Vapor

9. Inspiração na madrugada


CAPÍTULO 9

inspiração na madrugada



alissa fontes

— Você que acorda eles. — Marina murmurou.

Ashton olhou para a garota como se ela tivesse acabado de falar algo absurdo.

— Não, você acorda eles.

Marina bufou, cruzando os braços sem coragem alguma de cutucar uma Alissa que estava dormindo de conchinha com Calum Hood no sofá da sala de convivência da república. A festa não tinha acabado, mas já era quase três horas da manhã e depois de seus desentendimentos com o namorado a garota queria voltar logo para sua casa o mais rápido possível.

Ashton por sua vez, tirou o celular do bolso e começou a fotografar os dois, sabendo que talvez demorasse para ver uma cena como aquela novamente. A garota dos cabelos coloridos olhou para o Irwin e apesar de estar emburrada acabou rindo de leve, observando por cima de seu ombro como as fotos estavam ficando.

— Alissa vai ficar furiosa. — disse rindo.

— Calum também. — Irwin admitiu dando de ombros — Mas eu não poderia perder isso daqui por nada.

Em meio às várias fotos e os risinhos dos dois, Calum começou a se mexer e abriu os olhos. Marina achou muito fofo a forma em como ele segurava Alissa com os braços, formando o concha maior.

— Que porra você está fazendo Ash? — a voz do garoto saiu levemente embargada por causa do sono e o seu rosto estava um pouco amassado, conforme ele se erguia para brigar com o amigo, dava para ver uma marca do batom de Alissa na linha do seu maxilar.

— Fotografando o momento. — o amigo sorriu malicioso.

Calum fechou a cara.

— Eu só não levanto para te bater porque a Ali está dormindo.

— Eles já estão usando apelidos! — Marina disse olhando para Ashton que imitou o olhar emocionado dela.

No sofá, Alissa começou a se movimentar lentamente nos braços do Hood. A garota suspirou baixinho quando sentiu o cheiro dele impregnando as suas roupas, e então começou a abrir os olhos.

— Onde eu estou? — ela murmurou olhando confusa para os três. Enquanto Calum sorria tímido para ela, Ashton e Marina tinham sorrisos maliciosos — O quê eu estou fazendo aqui?

— A gente acabou dormindo aqui, juro que foi só isso que aconteceu. — Cal disse em voz baixa enquanto ajudava a garota a se sentar no sofá. A garota franziu o cenho, lembrando-se de que eles ficaram pelo menos meia hora se beijando no sofá até que a bebida fizesse efeito e a deixasse morta de sono.

Marina olhou para Ashton pelo canto do olho enquanto o casal no sofá sorria timidamente.

— Que estranho, agora nós dois somos a vela? — ela indagou mais para si mesma do que para Ashton enquanto cruzava os braços.

Irwin por sua vez engoliu em seco, subitamente sentindo a vontade de falar para ela que eles não seriam uma vela se ela não estivesse namorando com o idiota que a deixou sozinha na festa. Contudo, optou por ficar calado porque ele sabia que naquele momento era o melhor a se fazer.

— Vamos embora Ali? Harry me deixou sozinha, por isso que eu chamei Ashton para me ajudar a te acordar. — a garota pediu para a amiga, e se Alissa não a conhecesse bem, não teria percebido o tom levemente desesperado no seu tom de voz, como se tudo o que ela quisesse agora era deitar na sua cama e se encolher na sua tristeza.

— Claro. — balançou a cabeça positivamente, levantando-se do sofá.

Alissa olhou para Calum confusa, não sabia como se despedir dele e definitivamente não sabia o que os dois eram. Amigos que se beijavam se despediam com beijos? Abraços?

— Tchau Cal. — sussurrou, seus olhos não conseguiam se desprender do magnetismo que Calum Hood tinha sobre ela. Ele sorriu brevemente.

— Mais tarde eu te mando mensagem, tchau Ali.



Alissa estava sentada em sua cama esperando que Marina saísse do banheiro para que pudesse tomar um banho, tirar toda a maquiagem de seu rosto e finalmente ir dormir. Já era quase quatro da manhã e de alguma forma ela tinha aceitado que não conseguiria acordar no horário ideal para a aula. Ficou um bom tempo parada, apenas revivendo cada minuto daquela noite desde a conversa que ela tivera com Calum no jardim, o jogo com os meninos, os dois no sofá. Como naquela noite ela tinha entrado em contato com Calum Hood bêbado pela segunda vez, sendo que a primeira vez não foi exatamente agradável, ela devia estar no mínimo ansiosa com toda aquela situação mas isso nunca aconteceu, o que era surpreendedor. De alguma forma, a maneira carinhosa e atenciosa como ele a tratava fez com que em momento algum ela se sentisse ansiosa a respeito de suas atitudes e o que poderia acontecer mais tarde. Tudo sobre aquela noite pareceu ter sido natural para ela (tirando o fato de que Michael e Luke estavam definitivamente tentando embebedar os dois para algo a mais acontecer). E quanto mais pensava sobre o assunto, mais ela se via sorrindo sozinha e colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha. Alissa queria acreditar que aquilo não estava acontecendo, que aqueles arrepios e o quentinho no seu coração eram coisa da sua cabeça, mas seu coração não estava disposto a esquecer aquele moreno por tão cedo o que era uma droga. Já fazia mais de um ano que ela não se apaixonava e gostaria de permanecer assim. Alissa não queria admitir, mas estava com medo.

Somente a palavra que começava “a” foi o suficiente para deixá-la nervosa, e em um impulso a garota deslizou o dedo para o maço que ela tinha guardado dentro de sua bolsa e puxou um cigarro. Ela esperava que Marina não se importasse com a fumaça, já que ela nunca tinha fumado na frente da amiga. De toda forma, Alissa colocou o cigarro na boca e o acendeu com o isqueiro.

Deitou-se na cama olhando para o teto enquanto tragava em meio a fumaça. Ela sentia que em meio a fumaça os seus pensamentos eram mais coerentes e de alguma forma mais leves. Toda vez que ela tinha algum problema que estava assolando a sua mente, Alissa gostava de acender um incenso ou um cigarro. Ela era apaixonada por fumaça e vapor, adorava a sensação quente - mesmo que passageira - que a fumaça lhe passava. Adorava ver o vapor escapar de suas mãos suavemente enquanto deixava um rastro de calor.

— Alissa? — Marina a chamou.

A garota vestia uma camiseta de beisebol que provavelmente era de seu irmão mais velho e tinha os cabelos molhados indicando que tinha acabado de sair do banho. A Gonzalez franziu o cenho ao ver Alissa fumando, mas não ficou exatamente surpresa. Já tinha ouvido a amiga falar que costumava fumar no ensino médio quando estava muito nervosa.

— Sobre o quê você quer desabafar? — ela perguntou sentando-se na cama novamente, com a escuta voltada completamente para a outra.

Marina sorriu, feliz com a compreensão. Seus olhos castanhos estavam levemente avermelhados indicando que ela tinha derrubado algumas lágrimas no banho mas ainda não tinha chorado tudo o que tinha para chorar.

— Vem, senta aqui. — Alissa chamou e a garota deitou no colo da amiga, se encolhendo ali. Não demorou muito para que ela começasse a chorar baixinho enquanto a Fontes fazia um cafuné de leve no seu cabelo.

— Toda essa semana ele ficou me dando bolos, como antes do relacionamento começar. Às vezes parece que nós dois nem namoramos. Ele esquece dos nossos compromissos com a desculpa de que está atolado de provas. — Marina começou a desabafar com a voz embargada.

Foi preciso respirar fundo para que Alissa não começasse a xingar Harry com todos os palavrões que ela tinha em seu vocabulário. Ela tinha plena noção de que Direito era um curso puxado, Mas não custava absolutamente nada mandar um mensagem para a namorada desmarcando o encontro, coisa que ele nunca fez desde o começo.

Ela não queria ser aquele tipo de amiga que dá pitaco no relacionamento da outra, porque por mais babaca que Harry fosse, talvez Marina visse um lado bom nele que ela simplesmente não conseguia enxergar. Também havia o fator de que Alissa não era muito boa em se relacionar com homens, e se ela fosse usar o seu último e único “relacionamento” de exemplo… Bem, então seria não somente um exemplo mas a receita para o desastre e desgaste emocional. Afinal, quem era ela para falar sobre relacionamentos ruins se fora traumatizada por um?

— Marin, eu te disse para conversar com ele hoje mais cedo. O que aconteceu durante a conversa? — perguntou cuidadosamente, de alguma forma ela já sabia a resposta, mas queria que Marina falasse com as próprias palavras. As vezes quando nós falamos as situações que passamos em voz alta para outra pessoa, acabamos percebendo o quão absurda fora a situação.

— Ele riu, e falou coisas bem ruins sobre Calum. Disse coisas bem preconceituosas que eu prefiro não comentar-

Alissa revirou os olhos, era óbvio que Harry diria coisas preconceituosas. A garota lembrava-se muito de quando o garoto a perguntou se ela não sabia sambar simplesmente porque era brasileira, e de acordo com as palavras dele “gostosa”. Marina tinha dito que era apenas uma brincadeira, mas a Fontes já estava acostumada a lidar com esse tipo de gente, e sabia seu perfil de longe.

— Pode falar, não é uma fala preconceituosa dele que vai me afetar.

Marina suspirou.

— Ele disse que Calum queria estar com você porque você é brasileira, é fácil. Por isso que ele começou a discutir com ele na festa. E então ele começou a me dizer tanta coisa… Que eu estava o sufocando sendo que não conseguia cuidar nem da minha melhor amiga.... — a última frase fez com que ela voltasse a chorar bastante, e a Fontes só pode acariciar seus cabelos, chocada demais para digerir aquela informação — E o pior e tudo é que eu sei que sobre isso ele está certo.

— Marin, eu não sou uma criança. Não precisa se preocu-

— Ali por favor, eu vejo o como você parece um zumbi todo dia, como se nada no mundo pudesse fazê-la feliz. E então você se prende aos seus estudos porque psicologia é uma das coisas que você mais ama no mundo, só que se impede de viver. Eu sei o que você passou dois anos atrás, e sei que você também está tendo algum problema com a sua família.

— Eu não quero fazer disso algo sobre mim. — Alissa murmurou com a voz fraca, pelos seus cílios castanhos, era possível algumas lágrimas começando a se formar.

Marina olhou para a amiga e sorriu triste.

— Vamos Ali, fale. Que tal a gente fazer uma sessão de choro e desabafo?

A garota deu risada, e então acabou cedendo. Alissa faria de tudo para que ela se sentisse mais leve em relação amizade das duas.

— O problema é o meu pai.

Ela se sentou na cama, com um olhar atento. Como se soubesse que momentos como aquele, onde Alissa admitia os seus problemas eram raríssimos.

— Você nunca me falou muito dele.

— Eu não falo do meu pai, porque todo mundo fala sobre ele. Você deve conhecê-lo também, seu nome é Victor King.

Marina piscou sem conseguir acreditar, e então depois de alguns momentos de espanto a percepção passou pelo seu rosto, como se ela conseguisse enxergar pequenos traços de Victor na amiga.

— Você nunca me falou que era uma King. — a Gonzalez murmurou surpresa mas não necessariamente magoada, porque de alguma ela entendia que se Alissa tinha escondido aquela informação, era porque aquilo era algo que ela não se orgulhava.

— E é exatamente esse o problema… — Alissa suspirou, começando a contar a longa história para sua amiga.



calum hood

Calum estava deitado de qualquer jeito no seu sofá, algum filme do Tarantino passava na televisão mas ele não estava com cabeça para assistir alguma coisa. Os efeitos do álcool já tinham passado e ele infelizmente não conseguia dormir. Haviam diversas coisas passando pela sua mente naquele momento, o curso que estava fazendo na faculdade, suas notas, a preocupação dos seus pais, a banda, o contrato, as músicas…

Ele já era um pouco acostumado com a sensação de ansiedade, talvez porque ele fosse muito quieto e guardasse a grande maioria dos seus pensamentos só para si. Era como se sua ansiedade soubesse que aquele era seu calcanhar de Aquiles, e aproveitasse justamente daquilo para o sufocar de uma vez.

Contudo, por mais piegas que fosse, quando estava conversando com Alissa, Calum sentia uma leveza inexplicável. Isso era engraçado porque Aimee nunca tinha tempo para escutá-lo falar de suas composições, e muito menos Elliot que sempre estava distraído demais para se importar com o que ele falava. Já Alissa, mesmo sendo tremendamente estudiosa, entrou atrasada em uma aula apenas porque estava ouvindo ele falar sobre algo que ela não entendia absolutamente nada que seria música.

Calum apreciava isso. Ele gostava de pessoas que o escutavam quando ele decidia falar. E ele sentia que quanto mais tempo passava com ela, mais as palavras se tornavam naturais, ele sentia mais vontade de externalizar seus pensamentos.

Já havia algum tempo que ele não tinha inspiração alguma para poder escrever alguma música, mas quando ele pensava na festa que tinha acabado de acontecer na república, parecia que sua criatividade tinha voltado. Toda vez que ele se pegava pensando nos últimos momentos da festa, em como ele e Alissa se beijaram novamente e aquilo tinha sido tão natural, como se fosse para acontecer, ele só conseguia se perguntar “como eles tinham chegado ali”?

Foi como se um click tivesse acontecido no fundo da sua mente.

Hood levantou do sofá de supetão e pegou um bloco de notas e caneta que estavam jogados na mesinha de centro, rapidamente começou a escrever antes que as palavras fugissem de sua mente.



You’re telling me how you love that song

Você está me dizendo que ama aquela canção

About living on a prayer

Sobre viver em uma oração

I’m pretty sure we’re halfway there

Tenho certeza de que estamos no meio do caminho

And when I wake up next to you I wonder how

E quando eu acordar do seu lado eu me pergunto como

How did we end up here

Como é que acabamos aqui”



Ele ficou parado por alguns momentos apenas observando os versos que tinha acabado de escrever, batucando a caneta na mesa em um ritmo que ele sequer conhecia. Um sorriso cansado atravessou o seu rosto enquanto ele se levantava para pegar um violão e criar uma melodia.

cal perfeito hood [04:19 AM]

hey

hey

luke você não vai acreditar

acho que consegui compor alguma coisa

luke roberto [04:19 AM]

primeiro de tudo: por que caralho de motivo você está me mandando mensagem de madrugada

EU ESTAVA DORMINDO

e eu não acredito que vc mexeu no meu celular e alterou o nome do seu contato

seu narcisista

cal perfeito hood [04:20 AM]

a inspiração não tem hora roberto

luke roberto [04:21 AM]

certo então

amanhã você me mostra a música no estúdio

agora, pelo amor dos deuses, VAI DORMIR