelo sugeria ao falar sobre uma ordem de cavaleiros protegendo o lugar para conter Chthon…

Ao encarar a imensa porta de ferro, Wanda se lembrou de laboratórios militares que a mantiveram cativa por um longo tempo. Talvez o barô daquele clã rom estivesse certo sobre os experimentos na Montanha Wundagore.

— Eu não entendo, Agatha. — Ela passou a palma da mão sobre a superfície dura e gélida da porta dupla e, provavelmente, grossa. A aura do local, de fato, era amaldiçoada e ela não acreditava que somente aquela porta a distanciava do fim de todo aquele delírio nefasto. — Foi tão difícil para nós três chegarmos aqui. Como… Como é possível que uma mulher grávida tenha atravessado essa floresta? Como Magda…?

— Chthon ainda não estava acorrentado ao feitiço de repetição de Natalya. Talvez ele tenha facilitado o percurso para ela… — Agatha divagou. — Talvez justamente a tenha atraído até aqui.

— E se Chthon deseja meu corpo, por que não facilitou o caminho para mim também?

— Por que você veio aqui para matá-lo. Ele precisa de você fraca, querida. Vulnerável.

A Feiticeira assentiu, pensativa. Depois voltou sua mente para objetivos mais práticos:

— Quantos… Quantos frascos sobraram?

— Apenas um.

A mestra mostrou um único vidro com a poção brilhante. Ebony, ao assistir essa mesma cena, soltou um miado triste e irritado. A garganta da jovem se fechou com as consequências daquela situação.

— Então como… Iremos entrar?

— A poção era uma troca fraca, embora justa. Se sacrificarmos algo de maior valor…

Agatha deu passos a frente, seu olhar sombrio à luz pálida do luar. Levou sua a mão magra ao coração, silenciosa. Seus pensamentos eram dissonantes, terríveis. A feiticeira não precisava lê-los a fundo para entender o horror que ela cogitava, uma possibilidade autodestrutiva. Quem disse algo foi o gato:

— Ora, essa. Não vieram aqui pra se desmontarem na porta. — Soltou o comentário, ácido. Suas patinhas o levaram até aos pés das duas, sua cauda sinuosa e desinteressada. — Sou apenas um gato e não serviria muito contra um deus demoníaco, afinal.

— Ebony!

— Agatha, use o frasco. — Ele não deu atenção a sokoviana. — Eu vou fazer o sacrifício para que Wanda possa entrar.

— Não! Eu lhe proíbo. Não deve… Eu não posso lidar com isso. — A luz vermelha das íris dela se apagou em menos de um segundo. Somente ajoelhou-se no solo, encarando os olhos amarelos do bichano. Sua voz saiu miúda, uma súplica: — Por favor.

— E o que está pensando, bruxa boba? Eu tenho muitas vidas e uma a menos não faria diferença. E nem mesmo seria um sacrifício adequado.

— O que quer dizer com isso?

Ebony ronronou.

— Que, o quer que aconteça, vocês duas ainda terão que lidar comigo por um bom tempo. E que exijo mais coçadinhas atrás da minha orelha quando voltarmos para casa.

O sorriso fraco da feiticeira foi uma resposta melancólica e breve. Ela abraçou o gato, levantando-o chão por um momento, para em seguida dar-lhe um beijo no topo da cabeça e repousa-lo de novo no mesmo lugar.

— Promete?

— Prometo. Só voltem vivas daí. Terão que arrumar alguma outra forma de retornar.

— Com Chthon morto, acredito que será fácil.

Agatha nada comentou. Seu rosto era sério, por mais que sua aura lilás transbordasse emoção. Em outra ocasião, a feiticeira talvez até tentasse captar o que ela pensava de forma tão soturna… Ou então perguntaria em alto e bom som. Naquele instante, algo lhe dizia que não importava. Deveriam apenas seguir em frente.

A bruxa mestre jogou o último frasco na imensa porta, abrindo uma efêmera e bela abertura mágica. Passou brevemente por ali, prometendo a Wanda que encontrariam-se logo no outro lado. Assim que as dobras de suas vestes roxas atravessaram a luz, a abertura de fechou como se jamais tivesse sido conjurada.

Já o gato indicou o ponto onde a feiticeira deveria esperar. Ela obedeceu, ainda perguntando-se o que ele iria sacrificar, mas ela mal teve tempo para remoer as alternativas. Fez-se novamente luz e mais um portal se abriu.

O bichano ainda estava lá, mexendo a ponta de sua cauda. Wanda sorriu aliviada antes de agradecer:

— Obrigada. Você é mais do que um gato.

Ebony apenas piscou e miou.

Uma coisa normal, até corriqueira, para cada felino existente na Terra, entretanto… Ele não a chamou de boba, não lhe disse que era infinita. Não demorou para o entendimento da situação atingisse Wanda como um golpe. O rosto dela se torceu com dor e incredulidade, uma lágrima escapou de seus olhos. Seus ombros e joelhos tremiam.

— Ah, Ebony…

O gato havia perdido sua capacidade de falar.

O que ela mais desejava naquele momento era apertá-lo contra o peito e afastá-lo de todo mal e loucura que sempre apareciam em sua vida. Sem o luxo de perder tempo, porém, a Feiticeira se recompôs, agradeceu o gato e enfim atravessou o portal para dentro da Montanha Wundagore.

*

Era final da tarde em Outer Heaven e, incrivelmente, não havia muito o que se fazer na base voadora dos Vingadores Secretos. Natasha estava conversando com Yelena no próprio quarto, enquanto Sam Wilson fazia sua corrida diária no convés. Preferia fazer isso sozinho, pois não aguentava mais Steve lhe dizendo “à esquerda” toda vez que o ultrapassava e havia ameaçado a vida de Bucky caso ele fizesse o mesmo e gritasse “à direita”.

Steve Rogers estava na Sala de Comando. Não fazia tanto tempo assim que todos tinham curtido uma festa improvisada naquele mesmo lugar, comemorando a vitória sem baixas em Genosha. É claro, algumas semanas se passaram, mas… Steve tinha dificuldades com o correr do tempo. Talvez fosse algum efeito de passar setenta anos no gelo. Ele passou as mãos pela própria barba, soltando um suspiro. Não havia nada na tela, nenhuma atividade suspeita que deveria acompanhar ou pedido de socorro. Não havia nenhuma chamada de Tony.

Antes que alcançasse seu caderno de bolso para desenhar qualquer coisa que o inspirasse, talvez os cabelos de Natasha, Bucky aproximou-se de repente e colocou uma garrafa de cerveja na superfície lisa da mesa, abrindo-a em seguida com um movimento único de sua mão metálica. Fazia tempo que nenhum deles ouvia o som da pressão da tampa de uma garrafa em um momento tão ameno assim. Ele sorriu e seu amigo sentou-se à sua frente, brindando com a garrafa do outro ainda parada.

— Não deveríamos comer ou beber nada aqui, perto dos computadores. — O loiro comentou. — Temos o refeitório e a Ala Comum.

Levou um segundo para James Barnes responder e, quando o fez, seu tom era brincalhão como há muito tempo Steve ansiava ouvir:

— O que diabos você está falando? Não me venha com uma bobagem dessas. — Bebeu um pouco, mas logo um pensamento o invadiu e ele se adiantou para expressá-lo: — Natasha come aquele sanduíche de amendoim aqui todo dia. E desde quando se importa com regras?

De fato, boa parte do costume do Capitão América em seguir diretrizes vinha também de sua propaganda de bom moço, uma reputação forjada em cima de seu uniforme. Ele, na realidade, admirava o bom senso… Mas Bucky também discordaria dessa afirmação, afinal, ele mentiu mais de uma vez para se alistar no exército e no fim enfiou uma aeronave no gelo.

— Você está certo.

Bucky se deu por satisfeito e bebeu de novo.

— Há quantos anos estamos devendo uma cerveja dessas, Steve?

— Não muitos. — Ele não recusou um gole. — Só desde 44.

Os dois riram, sozinhos naquele ambiente espaçoso. As luzes automáticas começavam a acender uma a uma, pois o sol lá fora já não passava de um borrão laranja. Steve parecia dividido entre o momento presente e um longínquo passado ao conversar de forma tão despreocupada com seu velho amigo.

— Acho que Sam vai ficar bravo por não chamarmos ele.

— Eu me preocuparia mais com Natasha. Ou não. — Deu de ombros. — Eles entenderiam.

Barnes estava certo, mais uma vez. Cada um deles tinha seus assuntos, coisas particulares e laços diferentes. Por isso Wanda não estava ali e por isso Natasha gostava de falar em russo com sua quase irmã, Yelena Belova.

Então sim, eles entenderiam que Steve e Bucky tinham a própria dinâmica, piadas internas e histórias idiotas da adolescência. Queria que isso não o fizesse sentir culpado, pois era impossível deixar de pensar em Tony Stark quando pensava um pouco mais sobre o assunto. Tony era seu amigo e Steve valorizava sua amizade. Ele tinha atendido seu telefonema quando precisou dele em Zurique, mas depois disso… Silêncio. Portanto, não sabia se o outro realmente havia o perdoado por não ter sido sincero sobre a morte de Maria e Howard. Esperava que sim. No entanto, entenderia também se isso demorasse a acontecer ou até se nem mesmo acontecesse.

Independente de todas essas complicações, a timidez e a culpa de Steve logo se dissolveram. Não poderia ficar bêbado devido a seu metabolismo aperfeiçoado pelo soro do supersoldado, mas poderia se sentir mais confortável e, quem sabe, mais festivo. Tomou outro gole, um longuíssimo gole, de modo que Bucky exclamou com entusiasmada aprovação.

Assim como acontece com toda amizade de longa data, os dois logos se puseram a remoer coisas antigas e estúpidas, pessoas que há muito tempo não viam e manias chatas um do outro. Bucky mais uma vez o lembrou o quanto costume dele de bater a ponta da caneta no caderno poderia ser irritante, mas Steve rebateu que o outro não reclamava quando pessoas, especialmente moças, vinham conferir o que ele estava desenhando.

Bucky não retrucou. Somente riu, mas o Capitão podia enxergar certa saudade ao mencionar moças para o soldado. Soube então que ele pensava em Wanda, então decidiu mudar de assunto.

Falaram de feriados, como o Natal. Pegaram mais cervejas na geladeira. Comentaram coisas estranhas da Guerra, como aquele homem que dizia vir do mar. Como era nome do sujeito? Namor! E Steve até que o considerava uma boa pessoa. Nunca mais o viu.

Depois discutiram amenidades, como estilos musicais que estavam ouvindo agora. Steve tinha se interessado por electroswing, mas gostava sempre das sugestões de Sam Wilson. Bucky, por sua vez, tinha apreço pelo estilo dos anos oitenta, cujas músicas Wanda tinha lhe apresentado. Dissera que lembrava Pietro. Mas ainda estava descobrindo outros gêneros e não tinha um favorito.

Conversam também assuntos sérios. Coisas que tinham visto na Guerra. Ainda era especialmente difícil para o sargento James Barnes falar sobre o momento em que foi resgatado, por assim dizer, pela HYDRA. Certas coisas pesavam demais e os anos seguintes para Bucky poderiam ser resumidos a pura tortura.

Sobre o trabalho que faziam agora, não tinham muitas certezas. Não podiam simplesmente parar o que estavam fazendo, mesmo que o Projeto Sentinela tenha sido anulado, porém não tinham um único objetivo em mente. A ideia era ajudar as pessoas, é claro. A ideia sempre foi essa.

Era complexo e simples. Tudo mudava e tudo parecia permanecer igual.

— Será que nossa vida vai ser sempre assim? — Bucky questionou, de repente. — Salvando gente. Vendo coisas absurdas.

— Por que essa pergunta?

— Não sei. Um dia ficaremos velhos.

Ele encarou a barba por fazer do amigo, ciente que carregava uma barba ainda mais cheia no rosto. Antes, Bucky cortava religiosamente o cabelo numa mesma barbearia e vestia roupas que caiam sob medida em seu corpo jovem e esguio, já Steve não encontrava algo que não parecesse três números maior. Hoje, ambos estavam quilos maiores devido aos músculos e anos nas costas.

Quanta diferença daqueles meninos do Brooklyn.

— Nós somos velhos.

— Não posso discutir. Só é… Estranho.

— É, é sim. — Steve suspirou. — Mas estou com você até o fim da linha…

Bucky ergueu a quinta garrafa que tinha em mãos, concordando:

— Onde quer que isso seja.

Veio a quietude. A noite cobria Outer Heaven com silêncio, como geralmente fazia. Sempre estacionados em altas altitudes, eram raras as noites sem ventos gélidos e ausência absoluta de sons. Steve notou o olhar distante do amigo, sua atenção dissolvida no ar. Parecia observar algo que somente ele enxergava.

— Pensativo?

— Só...Com uma sensação.

*

Agatha Harkness a aguardava com um feitiço de luz roxa entre a escuridão e o pó do local. Existiam aberturas no topo da construção, janelas muito no alto e de vidro grosso para que o calor de dentro não escapasse. O luar penetrava muito pálido ali dentro de modo que luzes artificiais, ou mágicas no caso das bruxas, eram necessárias para enxergar melhor. Elas se cumprimentaram de maneira breve e logo Wanda passou estudar o ambiente frio, impessoal.

De fato, ela poderia caracterizar essa construção da Montanha Wundagore como uma base, uma estrutura que muito bem serviria de laboratório. Isso a fez questionar a informação do Bestiário Amarelo, sobre cavaleiros que protegiam o local; mas tinha que concordar que haviam se passado muitos anos - portanto era natural que sofresse reformas e modificações. Só não esperava não encontrar nada que lhe remetesse a Idade Média. As paredes eram cinzas e retas, sem decorações ou quaisquer detalhes. Só existiam painéis antigos, móveis simples e balcões de estudos, talvez. As tubulações eram visíveis nas paredes.

Ela engoliu seco. Não gostava de laboratórios devido ao seu histórico trágico com esse tipo de lugar. Não que agora não conseguisse caminhar por ali, afinal, recentemente parecia que Wanda sempre encontrava um laboratório para visitar vez ou outra, fosse em missões ou para realmente ser testada e tratada. Mas existia algo mais na cor opaca e insaturada daquela base. Algo que apertava sua garganta e fazia seus olhos arderem.

Eram lembranças que não eram suas, ou totalmente suas. Uma aura pesada e morta.

Em algum ponto dali, talvez nas salas adiante daquela construção imensa, sua mãe biológica tinha morrido, sacrificado-se para salvar seus filhos, seus bebês, Wanda e Pietro. E em outro ponto, sua tia Natalya estava presa com um demônio há anos.

Então a Feiticeira Escarlate enxergou com seus olhos vermelhos e atentos uma estranha cena se desenrolar diante de si, uma cena translúcida e impalpável como névoa. Não era uma ilusão, pois seu coração era capaz de distinguir isso. Tratava-se de uma memória impregnada local, um evento que ocorrera há anos.

Difícil saber quantos, exatamente. A passagem de tempo em Wundagore não era nada natural. No entanto, a Feiticeira sabia quem era a mulher que adentrara o local pela mesma porta que as duas, uma moça grávida e com as roupas e cabelos pingando pela chuva lá fora. Relâmpagos no céus iluminaram seu rosto assustado, lançando um lampejo brilhante em seus olhos grandes e verdes. Magda. Uma figura grande e encapuzada lhe acolheu, dizendo palavras doces e conduzindo-a para os fundos. E, assim como subitamente a cena apareceu diante de si, se desfez no ar.

— Agatha… Se eu chorar, não me impeça. E não se preocupe, eu vou ficar bem.

Sua mentora a encarou com cautela, andando poucos passos para frente. Tentou enxergar o que a teria perturbado, e então entendeu que na realidade sua aprendiz conseguia ver muito além do que a bruxa poderia supor. Ela já tinha usado tais poderes para saber a história de objetos simples, ajudou uma senhora a encontrar um amuleto na Loja de Bruxa e também auxiliou seus amigos a desvendarem um pouco mais dos planos de Zola ao bisbilhotar a história de uma seringa.

Agatha respirou fundo e questionou:

— Você vai vislumbrar o que houve aqui, não vai? — Wanda assentiu para a velha, o que a fez comprimir os lábios em apreensão. — Acha que é uma boa ideia? Pode afetar profundamente seu estado emocional e isso não vai lhe favorecer contra Chthon.

Havia fogo na expressão da jovem quando ela respondeu.

— O passado não pode ser enterrado com minha mãe.

— Então vamos andar, querida. Estarei sempre do seu lado.

Ela lhe apertou a mão com carinho.

— Obrigada, Agatha.

Havia esqueletos no local. Ossos quase já inteiros limpos, ainda trajados em roupas azuis, pedaços de armadura prateada e espadas embainhadas nas laterais do quadris. Parecia um uniforme, talvez, mas não era isso que chamou a atenção da Feiticeira Escarlate, apesar de ser informação demais. O que saltou ao seus olhos foram… Foram os chifres e crânios animalescos, os ossos longos das patas traseiras e a extensão da cervical em caudas. O local não tinham sido violado nesses anos todos, então não era possível que alguém com humor mórbido tenha trocado as peças para recriar um esqueleto fantasioso, como se o ser tivesse sido um cavaleiro-besta enquanto vivo.

Wanda, com assombro, concluiu que as duas informações eram verdadeiras.

Wundagore abrigou cavaleiros. Wundagore era um laboratório.

E aqueles esqueletos não eram humanos. Eram experimentos.

Ela parou adiante de uma figura que atraiu seu olhos, um corpo grande e apoiado na parede. Um esqueleto que não vestia armadura, pelo contrário: os farrapos de sua roupa carcomida pelo tempo indicavam que era um vestido longo, embora prático. Wanda tocou em seus chifres curtos e polidos, encarou a espada atravessada em seu tronco. Tinha sido assassinada, mas… Ela sentia um pouco de paz ao passar as pontas dos dedos em sua caveira. Familiaridade.

As inúmeras lembranças do local a alfinetavam, cada uma delas desejando tecer sua história de maneira simultânea na cabeça da Feiticeira Escarlate. Ela inspirou fundo, seus olhos cheios de luz e cabelos ondulando pela magia. Levitou alguns centímetros do chão, invocando seus poderes para desenrolar a verdade que há tanto se escondia em Wundagore. E então mais lembranças tomaram vida diante de si, dando forma e peso para aquele esqueleto.

A figura encapuzada que acolhera Magda era uma criatura com chifres, mas definitivamente não se tratava do próprio demônio Chthon. Era o rosto bovino que Wanda já tinha visto em sonhos que ela mais considerava alucinações infantis, coisas bobas. Chamava-se Bova, uma vaca dócil que apoiava-se bípede no chão e falava com a proficiência de um ser humano comum.

Bova vestia-se tal qual uma senhora, com vestidos e aventais coloridos, e parecia cozinhar igual ao estereótipo de uma avó do interior de Sokovia, abusando de geleias de frutas vermelhas.

Wanda podia vê-la cuidando da humana, Magda, já nos últimos meses da gravidez. Tinha sido complicado para a criatura explicar para a rom qual era sua verdadeira natureza, sobre sua forma bestial aliada de intelecto.

Dissera simplesmente que era uma das últimas, junto com poucos irmãos. Contou que foram criados nos antigos moldes da cavalaria e habitavam aquele estranho lugar.

Últimas do quê, Magda perguntou.

Ela não lhe respondeu diretamente. Narrou que o lugar servia para proteger o mundo de um grande mal e que era uma sorte sem tamanho Magda ter encontrado a porta para pedir abrigo. Afinal, eram tempos perigosos e eles lançariam em breve um feitiço para impedir a entrada e a saída livre da Montanha.

Magda riu incrédula e, naquela lembrança, Wanda podia entender porque Erik Lensherr enxergava o rosto da esposa quando via a jovem sokoviana. Os olhos, o sorriso… Eram os mesmos. A diferença principal eram os cabelos, pois Magda tinha madeixas mais cheias e isso a fez se recordar dos cabelos de Pietro, mais ondulados do que de Wanda.

E Magda ficou. Precisava de ajuda. Recebê-la de uma vaca falante era absurdo, mas não era a pior coisa que tinha acontecido com ela, afinal… Sobreviveu ao inferno quando ficou num campo de concentração anos antes. E parte dela havia morrido quando sua filha Anya foi consumida por um incêndio.

A rom podia fingir que estava no meio de um conto de fadas. Meses se passaram, embora se tratassem de décadas no mundo real lá fora. As outras criaturas da Montanha pareciam apenas tolerá-la, sempre temerosos, sempre esperando… Algo. Alguém. Ao menos lhe contavam histórias interessantes no marasmo das tardes de inverno, histórias sobre quem lhes concedera vida e inteligência e que também confiara-lhes a missão de derrotar um demônio chamado Chthon.

Só Bova a confortava, dizendo que muitos anos se passaram sem que o pior tivesse acontecido.

Agatha e Wanda continuaram a caminhar, observando o local e sua indiferença, suas histórias invisíveis para todos, exceto a Feiticeira. Ela encarou uma sala anexa, com vista para o restante dos montes e neve. Lá, além de equipamentos estranhos e ferramentas, havia uma cama no centro, também coberta por camadas do tempo e pó. O local onde ocorrera o parto de Magda.

A visão dela, envolta em névoa, cantando a canção polonesa para seus dois bebês fez os sentidos de Wanda se abalarem. Ela desejou entrar naquela memória translúcida e dizer que tudo ia ficar bem, mesmo que fosse uma mentira oca. Na cena seguinte, Magda permanecia viva, segura e falando de seu marido aos seus filhos, com tanto amor e com tanta dor. Falava o que os dois tinham passado juntos nos campos de concentração… E que eles jamais experimentaram a mesma coisa.

Nunca mais.

Lágrimas escorreram pela face da Feiticeira, mas ela não interrompeu a visão de se desenrolar mais ainda. Tinha que descobrir o que tinha dado de errado. Como… Como Magda havia chegado até aquele ponto onde foi obrigada a ficar na Montanha, enquanto Natalya salvava os dois bebês.

Agatha não fez maiores menções ao fato de sua aprendiz estar chorando. Só apertou mais sua mão, mostrando solidariedade. O local era simples em sua estrutura de paredes grossas e tubulações; o real labirinto eram as memórias que a sokoviana escavava.

As respostas para os questionamentos da Feiticeira Escarlate vieram com um longo terremoto. Era noite na visão e, a cada sacudida, o ambiente era tomado por uma aura maldita e vermelha. As lembranças também se tornaram mais fragmentadas, mais curtas e cortantes. A realidade ali parecia colidir em si mesma, revelando somente trechos da verdade.

O tórax de Wanda, ainda um frágil bebê, foi tingido por um tom vermelho pulsante. Seu coração, forjado pelo caos, havia sido também tocado por uma força severa, vil, disseram. Segundo os cavaleiros, ela tinha sido marcada e, naquela ocasião, eles eram mais bestas do que seres racionais. Tinham medo, pois os gêmeos não eram normais desde seu nascimento. Carregavam genes poderosos. A criança seria receptáculo para Chthon e deveria ser destruída, totalmente aniquilada. Ou então deveriam permitir que o deus perverso a possuísse primeiro, para assim eliminarem a entidade junto com a menina. Quem sabe varressem o resto dele desse mundo para sempre.

A frase de Zola de súbito fez sentido, embora não da maneira que Wanda achava desde início:

"Você foi criada! E seus criadores a querem de volta.”

Ela e seu irmão então nasceram num laboratório, tipo de lugar que revirou tanto a vida dos dois ao longo dos anos. Wanda ainda foi marcada por um demônio que ainda ansiava por possuir seu corpo.

Nas últimas visões do passado, ela viu que Bova tentou proteger Magda e seus filhos dos cavaleiros, mas acabou com aquela espada atravessada no peito. Magda, por sua vez, trancou-a num cômodo mais a frente e chorou por ajuda, uma súplica que foi atendida por uma estranha há décadas de distância:

Natalya.

Os horrores da Montanha Wundagore envolviam demônios e experimentos, dobras no tempo que permitiram que Magda chegasse em 1953 e desse a luz aos gêmeos em 1994, como se apenas tivessem transcorrido meses.

Natalya conseguira entrar e tirar as crianças daquele lugar, de acordo com o que Wanda viu num outro momento. Sabia que sua mãe biológica permanecera na base, consumida pela energia nefasta até o seu fim. Só existia morte na Montanha Wundagore, decadência. Só existia Chthon.

O que quer que segurava a entidade abaixo das rochas - um selo mágico, uma maldição ou feitiço - tinha se rachado e, quem sabe por isso, as pessoas tanto diziam que a Montanha sangrava. Wanda agora estava parada diante de uma longa porta de ferro, com Agatha ao seu lado. Lá dentro, ela sentia, estava a aura maldita que lhe aguardava há décadas. Havia uma última barreira física na porta, uma espada apoiada na horizontal, usada daquela forma numa tentativa de a passagem de alguém.

A Feiticeira Escarlate delicadamente soltou a mão da mentora, oferecendo-lhe um sorriso confiante. Piscou os olhos em tons verdes por um momento, grata por estar ali e por ter alguém ao seu lado.

Sempre havia alguém.

Agatha. Ebony. Seus amigos, James também. Natalya. Bova. Pietro.

A mentora questionou:

— Você descobriu o que houve, Wanda?

— Sim. — Assentiu. — Coisas terríveis, desde o início.

— E agora?

— O fim.

Com um aceno breve, os poderes escarlates de Wanda tomaram forma e tiraram a espada de seu lugar, abrindo a porta de ferro com um rangido longo, agudo. Só vazio a recebeu, a escuridão absoluta. As duas se entreolharam antes de adentrar o desconhecido.