Luke Skywalker sentiu um arrepio. Franziu uma das sobrancelhas, intrigado com aquela sensação súbita de um frio estranho a arrefecer-lhe as costas, sob o casaco quente. Não havia motivo para se ter arrepiado. Estava no interior climatizado da Millenium Falcon e estava agasalhado, depois de ter corrido para salvar a vida, literalmente, e de a adrenalina lhe ter incendiado o sangue nas veias. Aliás, devia sentir calor e não frio. O suor ainda lhe molhava a testa e escorria, em gotas grossas, pelas têmporas, encharcava-lhe as axilas e contribuía para o seu estado de irritação e de impaciência.

Continuavam a fugir. E nunca confiara tanto naquela sucata voadora que Han Solo e Chewbacca pilotavam em voltas, piruetas e arranques súbitos, que estava prestes a salvar-lhe a vida pela terceira vez.

Na fuga da base imperial de Dantooine tinham perdido um segundo caça X-Wing, o Vermelho Onze, em combate direto contra um caça TIE que estava a ser demasiado ousado e imprudente. Este caça tivera certamente uma alegria momentânea ao ver que os seus raios laser verdes tinham conseguido abater um dos inimigos, mas era também o derradeiro dos TIE, que lutava com uma ferocidade admirável, talvez mais por desespero do que por bravura e que não tardou a conhecer o mesmo destino que os restantes quatro que tinham ficado para trás após a retirada estratégica do comandante Vikasterr. Dois disparos certeiros de Antilles acabaram com as veleidades do caça TIE que rebentou numa nuvem branca e brilhante na atmosfera crepuscular do planeta.

O saldo era positivo, malgrado as baixas, cada uma delas, na sua individualidade e na sua particularidade, a pesar na consciência de Luke Skywalker, que remoía essa contabilidade com uma insistência doentia. Não tinham perdido muita gente, os que se tinham salvado eram em número superior, mas cada um deles era um fantasma que assombraria para sempre o eventual triunfo daquela incursão rebelde a Dantooine.

Tinham morrido três soldados, um dos sargentos e dois pilotos. Tinham perdido a Jenna Shmura.

Fechou os olhos, susteve a respiração, limpou o suor da testa. Um zumbido afetou-lhe a audição, lançando uma dor perfurante e seca no cérebro que o deixou indisposto. Ele tentava fazer como Han certamente faria, como Han seguramente lhe aconselharia a fazer se soubesse do seu tormento pessoal. Se visse a questão pela perspetiva mais positiva, tinham perdido sete elementos de um total de trinta e dois que compunham o grupo, incluindo cinco androides e um wookie. Ou se pedisse uma opinião a Threepio, que se lamentava alto e lançava os braços metálicos ao ar por cada sacudidela da Millenium Falcon, as perdas representavam apenas vinte e dois por cento, numa missão que tinha, à partida, sessenta e três porcento de hipóteses de sucesso.

Qualquer uma das análises, porém, era parco consolo ao recordar-se da forma como a Jenna se tinha sacrificado por eles, da voz estridente de Wedge a relatar-lhe que o Vermelho Sete tinha sido abatido e acabava de se despenhar sobre as suas cabeças, do tom amorfo como o tenente o informou do número de baixas do assalto terrestre logo que alcançaram os transportadores que preparavam a saída do sistema.

Continuavam a fugir. Após se terem desenvencilhado dos caças adversários que tinham sido despachados para combater os X-Wing, outros caças TIE tinham surgido quando a Millenium Falcon, atabalhoada e ruidosa, esforçava-se por deixar os hangares da base imperial em chamas. Aparentemente fariam parte da escolta de Vikasterr que teria ordenado que fossem deter os rebeldes atacantes e que tinham regressado, furiosos e sedentos de vingança. Mas quantas naves teria o comandante cobarde a proteger o seu flanco? Mais do que as necessárias, certamente, a vaidade impunha-lhe uma nuvem de naves em seu redor como testemunho da sua importância, porque do nada surgiu uma esquadrilha de oito caças TIE a disparar ininterruptamente. Wedge e os dois X-Wing que restavam fizeram apelo das capacidades elásticas dos caças rebeldes para escaparem da primeira barragem de fogo e tentaram separar a esquadrilha para permitir um voo desimpedido do cargueiro corelliano.

Os TIE separaram-se, de facto, mas perceberam que os alvos se escapavam para o espaço, deixando a base incendiada e o planeta para trás. A decisão de uma perseguição fora óbvia, ninguém esperaria que os caças imperiais desistissem e a batalha recomeçou para além da atmosfera de Dantooine. Os raios laser esverdeados vinham de todos os lados, choviam mortíferos sobre a Millenium Falcon, rasgavam o vácuo apontando para os X-Wing. A manobra era clássica. Tentavam criar um cerco artificial para empurrar as quatro naves, o cargueiro e os caças, para um centro de onde não se conseguiriam evadir e assim, permitir o abate, a destruição e a explosão. Aquela era uma refrega definitiva que não admitia outro resultado que não fosse a eliminação do inimigo.

Um caça TIE explodiu em mil fagulhas alvas na grande janela panorâmica da carlinga. Luke Skywalker fincou as unhas nos braços do seu assento. Os alarmes soavam estridentes e coloridos.

— Han, vou para os canhões laser! – disse agastado. – Não podemos ficar à espera de sermos atingidos. Perdemos os escudos defletores traseiros e os dianteiros estão no limite.

— Eu sei, miúdo! – devolveu Han também irritado. – Dá-me tempo!

— Só temos três caças para nos defender e defender os transportadores. São sete caças TIE lá fora! O Wedge tem estado a portar-se bem, mas se comete um erro mínimo vamos perder mais caças dos nossos. Podemos perdê-los todos! Os transportadores não podem disparar, não foram equipados com canhões laser, mas este cargueiro está armado!

— Seis! – corrigiu Han quando a nave foi sacudida até ao derradeiro parafuso com uma segunda explosão.

— Ahn?

— Seis caças TIE lá fora.

Luke revirou os olhos. Threepio avançou, numa tagarelice articulada que indicava como estava em pânico:

— Capitão Solo, o menino Luke tem razão. Não nos resta muitas alternativas a este ataque cerrado. Ou nos entregamos após uma rendição honrosa, ou tentamos abater o máximo de caças inimigos, juntando o nosso poder de fogo ao dos X-Wing. De qualquer modo, será sempre um risco, pois os canhões laser AG-2G deste cargueiro representam apenas um acréscimo de vinte e sete por cento se manobrados com um único artilheiro e as nossas probabilidades de conseguirmos ultrapassar os caças TIE são de, aproximadamente…

— Cala-te, lata imprestável! – exigiu Han, evitando conhecer os números que Threepio tinha para apresentar. – Eras mais útil se fosses lá para trás ajudar o teu amigo a corrigir o motor de hiperpropulsão. Os cálculos que estou a receber no navegador continuam a não estar corretos.

Referia-se a Artoo. O astromec, desde que subira a bordo, ligara-se ao computador central do cargueiro para ajudar à navegação e estava a tentar calibrar o sistema para permitir o salto para o hiperespaço. Avisara na sua linguagem habitual sonora que havia algumas avarias menores e fugas não programadas de lubrificantes vários que estavam a condicionar o hiperpropulsor. Fora de imediato encarregado de fazer as correções necessárias, em pleno voo, para permitir a conclusão daquela fuga com sucesso. Um salto mal calculado para a velocidade da luz e a Millenium Falcon poderia chocar com um cometa, um asteroide ou outro corpo celeste errante.

Threepio saiu da carlinga, após um gesto de cabeça de Luke que lhe pediu paciência e que obedecesse ao contrabandista. O androide protocolar levantou-se do seu lugar e assim fez.

— Han!

— Só mais um pouco, miúdo!

Luke recostou-se nervoso na sua cadeira, sentindo o cinto prender-lhe os ombros. Continuavam a fugir. Han acreditava que mais uns segundos e conseguiriam saltar para o hiperespaço, ele queria ir disparar o canhão laser para ajudar Wedge.

Logo que abandonaram Dantooine, usara os códigos secretos de ajuda que Leia lhe tinha entregado. Introduzira os vetores para o novo destino do grupo, o sistema de Qryatus, e lançara uma comunicação para todas as naves, os transportadores e os caças, com essas indicações. De Qryatus deveriam seguir para D’Qar. Era uma rota estranha que o Império teria dificuldades em seguir, acrescentara na mensagem que selou a sua última comunicação antes de se voltarem a ver no ponto de encontro combinado, situado em Qryatus. Fechara os olhos e recordara que tinham sido essas, aproximadamente, as palavras da princesa. Uma garantia de que tudo iria correr bem depois de saírem de Dantooine. Confiava que haveria de se reencontrar com todos os sobreviventes do assalto à base imperial em Qryatus, confiava que as baixas não iriam subir para além dos tais vinte e dois porcento.

Mas continuavam a fugir e havia problemas.

Dois transportadores tinham conseguido escapar do cerco invisível que estava a ser montado pelos caças imperiais e acabavam de utilizar a velocidade da luz para sumirem e, deste modo, avançar para o destino definido. Luke sentiu-se mais aliviado. A tática de Antilles de proteção e ataque estava a resultar. Quando o terceiro transportador seguiu o caminho dos dois primeiros e também este deu o salto para o hiperespaço, o seu alívio aumentou e ele suspirou longamente.

A carlinga tremeu violentamente.

— Não foi um dos nossos, pois não?! – exclamou Luke. – Porque se tiver sido, acabou-se. Vou para os canhões!

Chewie rosnou alto.

— Não, miúdo. Cinco caças TIE!

O X-Wing de Wedge Antilles passou diante deles, atrás de um TIE.

— O teu astromec trabalha bem, miúdo. Agarra-te!

A seguir, o contrabandista puxou por duas alavancas do painel de instrumentos. As estrelas na janela transformaram-se em traços brancos, cada vez mais longos, a convergir para um centro imaginário, os traços uniram-se em longas retas e também o cargueiro corelliano saltou para o hiperespaço. Luke olhou ansioso para a sua consola. Carregou num botão, lançou um sinal mínimo, constituído por um único bipe. Dava a ordem de retirada aos caças X-Wing, reunião em Qryatus.

Recostou-se na sua cadeira.

— Isso foi arriscado – comentou.

Han espreitou por cima do ombro.

— Eu disse-te que adorava fugas complicadas.

***

A paisagem era de uma desolação agreste e selvagem. Luke fechou o casaco até ao queixo, mas mesmo assim não deixou de se sentir enregelado até aos ossos. O vento soprava com uma constância agressiva, atravessando com as suas rajadas o vasto vale rochoso e mineral de onde brotavam afiadas e esguias arestas de ferro. O céu tinha o tom da ferrugem que carcomia as lanças naturais espetadas na terra negra.

— Alguma coisa, Artoo?

O androide postava-se ao seu lado com os radares e antenas ligados aparelhados na sua cúpula que abrira os compartimentos devidos para exibir aquela parafernália de instrumentos eletrónicos de deteção e mapeamento. Os novos apêndices, sacudidos pela ventania implacável, rodavam devagar para abarcar o lugar. Enquanto o androide procedia nas suas prospeções sistematizadas, deixando soar, de vez em quando, um apito frouxo que era como uma queixa relacionada com o frio, se pudesse sentir as variações de temperatura que tanto afetavam os humanos, Luke abraçou-se e enfiou as mãos dormentes nas dobras interiores dos cotovelos, para ver se as aquecia. Tentava ver alguma coisa no horizonte, estreitava os olhos e fixava a visão num ponto específico, mas não lobrigava mais do que solidão e deserto.

Pelo menos, Tatooine era quente, mesmo quando surgiam nas lonjuras as terríveis tempestades de areia. Só arrefecia de noite e quando já se abrigava no interior confortável da quinta do tio Owen, mas nem assim se comparava àquele gelo que o vento carregava ali.

Tinham feito um desvio imprevisto. Não se queria focar naquele azar para não se enervar e começar a discutir com Han Solo, quando a culpa não podia ser somente assacada ao contrabandista, quando podia nessa explosão de génio perder a razão e ele continuava a ser o líder da missão. Ao respirar fundo sentiu o ar gélido arrefecer-lhe o nariz e o cérebro.

Durante a viagem, um alarme estridente soara na cabina da Millenium Falcon. O hiperpropulsor da nave estava com problemas e surgira a indicação no painel de navegação de que dentro de escassos minutos-padrão, por precaução, para evitar um curto-circuito fatal e um possível incêndio complicado, passariam para a velocidade subluz. Ele perguntara o que raio se estava a passar e Han respondera entre dentes que já estava à espera que algo semelhante ocorresse. Pedira num berro indignado uma definição mais precisa do que estava a acontecer à nave, acrescentando que não estava previsto nada semelhante acontecer durante uma fuga arriscada ao Império para um local secreto, ao que se seguiria nova rota para um sistema ainda mais longínquo. Não podiam fazer mais nada, acrescentara Han desligando o hiperpropulsor que se avariara. Chewbacca rosnara frustrado, nem quisera saber a reação de Threepio e Artoo no compartimento dos passageiros, se o segundo previra de algum modo aquela avaria. A nave sacudira-se e as estrelas surgiram no fundo negro do espaço. Ele enviara uma mensagem encriptada para Wedge, informando-o do que estava a acontecer à Millenium Falcon, que o piloto agora liderava o grupo, que deveriam prosseguir com o plano, seguindo sem interrupções para Qryatus e posteriormente para Ileenium, em D’Qar e que reportasse à Base Um de que eles fariam um desvio diferente antes de voltarem a Yavin Quatro. Entretanto, Han recorrera aos mapas estelares inseridos no banco de dados do sistema de navegação e encontrara um possível poiso para efetuarem as reparações necessárias e prosseguir viagem com a maior brevidade possível.

Era aquele planeta gelado e solitário, inóspito como um pesadelo sombrio coberto de metal em bruto. Nem sequer tinha um nome que se pudesse pronunciar para amaldiçoá-lo conveniente e apropriadamente, ou pelo menos não estava assinalado no mapa a que tinham recorrido para aquela escolha imprevista. Aliás, nem se podia considerar como uma escolha, pois que não tinham outra alternativa a não ser pousar naquele minúsculo mundo rochoso pois as células de combustível, assinalara Chewie, não estavam suficientemente abastecidas para grandes explorações. Em princípio seria desabitado, mas logo que a Millenium Falcon aterrou, ele tinha saído, acompanhado de Artoo e pedira ao androide que fizesse uma análise preliminar ao lugar, varrendo com minúcia as milhas próximas.

Desistiu do refúgio proporcionado pelas dobras dos cotovelos, retirou daí as mãos, uniu-as junto à boca e soprou-lhes para cima. O vento incomodava-o mais do que nunca, mas não sairia dali até Artoo dar por concluída a sua exploração. Não falara com Han Solo desde que tinham chegado ao planeta. Ficara zangado e aborrecido. Saíra da cabina cabisbaixo, passando as mãos pelo cabelo, chamara por Artoo que fora com ele, rolando obediente. O contrabandista haveria de dizer que ele estava era amuado, como uma criança contrariada, mas ele, na realidade, não desejava discutir com o amigo e não queria abrir as hostilidades com uma observação dessas, tão infantil. Uma altercação com o contrabandista não iria adiantar de nada. O frio tinha o mérito, não servia para mais nada além de emular um potente anestésico de vontades, de amolecê-lo até ao ponto da dormência. Tudo se relativizava, tudo era mais simples, o que era importante perdia valor, o que era desprezível tornava-se essencial. De facto, não queria mesmo discutir com Han Solo. O seu empenho seria mais válido a encontrar uma solução para o hiperpropulsor e não a escavar culpas.

Começava por aquela busca.

Han apareceu a descer a rampa encolhido com o frio, abraçado a si mesmo, as abas do colete negro a abanar violentamente por causa do vento.

— Ei, miúdo! Estás melhor lá dentro do que aqui fora.

— Tens razão – concordou Luke com o queixo a tremer ao pronunciar aquelas palavras. – Mas quero saber se estamos mesmo sozinhos neste rochedo.

— Se não estivermos sozinhos, mais vale não darmos a conhecer a nossa presença aqui. Não me parece que vamos encontrar gente muito simpática neste planeta.

O queixo de Han também tremia à medida que fazia o esforço de abrir a boca para falar.

— Um refúgio de malfeitores?

— Nunca encontrei bandidos em lugares civilizados.

Luke tentou sorrir. Olhou para o cargueiro corelliano, cuja sombra se alongava com o entardecer, crescendo devagar sobre os espetos férreos. A noite chegava muito depressa por aqueles lados, cogitou, Artoo teria de se despachar. Se fazia frio no fim do dia, de noite seria insuportável e potencialmente mortal. Voltou a soprar para cima das mãos geladas e insensíveis.

— É muito grave? – perguntou.

— O professor está a ajudar o Chewie a fazer um pequeno diagnóstico da situação atual. – Quando estava de bom humor, o que era no mínimo estranho naquela situação extrema, o contrabandista chamava Threepio de professor. Na maioria das vezes estava a ser sarcástico, mas denotava nesse tratamento uma espécie de admiração pelo androide protocolar. – Antes de avançarmos, precisamos de saber o estado atual dos sistemas da nave. O problema no hiperpropulsor pode não ser localizado, mas fazer parte… Bom, digamos, de uma avaria maior. Não quero mais surpresas até chegarmos ao nosso destino. Daqui seguimos diretamente para Yavin Quatro, se queres a minha opinião.

— Não podemos! – exclamou Luke.

— Claro que podemos. O Império nem imagina que estamos neste mundo esquisito, longe de qualquer centro da galáxia. É um esconderijo perfeito, onde não seremos incomodados durante muito tempo… Claro que vai ser complicado passar aqui mais do que alguns dias, pois os nossos mantimentos não abundam, mas acredito que eu e o Chewie vamos conseguir arranjar uma solução rápida para este problema imprevisto. E depois, o que nos vai adiantar seguir para Qryatus, quando entretanto, imagina, o Wedge já regressou à Base Um depois da tal estadia em Ileenium? Por que motivo iríamos para um lugar que, eventualmente, o Império já andará a investigar graças a alguma denúncia de um dos seus milhares de espiões? Ou julgas que depois de os nossos transportadores e dos nossos X-Wing passarem por Qryatus e Ileenium, não vão dar nas vistas de algum ambicioso que quer cair nas boas graças imperiais? Essa rota, embora secreta, ficará comprometida e nós seremos idiotas se prosseguirmos com esse plano.

Com alguma relutância, Luke concordou com o raciocínio de Han. Fazia sentido e tinha uma lógica indestrutível, como haveria de defender Threepio se ali estivesse com eles. E ele não queria, lembrou-se derrotado e cansado, discutir com Han.

— Esta será a nossa… rota secreta.

— Claro, miúdo! Nunca nos vão encontrar neste buraco.

— Se a avaria for maior, como estavas a dizer…

— Só precisamos que a Falcon nos leve até Yavin Quatro. Nem precisa de ser nas melhores condições… certo?

— Só precisamos do hiperpropulsor operacional o tempo suficiente para evitar outro curto-circuito.

— Certo. Estás a perceber onde quero chegar.

Luke sorriu.

— Não tínhamos estado em Dantooine a fazer reparações à Millenium Falcon?

Han também sorriu.

— Pensava que era apenas uma fachada. Eu e o Chewie não mexemos num parafuso. Se calhar devíamos ter verificado um ou outro pormenor… – Fez um esgar. – Mas julgava, sinceramente, que estava tudo bem depois da manutenção que fizemos em Yavin Quatro. Enfim, esta beleza foi sempre capaz de me surpreender.

— Também a mim.

Em todos os sentidos, acrescentou Luke mentalmente com um estremecimento provocado pelo frio que parecia se ter intensificado. Soprou novamente para as mãos crispadas, o contrabandista continuava abraçado a si próprio e agora saltava para bater com os pés, alternadamente. Em todos os sentidos, na verdade. Para o bem, quando o cargueiro corelliano lhe salvara a vida tantas vezes. Para o mal, quando o deixava encalhado naquela tumba gelada.

Um conjunto excitado de assobios quebrou-lhe o raciocínio. Han perguntou espantado:

— O que foi?

Ao decifrar a linguagem binária do astromec, Luke sentiu outro arrepio.

— O Artoo está a captar formas de vida. – Acrescentou, inquieto: – Isso será uma boa ou uma má notícia?

— Depende, miúdo… Que tipo de formas de vida?

Artoo apitava sem parar, rodando a cúpula de um lado para o outro, acrescentando informações em cascata que Luke tinha dificuldade em acompanhar. Percebia-lhe o código de comunicação binário, mas não conseguia traduzi-lo literalmente. Murmurou:

— Humanoides…

Instintivamente, Han levou a mão à coronha da sua pistola laser DL-44.

— Presumo que seja uma má notícia – completou.

— Onde?

Ao esticar o braço para apontar o horizonte, Luke sentiu os músculos rijos e gelados. A dor foi desagradável. Um amargor subiu-lhe do estômago para a garganta.

— Ali… Vinte milhas-padrão. Depois daquela cadeia de montanhas. Deve haver um vale ou coisa parecida.

— Não vai ser um passeio agradável.

— Vamos até lá? – perguntou Luke arregalando os olhos.

— Quando amanhecer. Não temos outra alternativa, miúdo. Nem que seja para verificar o que se esconde por detrás das montanhas, que tipo de inimigos teremos de esquivar ou de enfrentar.

— Pensava que não querias encontrar ninguém… E poderão não ser inimigos.

Han entortou o sorriso.

— Neste lugar? Não contava com uma festa calorosa de boas-vindas…

— Sim… Provavelmente, tens razão. Devemos ver quem mora aqui, para evitá-los. Ou talvez nos possam ajudar…

Han assentou-lhe uma palmada nas costas hirtas.

— Vamos regressar à nave. Diz ao teu amigo que guarde o radar e que vá ajudar o professor com os sistemas da Falcon. Já que se portou tão bem cá fora, vai com certeza portar-se melhor lá dentro.

Subiu a rampa a correr. Luke também subiu a rampa numa corrida, precisava de restabelecer a sua temperatura corporal. Artoo foi no seu encalço, rápido, a indicar que mesmo com um corpo artificial e metálico, também sentia, de algum modo misterioso, aquele frio cortante.