Um Cupido (quase) Flechado
Capítulo 16 - Críticas... Construtivas?
Thomas
Ela sabia. Ô se sabia.
Serena se remexia na poltrona, inquieta, tentando reprimir um sorriso sem muito sucesso. Eu estava deitado no sofá com os fones de ouvido no máximo, para caso ela resolvesse falar. É claro que ela estava esperando que eu começasse, o que, é claro, não aconteceria.
I've just seen a face
I can't forget the time or place
Where we just met.
She's just the girl for me
And I want all the world to see we've m...
— Está com fome? — indagou ela.
— Não. Vou dormir daqui a pouco.
— Você chegou cedo.
— São meia-noite.
— É, mas... Sei lá, não achei que voltaria antes das três.
— Não tem tanta coisa para se fazer em um baile.
— Não fui ao meu baile de caloura.
— Eu me lembro.
— Eu deveria me arrepender?
— Provavelmente não.
Seus olhos continuavam cravados em mim, mas fingi não notar. Minha mente estava bem longe de minha irmã, e continuaria assim.
Serena
— Ele nunca vai me contar nada, vai?
Heath deu de ombros, me abraçando mais forte.
— Provavelmente não.
— Droga.
Empurrei-o na cama, rolando para o outro lado.
—... Eu não queria ser a irmã chata.
— Você não é a irmã chata. Dê um tempo a ele.
— Quanto tempo?
Heath suspirou.
— Olha, Argent, é que às vezes você pode ser meio...
Ergui uma sobrancelha.
— Meio...?
— Crítica.
— Crítica?
— É, você... tem opiniões fortes... sobre... Bem, tudo.
— Mas as pessoas pedem minha opinião.
— Não. Elas te contam a história delas. Isso não quer dizer que elas querem uma análise completa.
— Mas...
— Argent.
Suspirei.
— Está bem! Sem mais julgamentos. Prometo.
Ele ergueu uma sobrancelha.
— Para ser sincero, estou meio curioso para ver aonde tudo isso vai dar.
Audrey
— Então, hum, você vai ao baile com Ricky Patters? — indagou Serena, com a boca meio cheia de pão de queijo.
— Eu sei que você não gosta muito dele, mas...
— Eu nunca disse isso.
— Verdade, suas palavras exatas foram "Ele me dá vontade de infincar um garfo no meu olho".
Ela torceu o nariz.
— É, isso soa como algo que eu diria... Mas ele até que é bonitinho.
— Certo? Também acho.
— Por que estamos tendo essa conversa? O Chris chamou a Celeste?
— Sei lá, mas até onde eu sei eles não vão juntos. Mas ele convidou a gente para ir de carona com eles.
— Ah, seria ótimo, exceto pelo fato de que eu preferiria tomar banho com uma torradeira lgada na tomada — ela fez uma pausa. — Mas não estou julgando. Foi só um comentário. Porque eu não julgo.
Franzi o cenho.
— Você tá bem?
— Hmmm... Claro.
— Mas qual é, S.! Eu não quero ir sozinha com eles!
— Eu até te daria carona, mas você e o Ricky teriam que ir no bagageiro da picape.
— Porra, meu sonho, Serena. Vaaaamos! Por favor!
Ela suspirou e ficou em silêncio por um minuto antes de dizer:
— Tá. Que seja.
Abri meu maior sorriso e a abracei.
— Por isso eu te amo, S.!
— Mas ainda não te perdoei pelo tema escroto.
— Sem problemas.
— Mas não estou julgando.
Serena
— Então, parabéns. Vocês concluíram a primeira parte do treinamento — anunciou o professor Oyler, batendo palmas. — É agora que a coisa fica brutal.
Nós nos entreolhamos, tentando identificar as reações. Matthew Coltello parecia muito calmo, como se a simples ideia de competição lhe satisfizesse.
— Vamos dividi-los em grupos — continuou o sr. Goodman. — O grupo vencedor ganha a bolsa. Os outros, não. Vão ajudar na papelada de alguns casos da firma antes de serem designados ao caso final. Quando eu chamar seus nomes, deem um passo à frente.
E assim foi. O grupo de Matthew estava bem forte. Ele era muito bom, e estava com alguns caras mais velhos que eram verdadeiros crânios.
— Argent — chamou o sr. Goodman. Dei um passo à frente. — Burke — o cara encorpado e caladão que ficara comigo na primeira tarefa. — Truman. Layhead. Filker.
Observei meu grupo. Não me lembrava de nenhum deles das aulas.
— E então, o que acham? — indagou o sr. Oyler quando os grupos acabaram de ser formados. — Temos alguns competidores fortes. Coltello, Drayson, Joyson, Argent... — Matthew soltou um risinho. — O que foi?
— Todo mundo sabe que a Argent só está aqui por causa da mãe dela — Matthew deu de ombros.
Meu queixo caiu.
— Eu estava no seu time! Que, por acaso, ganhou a tarefa!
Ele cravou os olhos verdes em mim.
— Exatamente. Você estava no meu time. Por isso sei que é superestimada.
— Você vai ver o que é superestimado, seu grande pedaço de...
— Eeei, calma lá — o sr. Oyler interviu. — Todos aqui se provaram capazes. Agora vão conhecer seu grupo.
Sentei-me numa das mesas com o meu.
— Nós vamos ganhar essa bolsa — falei, séria. — Agora é pessoal. E mais que isso... Nós vamos garantir que aquele italiano filho de uma vaca não ganhe.
Franklin Filker, um cara magricela de óculos, pigarreou.
— Bem... Estatisticamente, ele têm o time mais forte, sabe. A maioria já fez cursos suplementares em grandes universidades, e chegou aqui com muitas cartas de recomendação.
— E vocês chegaram aqui como? Oras, não somos burros.
— Tipo, tem aquele filme lá, Os Estagiários — argumentou Lissa Layhead. — Deu certo pra eles, né. Tipo, eram meio fracassados, tipo a gente.
Silêncio. Ross Truman se remexia na cadeira, como se tivesse tomado muito café, mas não disse nada. Então resolvi me pronunciar:
— Escuta, eu entendo. Não temos muita experiência e tal. Matthew e os outros são tipo Barbies agora — levantei-me, rondando a mesa. — E nós somos como aquela amiguinha morena dela, Teresa. Ninguém se lembra da Teresa, porque a Teresa nunca quis ser lembrada. Ela só fica ali no canto da prateleira se contentando em ser mais barata e vir com menos acessórios. Mas nós não vamos aceitar isso! — bati teatralmente na mesa. — Nós vamos lutar! E nós vamos vencer! OU VOCÊS QUEREM SER A TERESA?!
Silêncio por um momento.
— Bem — Burke deu de ombros. Acho que eu nunca o ouvira falar, nem mesmo na tarefa anterior. — Estou mesmo com vontade de chutar algumas bundas.
— VAMOS CHUTAR BUNDAS! — gritou Truman, levantando-se também. Os outros o seguiram, exceto Burke, que permaneceu sentado fitando a mesa.
O sr. Oyler se aproximou.
— Parece que a coisa deu certo aí, hein?
Abri um sorriso satisfeito.
— Estamos prontos.
Damien
Peguei um terno emprestado de Thai e uma máscara preta simples que Celeste havia feito. Ela cobria a maior parte do meu rosto, conforme eu pedira. Claro que ela não entendia a gravidade do que havia me pedido para fazer.
Eu não estava preparado para ver Heath e Serena. Celeste os mencionava às vezes e eu fingia não ligar, mas por dentro parecia que toda a minha energia estava sendo sugada gradativamente. Não sobrava mais muita.
— Você está bem? Consigo ouvir seu coração — disse Celeste. Maldita audição Nefilim. — Está desritmado.
— Ótimo. Estou ótimo.
Ela não insistiu. Ficava remexendo o vestido azul, inclinando o corpo para frente e para trás com os saltos baixos. Estava muito bonita, e pensei que seria educado dizer isso a ela, mas estava irritado demais.
Ouvimos uma buzina, então fomos até a calçada, onde estava estacionado o carro de Christopher Jacobs, cujo era — é claro — um potencial ator de série da CW, com o cabelo impecável e o terno preto caro. Era o tipo de cara que eu conhecera em meu ano de colegial e aprendera que não me dava muito bem.
Coloquei a máscara, ignorando os protestos de Celeste.
— Oi, pessoal! — ela sorriu. — Esse aqui é o meu amigo Da...
— David — apressei-me em apresentar-me, forçando um sorriso. — É um prazer.
— Oi! — disse a garota no banco do passageiro. — Sou a Maya. Prazer em conhecer vocês.
Celeste franziu o cenho para a garota sem que ela percebesse e entrou no carro. Sentada no banco de trás estava Audrey Miller. Engoli em seco e sentei-me o mais longe possível dela.
— Só mais uma parada e direto para o baile — anunciou Christopher.
Minhas preces foram perdendo forças quando comecei a reconhecer o caminho. Eu costumava fazê-lo todos os dias. Logo havíamos parado na casa dos Argent, e sentada no degrau da porta estava a própria.
Serena Argent levantou-se, ajeitando os saltos pretos, e deu uns tapinhas no vestido roxo rodado. Observei seus olhos azuis cravarem-se no nosso carro e logo minha mão estava na porta, prestes a comandar uma fuga desesperada.
Como nunca fora próximo de Serena, não imaginara que vê-la fosse trazer tantas emoções. Senti mais coisas por ela naquele segundo do que sentira em um ano inteiro.
— Cadê o Heath? — Chris perguntou.
Ela encarou-o. Não gostava dele. Eu conhecia aquele olhar, ela o lançara para mim algumas vezes.
— Ele ficou preso no trabalho, vai nos encontrar lá.
— Ainda bem, porque não tem mais espaço nessa coisa — murmurou o garoto ao lado de Audrey, que imaginei ser seu par.
Serena ergueu uma sobrancelha.
— Beleza, Ricky, da próxima vez a gente te faz um favor e te larga ir de ônibus.
É, ela não mudara nada. Isso foi um pouco reconfortante, surpreendentemente.
Serena sentou-se ao meu lado.
— E aí? A cola quente da máscara grudou na sua cara? — ela indagou. — Mas não estou julgando. Porque eu não julgo. E tal.
— É que ela é difícil de tirar — falei baixo e tentei engrossar a voz para que ela não a reconhecesse. Felizmente, ela não prestava muita atenção no que as pessoas diziam.
Foram dez minutos infernais até a escola, mas chegamos. Serena ficou esperando na porta do ginásio, e Celeste se ofereceu para esperar com ela, mas eu a puxei para longe.
— Não é educado deixar Serena sozinha — argumentou a ruiva.
— É, eu não ligo — continuei puxando-a cada vez mais para dentro do baile. Daria qualquer coisa para não ver Heath naquela noite.
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