Roxton dirigiu até a propriedade Krux na esperança de encontrar sua amada e resolver este mal entendido. Os empregados lhe informaram que ela estava hospedada na residência do professor Summerlee. O caçador ficou confuso, mas esse era um assunto para ser esclarecido depois, a prioridade no momento era convencer a herdeira de que ele e a assistente não tinham absolutamente nada um com o outro.

Marguerite vagou pelas ruas até encontrar um carro de aluguel. A cena de Christine sentada no colo de Roxton beijando-o tão apaixonadamente e ele confidenciando que ela era uma mulher digna de sua admiração, não saiam de sua mente. “Como ele pôde me trair de forma tão baixa?” A herdeira sabia da reputação de conquistador que era atribuída a Lorde Roxton, mesmo antes de conhecê-lo, aliás todo Reino Unido sabia dela. Marguerite já havia presenciado algumas dessas conquistas baratas no tempo em que ficaram presos no platô. Entretanto, ele parecida ter mudado quando decidiu estabelecer uma relação sólida com ela. A herdeira era uma mulher experiente, já havia caído em algumas armadilhas do coração durante sua juventude e se julgava capaz de distinguir uma simples aventura de um amor verdadeiro, quando encontrava um. Mas, pelo visto ainda era boba o suficiente para acreditar em contos de fadas, com um cavaleiro de armadura reluzente salvando a pobre donzela. Ela sentiu ódio de si própria por acreditar nesta ilusão. Roxton a havia magoado de uma forma que ela pensou que ninguém nunca mais o faria e desejou do fundo do coração jamais vê-lo novamente.

O carro parou em frente à charmosa casa em que Marguerite estava hospedada. Ela subiu rapidamente as escadas e encontro Benjamin e Arthur na sala principal. Ambos se assustaram com o estado desolado que a gestante aparentava e o botânico se apressou em pegá-la pela mão e conduzi-la até a poltrona, dando ordens ao criado que trouxesse um copo com água para a jovem mulher.

“Minha criança, o que aconteceu?”

“Está tudo acabado” ela disse entre soluços “Ele não me ama”.

“Do que você está falando, Marguerite?” o médico expressava indignação na voz e começava a formular várias teorias em sua cabeça. “Será que Lorde Roxton foi tão infame a ponto de abandoná-la nesta situação?” ele pensou em silêncio.

“Roxton está tendo um romance com a sua assistente, Christine, a mulher que o acompanhou a recepção na casa de Challenger. Eu mesma os vi se beijando com muita intimidade” disse envergonhada.

“Isso não faz sentido” ponderou o professor “Por que então John a chamaria em sua mansão?”

“Provavelmente porque queria romper definitivamente nosso relacionamento” ela concluiu antes de tomar um gole da água que lhe foi oferecida.

“Mas que bastardo! Ele não levou em consideração seu estado? Eu esperava que Lorde Roxton fosse um cavalheiro mais nobre” o médico não conseguia controlar a raiva em sua voz.

“Ele não sabe sobre os bebês” a herdeira confidenciou aos amigos “E eu não quero que saiba, não quero que ele mantenha nossa relação por obrigação tampouco desejo viver como sua amante. Sou o suficiente para esses bebês”

“Querida, ninguém contará nada a John, mas você não conseguirá esconder essa gravidez por muito tempo. Ele é um homem esperto fará as contas e saberá que essas crianças foram concebidas ainda no planalto. Além disso...ele tem direito de saber que terá dois filhos e seus filhos tem o direito de saber quem é o seu pai” Summerlee falou com calma.

Marguerite o olhou indignada.

“Summerlee, eles são meus filhos! Roxton terá a oportunidade de ter quantos filhos quiser com uma esposa que a sociedade e Lady Roxton considerar adequada”.

Percebendo a alteração da jovem grávida e os possíveis danos que seu estado de espírito poderia causar a ela e as crianças, Benjamin sugeriu que eles tomassem um chá na estufa, ele sabia que este era o lugar favorito de Marguerite e que o contato com as plantas a acalmava. Ela protestou de início dizendo que não estava nervosa, mas, por fim aceitou o convite do médico.

Arthur permaneceu na sala fumando seu inseparável cachimbo e tentando achar explicações para os fatos narrados por Marguerite. O professor conhecia o caçador o suficiente para saber que não era de sua índole tratar desta maneira nenhuma uma dama, muito menos à Marguerite. Summerlee,desde o primeiro dia que conheceu o casal, percebeu a atração inevitável que o nobre sentia pela herdeira. Provavelmente o professor foi o primeiro a notar isso, com passar do tempo, Arthur testemunhou essa atração se transformar no mais genuíno amor. Roxton era leal o suficiente para proteger a qualquer membro da expedição, mas, quando o assunto era Marguerite, ele ofereceria sua própria vida de boa vontade em troca de salvá-la ou simplesmente pra ver um sorriso em seu belo rosto, o que inclusive ele já tinha feito em algumas oportunidades. A campainha soou e o professor fez sinal para a empregada sinalizando que ele mesmo atenderia ao chamado.

“John?!” perguntou surpreso.

“Arthur, onde ela está?” Roxton dispensou as formalidades e cumprimentos. Havia urgência em sua voz.

“Bem, meu jovem, eu não acho que o momento seja oportuno. Marguerite está bem, mas, chegou muito exaltada e não quer vê-lo. Dê tempo a ela” o botânico decidiu que não podia negar ao homem a informação de que Marguerite estava bem sob sua proteção, mas também sugeriu que o caçador não a enfrentasse tão repentinamente.

“Por favor, Summerlee!” John estava indignado. “Eu preciso falar com ela agora mesmo, ela entendeu tudo errado...Christine entendeu tudo errado...todos estenderam tudo errado. O universo está conspirando para me colocar em apuros”caçador passava nervosamente as mãos nos cabelo buscando alguma alternativa “Eu preciso desfazer essa confusão. Fui até a casa dela e me disseram que ela era sua hóspede. Por que isso?”

O professor pensou no que acabar de prometer a Marguerite, não era seu costume desonrar uma promessa, mas, havia muito mais coisas envolvidas numa situação como aquela. O homem a sua frente era seu amigo, salvou sua vida algumas vezes e estava desesperado por esclarecer um engano que colocaria em risco não só a sua felicidade, mas também, a felicidade se sua querida Marguerite e de duas crianças inocentes que ele já amava como seus netos.

“Escute, John, você precisa saber que Marguerite...”

“Eu sei que Marguerite está grávida, Arthur”Roxton respondeu com impaciência “esse é mais um motivo para eu querer vê-la com urgência. Por que ela não me contou sobre a gravidez? Por que não me escreveu?”

“Bem, essas são perguntas que você terá que fazer a ela. O que posso lhe dizer em sua defesa é que a gravidez de Marguerite inspira alguns cuidados, em virtude do seu histórico obstétrico. Na manhã que você partiu ela sofreu uma queda e uma concussão. Por sorte, nada grave” ele o tranquilizou quando viu a expressão de preocupação no rosto do homem mais jovem “Os empregados chamaram Benjamin e ele a convenceu de ficar conosco durante o tempo que você estivesse fora. Ela aguardou ansiosamente todos os dias pelo seu retorno.”

Roxton caminhava nervosamente de um lado ao outro da sala enquanto ouvia o que o amigo lhe contava.

“Muito obrigada, por cuidarem dela. Eu prometi protegê-la e não estava aqui para apoiá-la quando ela mais precisou de mim”.

“Oh, John, não se culpe, ela não o culpou nem por um minuto”.

“Summerlee, você me conhece, sabe que eu seria incapaz de magoá-la intencionalmente. Por favor, deixe-me falar com Marguerite” Roxton implorou.

​Marguerite sorveu o último gole da infusão de camomila que Benjamin tinha lhe servido, e depositou a xícara sobre a pequena mesa próxima a cadeira de balanço que ela estava sentada. O médico tinha razão, a bebida a deixou mais relaxada.

​“Sente-se melhor?” ele perguntou ao perceber que as feições da herdeira não expressavam mais angústia como minutos antes.

​“Sim, obrigada” Ela sorriu.

​“Marguerite, sei que não é da minha alçada, mas, me preocupo com você... o que você pretende fazer agora?”

“Você tem razão, não é da sua alçada!” respondeu ríspida, mas se arrependeu em seguida. O médico tinha sido um bom amigo, não merecia que ela o tratasse desta forma. “Desculpe-me, você não tem culpa pelo meu péssimo humor, só tem feito foi me ajudar” ela sorriu e tocou sua mão.

“Não se preocupe, eu não me ofendi”

“Bem, eu ainda não sei que rumo tomar. Mas não se preocupe que não pretendo ficar aqui com você muito mais tempo, vocês já fizeram muito por mim. O convite se estendia até o retorno de Lorde Roxton, não havia como prever que algo assim aconteceria. Eu pretendo contratar uma enfermeira que possa me acompanhar durante os últimos meses de gestação em minha mansão ou em qualquer outro lugar.”

“Ouça Marguerite, eu sei que pode parecer precipitado, mas, se você permitir, eu ficaria honrado em ajudá-la a criar essas crianças. Meu avô já a considera da família e podemos nos mudar se você quiser. Recomeçar em outro lugar, talvez Paris, você me disse que gosta tanto da cidade luz. Tenho uma boa reputação como médico, conseguiria facilmente uma posição lá” ele sugeriu com ansiedade.

Marguerite se surpreendeu com a proposta, não conseguia raciocinar e pensar em uma resposta que não ofendesse ao amigo.

“Benjamin, eu não...” ela tentou, mas, ao perceber sua negativa, o médico a interrompeu.

“Não precisa me responder agora, apenas prometa que vai pensar a respeito”.

Ela simplesmente sorriu por não saber que palavras escolher. Com um pequeno susto ela levou a mão ao ventre.

“Algo errado?” o médico parecia preocupado.

“Não” ela abriu um sorriso radiante “Os bebês... eles se mexeram” seus olhos se encheram de lágrimas de emoção.

O médico sorriu ao ver a felicidade estampada no rosto da linda mulher. Ele perguntou:

“Posso sentir?” ele se agachou ao lado da cadeira dela.

Marguerite diminuiu o sorriso, constrangida com o pedido, mas, concordou. Tomando a mão dele, ela colocou-a na posição onde havia sentido o movimento. As crianças se remexeram novamente em resposta a pressão do toque, os dois riram alegremente da sensação.

Do outro lado da parede de vidro da estufa, Roxton viu a cena com um ódio crescendo incontrolavelmente dentro de si. Ele não sabia que um ser humano era capaz de sentir tanto ciúmes sem entrar em combustão espontânea. Lamentou por não estar em posse de sua Webley 45, naquela distância ele não erraria a cabeça de Benjamin Summerlee. Em passos largos ele cruzou a entrada e gritou:

“Tire suas mãos dela!”

O casal se assustou com a fúria na voz do caçador.

“Você não me ouviu? Afaste-se dela imediatamente!” ordenou.

“Roxton, o que você está fazendo aqui?” o médico se posicionou defensivamente entre Marguerite e John.

“Isso realmente não é da sua conta. E não seja ridículo, saia da frente.” Roxton o empurrou.

“Engano seu, você está na minha casa e Marguerite é assunto meu...ela é minha paciente” Benjamin o enfrentou.

Antes que Roxton nocauteasse o médico, Marguerite interrompeu a discussão.

“John, por favor, o que você faz aqui?”

“Preciso falar com você” seu olhar era implorante.

“Eu não vejo razão para conversarmos” ela disse evitando olhar nos olhos do caçador.

“Pois eu vejo...uma bem grande...dentro da sua barriga”.

A herdeira sabia que ele não desistiria, então, decidiu que era melhor esclarecer as coisas de uma vez por todas.

“Benjamin, por favor, pode nos deixar a sós?” a contragosto o médico saiu. “Então, sobre o que você quer conversar?”

“Por que você não me contou sobre a gravidez?”

Ela sorriu sarcástica.

“Eu fiquei sabendo que estava grávida na manhã da festa na casa de Challenger. Naquela noite, eu esperava ter uma oportunidade para te dar a notícia, mas, você estava acompanhado todo o tempo”.

“Mas eu estive em sua casas depois, por que não me disse lá?”

“Eu estive a ponto de lhe revelar, mas, então,você me contou sobre a viagem e de como tinha sido difícil a conversa com sua mãe. Eu sabia o quanto era importante você fazer o que ela tinha lhe ordenado. Não quis ser um empecilho, não queria que você desistisse da viagem ou embarcasse preocupado comigo ”.

O caçador se comoveu com a atitude altruísta da herdeira. Por mais que ela sempre tentasse esconder seu coração nobre sob uma armadura egoísta, ele a conhecia e sabia que ela era capaz de fazer os maiores sacrifícios pelas pessoas que amava.

“Esta manhã” ela continuou “quando recebi sua mensagem, eu...eu fui na mesma hora ao seu encontro, pronta para lhe contar tudo, mas, quando vi aquela mulher e você se beijando, trocando confidências” ela tinha a voz carregada de magoa “eu percebi que você não estava interessado em saber desta novidade. Já tinha encontrado outra diversão, uma nova aventura. Eu deveria estar preparada para isso, já que você sequer havia me enviou uma mensagem nesses dois meses. Conclui que estivesse ocupado, só não imaginei com o que”.

“Mas, isso não faz sentido, eu enviei várias mensagens, todas sem resposta. A preocupação me consumia, por isso decidi retornar antes do tempo”.

“Ora Roxton, não me venha com desculpas. Você certamente estava muito ocupado com sua assistente para me mandar notícias, não seria primeira vez”.

“Ouça, Marguerite! Christine não significa nada, o que você viu...”

“Se ela significa ou não, isso realmente não vem ao caso” ela o interrompeu de maneira alterada “Ela não significa nada, assim como Danielle não significou, nem Isadore, nem Callista, ou Hipólita e seja lá quantas outras mais. A questão é que sua vaidade é muito grande, você não consegue por limites e sempre as deixa se aproximar demais.Deixando que elas entendam sinais errados e causando maus entendidos. Eu estou farta”.

“O que você quer dizer?”

“Que acabou Lorde Roxton. Estou te liberando da sua obrigação comigo e com meus filhos. Volte pra sua vida galante. Reconcilie-se com sua mãe,encontre uma esposa apropriada para sua posição e nos esqueça, porque eu estarei fazendo o mesmo”.

“Filhos? Marguerite, você espera gêmeos?”

“Isso não faz diferença. Agora, por favor, saia daqui” ordenou.

O caçador não podia acreditar no que estava ouvindo. Só podia ser um pesadelo do qual ele logo acordaria. Era inimaginável perdê-la, muito menos a seus filhos. No desespero de fazê-la refletir sobre o que acabara de dizer, John escolheu mal as palavras:

“Não seja ridícula, Marguerite, você sabe que não pode se afastar de mim, eu tenho direito sobre essas crianças” Roxton demorou um instante para perceber que sua frase poderia ser mal interpretada.

Marguerite olhou incrédula para o caçador. A fúria de uma tempestade tomou conta de seu ser e ela aos gritos respondeu.

“O que você quer dizer com isso? Você estaria disposto a arrancar meus filhos de mim? Eu não posso ter-me engando tanto, você é sórdido e inescrupuloso. Antes que tente alguma coisa eu sumo sem deixar rastros, você nunca saberá de nós”.

John nunca tinha visto Marguerite tão descontrolada, seu comportamento selvagem o lembrava as leoas que ele costumava caçar durante seus safaris na África. O instinto materno de proteger os filhotes era eminente em todas as fêmeas e a herdeira acabara de lhe comprovar isso . Ele a observou sem conseguir explicar que ele jamais seria capaz de tal atrocidade, que ele a queria para sempre junto dele, criando seus filhos.

Ao ouvir os gritos de Marguerite, Arthur e Benjamin vieram ao seu socorro.

“O que você fez?” indagou o médico ao lorde, enquanto a amparava em seu abraço. Em todos os anos convivendo com Marguerite, Roxton nunca a viu tão vulnerável.

“John, é melhor você sair, ela precisa se acalmar. Este estado não é aconselhável para a saúde dos bebês” aconselhou o professor.

Com relutância o caçador deixou a casa de vegetação. Ele queria abraçá–la e acalmá-la, dizer que a amava, mas sabia que sua presença ali só estava deixando Marguerite mais nervosa.

“Cuide dela pra mim, Arthur” ele pediu com tristeza.

“Não se preocupe quanto a isso.”

“Não deixe que ela fuja de mim, eu não posso perdê-la”.

“Se acalme, meu jovem, o tempo é capaz de colocar todas as coisas em seus devidos lugares”.

Roxton assentiu e sem alternativa seguiu para sua mansão pensando em uma maneira de conseguir o perdão de Marguerite. Ao chegar, decidiu que uma dose de whisky e um charuto seriam as melhores companhias para e

Entender o que pôde ter dado tão errado no plano inicial para hoje. Ao caminhar em direção a biblioteca ouviu vozes femininas. Reconheceu facilmente como sendo a de sua mãe e com um pouco mais de esforço identificou a voz de sua assistente.

“Você fez um bom trabalho Srta. Fraser, eu soube o quão transtornada aquela mulher saiu daqui mais cedo. Aquela caça fortunas da Srta. Krux ficará longe família Roxton definitivamente. Conversarei com John e vou sugerir sua promoção, pode ficar tranquila quanto a isso”. Lady Roxton dizia as palavras com satisfação em sua voz.