Vapor

Capítulo Único


Vapor

Capítulo Único

Written by Rocker

Olhei de soslaio para Calum. Deveríamos estar fazendo o trabalho de Literatura, mas enquanto eu fazia tudo, ele estava jogado no sofá da minha sala com um violão em mãos e partituras soltas à sua frente. Eu queria muito poder reclamar de estar fazendo tudo sozinha, mas a visão de Calum reclinado sobre o violão e com mechas do cabelo tapando seu rosto enchia meus olhos e me hipnotizava. Então eu simplesmente não me importava com nada – não me importava que estávamos no último ano e em breve eu teria que decidir o que fazer da minha vida, não me importava o medo que eu tinha de acabar afastando-me de Calum com o tempo e importava-me menos ainda que eu estava apaixonada por meu melhor amigo.

O que me importava, porém, era o fato de ele estar ocupado demais com uma música que vem escrevendo há alguns dias e mal dava atenção a mim. Isso quebrava-me em tantos pedaços que nem mesmo eu sabia quantos eram.

Savour your voice, I will never forget... Não, não, não, ainda não está bom. – ele murmurava ele, dedilhando as cordas do violão mais uma vez e fazendo mais algumas anotações nas folhas. – Savour your words, I won’t ever waster them. Look in your eyes and know just what you miss. So lie to me, just lie to me.— ele abriu um sorriso nos lábios carnudos e suas bochechas grandes apertaram-se e ficaram mais evidentes com o gesto. – Bem melhor!

Respirei fundo pela milionésima vez apenas naquela tarde. O sentimento de calma começava a esvair-se de meu peito, sento substituído pelo de impaciência e incômodo. E eu não sabia se ficava mais incomodada pelo fato de ele não ajudar no trabalho que decidimos falar sobre literatura inglesa, se era porque eu estava tentando concentrar-me para ganhar uma nota que nós dois precisávamos, ou se era porque ele estava escrevendo uma música para uma garota. Ele estava escrevendo uma música para uma garota. Calum Hood jamais fazia isso e tanto eu quanto os colegas de sua banda recém-formada sabíamos disso. Então quando ele disse que estava trabalhando em uma música para uma garota, mas que ela ficaria guardada até a hora certa, eu soube que o havia perdido, mesmo nunca o tendo tido. E era definitivo apenas pelo olhar iluminado que ele tinha sempre que dedilhava as mesmas notas.

Balancei rapidamente minha cabeça, tentando fazer-me entender que um possível romance entre nós dois só existia na minha cabeça – e na de Michael, que era o único que sabia da minha paixão e que vivia dizendo que devíamos nos casar e tem sete filhos. O que aparentemente nunca iria acontecer.

Bati rápidas vezes a caneta sobre a folha A4, tentando concentrar-me novamente no que fazia antes de perder-me em pensamentos.

— ...o que poucos sabiam, porém, era que todas as irmãs Brontë se tornaram grandes escritoras da literatura inglesa por meio de pseudônimos.— murmurei baixinho, continuando o trabalho.

O que não durou muito tempo, já que segundos depois meu coração apertou-se novamente quando Calum voltou a dedilhar as mesmas notas que eu mesma já havia decorado. Desistindo definitivamente do trabalho, joguei a caneta de lado e apoiei minha cabeça sobre o tampo de vidro da mesa de centro. Sentia o olhar de Calum sobre mim, mas mesmo assim ele não me dirigiu a palavra. Sabia que não aconteceria tão cedo, não depois que Luke sem querer abriu a boca sobre o beijo que demos numa festa há alguns meses. Eu jurava que ele estava bêbado demais, e depois saber que ele apenas ignorara o beijo e agia como se nada tivesse acontecido destruía-me de dentro para fora.

Eu já me sentia tonta pela bebida e os saltos agulha que eu usava não me ajudavam em nada no equilíbrio. Eu procurava meus quatro amigos porque já estava ficando, mas depois de voltas e voltas pela casa de alguma das líderes de torcida, não consegui encontrá-los. Provavelmente estavam cada um com alguma das muitas menininhas nojentas que havia ali no colégio. E mesmo que Ashton não fosse da escola, Lindsey praticamente nos obrigou a convidá-lo por saber que ele também era parte da banda e já havia formado.

— Hey, pequena! – ouvi uma voz familiar berrar ao meu ouvido, e quando virei-me, demorei alguns segundos a mais para focalizar Calum. – Te procurei a noite inteira! – ele disse, abraçando-me forte pelos ombros e puxando-me contra si. Era possível sentir o cheiro de vodca mesmo que ele não tivesse feito isso.

— Também te procurei! – foi tudo o que consegui gritar de volta.

Calum abriu um sorriso malicioso, daqueles que ele nunca tinha aberto antes para mim. Nunca.

— Então vamos aproveitar, docinho! – e me beijou, simples assim.

E, claro, eu me deixei levar, afinal, eu estava bêbada e beijando meu melhor amigo por quem sempre fui apaixonada. Eu sabia que não deveria beber tanto, mas se eu soubesse que as consequências disso seria beijar Calum e no dia seguinte ele agir como se não se lembrasse, então eu teria evitado.

Por mais que aquele beijo tenha acendido ainda mais a chama que havia dentro do meu peito.

— Como está a música? – as palavras saíram da minha boca assim que saí dos devaneios sem meu consentimento.

Mordi o lábio inferior imediatamente, nervosa com o que ele diria.

— Está quase pronta! – exclamou ele, abrindo um dos maiores sorrisos que já vi em seus lábios.

— Que bom... – comecei, levantando-me tentando não criar suspeitas. – ... porque agora é minha vez de ler!

Antes que ele dissesse qualquer coisa que fosse, eu corri o quanto conseguia. Podia ouvir seus gritos atrás de mim e seus passos pesados seguindo os meus, mas não desisti. Não pela brincadeira em si de pega-pega, infantil demais para a nossa idade, mas apenas por aquela parte que toda garota tem que adora um masoquismo. Até porque era a única explicação para a súbita necessidade de ler algo escrito para outra garota. Gostaria de achar um culpado para isso e, por mais que no fundo eu soubesse que era eu mesma, iludia-me dizendo que era minha burrice.

— Hey, volta aqui! – Calum gritou mais uma vez, depois de termos dado uma volta ao redor da piscina nos fundos da minha casa e voltávamos à cozinha.

Foi quando senti seus dedos se prenderem no passador do meu short jeans. Por instinto, apoiei-me sobre a ilha de mármore negro, sentindo Calum abraçando minha cintura e tentando alcançar a folha. Por mais que Calum fosse alto e ele e os outros garotos deram-me o apelido de “pequena” e derivados, eu não era assim tão baixinha.

— Ora, ora, o que temos aqui... – falei, ainda me esforçando para manter minha mão longe do alcance dele. Por mais que fosse difícil, consegui finalmente a letra base da música.

I'll take what you got, got, got

I know it's not a lot, lot, lot

Cause I just need another hit

You're the thing that I can't quit

You got what I want, want, want

Here and then you're gone, gone, gone

If you told me that we were through

You know that I would break the truce



I want to breathe you in like your vapor

I want to be the one you remember

I want to feel your love like the weather

All over me, all over me

I want to print our hands in the pavement

Savour your words, I won't ever waste them

Look in your eyes and know just what you miss

So lie to me, just lie to me



So talk, talk, talk

Well tell me what I want, want, want

If I don't look into your eyes

It's almost like a perfect line

So don't stop, stop, stop

We'll take another shot, shot, shot

Cause you know you got perfect aim

I wanna feel you in my veins

— Calum, isso é... – virei-me para ele, completamente chocada. Quando ele percebeu que não descansaria enquanto não lesse, desistiu de tentar tomar novamente da minha mão.

— Uma porcaria inutilmente desnecessária? – ele chutou, fazendo uma careta como se pudesse conter sua ansiedade.

— É incrível! – murmurei, olhando diretamente para seus olhos. À medida que seus olhos começavam a brilhar, porém, dei-me que conta que aquela música incrível era para outra garota.

— O que foi? – ele perguntou assim que viu o sorriso murchar em meus lábios.

Abaixei a cabeça, tentando segurar lágrimas que ameaçavam cair.

— Sua garota vai adorar a música. – murmurei, estendendo a mão com o rascunho da música.

— O quê?! – ele pareceu incrédulo. – Que garota?

Abri um sorriso triste.

— Aquela para quem você fez a música. – deixei a folha sobre a ilha e tentei sair daquele campo minado o mais rápido possível, mas senti Calum segurando meu braço.

— Como assim? – ele pareceu surpreso. – Não tem garota nenhuma!

— Mas a música... – comecei, mas ele interrompeu-me com uma risada.

— Ela era para você!

Arregalei os olhos e meus músculos contraíram-se. Eu estava chocada com tal informação.

— M-mas...

— Sempre foi você. – ele sussurrou, sorrindo e colocando uma mão delicadamente sobre minha bochecha. – Pode parecer clichê ou idiota, mas sempre fui apaixonado pela minha melhor amiga.

Eu.

Eu sempre fui a melhor amiga dele.

— Sei que não sente o mesmo. – ele continuou enquanto eu ainda permanecia sem palavras. – Mas eu precisava falar.

Segurei seu rosto entre minhas mãos quando ele ameaçou afastar-se. Eu não sabia o que poderia dizer naquele momento, era muita coisa que para absorver, então eu simplesmente agi. Dei um passo à frente e joguei-me em seus braços. Um pouco surpreso, Calum demorou um pouco para raciocinar quando o beijei. Quando segurei sua nuca e puxei-o para mais perto, ele finalmente reagiu, abraçando minha cintura e diminuindo ainda mais o espaço já inexistente. Mordi seu lábio interior quando senti a falta de ar atingir-me e quebrei o beijo, ofegante.

— Acho que então chegou a hora de dizer que também me apaixonei por meu melhor amigo. – sussurrei contra seus lábios, a voz um pouco rouca pela falta de fôlego.

Senti que Calum sorriu sobre meus lábios antes de puxar-me para um segundo beijo.

De muitos outros que ainda viriam.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.